A C Ó R D Ã O

Tribunal Pleno

GMCB/fmc

INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS. ADMISSIBILIDADE. CUMPRIMENTO DOS REQUISITOS NORMATIVOS. QUESTÃO EXCLUSIVAMENTE DE DIREITO. EMPREGADO NÃO SINDICALIZADO. CONTRIBUIÇÃO ASSISTENCIAL. EXERCÍCIO DO DIREITO DE OPOSIÇÃO. MODO, MOMENTO E LUGAR APROPRIADO.

Conforme estabelece o artigo 976, I e II, do CPC, o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) é um instrumento do sistema processual brasileiro destinado a conferir tratamento isonômico e propiciar segurança jurídica aos jurisdicionados. Como se trata de um mecanismo de solução coletiva de conflitos, o IRDR assegura entendimento uniforme acerca da mesma questão de direito, o que evita a dispersão jurisprudencial.

Cumpre registrar que os pressupostos para a instauração do referido Incidente deverão ser preenchidos concomitantemente. São eles: a) controvérsia acerca da mesma questão (unicamente) de direito; b) efetiva repetição de processos; c) risco de afronta aos princípios da isonomia e da segurança jurídica; e d) pendência de julgamento do feito no âmbito do tribunal. Sem olvidar, há, ainda, um requisito negativo no sentido de obstar a instauração de IRDR quando um dos tribunais superiores já tiver afetado recurso para definir tese sobre questão repetitiva de direito material ou processual, nos termos do artigo 976, § 4º, do CPC.

Na situação em análise , o cerne da questão submetida à apreciação trata especificamente sobre o exercício do direito de oposição dos empregados não filiados ao sindicato a pagar a contribuição assistencial. Isso porque, conquanto o excelso Supremo Tribunal Federal tenha salvaguardado o referido direito, devem ser adotados parâmetros objetivos e razoáveis para que seja exercido oportunamente, de modo que a contribuição não se torne uma cobrança compulsória àqueles que não demonstrem interesse em custeá-la.

Como não foram definidos os critérios para o exercício do direito de oposição, a matéria tem sido controvertida no âmbito dos Tribunais Regionais do Trabalho, principalmente no que se refere ao modo, ao momento e ao lugar apropriado para o empregado não sindicalizado refutar o pagamento da contribuição assistencial. A propósito, os precedentes evidenciam conclusão jurídica diversificada entre as Cortes Regionais com relação à matéria em exame, cujo demonstrativo amostral de processos revela uma demanda repetitiva.

É inequívoco que essa dissonância de entendimento nos Tribunais Regionais sobre a mesma questão de direito torna perceptível o risco de violação dos princípios da isonomia e da segurança jurídica. Sob o prisma material, essa heterogeneidade na interpretação do modo do exercício do direito de oposição acarreta tratamento diferenciado entre pessoas submetidas a situações fáticas idênticas.

Impende salientar, ademais, que a aludida matéria encontra-se pendente de resolução na egrégia Seção Especializada em Dissídios Coletivos deste Tribunal Superior, sem afetação para definir tese sobre questão repetitiva. Na sessão realizada em 20/11/2023, iniciou-se a apreciação do ROT 20516-39.2022.5.04.0000, a ser utilizado, inclusive, como processo paradigma para a instauração do IRDR. Na ocasião, ao proferir voto na condição de relator, o julgamento foi suspenso em decorrência do pedido de vista regimental formulado pelo e. Ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho.

No aludido recurso ordinário, a Cláusula 12ª do acordo entabulado entre os sindicatos previu o direito de oposição dos empregados à cobrança da contribuição assistencial, sob a condição de comunicação pessoal e escrita ao sindicato profissional no período de quinze dias, a contar da assinatura da Convenção Coletiva e sua divulgação nas redes sociais. No exercício do seu poder normativo, o Tribunal Regional homologou integralmente o acordo firmado entre as partes, o que incluiu a cláusula em comento.

