A C Ó R D Ã O
Tribunal Pleno
GPACV/rdc
REPRESENTATIVO PARA REAFIRMAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. INCIDENTE DE RECURSO REPETITIVO. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. ABASTECIMENTO DE AERONAVE. ÁREA DE OPERAÇÃO. Diante da manifestação de todas as Turmas do Tribunal Superior do Trabalho e da C. SBDI-1 indica-se a matéria a ter a jurisprudência reafirmada, em face da seguinte questão jurídica: É devido adicional de periculosidade em razão do labor em área de abastecimento de aeronaves? Para o fim de consolidar a jurisprudência pacificada no Tribunal Superior do Trabalho, deve ser acolhido o Incidente de Recurso de Revista para o fim de fixar a seguinte tese vinculante: É devido o adicional de periculosidade aos empregados que exercem suas atividades na área de abastecimento de aeronaves, ainda que não atuem diretamente nesta função, desde que na área externa da aeronave, uma vez que esta área se caracteriza como de risco na forma do Anexo 2 da NR 16 do MTE.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista nº TST- RR - 0001038-15.2023.5.12.0056 , em que é RECORRENTE PATRICIA PADOIN CHIESORIN e é RECORRIDO GOL LINHAS AEREAS S.A. .
O presente recurso é representativo de controvérsia que, a despeito de estar pacificada nas oito turmas e na Subseção I de Dissídios Individuais do TST , ainda enseja elevada recorribilidade, em razão de resistente divergência entre os Tribunais Regionais, colocando em risco a segurança jurídica e a missão constitucional deste Tribunal Superior, enquanto Corte de Precedentes responsável pela unidade nacional do direito, nas matérias de sua competência.
A utilização da sistemática de demandas repetitivas tem por finalidade aumentar a segurança jurídica proporcionada ao jurisdicionado, pois consolida a jurisprudência e reduz, consequentemente, a litigiosidade nas Cortes superiores.
Apresentada, portanto, a presente proposta de afetação do processo TST-RR-0001038-15.2023.5.12.0056 como Incidente de Recurso Repetitivo junto a este Tribunal Pleno, a fim de examinar a possibilidade de reafirmação de jurisprudência da Corte, nos termos do art. 132-A e parágrafos, do RITST, com o fim de dirimir a seguinte questão jurídica:
É devido adicional de periculosidade em razão do labor em área de abastecimento de aeronaves?
No caso em exame, se trata de tema a ser reafirmado no recurso de revista Patricia Padoin Chiesorin (AUTORA), em que consta a matéria acima delimitada “ADICIONAL DE PERICULOSIDADE” – “PERMANÊNCIA EM ÁREA DE ABASTECIMENTO DE AERONAVE”.
É o relatório.
V O T O
ADMISSIBILIDADE DE INCIDENTE DE RECURSO DE REVISTA REPETITIVO PARA REAFIRMAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO TST
A formação de precedentes obrigatórios constitui um dos principais mecanismos de gestão processual introduzidos pelo legislador nas últimas décadas. A despeito de reiterados recordes de produtividade, é essencial que seja enfrentado de forma célere, coerente e isonômica o exponencial crescimento da demanda, conforme demonstram as estatísticas do Tribunal Superior do Trabalho, que vem recebendo um volume maior de novos processos em comparação com os últimos anos. São números incompatíveis com a estruturação do Poder Judiciário, cujas cortes de vértice são funcionalmente destinadas a dirimir as novas controvérsias nacionais, sem repetição do mesmo labor já realizado nas instâncias ordinárias, sob pena de comprometimento da isonomia, segurança jurídica e razoável duração do processo (CF, art. 5º, caput e LXXVIII).
Assim é que esta Corte Superior, com inspiração na prática já tradicional no Supremo Tribunal Federal, para fins de maior celeridade na formação de precedentes obrigatórios em matérias já conhecidas e sedimentadas, adotou fluxo procedimental (cf. Emenda Regimental n. 7, de 25/11/2024 ), segundo o qual:
“Art. 132-A. A proposta de afetação do incidente de recurso repetitivo (...) será necessariamente incluída em pauta de sessão virtual e deverá conter o tema a ser afetado.
