A C Ó R D Ã O

2ª Turma

GMJRP/mc

RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014.

CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. FATO GERADOR. INCIDÊNCIA DE JUROS DE MORA E MULTA. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS ANTERIOR E POSTERIOR À ENTRADA EM VIGOR DOS §§ 2º E 3º DO ARTIGO 43 DA LEI Nº 8.212/91, ACRESCIDOS PELA MEDIDA PROVISÓRIA Nº 449/2008, CONVERTIDA NA LEI Nº 11.941/2009.

1. Discute-se, no caso, qual o fato gerador das contribuições previdenciárias relativas às parcelas trabalhistas objeto de condenação ou de acordo homologado pela Justiça do Trabalho e, consequentemente, o marco inicial para a incidência dos acréscimos legais concernentes aos juros e às multas, em virtude da nova redação do artigo 43 da Lei nº 8.212/91, dada pela Medida Provisória nº 449/2008, posteriormente convertida na Lei nº 11.941/2009.

2. Percebe-se do artigo 146, inciso III, da Constituição Federal, que o constituinte remeteu à legislação infraconstitucional a definição e a delimitação dos tributos, inclusive a especificação dos seus fatos geradores. Por sua vez, o artigo 195 da Constituição Federal não define o fato gerador das contribuições previdenciárias, mas apenas sinaliza suas fontes de custeio, a fim de evitar que o legislador infraconstitucional institua outro tributo de natureza semelhante se amparando nos mesmos indicadores ou fontes, prática coibida pela Lei Maior, conforme se infere do seu artigo 154, inciso I, ao cuidar da instituição de impostos não previstos no Texto Constitucional.

3. No caso, o § 2º do artigo 43 da Lei nº 8.212/1991, acrescido pela Lei nº 11.941/2009, prevê expressamente que o fato gerador das contribuições sociais se considera ocorrido na data da prestação do serviço, a partir da qual, portanto, conforme dicção dos artigos 113, § 1º, e 114 do CTN, surge a obrigação tributária principal, ou obrigação trabalhista acessória. Nesse passo, a liquidação da sentença e o acordo homologado judicialmente equivalem à mera exequibilidade do crédito por meio de um título executivo judicial, ao passo que a exigibilidade e a mora podem ser identificadas desde a ocorrência do fato gerador e do inadimplemento da obrigação tributária, que aconteceu desde a prestação dos serviços pelo trabalhador sem a respectiva contraprestação pelo empregador e cumprimento da obrigação trabalhista acessória, ou obrigação tributária principal, de recolhimento da respectiva contribuição previdenciária. A prestação de serviços é o fato gerador da contribuição previdenciária, mesmo na hipótese de existência de controvérsia acerca dos direitos trabalhistas devidos em decorrência do contrato de trabalho, visto que as sentenças e os acordos homologados judicialmente possuem natureza meramente declaratória ou condenatória (que tem ínsita também uma declaração), com efeitos ex tunc , e não constitutiva, vindo apenas a reconhecer uma situação jurídica que já existia. A própria Constituição Federal, em seu artigo 195, ao se referir aos salários e demais rendimentos do trabalho "pagos ou creditados", a qualquer título, já sinaliza para a viabilidade dessa interpretação de o fato gerador ser a prestação de serviços, pois não se pode ter como sinônimos os vocábulos pagos e creditados .

4. A interpretação no sentido de o fato gerador das contribuições previdenciárias ser a liquidação dos créditos ou o pagamento implica negar vigência ao que foi estabelecido pelo legislador, que elegeu expressamente a prestação de serviços como fato gerador do aludido tributo, não havendo falar em inconstitucionalidade do artigo 43 da Lei nº 8.212/91, diante das alterações introduzidas pela Lei nº 11.941/2009. Por outro lado, não cabe, com o escopo de defender a tese de o fato gerador ser o pagamento ou a liquidação do crédito do trabalhador, invocar a interpretação conforme a Constituição Federal, pois esse tipo de exegese só é cabível quando a lei dá margem a duas ou mais interpretações diferentes. De fato, é imprescindível, no caso da interpretação conforme a Constituição Federal, a existência de um espaço de proposta interpretativa, sendo inadmissível que ela tenha como resultado uma decisão contra o texto e o sentido da lei, de forma a produzir uma regulação nova e distinta da vontade do Poder Legiferante, pois implicaria verdadeira invasão da esfera de competência do legislador, em nítida ofensa ao princípio fundamental da separação dos Poderes, insculpido no artigo 2º da Constituição Federal, e protegido como cláusula pétrea pelo artigo 60, § 4º, da Lei Maior, e à própria ratio que levou à edição da Súmula Vinculante nº 10 do STF.