Considerando, portanto, o cumprimento dos requisitos necessários à instauração do IRDR, mostra-se cabível a admissibilidade do Incidente pelo Tribunal Pleno desta Corte Superior a fim de apreciar a questão exclusivamente de direito que trata sobre o modo, o momento e o lugar apropriado para o empregado não sindicalizado exercer seu direito de oposição ao pagamento da contribuição assistencial.

Incidente admitido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas nº TST-IRDR - 1000154-39.2024.5.00.0000 , em que é SUSCITANTE Ministro GUILHERME AUGUSTO CAPUTO BASTOS e é SUSCITADO SEÇÃO ESPECIALIZADA EM DISSÍDIOS COLETIVOS .

Trata-se de propositura de Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR), em face da Seção Especializada de Dissídios Coletivos desta Corte Superior, com a finalidade de submeter sua admissibilidade à apreciação deste Tribunal Pleno.

A propósito, o cerne da questão de direito sujeita a deliberação aborda especificamente o modo, o momento e o lugar apropriado para o empregado não sindicalizado exercer seu direito de oposição ao pagamento da contribuição assistencial.

a egrégia Seção de Dissídios Coletivos deparou-se com a matéria ao julgar o ROT 20516-39.2022.5.04.0000 na sessão de 20/11/2023. Na ocasião, após proferir voto na condição de relator, o julgamento foi suspenso em decorrência do pedido de vista regimental formulado pelo e. Ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho.

Diante da relevância do tema, encaminhou-se, por meio de ofício, ao Presidente deste Tribunal Superior do Trabalho, Ministro Lélio Bentes Corrêa, requerimento a fim de instaurar IRDR, com fulcro nos artigos 976 e 977, I, do Código de Processo Civil e 305 do Regimento Interno do Tribunal Superior do Trabalho.

Uma vez recebido o ofício, o e. Ministro Lélio Bentes Corrêa determinou a autuação do processo judicial na classe concernente ao IRDR, bem como a distribuição, por prevenção, a este Relator.

É o relatório.

V O T O

1. REQUISITOS NORMATIVOS DE ADMISSIBILIDADE

É cediço que o Código de Processo Civil de 2015 previu diversos institutos processuais destinados a garantir a uniformidade das decisões judiciais proferidas nas demandas que tenham por objeto a mesma questão de direito. Conforme consignado na exposição de motivos do aludido diploma legal, a possibilidade de os julgadores adotarem posicionamentos distintos na interpretação da mesma norma jurídica “ fragmenta o sistema, gera intranquilidade e, por vezes, verdadeira perplexidade na sociedade ”.

Nessa perspectiva, os instrumentos inseridos em nosso sistema processual brasileiro são considerados essenciais para conferir tratamento isonômico aos jurisdicionados, bem como para permitir a concretização do princípio constitucional da razoável duração do processo, na medida em que criam condições para a redução do número de ações submetidas ao exame do Poder Judiciário, sem, contudo, comprometer a prestação jurisdicional.

Dentre as figuras processuais está o incidente de resolução de demandas repetitivas - IRDR, com inspiração no direito alemão e disciplinado nos artigos 976 a 987 do CPC.

Para Dantas, o IRDR destina-se a “ assegurar interpretação isonômica à questão jurídica controvertida em demandas repetitivas que busquem tutela jurisdicional a interesses individuais homogêneos ”. (DANTAS, Bruno. Incidente de resolução de demandas repetitivas. In: Teresa Arruda Alvim Wambier; Fredie Didier Jr.; Eduardo Talamini; Bruno Dantas (coords). Breves comentários ao novo Código de Processo Civil . São Paulo: Ed. RT, 2015, p. 2.180-2.198)

De igual modo, Mendes e Silva entendem que o incidente em exame consiste em “ mecanismo de solução coletiva de conflitos, delineado na tentativa de trazer racionalidade e eficiência diante dos conflitos de massa, para realizar a árdua tarefa de julgar os litígios envolvendo direitos individuais homogêneos ” (MENDES, Aluísio Gonçalves de Castro e SILVA, Larissa Clare Pochmann. Precedente e IRDR: algumas considerações. In: Fredie Didier Jr. Et al (coords.). Precedentes . Salvador: Ed. JusPodivm, 2015, p. 574).