§ 2º As disposições dos arts. 133 e 134 do Regimento Interno são aplicáveis, no que couber, ao procedimento de afetação do incidente de recurso repetitivo, vedada em qualquer caso a remessa do processo inserido em sessão virtual à sessão presencial , para os fins previstos no caput deste artigo. (...)
§ 5º O julgamento de mérito do incidente de recurso repetitivo, no caso de mera reafirmação de jurisprudência dominante da Corte, também será realizado por meio do Plenário Eletrônico, na mesma sessão virtual que decide sobre a proposta de afetação.
§ 6º Quando designada sessão virtual para afetação de incidente de recursos repetitivos, com proposta de reafirmação de jurisprudência, eventuais sustentações orais quanto ao mérito deverão ser necessariamente juntadas por meio eletrônico , após a publicação da pauta e até 48 horas antes de iniciado o julgamento em ambiente virtual.”
Compete ao Presidente do Tribunal “ indicar recurso representativo da controvérsia, dentre aqueles ainda não distribuídos, submetendo-o ao Tribunal Pleno para fins de afetação de IRR (...), inclusive mediante reafirmação de jurisprudência” (RITST, art. 41, XLVII), quando houver “ multiplicidade de recursos de revista (...) fundados em idêntica questão de direito , (...) considerando a relevância da matéria ou a existência de entendimentos divergentes entre os Ministros da Subseção ou das Turmas do Tribunal ”.
Quanto à multiplicidade de recursos sobre o debate da questão jurídica no Tribunal Superior do Trabalho, a despeito de já estar aqui sedimentado, veja-se que simples consulta ao acervo jurisprudencial do TST, a partir da temática ora em exame, revelou 47 acórdãos e 261 decisões monocráticas , nos últimos 12 meses (pesquisa realizada em 11/03/2025 no sítio www.tst.jus.br).
A relevância da formação de precedente obrigatório sobre o tema se configura justamente pelo fato de que a jurisprudência persuasiva desta Corte não se mostrou, até o presente, suficiente para garantir a unidade do Direito nacional em relação a tal matéria, havendo entendimentos dissonantes nos Tribunais Regionais, os quais ainda fomentam elevada recorribilidade.
O posicionamento do Tribunal Superior do Trabalho pode ser sintetizado no sentido de que é devido o adicional de periculosidade aos empregados que exercem suas atividades na área de abastecimento de aeronaves, uma vez que se caracteriza como área de risco na forma do Anexo 2 da NR 16 do MTE..
Nesse sentido, a jurisprudência de todas as Turmas desta Corte Superior:
AGRAVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI N.º 13.467/2017. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. DESENVOLVIMENTO DE ATIVIDADES NA ÁREA DE RISCO DURANTE O ABASTECIMENTO DE AERONAVE. PAGAMENTO DEVIDO. TRANSCENDÊNCIA NÃO RECONHECIDA. 1. Confirma-se a decisão agravada que negou seguimento ao agravo de instrumento, por ausência de transcendência. 2. Na hipótese, o Tribunal Regional do Trabalho, valorando os fatos e as provas dos autos, consignou que "resta caracterizada a condição de periculosidade nas atividades da Reclamante, em conformidade com o Anexo 2 da NR - 16 da Portaria 3.214/78, em função da execução de atividades em área de risco de reabastecimento de aeronaves e equipamentos de forma habitual e intermitente". 3. Diante das premissas fáticas assentadas, insuscetíveis de reexame nesta fase recursal extraordinária, ante os termos da Súmula n.º 126 do TST, constata-se que o acórdão regional alinha-se à jurisprudência atual, iterativa e notória desta Corte Superior, segundo a qual, uma vez estabelecido que o empregado exerce suas atividades na área de risco, onde se dá o abastecimento das aeronaves, ressalvadas tão somente as hipóteses em que sempre permanece no seu interior (o que não é caso), mostra-se devido o pagamento do adicional de periculosidade . Incidência do artigo 896, § 7º, da CLT e da Súmula n.º 333 do TST. Agravo não provido. (...) (Ag-AIRR-1000754-67.2020.5.02.0316, 1ª Turma , Relator Desembargador Convocado Joao Pedro Silvestrin, DEJT 11/09/2023).
