A C Ó R D Ã O
(Ac. 6ª Turma)
GMACC/ars/afs
AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO DO ACÓRDÃO. RECURSO ORDINÁRIO. EFEITO DEVOLUTIVO EM PROFUNDIDADE. FUNDAMENTO DA DEFESA E CONTRARRAZÕES NÃO EXAMINADO PELO TRIBUNAL. RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO . Tendo o Tribunal a quo reformado a sentença para julgar procedentes em parte os pedidos, as questões afetas à União trazidas em contestação e renovadas em contrarrazões deveriam ser apreciadas. A União, como parte então vencedora, não tinha interesse recursal para atacar a sentença, com insistência no fundamento da defesa que não tinha sido acolhido, notadamente sua responsabilização no pagamento dos créditos trabalhistas. Assim, tal tema estava dentro da esfera da devolutividade do recurso ordinário agitado (como na apelação civil), cabendo ao Tribunal apreciar expressamente, com a devida fundamentação (Súmula 393/TST). Não o fazendo, mas se limitando a condenar o segundo reclamado, vulnera diretamente o art. 93, IX, da Constituição Federal. Recurso de revista conhecido e provido.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR-92000-74.2007.5.04.0733 , em que é Recorrente UNIÃO (PGU) e são Recorridas MARIA GLACI GUEDES e SANTOS & ALVES ASSESSORIA EMPRESARIAL LTDA.
O egrégio Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, por meio do v. acórdão de fls. 340/342, reformou parcialmente a sentença para condenar as reclamadas ao pagamento das diferenças de adicional de insalubridade pago pela base de cálculo, incidindo sobre o salário-mínimo nacional integral, com reflexos, e honorários advocatícios.
Embargos declaratórios da União às fls. 347/348, aos quais se negou provimento às fls. 350/350-v.
A União interpôs recurso de revista às fls. 355/367, com fulcro no art. 896, alíneas “a” e “c”, da CLT. Suscitou preliminar de nulidade por ausência de fundamentação, com esteio no art. 93, IX, da CF; indicou violação dos arts. 71, § 1º, da Lei 8.666/93, 5º, II, 37, caput , § 6º, da CF para corroborar a tese de que não pode ser responsabilizada, ainda que subsidiariamente. Quanto às diferenças de adicional de insalubridade, apontou violação dos arts. 58-A, caput , e 192 da CLT, mencionando a OJ n.º 358 da SBDI-1 do TST. Por fim, insurgiu-se contra a condenação em verba advocatícia, nos termos das Súmulas 219 e 329 do TST e do art. 14 da Lei 5.584/70.
O recurso foi admitido à fl. 369.
Contrarrazões não foram apresentadas.
Por meio do parecer de fls. 375/377, o douto Ministério Público do Trabalho opinou pelo conhecimento parcial do recurso e pelo seu provimento para extirpar da condenação o pagamento de honorários advocatícios.
É o relatório.
V O T O
O recurso é tempestivo (fls. 353 e 355), subscrito por procurador regularmente constituído nos autos (OJ 52 da SBDI-I), e é regular o preparo (isento nos termos da lei).
PRELIMINAR DE NULIDADE. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO
Conhecimento
A União, com supedâneo no art. 93, IX, da Constituição Federal, alega que foi condenada em instância regional, sem qualquer fundamentação a respeito.
Realmente, razão assiste à ora recorrente.
Não obstante o juízo de primeiro grau tenha julgado improcedentes os pedidos da reclamação, emitiu tese acerca da responsabilidade subsidiária da União, com base na Súmula 331, IV, do TST.
Somente a reclamante interpôs recurso ordinário, não se olvidando que a União ofereceu contrarrazões (fls. 310/318) enfrentando o tema de sua responsabilização.
O Regional modificou parcialmente a sentença para deferir parte dos pedidos e consignou, apenas na parte dispositiva, que as reclamadas eram condenadas a pagar as verbas concedidas. Nada dispôs, portanto, acerca da legalidade da responsabilização da União.
Impende gizar que não se trata de aplicar ao caso a Súmula 297, I, desta Corte, haja vista o teor da OJ n.º 119 da SBDI-1, no sentido de que, uma vez que a violação (ausência de fundamentação) nasceu na própria decisão recorrida, inexigível o prequestionamento. Assim, a despeito de a União não ter ventilado tal matéria nos embargos declaratórios por ela opostos, possível é o exame nesta Corte.
Com efeito, tendo o Tribunal a quo reformado a sentença para julgar procedentes em parte os pedidos, as questões afetas à União trazidas em contestação e renovadas em contrarrazões deveriam ser apreciadas. Frise-se: a União, como parte então vencedora, não tinha interesse recursal para atacar a sentença, com insistência no fundamento da defesa que não tinha sido acolhido, notadamente sua responsabilização no pagamento dos créditos trabalhistas. Assim, tal tema estava dentro da esfera da devolutividade do recurso ordinário agitado, ainda que pela reclamante (como na apelação civil), cabendo ao Tribunal apreciar expressamente, com a devida fundamentação. Não o fazendo, mas se limitando a condenar o segundo reclamado, vulnera diretamente o art. 93, IX, da Constituição Federal.