Os pressupostos para a instauração do referido incidente estão previstos no artigo 976 do CPC, os quais deverão ser preenchidos concomitantemente. São eles: a) controvérsia acerca da mesma questão (unicamente) de direito; b) efetiva repetição de processos; c) risco de afronta aos princípios da isonomia e da segurança jurídica; e d) pendência de julgamento do feito no âmbito do tribunal.

O legislador, portanto, deixa evidente a preocupação em promover a efetivação dos princípios constitucionais da segurança jurídica e da isonomia, ao estabelecer meios que garantam a uniformidade de entendimento acerca da mesma quaestio iuris , evitando, por conseguinte, a dispersão jurisprudencial.

Isso porque, com o julgamento do mérito da questão de direito controvertida no IRDR, serão fixadas teses jurídicas, as quais deverão integrar banco eletrônico de dados mantido pelos tribunais, “ com os fundamentos determinantes da decisão e os dispositivos normativos a ela relacionados ” (artigo 979, § 2º, do CPC). Tal exigência tem como finalidade possibilitar a identificação dos processos que serão abrangidos pela tese então fixada, de adoção obrigatória para os casos que versem sobre idêntica questão de direito, ante a possibilidade de a decisão ser cassada por meio de reclamação, caso esteja em sentido contrário ao posicionamento firmado.

De acordo com o artigo 985 do CPC, tem-se que, nos casos de decisão proferida nas instâncias ordinárias, pelos tribunais regionais e de justiça, a pacificação do entendimento ocorrerá apenas no âmbito de sua jurisdição. Para Alvim e Dantas, essa previsão “ satisfaz a promessa constitucional de igualdade perante a lei, sem vulnerar nosso modelo federativo, pois limita os efeitos da decisão em IRDR à área territorial de jurisdição de cada tribunal ” (ALVIM, Teresa Arruda e DANTAS, Bruno. Recurso especial, recurso extraordinário e a nova função dos tribunais superiores no direito brasileiro . 6ª edição. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2019, p.567).

Não se pode olvidar, contudo, que a questão de direito pode possuir alcance nacional, hipótese em que seria de interesse dos jurisdicionados o exame da matéria controvertida pelos tribunais superiores, aos quais compete “ proferir decisões que moldem o ordenamento jurídico, objetivamente considerado ”, norteando os demais tribunais e magistrados de primeiro grau.

Nessa conjuntura, é indubitável que o modo a ser exercido o direito de oposição da contribuição assistencial constitui matéria de abrangência nacional, porquanto se trata de cobrança destinada aos trabalhadores não filiados a sindicatos das diversas unidades da federação do país. Desse modo, essa heterogeneidade no procedimento do exercício do direito de oposição a pagar a aludida contribuição compromete a segurança jurídica, principalmente quando não são adotados parâmetros razoáveis.

Uma vez demonstrado o alcance da matéria, será evidenciado a seguir o cumprimento dos requisitos de admissibilidade para a instauração do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas.

1.1 CONTROVÉRSIA ACERCA DA MESMA QUESTÃO UNICAMENTE DE DIREITO

A contribuição assistencial encontra previsão no artigo 513, "e", da CLT e se destina a compensar a entidade sindical por eventuais despesas suportadas no processo de negociação, em que se busca auferir vantagens a toda categoria por ela representada. Vejamos o artigo:

“Art. 513. São prerrogativas dos sindicatos:

(...)

e) impor contribuições a todos aqueles que participam das categorias econômicas ou profissionais ou das profissões liberais representadas”.

A propósito, a jurisprudência então consolidada no âmbito desta Corte Superior era no sentido de que a instituição obrigatória da contribuição assistencial aos empregados não sindicalizados fere os princípios da livre associação e da sindicalização, previstos nos artigos 5º, XX, e 8º, V, da Constituição Federal.