"AGRAVO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI 13.467/2017. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. TRABALHO REALIZADO NA ÁREA DE ABASTECIMENTO DAS AERONAVES . Está consignado no acórdão regional, mediante análise do conjunto fático-probatório, em especial do laudo pericial, que a reclamante desenvolvia suas atividades habitualmente em área de risco. Levando-se em consideração esta premissa, inviável de ser reexaminada nesta instância (Súmula 126 do TST), a decisão regional está em consonância com a atual, iterativa e notória jurisprudência desta Corte, a qual se firmou no sentido de que é devido o adicional de periculosidade aos empregados que exercem suas atividades na área de abastecimento de aeronaves, excluindo-se apenas aqueles que permanecem dentro da aeronave durante o abastecimento (Súmula 447 do TST), hipótese não configurada nos autos . Agravo conhecido e não provido" (AIRR-1000485-85.2021.5.02.0318, 2ª Turma , Relatora Ministra Delaide Alves Miranda Arantes, DEJT 14/03/2025).
"AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. PROCESSO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.015/2014. AÇÃO COLETIVA. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. TRABALHO EM ÁREA DE ABASTECIMENTO DE AERONAVES. MATÉRIA FÁTICA. SÚMULA 126/TST . O entendimento desta Corte é o de que o adicional de periculosidade é devido aos empregados que exercem suas atividades na área de abastecimento de aeronaves, excluindo-se apenas aqueles que permanecem a bordo durante o período de abastecimento (Súmula 447/TST) . Na hipótese, o Tribunal Regional, com base no conjunto fático-probatório, especialmente o laudo pericial, constatou que os substituídos desenvolviam suas atividades no pátio de manobras, expostos a risco devido ao abastecimento de aeronaves. Evidenciado que o trabalho se dava em área externa, reconhecidamente de risco, correta a decisão que condenou a Reclamada ao pagamento do adicional de periculosidade conforme a Norma Regulamentadora 16 (NR 16). Agravo de instrumento desprovido" (AIRR-0010954-10.2013.5.07.0009 , 3ª Turma , Relator Ministro Mauricio Jose Godinho Delgado, DEJT 01/07/2024).
(...) 2. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. INFLAMÁVEIS. LABOR EM ÁREA DE ABASTECIMENTO DE AERONAVES. PÁTIO DE AERONAVES. AUXILIAR DE RAMPA . NÃO PROVIMENTO. I. A jurisprudência desta Corte possui o entendimento no sentido de que o desempenho de atividades na área de abastecimento das aeronaves dá direito à percepção do adicional de periculosidade, ainda que o Empregado não tenha contato direto com a substância inflamável . II. A decisão regional está em harmonia com a jurisprudência desta Corte sobre a matéria, o que obsta o conhecimento do recurso de revista (art. 896, § 7º, da CLT e na Súmula nº 333 do TST). III. Agravo de instrumento de que se conhece e a que se nega provimento. (AIRR-1259-78.2014.5.10.0020, 4ª Turma , Relator Ministro Alexandre Luiz Ramos, DEJT 07/06/2019).
(...) RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. ATIVIDADES REALIZADAS NA RAMPA JUNTO ÀS AERONAVES. A SBDI-1 deste TST adota entendimento de que o desempenho de atividades na área de abastecimento das aeronaves dá direito à percepção do adicional de periculosidade, pois exercidas dentro da área de risco . Portanto, o entendimento fixado pelo acórdão regional, de que o reclamante não faz jus ao adicional de periculosidade este em desacordo com a jurisprudência pacificada desta Corte (sic). Recurso de revista conhecido e provido. (RR-10898-60.2014.5.15.0092, 5ª Turma , Relator Ministro Breno Medeiros, DEJT 28/06/2019).
ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. ABASTECIMENTO DE AERONAVE. ÁREA DE RISCO. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA RECONHECIDA. Cinge-se a controvérsia a respeito do pagamento do adicional de periculosidade aos empregados que permanecem trabalhando na pista durante o abastecimento de aeronaves. O Tribunal Regional concluiu que “Portanto, à exceção daqueles que realizavam o abastecimento das aeronaves, as atividades executadas pelos empregados que laboram no pátio de estacionamento das aeronaves não são perigosas ” . No entanto, esta Corte tem adotado o entendimento de que a permanência do empregado na pista durante o abastecimento das aeronaves enseja direito ao pagamento do adicional de periculosidade, porquanto caracterizada área de risco . Verifica-se a transcendência política da causa. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-994-62.2018.5.12.0026, 6ª Turma , Relator Ministro Antonio Fabricio de Matos Goncalves, DEJT 06/12/2024).
RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO DO REGIONAL PUBLICADO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.467/2017. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. ABASTECIMENTO DE ARERONAVE. PERMANÊNCIA EM ÁREA DE RISCO. TEMPO DE EXPOSIÇÃO. TRANSCENDÊNCIA POLÍCITA. A lide versa sobre o direito ao pagamento do adicional de periculosidade em face da permanência na área de abastecimento de aeronaves. A Corte Regional manteve a improcedência do pleito de pagamento do adicional de periculosidade ao fundamento de que o tempo de exposição era eventual e extremamente reduzido (9 minutos), apesar de ser diário. No caso em exame, restou evidenciado que o trabalho exercido pelo reclamante não se dava no interior da aeronave, mas, sim, em aérea externa, reconhecidamente de risco, diante das proximidades ao abastecimento de aeronaves. A jurisprudência desta Corte Superior é no sentido de que a permanência do empregado na pista durante o abastecimento das aeronaves gera direito ao pagamento do adicional de periculosidade, em razão da possibilidade de a qualquer momento haver uma explosão, evidenciando-se dessa forma a exposição intermitente, nos termos do item I, da Súmula 364 do TST . Precedentes. E nem se alegue que o tempo de 9 minutos diários era extremamente reduzido para fins de afastar o direito ao recebimento do referido adicional. Com efeito, esta Corte Superior tem entendido que o conceito jurídico de tempo extremamente reduzido, a que se refere à Súmula nº 364, I, envolve não apenas a quantidade de minutos considerada em si mesma, mas também o tipo de perigo ao qual o empregado é exposto. Precedentes. Recurso de revista conhecido por violação do art. 193 da CLT e provido (RR-1708-21.2015.5.12.0028, 7ª Turma , Relator Ministro Alexandre de Souza Agra Belmonte, DEJT 26/05/2023).
(...) ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. DESCONSIDERAÇÃO DO LAUDO PERICIAL QUE CONCLUIU CARACTERIZADA A PERICULOSIDADE PELO LABOR DOS SUBSTITUÍDOS EM ÁREA DE RISCO. IMPOSSIBILIDADE. INEXISTÊNCIA DE OUTROS ELEMENTOS DE PROVA NOS AUTOS. AUXILIAR DE RAMPA E LÍDER DE RAMPA. ÁREA DE RISCO. ABASTECIMENTO DE AERONAVE. PERMANÊNCIA. PROVIMENTO. O laudo pericial, apesar de se tratar de prova técnica hábil a demonstrar a periculosidade das atividades (artigo 195, § 2º, da CLT), pode ser desconsiderado pelo juiz se houver elementos nos autos que o permitam formar a sua convicção em sentido contrário à conclusão do perito, nos termos do artigo 479 do CPC. Desse modo, não pode o Tribunal desprezar o laudo pericial que concluiu pela caracterização da periculosidade e indeferir o adicional de periculosidade pleiteado, quando não há sequer notícia de outros elementos probatórios nos autos hábeis a formar a sua convicção. Na hipótese, o egrégio Tribunal Regional, afastou a conclusão da prova pericial que entendeu caracterizada a periculosidade, registrando para tanto que só pela descrição das atividades exercidas pelos substituídos, já era possível verificar que eles não realizavam atividade em postos de abastecimento de aeronaves e que, por não realizarem atividade de abastecimento, mas predominantemente de carga e descarga de bagagens nas aeronaves que estavam no aeroporto, não precisavam permanecer em área de risco normatizado de forma permanente. Consignou, dessa forma, que as provas dos autos foram insuficientes