5. De mais a mais, essa interpretação de o fato gerador das contribuições previdenciárias e de o termo inicial para a incidência dos juros de mora a elas relativos serem o pagamento ou a liquidação dos créditos despreza, data venia , os princípios da efetividade do direito material trabalhista e da duração razoável do processo, pois incentiva o descumprimento e a protelação das obrigações trabalhistas, tanto quanto a sua discussão em Juízo, porquanto a lide trabalhista passa a conferir vantagem tributária diante da supressão de alto quantitativo de juros e multas acumulados ao longo do tempo. Ou seja, implicaria premiar as empresas que não cumpriram a legislação trabalhista e tributária no momento oportuno, isentando-as dos encargos decorrentes do não recolhimento da contribuição previdenciária no seu vencimento, em detrimento daqueles empregadores que, não obstante em mora, espontaneamente dirigem-se ao Ente Previdenciário para o cumprimento dessas obrigações, com a obrigação de arcar com tais encargos. Isso acarreta, aliás, nítida ofensa ao princípio da isonomia, consagrado no artigo 5º, caput , da Constituição Federal, e ao princípio da isonomia tributária, previsto no artigo 150, inciso II, também do Texto Constitucional, pois institui tratamento desigual entre contribuintes que se encontram em situação equivalente, ao aplicar, de forma distinta, os critérios da legislação previdenciária relativamente aos valores a serem pagos, para contribuintes que possuem débitos de mesma natureza, devidos à Previdência Social e referentes a períodos idênticos ou semelhantes.

6. Por outro lado, conforme disposto no artigo 195, § 6º, da Constituição Federal, as contribuições sociais só poderão ser exigidas após decorridos 90 dias da data da publicação da lei que as houver instituído ou modificado. Como a MP nº 449/2008 foi publicada em 4/12/2008, o marco para incidência dos acréscimos dos §§ 2º e 3º ao artigo 43 da Lei nº 8.212/91, por meio da Lei nº 11.941/2009, é 5/3/2009 , pelo que somente as prestações de serviços ocorridas a partir dessa data é que deverão ser consideradas como fato gerador da contribuição previdenciária para o cômputo dos juros moratórios então incidentes.

7. Quanto ao período anterior ao advento da Medida Provisória nº 449/2008, o entendimento majoritário desta Corte é de que o termo inicial para os juros moratórios da contribuição previdenciária, no caso das parcelas deferidas judicialmente, é o dia dois do mês seguinte ao da liquidação da sentença, nos termos do artigo 276, caput , do Decreto nº 3.048/99.

8. Diferentemente da atualização monetária das contribuições previdenciárias, que visa recompor o seu valor monetário e pela qual respondem tanto o empregador como o trabalhador, cada qual com sua cota parte - sem prejuízo para este último, visto que receberá seu crédito trabalhista igualmente atualizado -, os juros moratórios visam compensar o retardamento ou inadimplemento de uma obrigação, propiciando, no caso, o devido restabelecimento do equilíbrio atuarial mediante aporte financeiro para o pagamento dos benefícios previdenciários, pelo que a responsabilidade pelo seu pagamento deve ser imputada apenas ao empregador, que deu causa à mora.

9. Com relação à multa, igualmente imputável apenas ao empregador, tratando-se de uma sanção jurídica que visa a compelir o devedor ao cumprimento de uma obrigação a partir do seu reconhecimento, não incide desde a data da prestação dos serviços, mas sim a partir do exaurimento do prazo decorrente da citação para o pagamento dos créditos previdenciários apurados em Juízo, observado o limite de 20%, conforme se extrai da dicção dos artigos 61, § 1º e § 2º, da Lei nº 9.430/96 e 43, § 3º, da Lei nº 8.212/91 .