Nesse sentido, inclusive, a Orientação Jurisprudencial nº 17 da SDC e o Precedente Normativo nº 119, de seguinte teor, respectivamente:

"CONTRIBUIÇÕES PARA ENTIDADES SINDICAIS. INCONSTITUCIONALIDADE DE SUA EXTENSÃO A NÃO ASSOCIADOS. (mantida) - DEJT divulgado em 25.08.2014

As cláusulas coletivas que estabeleçam contribuição em favor de entidade sindical, a qualquer título, obrigando trabalhadores não sindicalizados, são ofensivas ao direito de livre associação e sindicalização, constitucionalmente assegurado, e, portanto, nulas, sendo passíveis de devolução, por via própria, os respectivos valores eventualmente descontados".

"CONTRIBUIÇÕES SINDICAIS - INOBSERVÂNCIA DE PRECEITOS CONSTITUCIONAIS – (mantido) - DEJT divulgado em 25.08.2014

A Constituição da República, em seus arts. 5º, XX e 8º, V, assegura o direito de livre associação e sindicalização. É ofensiva a essa modalidade de liberdade cláusula constante de acordo, convenção coletiva ou sentença normativa estabelecendo contribuição em favor de entidade sindical a título de taxa para custeio do sistema confederativo, assistencial, revigoramento ou fortalecimento sindical e outras da mesma espécie, obrigando trabalhadores não sindicalizados. Sendo nulas as estipulações que inobservem tal restrição, tornam-se passíveis de devolução os valores irregularmente descontados”.

Registre-se que esse direito à liberdade de associação, analisado sob um enfoque individual, pode ser verificado tanto em sua dimensão positiva , caracterizada pela liberdade de escolha do empregado de se associar a uma determinada entidade sindical, quanto em sua dimensão negativa , caracterizada pela possibilidade do empregado não se filiar ou, até mesmo, retirar-se do sindicato no momento em que bem entender, sem que a ele se possa impor qualquer ônus, ainda que de natureza financeira.

Cumpre destacar que a matéria em questão foi objeto de análise pelo excelso Supremo Tribunal Federal, no ARE 1.018.459/PR (Tema 935), cuja repercussão geral foi reconhecida, com a reafirmação da jurisprudência daquela Corte acerca da controvérsia. Na oportunidade, foi fixada a seguinte tese jurídica: " é inconstitucional a instituição, por acordo, convenção coletiva ou sentença normativa, de contribuições que se imponham compulsoriamente a empregados da categoria não sindicalizados ".

Após o aludido julgamento, todavia, o sindicato profissional opôs embargos de declaração, os quais foram acolhidos pela excelsa Suprema Corte, com efeitos infringentes, para modificar o entendimento anteriormente adotado. Na ocasião, fixou-se tese no sentido de ser constitucional, por meio de acordo ou convenção coletiva de trabalho, a instituição de contribuição assistencial a todos os empregados da categoria, ainda que não sindicalizados, contanto que seja assegurado o direito de oposição .

O cerne da questão submetida à apreciação trata especificamente sobre o exercício do direito de oposição dos empregados não filiados ao sindicato a pagar a contribuição assistencial. Isso porque, conquanto o excelso Supremo Tribunal Federal tenha salvaguardado o referido direito, devem ser adotados parâmetros objetivos e razoáveis para que seja exercido oportunamente, de modo que a contribuição não se torne um mecanismo de cobrança compulsória àqueles que não demonstrem interesse em custeá-la.

Como não foram definidos os critérios para o exercício do direito de oposição, a matéria tem sido controvertida no âmbito dos Tribunais Regionais do Trabalho, principalmente no que se refere ao modo, ao momento e ao lugar apropriado para o empregado não sindicalizado refutar o pagamento da contribuição assistencial. A propósito, trago à colação os seguintes precedentes acerca dessa questão exclusivamente de direito:

“DESCONTOS DE CONTRIBUIÇÃO ASSISTENCIAL. ILICITUDE. DEVOLUÇÃO A CARGO DA EMPREGADORA. Em recente decisão proferida pelo E. STF, na Sessão Virtual de 1.9.2023 a 11.9.2023, houve alteração da tese de repercussão geral fixada no Tema 935, em virtude da qual, embora as contribuições que dependam de aprovação em assembleia geral possam agora obrigar também os trabalhadores não sindicalizados de determinada categoria, há que se assegurar ao empregado o exercício eficaz do direito de oposição. No caso, houve autorização do reclamante para a incidência de tais descontos, e nela se louvou o Juízo de origem para considerá-los válidos. No entanto, tal autorização foi assinada pelo reclamante no exato momento da contratação, com aparente caráter impositivo e sem representar, comprovadamente, a efetiva vontade do empregado. Mais que isso, embora o direito de oposição disponha de previsão expressa na norma coletiva, ainda que com determinadas condições, o fato evidente é que o reclamante, recém-admitido na empresa e já compelido a autorizar tais descontos, sequer teve a ocasião de exercer oportunamente o direito de recusa às deduções ou mesmo informar-se a esse respeito. Assim, neste caso particular, os descontos perpetrados a título de contribuição assistencial, mesmo que com formal autorização do trabalhador ao ensejo da admissão, são ilegais, por ofensivos à garantia de intangibilidade salarial do art. 462 da CLT, já que não assegurado em termos concretos o exercício do direito de oposição, conforme tese fixada pelo E. STF no Tema 935 de Repercussão Geral . Recurso ordinário a que se dá parcial provimento, para julgar a ação parcialmente procedente” ( TRT da 2ª Região ; Processo: ROT 1000627-77.2023.5.02.0073; Data: 17-11-2023; Órgão Julgador: 6ª Turma; Relator (a): EROTILDE RIBEIRO DOS SANTOS) (sem grifos no original).

“Contribuição assistencial. Legitimidade. Financiamento do sindicato por contribuições voluntárias dos trabalhadores, com direito de oposição . Ausência de financiamento por contribuições de empresas ao sindicato. O financiamento da atividade sindical por meio de contribuições voluntárias dos trabalhadores, descontadas diretamente de seus salários, sob a denominação de contribuição assistencial, taxa negocial ou assemelhadas, é legítimo e possui sólido supedâneo legal (CLT, arts. 513 e 462; DL nº 24/1956; Lei nº 11.648/2008). Apesar da jurisprudência errática dos Tribunais Superiores, vem se consolidando em decisões judiciais e no posicionamento do MPT, cuja aguerrida militância contra tais formas de financiamento já se encontra hoje mitigada. Por sua vez, o financiamento do sindicato mediante repasse de parcelas salariais dos trabalhadores pela empresa não constitui financiamento empresarial antissindical, vez que este se configura pela transferência de dinheiro da empresa, e não dos trabalhadores . O reconhecimento desta diferença é fundamental na análise das questões que envolvem tal financiamento, mormente após as alterações trazidas pela Lei nº 13.467/2017, que suprimiram a compulsoriedade da vetusta contribuição sindical do art. 578 da CLT, resultando em importante diminuição de receita das entidades sindicais, cuja existência e liberdade de atuação e gestão é de fundamental importância para a democracia. Recurso não provido, com declaração incidente de legitimidade das contribuições ao sindicato” ( TRT da 2ª Região ; Processo: ROT 1001252-76.2019.5.02.0033; Data: 08-07-2020; Órgão Julgador: Gabinete da Vice-Presidência Judicial - Tribunal Pleno; Relator(a): DAVI FURTADO MEIRELLES) (sem grifos no original).

“CONTRIBUIÇÃO NEGOCIAL. TRABALHADOR NÃO SINDICALIZADO. DESCONTO INDEVIDO. A contribuição assistencial/negocial somente pode ser descontada dos empregados sindicalizados, conforme se extrai do entendimento do STF já consolidado na Súmula Vinculante n. 40. Além disso, nos termos da OJ 17 da SDC do TST: ‘As cláusulas coletivas que estabeleçam contribuição em favor de entidade sindical, a qualquer título, obrigando trabalhadores não sindicalizados, são ofensivas ao direito de livre associação e sindicalização, constitucionalmente assegurado, e, portanto, nulas, sendo passíveis de devolução, por via própria, os respectivos valores eventualmente descontados’. Dessa forma, a previsão normativa do desconto, em que pese a previsão do direito de oposição do empregado, não legitima a cobrança da contribuição negocial, vez que a cobrança não pode ocorrer sem a autorização individual e expressa do trabalhador ” ( TRT da 3.ª Região ; PJe: 0010263-75.2022.5.03.0143 (ROT); Disponibilização: 16/10/2023; Órgão Julgador: Sétima Turma; Relator(a)/Redator(a) Paulo Roberto de Castro) (sem grifos no original).