para se considerar que todos os substituídos processuais, classificados pela ré nas funções de auxiliar de rampa e líder de rampa, atuam de forma habitual ou intermitente em área de risco prevista na NR nº 16, de forma que indeferiu o pagamento do adicional de periculosidade. Verifica-se que o indeferimento do adicional de periculosidade, em tais circunstâncias, afronta a disposição contida no artigo 195, § 2º, da CLT, que não prescinde da prova técnica para a demonstração da periculosidade. Ademais, relativamente ao manuseio de inflamáveis para abastecimentos de aeronaves, esta colenda Corte firmou o entendimento de que a área de risco a que se reporta a NR nº 16, anexo 2, diz respeito à área de operação, tendo, assim, direito ao adicional de periculosidade os empregados que efetuam diretamente o abastecimento da aeronave e aqueles que, no exercício de suas atribuições, transitam nessa área externa em situação de risco acentuado . Ora, ao referir-se a uma "área de operação", necessariamente a referida norma não pretendeu restringir sua aplicação àqueles empregados que efetuam o abastecimento da aeronave com combustível, mas também, àqueles que transitam na área externa à fuselagem do avião, por estarem todos sujeitos ao risco acentuado de eventual explosão ou incêndio do combustível. Assim, é devido o adicional de periculosidade, na forma do artigo 193 da CLT, aos trabalhadores que prestam serviços em área de risco (de forma permanente ou intermitente), em razão do contato com inflamáveis ou explosivos, como é o caso dos autos. Precedentes. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento. (RR-12166-02.2016.5.03.0097, 8ª Turma , Relator Ministro Guilherme Augusto Caputo Bastos, DEJT 06/03/2023).
A C. Subseção I Especializada em Dissídios Individuais posicionou-se no mesmo sentido:
(...) EMBARGOS REGIDOS PELA LEI Nº 11.496/2007. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. TRÂNSITO E PERMANÊNCIA HABITUAIS DO EMPREGADO NA ÁREA DE RISCO DURANTE O ABASTECIMENTO DE AERONAVES. TEMPO EXTREMANTE REDUZIDO NÃO CONFIGURADO . No caso do abastecimento de aeronaves, a jurisprudência desta Corte adota o entendimento de que, para a caracterização da periculosidade, é irrelevante o fato de o empregado não realizar o abastecimento uma vez que, independentemente de qual seja a sua atividade, a permanência durante o abastecimento na área externa da aeronave definida como sendo de risco . Na hipótese, o reclamante, duas a três vezes por semana, buscava malotes bancários no aeroporto, ocasiões em que permanecia por até trinta minutos na área onde se realizava o abastecimento de aeronaves, o que revela que a exposição ao risco não era eventual, nem por tempo extremamente reduzido, tendo em vista o risco potencial da ocorrência de sinistro e de danos ao trabalhador. Desse modo, verifica-se que a Turma, pautando-se na premissa registrada pelo Regional de que o reclamante estava exposto habitualmente a condições de risco acentuado, não contrariou o disposto na Súmula nº 364 do Tribunal Superior do Trabalho, mas decidiu em consonância com os seus exatos termos. A divergência jurisprudencial não está demonstrada, os termos da Súmula nº 296, item I, do Tribunal Superior do Trabalho, pois os arestos citados para o cotejo de teses referem-se a empregados que permanecem no interior das aeronaves durante o seu abastecimento, circunstância fática distinta do caso destes autos. Embargos não conhecidos. (E-ED-RR-102600-46.2004.5.04.0027, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais , Relator Ministro Jose Roberto Freire Pimenta, DEJT 02/03/2018)
A despeito da uniformização da jurisprudência no âmbito do Tribunal Superior do Trabalho, verificou-se que ainda remanescem recentes divergências nos Tribunais Regionais quanto ao tema, conforme se infere das seguintes ementas:
ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. ABASTECIMENTO DE AERONAVE. Não caracteriza a periculosidade o acompanhamento de abastecimento de aeronave realizado por outra pessoa, pois o simples ingresso na área de risco não enseja o pagamento do adicional de periculosidade, nos termos da Súmula n. 59 deste Tribunal Regional. Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (05ª Turma). Acórdão: 0010757-06.2022.5.03.0024. Relator(a): MARCOS PENIDO DE OLIVEIRA. Data de julgamento: 30/05/2023. Juntado aos autos em 05/06/2023.