10. Essa matéria foi à deliberação do Pleno do Tribunal Superior do Trabalho, que, julgando a matéria afetada, com esteio no § 13 do artigo 896 da CLT, decidiu, no julgamento do Processo n° E-RR-1125-36.2010.5.06.0171, em sessão realizada em 20/10/2015, no mesmo sentido ao entendimento ora sufragado.

Recurso de revista conhecido e parcialmente provido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR-1438-82.2012.5.06.0023 , em que é Recorrente UNIÃO (PGF) e são Recorridos JOSÉ RONALDO DO NASCIMENTO e JOSIANE IARA DE PAULA CAVALCANTI - ME .

O Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região, por meio do acórdão de págs. 336-341, negou provimento ao recurso ordinário interposto pela União para confirmar a sentença na qual se considerou como fato gerador da contribuição previdenciária o efetivo pagamento do crédito ao empregado .

Inconformada, a União interpõe recurso de revista, às págs. 346-362, com fundamento no artigo 896, alíneas "a" e "c", da CLT.

O recurso de revista foi admitido no despacho exarado às págs. 366-369.

Sem apresentação de contrarrazões, conforme certificado à pág. 372.

Não houve remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho, ante o disposto no Ofício nº 95 de 12/02/2009 da Procuradoria- Geral do Trabalho.

É o relatório.

V O T O

CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. FATO GERADOR. INCIDÊNCIA DE JUROS DE MORA E MULTA. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS ANTERIOR E POSTERIOR À ENTRADA EM VIGOR DOS §§ 2º E 3º DO ARTIGO 43 DA LEI Nº 8.212/91, ACRESCIDOS PELA MEDIDA PROVISÓRIA Nº 449/2008, CONVERTIDA NA LEI Nº 11.941/2009

I - CONHECIMENTO

Trata-se de caso em que a prestação de serviços se iniciou em 1º/6/2005 e findou em 1º/9/2011 (págs. 2, 4 e 214), havendo condenação ao pagamento de parcelas vencidas dentro do período imprescrito de 2/10/2007 a 1/9/2011 (pág. 214), portanto, anterior e posterior à entrada em vigor dos §§ 2º e 3º do artigo 43 da Lei nº 8.212/1991, acrescidos pela Medida Provisória nº 449/2008, convertida na Lei nº 11.941/2009 ( 5/3/2009 ).

O Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região, por meio do acórdão de págs. 336-341, negou provimento ao recurso ordinário interposto pela União para confirmar a sentença na qual se considerou como fato gerador da contribuição previdenciária o efetivo pagamento do crédito ao empregado, mediante os seguintes fundamentos:

" Do mérito

Não assiste razão à recorrente.

É que o procedimento utilizado para as formas usuais de arrecadação, em que o empregador efetua o pagamento do salário ao empregado e não recolhe a contribuição para a seguridade social, não se aplica aos débitos oriundos das sentenças trabalhistas, eis que para estes existe legislação própria a ser aplicada, qual seja, o art. 276 do Decreto n^' 3048/99, que regulamenta o art. 43 da Lei n° 8.212/91, assim dispondo: "Nas ações trabalhistas de que resultar o pagamento de direitos sujeitos à incidência de contribuição previdenciária, o recolhimento das importâncias devidas à seguridade social será feito no dia dois do mês seguinte ao da liquidação da sentença".

Com efeito, quando o crédito trabalhista é constituído em juízo, não há que se falar em mora do empregador no que diz respeito à contribuição previdenciária, porque não houve a constituição regular do crédito previdenciário, eis que o INSS não ajuizou ação de cobrança em face do empregador, para que então fosse constituído em mora. Na verdade, o que corre perante a Justiça do Trabalho é a lide travada entre empregado e empregador, da qual sequer participa o INSS.

Portanto, é no momento da disponibilidade do pagamento, oriundo da sentença, que ocorre o fato gerador da contribuição previdenciária respectiva. Diferente da regra geral da contribuição previdenciária, pois decorre do pagamento efetuado em virtude da sentença judicial, e não da situação normal da atividade da empresa.