“CONTRIBUIÇÕES CONFEDERATIVA E ASSISTENCIAL - Ainda que haja previsão em instrumento coletivo de desconto da mensalidade sindical e de qualquer contribuição com o correspondente repasse ao sindicato profissional, obrigando trabalhadores não sindicalizados ao seu pagamento , seja a título de taxa de custeio do sistema confederativo, assistencial ou quaisquer outras taxas da mesma natureza, referida cláusula é nula, sob pena de ofensa ao princípio da plena liberdade de associação e sindicalização previsto nos incisos XX do artigo 5° e V do artigo 8°, ambos da CR/88, mesmo quando garantido o direito de oposição ao desconto, pois nos termos do Precedente Normativo 119 e OJ-17 da SDC, ambos do TST, e Súmula 666 do STF, a vontade da assembleia não pode se sobrepor à do empregado não sindicalizado, que sequer participou dela ” ( TRT da 3.ª Região ; PJe: 0010366-93.2018.5.03.0023 (AP); Disponibilização: 10/06/2019; Órgão Julgador: Quinta Turma; Relator(a)/Redator(a) Oswaldo Tadeu B.Guedes) (sem grifos no original).

“CONTRIBUIÇÃO ASSISTENCIAL. DIREITO DE OPOSIÇÃO. Ação anulatória julgada procedente em parte, a fim de determinar que seja efetuado o direito dos empregados, em face da empresa, à oposição ao desconto da contribuição assistencial, sem necessidade de comparecimento presencial ” ( TRT da 4ª Região , Seção de Dissídios Coletivos, 0029372-89.2022.5.04.0000 AACC, em 03/10/2023, Desembargador Clovis Fernando Schuch Santos) (sem grifos no original).

“CONTRIBUIÇÃO SINDICAL. DESCONTO AUTORIZADO EM ASSEMBLEIA. LEGALIDADE DA CLÁUSULA COLETIVA. APLICAÇÃO DO TEMA 1046 DO STF. É permitido que as partes negociem desconto assistencial através de autorização coletiva aprovada em assembleia geral, suprindo a autorização individual prévia e expressa de cada empregado, desde que reconhecido o direito de oposição . Conhecer da ação e julga-la improcedente revogando a liminar deferida” ( TRT da 7ª Região ; Processo: AACC 0004012-71.2022.5.07.0000; Data de assinatura: 11-08-2023; Órgão Julgador: Gab. Des. Maria José Girão - Tribunal Pleno; Relator(a): CARLOS ALBERTO TRINDADE REBONATTO) (sem grifos no original).

“SINDICATO INTERMUNICIPAL DOS TRABALHADORES NO COMERCIO DE MACAPÁ E SINDICATO DOS REPRESENTANTES COMERCIAIS DO ESTADO DO AMAPÁ CONVENÇÃO COLETIVA DE TRABALHO. CLÁUSULA VIGÉSIMA OITAVA - CONTRIBUIÇÃO ASSISTENCIAL E DIRIETO DE OPOSIÇÃO. Se a questão tratada na cláusula convencional, impugnada pelo Parquet, viola frontalmente previsão legal, a respectiva cláusula é nula de pleno direito, nos termos do art. 9º da CLT. Contribuição Assistencial não pode alcançar trabalhadores não associados ao sindicato, sem expressa e espontânea autorização, ainda que estipulada em assembleia geral , por violar os arts. 5º, XX e 8º, V, da Constituição, a Súmula Vinculante nº 40 do STF, à Orientação Jurisprudencial nº 17 e ao Precedente Normativa nº 119, ambas da SDC do TST. Portanto, por violar o regramento legal, procede a pretensão do Parquet” ( TRT da 8ª Região ; Processo: 0000308-62.2018.5.08.0000 AACC; Data: 10/07/2020; Órgão Julgador: Especializada I; Relator: GEORGENOR DE SOUSA FRANCO FILHO) (sem grifos no original).