DIREITO DO TRABALHO E PROCESSUAL DO TRABALHO. RECURSO DA RÉ. NULIDADE DO PROCESSO. VALORAÇÃO DAS PROVAS. FACULDADE DO JUIZ. CERCEAMENTO DO DIREITO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. TERMINAL AEROPORTUÁRIO. AGENTE DE OPERAÇÃO. ABASTECIMENTO DE AERONAVES. ÁREA DE RISCO. EXPOSIÇÃO. INOCORRÊNCIA. PRETENSÃO INDEVIDA. 1. A utilização de prova produzida em outro processo é uma faculdade do juiz, que a ela atribui o valor que considerar adequado, a teor do art. 372 do CPC. A adoção da prova pericial específica do processo, em detrimento de laudos importados, não configura cerceamento de defesa. 2. Evidenciado que as atividades de abastecimento das aeronaves são acompanhadas à distância pelos trabalhadores que não estão envolvidos diretamente no processo, e que o agente de operação não se envolve nesse procedimento, não é devido o adicional de periculosidade. Recurso ordinário parcialmente conhecido e provido, para julgar improcedente o pedido de adicional de periculosidade.
“É incontestável que o autor não laborava diretamente no abastecimento e reabastecimento de aeronaves, mas desenvolvia funções no pátio. (...) Porém, a permanência do autor no pátio não é suficiente para conferir o adicional de periculosidade. (...)” Tribunal Regional do Trabalho da 21ª Região (Primeira Turma de Julgamento). Acórdão: 0000228-22.2024.5.21.0002. Relator (a): RICARDO LUIS ESPINDOLA BORGES. Data de julgamento: 22/10/2024. Juntado aos autos em 22/10/2024.
EMPREGADO QUE EXERCE SUAS ATIVIDADES LABORAIS EM PROXIMIDADE ÀS AERONAVES NO MOMENTO DO ABASTECIMENTO. RISCO CONTROLADO. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE INDEVIDO. Ao empregado que labora no pátio de estacionamento das aeronaves mas que, no entanto, não participa do abastecimento das aeronaves, tampouco tem contato com os combustíveis, não é devido adicional de periculosidade, pois não tem contato direto com agentes perigosos. O risco pela proximidade da área de abastecimento é controlado, sendo permitida, inclusive, a permanência dos passageiros a bordo da aeronave, por ser considerado seguro o procedimento. Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (5ª Turma). Acórdão: 0000201-22.2020.5.12.0037. Relator(a): MARI ELEDA MIGLIORINI. Data de julgamento: 17/05/2022. Juntado aos autos em 03/06/2022.
Feitos tais registros, verifico que o representativo definido para alçar o tema a debate foi interposto em face de acórdão do Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região que, adotando entendimento diverso deste C. Tribunal Superior do Trabalho, decidiu ser incabível o deferimento do adicional no caso de permanência em área de abastecimento de aeronave:
“(...) Após inspeção no local de trabalho da autora, o perito concluiu pela caracterização da atividade em condição de periculosidade, por permanecer na área de risco de abastecimento da aeronave.