A corroborar o posicionamento ora adotado, transcrevo o aresto:

DIREITO CONSTITUCIONAL, PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL DO TRABALHO. EXECUÇÃO. AGRAVO DE PETIÇÃO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. FATO GERADOR. PARCELA DE NATUREZA SALARIAL INCIDÊNCIA. I - Após a decisão do Plenário do Supremo Tribunal Federai que, negando provimento a Recurso Extraordinário interposto pelo INSS (RE569056), limitou a competência da Justiça do Trabalho para a execução de contribuições previdenciárias sobre salários pagos no curso do vínculo de emprego reconhecido apenas em sentença; a data-limite de pagamento das contribuições previdenciárias decorrentes de sentença condenatória trabalhista corresponde ao dia dois do mês seguinte ao do trânsito em julgado da sentença de liquidação. Esta a melhor exegese do disposto no art. 276 do Decreto 3.048/99, não havendo se falar em incidência de encargos (juros e multa) enquanto pendente de discussão o quantum debeatur, até para que se saiba, com exatidão, o valor a ser recolhido. Apelo a que se nega provimento. (TRT 6ª R., RO 00217-2008-231-06-00-7, 3ª Tuma, Relator: Ibrahim Alves da Silva Filho, DOE 09/04/2009).

Destaco ainda que em 02/04/2009, julgando o Incidente de Uniformização de Jurisprudência suscitado nos autos do Agravo de Petição n° 00381-2003-020-06-85-2, resolveu o Plenário desta Corte, por maioria, declarar que o fato gerador das contribuições para custeio da seguridade social é o pagamento ou o crédito dos rendimentos decorrentes do título executivo judicial trabalhista, resultando na edição da Súmula n° 14 deste Egrégio Regional, verbis:

CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. MOMENYO DE INCIDÊNCIA DE JUROS E MULTA. A hipótese de incidência da contribuição social prevista no artigo 195, inciso I, alínea "a", da Constituição da República Federativa do Brasil ocorre quando há o pagamento ou o crédito dos rendimentos de natureza salarial decorrentes do título judicial trabalhista, razão pela qual, a partir daí, conta-se o prazo legal para o seu recolhimento, após o que, em caso de inadimplência, computar-se-ão os acréscimos pertinentes a juros e multa mencionados na legislação ordinária aplicável a espécie. Ante as peculiaridades de cada forma de arrecadação acima mencionada, não há que se falar em violação ao princípio da isonomia, pretendida pela recorrente, uma vez que a g própria legislação, como visto, estabelece um critério diferenciado para o recolhimento da contribuição previdenciária apurada mediante sentença trabalhista.

Por fim, ressalto que a alteração introduzida no art. 43 da Lei nº 8.212/91 pela Lei nº 11.941/09, fez com que seu parágrafo 3º passasse a vigorar com a seguinte redação:

As contribuições sociais serão apuradas mês a mês, com referência ao período da prestação de serviços, mediante a aplicação de alíquotas, limites máximos do "salário-de-contribuição e acréscimos legais moratórios vigentes relativamente a cada uma das Competências abrangidas, devendo o recolhimento ser efetuado no mesmo prazo em que devam ser pagos os créditos encontrados em liquidação de sentença ou em acordo homologado, sendo que nesse último caso o recolhimento será feito em tantas parcelas quantas as previstas no acordo, nas mesmas datas em que sejam exigíveis e proporcionalmente a cada uma delas.

O que em nada afeta a conclusão que ora se chega, vez que já se firmou entendimento, inclusive no âmbito do Excelso STF, que o fato gerador das contribuições previdenciárias é o pagamento do crédito ao trabalhador, devendo a nova redação dada ao art. 43 da Lei de Custeio ser interpretada à luz do disposto no art. 195 da Carta Magna .

Nada a reformar neste ponto.