Nesse sentido é firme a jurisprudência desta Corte, cristalizada na Súmula 393, que assim estabelece:
“ RECURSO ORDINÁRIO. EFEITO DEVOLUTIVO EM PROFUNDIDADE. ART. 515, § 1º, DO CPC (conversão da Orientação Jurisprudencial nº 340 da SBDI-1) - Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005
O efeito devolutivo em profundidade do recurso ordinário, que se extrai do § 1º do art. 515 do CPC, transfere automaticamente ao Tribunal a apreciação de fundamento da defesa não examinado pela sentença, ainda que não renovado em contra-razões. Não se aplica, todavia, ao caso de pedido não apreciado na sentença. (ex-OJ nº 340 da SBDI-1 - DJ 22.06.2004).”
Em situação análoga à dos autos, assim decidiu este Colendo Tribunal:
“RECURSO DE REVISTA. RECURSO ORDINÁRIO. EFEITO DEVOLUTIVO EM PROFUNDIDADE. FUNDAMENTO DA DEFESA NÃO EXAMINADO NA SENTENÇA. RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO DAS FÉRIAS. Esta Corte uniformizadora, interpretando o art. 515, §§ 1º e 2º, do Código de Processo Civil, consolidou o entendimento, consubstanciado na Súmula nº 393, de que o efeito devolutivo em profundidade do recurso ordinário, transfere automaticamente ao Tribunal a apreciação de fundamento da defesa não examinado pela sentença, ainda que não renovado em contrarrazões. Não se impõe ao réu, que obteve vitória integral, o ônus de reiterar expressamente, na instância recursal, as questões ou fundamentos da defesa, não acolhidos em 1º Grau de jurisdição. Essas questões, de qualquer modo, não sofrem os efeitos da preclusão e ficam sujeitas à cognição do Tribunal Regional, em caso de recurso da parte sucumbente em 1º Grau. Na hipótese vertente, o Tribunal Regional, ao dar provimento ao recurso ordinário interposto pelos reclamantes para afastar a pronúncia da prescrição total, não examinou a questão concernente à responsabilidade do reclamado pelo pagamento das férias relativas ao período aquisitivo do ano de 1996, articulada na contestação e não apreciada pela sentença, que extinguira o processo pela ocorrência da prescrição total. Recurso de revista conhecido e provido.” (Processo: RR - 9022900-53.2003.5.02.0900, data de julgamento: 16/12/2009, Relator Ministro: Walmir Oliveira da Costa, 1ª Turma, data de divulgação: DEJT 5/2/2010.)
“RECURSO DE REVISTA. DIFERENÇAS SALARIAIS DECORRENTES DA NÃO CONCESSÃO DE REAJUSTES PREVISTOS EM CONVENÇÃO COLETIVA. FUNDAMENTO NÃO APRECIADO NA SENTENÇA. EFEITO DEVOLUTIVO EM PROFUNDIDADE DO RECURSO ORDINÁRIO . 1. O efeito devolutivo em profundidade do recurso ordinário transfere automaticamente ao Tribunal Regional a apreciação de fundamento da defesa não examinado na sentença. 2. Recurso de revista a que se dá provimento, para afastar a preclusão, quanto ao exame de argumento apresentado em defesa pela Reclamada, e determinar o retorno dos autos ao Tribunal Regional, a fim de que analise o pedido de pagamento de diferenças salariais, como entender de direito.” (Processo: RR - 279300-86.2003.5.02.0019, data de julgamento: 3/2/2010, Relator Ministro: Fernando Eizo Ono, 4ª Turma, data de divulgação: DEJT 26/02/2010.)
Conheço do recurso por violação do art. 93, IX, da Constituição Federal.
Mérito
Conhecido o recurso por violação a preceito constitucional, seu êxito é mero corolário.
Dou provimento ao recurso para, anulando os acórdãos de fls. 340/342 e 350/350-v., determinar o retorno dos autos ao Tribunal de origem, a fim de que analise e fundamente a responsabilização da União ao pagamento dos créditos trabalhistas, como entender de direito. Fica prejudicada a apreciação das demais matérias ventiladas no recurso de revista, nesta assentada.
ISTO POSTO
ACORDAM os Ministros da Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer do recurso, por violação do art. 93, IX, da Constituição Federal, e, no mérito, dar-lhe provimento para, anulando os acórdãos de fls. 340/342 e 350/350-v., determinar o retorno dos autos ao Tribunal de origem, a fim de que analise e fundamente a responsabilização da União ao pagamento dos créditos trabalhistas, como entender de direito. Fica prejudicada a apreciação das demais matérias ventiladas no recurso de revista, nesta assentada.
Brasília, 24 de março de 2010.
AUGUSTO CÉSAR LEITE DE CARVALHO
Ministro Relator