Com base nas informações prestadas por ela, registrou que, como agente de aeroporto, a demandante tinha entre suas atribuições: realizar "a atividade de pista, onde direcionava os clientes para embarque e desembarque, pegava as bagagens que são despachadas pelo embarque e levavam-nas até o porão da aeronave"; "levar as prioridades para a cabine, realizava a orientação dos passageiros para não ultrapassarem as delimitações da pista, verificava se a equipe de limpeza já havia terminado as suas atividades dentro da aeronave" (fls. 566-567).
Ela também informou que "durante o abastecimento ou permanecia na porta do porão porque estava conduzindo o processo de embarque das bagagens, ou na escada dianteira ou traseira acompanhado o embarque ou desembarque, e quando tinha duas aeronaves em operação, permanecia no meio das duas" (fl. 567).
O exercício dessas atribuições foi corroborado pelo supervisor do aeroporto, que acompanhou a perícia e disse que: "faz parte das atividades da função de pista levar algumas bagagens do embarque até o porão da aeronave, juntamente com outros colaboradores de rampa e Orange-cap, que essa movimentação ocorre em quase todos os voos"; "ela era multifunção, então circulou por várias áreas no aeroporto, porém, sua atuação mais frequente é do lado da aeronave voltada para os passageiros, também atuava com bastante frequência no check-in e embarque"; e que "ocorre de fato acontecer o abastecimento de aeronaves simultaneamente" (fl. 567).
Na mesma linha foi o depoimento das testemunhas ouvidas nos autos.
Por conseguinte, restou robustamente demonstrado que a autora trabalhava na pista de pouso durante o abastecimento das aeronaves.
Quanto ao tempo de exposição da autora, o perito esclareceu que (fl. 570):
Não é possível apontar o número de vezes e frequência com que ela realizava cada uma dessas atividades, por se tratar de atividades dinâmicas. O que nos foi relatado pela autora, é que por se tratar de um aeroporto pequeno, os Agentes de Aeroportos fazem um pouco de tudo, que no seu turno desembarcavam 06 aeronaves e de forma habitual, a reclamante realizava atividades na pista.
Outrossim, consta no laudo pericial que o abastecimento de cada aeronave durava cerca de 15 minutos.
Com base nessas informações, a autora atendia cerca de seis voos por dia, que demoravam 15 minutos para abastecer. Importante considerar, ainda, que ela tinha diversas atribuições no momento do embarque, tal como os outros funcionários da ré, de sorte que não há como considerar que durante o abastecimento de todas as aeronaves ficava integralmente na pista de pouso.
Dessa forma, entendo que a sujeição ao risco se dava por tempo reduzido , não ensejando o direito ao pagamento do adicional de periculosidade (Súmula n. 364, I, do TST).
Cito, ainda, precedente desta Câmara, no sentido de que as atividades na pista de pouso, em proximidade às aeronaves e durante o abastecimento, a princípio, não ensejam o pagamento do adicional em questão : (...)
Por tais motivos, dou provimento ao recurso para afastar a condenação da ré no pagamento do adicional de periculosidade. (...)”
Nesse sentido, demonstrado que a jurisprudência pacífica desta Corte encontra resistência nas instâncias ordinárias, forçoso admitir a necessidade de uniformizar a matéria, por meio do presente Incidente de Recurso de Revista, para reafirmação da jurisprudência, nos termos do § 5º do art. 132-A do Regimento Interno do TST:
“Art. 132-A. A proposta de afetação do incidente de recurso repetitivo (...) será necessariamente incluída em pauta de sessão virtual e deverá conter o tema a ser afetado.
§ 5º O julgamento de mérito do incidente de recurso repetitivo, no caso de mera reafirmação de jurisprudência dominante da Corte, também será realizado por meio do Plenário Eletrônico, na mesma sessão virtual que decide sobre a proposta de afetação.”
A atuação qualificada e célere do Tribunal Superior do Trabalho sob o rito dos recursos repetitivos converge para sua finalidade precípua como Corte de precedentes – ainda com mais razão nestes casos em que já produziu jurisprudência pacificada sobre a matéria, bastando que haja sua reafirmação sob rito destinado à conversão em precedente obrigatório, de modo a evitar a divergência de julgamentos nas instâncias ordinárias.