Ante o exposto, preliminarmente, não conheço do recurso da reclamada recorrente por intempestividade. No mérito, nego provimento ao recurso da União para reconhecer que a hipótese de incidência da contribuição social prevista no artigo 195, inciso I, alínea "a", da Constituição da República Federativa do Brasil ocorre quando há o pagamento ou o crédito dos rendimentos de natureza salarial decorrentes do título judicial trabalhista , razão pela qual, a partir daí, conta-se o prazo legal para o seu recolhimento , nos termos da súmula 14 deste E. TRT da 6ª Região" (págs. 339-341, grifou-se e destacou-se).

Nas razões de recurso de revista, sustenta a União que o fato gerador da contribuição previdenciária é a prestação de serviços e que, em razão disso, devem os juros moratórios e a multa incidirem desde esse momento.

Para tanto, indica afronta aos artigos 5º, caput , e 150, inciso II, da Constituição Federal, 22 e 43, §§ 2º e 3º, da Lei nº 8.212/91 e 114 e 116 do CTN e colaciona divergência jurisprudencial.

Razão assiste à União.

Discute-se, no caso, qual o fato gerador das contribuições previdenciárias relativas às parcelas trabalhistas objeto de condenação ou de acordo homologado pela Justiça do Trabalho e, consequentemente, o marco inicial para a incidência dos acréscimos legais concernentes aos juros e às multas.

Sabe-se que as espécies tributárias do ordenamento jurídico brasileiro, em conformidade com o entendimento já pacificado pelo Supremo Tribunal Federal, são cinco, nas quais se incluem os impostos, as taxas, as contribuições de melhoria, as contribuições sociais dos artigos 149 e 195 da Constituição Federal e os empréstimos compulsórios.

A Emenda Constitucional nº 45 de 2004, que acrescentou o inciso VIII ao artigo 114 da Constituição Federal, atribuiu à Justiça do Trabalho a competência para executar, de ofício, as contribuições sociais previstas no artigo 195, inciso I, alínea "a", e inciso II, e seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir.

O mencionado artigo 195 da Constituição Federal de 1988, por sua vez, que trata das contribuições sociais concernentes à seguridade social, em seus incisos I, alínea "a", e II, que cuidam especificamente das previdenciárias, dispõe o seguinte:

"Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:

I – do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)

a) folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)

b) a receita ou o faturamento; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)

c) o lucro; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)

II – do trabalhador e dos demais segurados da previdência social, não incidindo contribuição sobre aposentadoria e pensão concedidas pelo regime geral de previdência social de que trata o art. 201; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)

III - sobre a receita de concursos de prognósticos;

IV - do importador de bens ou serviços do exterior, ou de quem a lei a ele equiparar. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003)

[...]

§ 4º - A lei poderá instituir outras fontes destinadas a garantir a manutenção ou expansão da seguridade social, obedecido o disposto no art. 154, I.

§ 5º - Nenhum benefício ou serviço da seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio total.

§ 6º - As contribuições sociais de que trata este artigo só poderão ser exigidas após decorridos noventa dias da data da publicação da lei que as houver instituído ou modificado, não se lhes aplicando o disposto no art. 150, III, "b"." (destacou-se)

O entendimento majoritário desta Corte é de que, até o advento da Medida Provisória nº 449/2008, posteriormente convertida na Lei nº 11.941/2009, que conferiu nova redação ao artigo 43 da Lei nº 8.212/91, o termo inicial para os acréscimos legais moratórios da contribuição previdenciária, no caso das parcelas deferidas judicialmente, é o dia dois do mês seguinte ao da liquidação da sentença, pois o artigo 276, caput , do Decreto nº 3.048/99 prevê que o recolhimento dessas importâncias devidas à seguridade social será feito na referida data.

Isso porque, segundo o entendimento majoritário, não havendo previsão expressa em lei, até então, considerando como fato gerador das contribuições sociais a data da prestação dos serviços, ocorrendo o pagamento do crédito de parcelas deferidas judicialmente ao trabalhador somente após a liquidação de sentença, não é possível inferir-se que o fato gerador das contribuições previdenciárias seja outro que não esse.