“CONTRIBUIÇÃO ASSISTENCIAL PREVISTA EM CONVENÇÃO COLETIVA DE TRABALHO. VALIDADE. NOVO ENTENDIMENTO DO STF NO TEMA 935. Nos termos do novo entendimento do STF no Tema 935, ARE 1.018.459, resta superada a OJ-17 da SDI-1 do TST e o Precedente Normativo 119 da SDC do TST, devendo ser considerada legítima a cobrança de contribuição assistencial imposta aos empregados, indistintamente, em favor do sindicato, prevista em convenção coletiva de trabalho, desde que com possibilidade expressa do direito de oposição ” ( TRT da 17ª Região ; Processo: 0001219-48.2022.5.17.0141; Data de assinatura: 13-09-2023; Órgão Julgador: GAB. DESA. ALZENIR BOLLESI DE PLÁ LOEFFLER - 1ª Turma; Relator (a): ALZENIR BOLLESI DE PLA LOEFFLER) (sem grifos no original).

Conforme demonstrado por meio dos aludidos julgados dos Tribunais Regionais, há evidente divergência quanto ao exercício do direito de oposição pelos empregados não filiados ao sindicato.

1.2 EFETIVA REPETIÇÃO DE PROCESSOS

O artigo 976, I, do CPC estabelece a efetiva repetição de processos como requisito do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR). A partir da disposição normativa, depreende-se que a configuração da repetição não exige um quantitativo específico de processos, mas se mostra crucial que o número de demandas seja condizente com a instauração do IRDR.

A propósito do modo a ser exercido o direito de oposição ao pagamento da contribuição assistencial, é possível inferir dos precedentes dos Tribunais Regionais que há um demonstrativo amostral de processos a configurar uma demanda repetitiva. Como visto no tópico anterior, de 6 das 24 Cortes Regionais, foram citados 8 julgados cujo teor discute essa matéria com conclusão jurídica diversificada.

No âmbito deste Tribunal Superior do Trabalho, a egrégia Seção de Dissídios Coletivos deparou-se com a questão ao julgar o ROT 20516-39.2022.5.04.0000 na sessão de 20/11/2023. Na ocasião, fui relator do processo e, após proferir o meu voto, o julgamento foi suspenso em decorrência do pedido de vista regimental formulado pelo e. Ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho.

No aludido recurso ordinário, a Cláusula 12ª do acordo entabulado entre os sindicatos previu o direito de oposição dos empregados à cobrança da contribuição assistencial, sob a condição de comunicação pessoal e escrita ao sindicato profissional no período de quinze dias, a contar da assinatura da Convenção Coletiva e sua divulgação nas redes sociais. No exercício do seu poder normativo, o Tribunal Regional homologou integralmente o acordo firmado entre as partes, o que incluiu a cláusula em comento.

Com a finalidade de corroborar não somente a relevância, mas também a reiteração da matéria nesta Corte Superior, solicitei à Coordenadoria de Estatística um levantamento dos processos que tratassem sobre a contribuição assistencial e o eventual exercício do direito de oposição. Como resultado da pesquisa, constatou-se um total de 2.423 processos que tratam sobre essa temática, dentre os quais, por amostra, destaco os seguintes processos de cada uma das Turmas:

1ª Turma – ARR 1000004-31.2017.5.02.0038

2ª Turma – ARR 1000075-69.2019.5.02.0068

3ª Turma – RR 1000035-96.2020.5.02.0086

4ª Turma – AIRR 1000015-66.2021.5.02.0702

5ª Turma – RR 1000691-60.2020.5.02.0601

6ª Turma – RR 1001548-39.2017.5.02.0431

7ª Turma – Ag-AIRR 1000104-12.2020.5.02.0254

8ª Turma – AIRR 1000005-22.2021.5.02.0702

Depreende-se, portanto, a necessidade da atuação do Tribunal Superior do Trabalho no cumprimento de sua função de estabilizar a jurisprudência acerca dessa questão de direito. Nessa linha, como mecanismo de solução coletiva de conflitos, o IRDR revela-se como instrumento idôneo para assegurar que tanto os acórdãos dos Tribunais Regionais como os desta Corte Superior sejam proferidos de modo uniforme.