Como já mencionado, a posição consolidada do Tribunal Superior do Trabalho é no sentido de que é devido o adicional de periculosidade aos empregados que exercem suas atividades na área de abastecimento de aeronaves, uma vez que se caracteriza como área de risco na forma do Anexo 2 da NR 16 do MTE.
Com o condão de regulamentar o inciso I do art. 193, foi editada Norma Regulamentar nº 16 pelo MTE, que tratou da matéria em comento no anexo 2 itens 1, c e 3, g, in verbis:
“1. São consideradas atividades ou operações perigosas, conferindo aos trabalhadores que se dedicam a essas atividades ou operações, bem como aqueles que operam na área de risco adicional de 30 (trinta) por cento, as realizadas: (...)
c. nos postos de reabastecimento de aeronaves .
todos os trabalhadores nessas atividades ou que operam na área de risco.
(...)
3. São consideradas áreas de risco: (...)
g. Abastecimento de aeronaves
Toda a área de operação.”
Esta Corte fixou o entendimento de que é desnecessária a realização do abastecimento da aeronave diretamente pelo empregado, estando configurada a situação de risco pelo mero fato de haver labor próximo ao local do respectivo abastecimento (Ag-E-Ag-RR-11324-18.2015.5.15.0131, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relatora Ministra Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, DEJT 25/11/2022; E-ED-ED-RR-147400-95.2009.5.04.0024, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Marcio Eurico Vitral Amaro, DEJT 29/05/2015).
No caso em exame, o recurso de revista de que trata o tema afetado para representativo de controvérsia merece ser conhecido por contrariedade ao item I, parte final, da Súmula 364 do TST, já que a parte logrou êxito em demonstrar desrespeito ao entendimento ora fixado no âmbito desta Corte na interpretação do referido postulado com relação à permanência em local de abastecimento de aeronaves.
Assim, do julgamento do caso concreto afetado, extrai-se a reafirmação da mesma ratio decidendi antes firmada no julgamento da SBDI-1 transcrito acima, cuja tese pode ser fixada nos seguintes termos:
É devido o adicional de periculosidade aos empregados que exercem suas atividades na área de abastecimento de aeronaves, ainda que não atuem diretamente nesta função, desde que na área externa da aeronave, uma vez que esta área se caracteriza como de risco na forma do Anexo 2 da NR 16 do MTE.
No mérito, quanto ao recurso de revista interposto pela parte Patricia Padoin Chiesorin, no tema ora afetado, considerando que a partir da análise da moldura fática delineada no acórdão Regional, restou assente que o ofício desenvolvido pela obreira lhe impunha o trânsito pelo local no qual se dava o abastecimento das aeronaves, dou-lhe provimento para determinar o pagamento do adicional de periculosidade.
Não havendo temas remanescentes, prossiga-se com a regular tramitação do feito.
ISTO POSTO
ACORDAM os Ministros do Tribunal Pleno do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade: I – Acolher a proposta de afetação do incidente de recurso de revista, para reafirmar a jurisprudência deste Tribunal, quanto à matéria, fixando a seguinte tese obrigatória para o presente Incidente de Recursos Repetitivos: É devido o adicional de periculosidade aos empregados que exercem suas atividades na área de abastecimento de aeronaves, ainda que não atuem diretamente nesta função, desde que na área externa da aeronave, uma vez que esta área se caracteriza como de risco na forma do Anexo 2 da NR 16 do MTE. II – Conhecer do recurso de revista no tema objeto do representativo, por contrariedade à Súmula nº 364, item I, do TST, nos moldes do art. 896, alínea a), da CLT, e, no mérito, dar-lhe provimento, aplicando a tese ora reafirmada para determinar o pagamento do adicional de periculosidade. III – Determinar o regular prosseguimento do feito, diante da ausência de temas remanescentes.
Brasília, de de
ALOYSIO SILVA CORRÊA DA VEIGA
Ministro Presidente do TST