1.3 RISCO DE AFRONTA AOS PRINCÍPIOS DA ISONOMIA E DA SEGURANÇA JURÍDICA

A instauração do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas requer também o risco de afronta aos princípios da isonomia e da segurança jurídica, nos termos do artigo 976, II, do CPC. Na situação em debate, a dissonância de entendimento no âmbito dos Tribunais Regionais sobre a mesma questão de direito torna perceptível o risco de violação dos aludidos princípios na prestação jurisdicional.

Cumpre esclarecer que o perigo de ofensa aos princípios deve ser concreto, e não abstrato, porquanto, caso contrário, bastaria a mera repetição de processos em tramitação nos órgãos judiciais, o que se esgotaria no requisito previsto no inciso I do artigo 976 do CPC. Desse modo, mostra-se relevante que haja efetiva divergência no âmbito do Poder Judiciário.

Dos acórdãos antagônicos acerca da mesma questão de direito no âmbito dos Tribunais Regionais, constata-se que há risco concreto de afronta à isonomia e à segurança jurídica. Sob o prisma material, essa heterogeneidade na interpretação do modo do exercício do direito de oposição acarreta tratamento diferenciado diante da lei entre pessoas submetidas a situações fáticas idênticas.

1.4 PENDÊNCIA DE JULGAMENTO DO FEITO NO ÂMBITO DO TRIBUNAL

A matéria referente ao modo de exercício do direito de oposição encontra-se pendente de julgamento na egrégia SDC deste Tribunal Superior. Como processo paradigma a ser utilizado para a instauração do IRDR, mencione-se o ROT 20516-39.2022.5.04.0000 .

1.5 REQUISITO NEGATIVO: QUESTÃO JURÍDICA SEM AFETAÇÃO POR TRIBUNAL SUPERIOR

O artigo 976, § 4º, do CPC obsta a instauração de IRDR quando um dos tribunais superiores já tiver afetado recurso para definir tese sobre questão repetitiva de direito material ou processual, o que não se verifica no presente caso.

Impende salientar, ademais, que não se trata de questão jurídica já decidida pelo Supremo Tribunal Federal, porquanto, ao julgar o ARE 1.018.459/PR (Tema 935), fixou-se tese no sentido de ser possível a cobrança da contribuição assistencial dos empregados não sindicalizados, desde que assegurado o direito de oposição.

Ressalte-se, ainda, que a questão de direito discutida neste IRDR não se limita ao direito de oposição já reconhecido pela Suprema Corte, mas, sim, aos parâmetros para o exercício do referido direito, o que viabiliza a apreciação pelo Tribunal Pleno desta Corte Superior.

Pelas razões expostas, mostra-se cabível a admissibilidade do IRDR pelo Tribunal Pleno desta Corte Superior a fim de apreciar a questão exclusivamente de direito que trata sobre o modo, o momento e o lugar apropriado para o empregado não sindicalizado exercer seu direito de oposição ao pagamento da contribuição assistencial.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros do Tribunal Pleno do Tribunal Superior do Trabalho, por maioria, admitir o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas a fim de apreciar a questão exclusivamente de direito que trata sobre o modo, o momento e o lugar apropriado para o empregado não sindicalizado exercer seu direito de oposição ao pagamento da contribuição assistencial. Vencidos os Exmos. Ministros Maria Helena Mallmann, Delaíde Alves Miranda Arantes, Evandro Pereira Valadão Lopes, Morgana de Almeida Richa, Sergio Pinto Martins e Liana Chaib, que votaram no sentido de não admitir a instauração do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas.

Brasília, de de

CAPUTO BASTOS

Ministro Relator