Entretanto, a Lei nº 11.941, de 27 de maio de 2009, resultante da conversão da Medida Provisória nº 449 de 2008, acresceu o § 2º e o § 3º ao artigo 43 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, que passaram a prever expressamente que o fato gerador das contribuições sociais se considera ocorrido na data da prestação do serviço e que essas contribuições sociais serão apuradas mês a mês, mediante a aplicação, entre outros, de acréscimos legais moratórios vigentes relativamente a cada uma das competências abrangidas, devendo o recolhimento ser efetuado no mesmo prazo em que devam ser pagos os créditos encontrados em liquidação de sentença ou em acordo homologado. No caso do acordo homologado, o recolhimento será feito em tantas parcelas quantas as previstas no acordo, nas mesmas datas em que sejam exigíveis e proporcionalmente a cada uma delas.

A partir daí , seguiu-se celeuma relativamente à constitucionalidade do artigo 43 da Lei nº 8.212/91, diante das alterações introduzidas pela Medida Provisória nº 449/2008, convertida na Lei nº 11.941/2009, frente ao disposto no artigo 195, inciso I, alínea "a", da Constituição Federal.

Nesse contexto, observa-se , do Texto Constitucional , ter o Constituinte atribuído natureza tributária às contribuições previdenciárias, pelo que o regime jurídico que lhes é aplicável é o tributário, e, nesse caso, o artigo 146, inciso III, alínea "a", da Constituição Federal estabelece que:

"Art. 146. Cabe à lei complementar:

I - dispor sobre conflitos de competência, em matéria tributária, entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios;

II - regular as limitações constitucionais ao poder de tributar;

III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre:

a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes;

b) obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários;

[...]" (destacou-se)

Percebe-se , desse preceito , que a Constituição Federal remeteu à legislação infraconstitucional a definição e a delimitação dos tributos , inclusive a especificação dos seus fatos geradores , estabelecendo, no entanto, expressa e especificamente nos casos dos impostos discriminados no Texto Constitucional , incumbir à lei complementar a definição dos seus fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes.

Portanto, estabelecidas as normas gerais em matéria de legislação tributária, conforme preconizado no artigo 146, inciso III, da Constituição Federal, pela lei complementar - no caso , o Código Tributário Nacional (Lei nº 5.172/1966), promulgado como lei ordinária e recebido como lei complementar pelas Constituições Federais de 1967/69 e 1988 -, fica ao encargo da legislação ordinária a definição do fato gerador das contribuições sociais previdenciárias, visto que a exigência preconizada no mencionado dispositivo constitucional da necessidade de edição de lei complementar para a definição do fato gerador se restringiu aos impostos, dos quais se distinguem as contribuições sociais, não obstante ambos sejam espécies de tributos.

Com efeito, todas as contribuições sociais, sem exceção, sujeitam-se à lei complementar de normas gerais, ou seja, ao Código Tributário Nacional, o que não significa que a instituição dessas contribuições exija lei complementar, visto que não são impostos e, portanto, não há necessidade de que seus fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes estejam definidos em lei complementar, podendo sê-los por lei ordinária, como o foram pela Lei nº 8.212/91, com as alterações introduzidas pela Medida Provisória nº 449/2008, convertida na Lei nº 11.941/2009, que estabelece como fato gerador das contribuições previdenciárias a prestação dos serviços.

Apenas as contribuições sociais a que alude o § 4º do artigo 195 da Constituição Federal, instituídas sobre "outras fontes", que não aquelas já previstas no Texto Constitucional - como é o caso das contribuições previdenciárias estabelecidas nos incisos I e II do citado artigo 195, cujas fontes estão neles definidas -, é que exigem , para a sua instituição , lei complementar.

Nesse sentido, cabe trazer à colação os seguintes precedentes do Supremo Tribunal Federal:

"CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA DO EMPREGADOR. FATO GERADOR. PRAZO PARA RECOLHIMENTO. I – O estabelecimento do momento em que se dá o fato gerador e a exigibilidade da contribuição social devida pelo empregador, incidente sobre a folha de salários, são questões a serem reguladas mediante legislação ordinária, que não integra o contencioso constitucional. Precedentes. II – Agravo não provido." (STF, AI-AgR 508398, Rel. Min. Carlos Velloso, data da publicação 14/10/2005)

"As contribuições do art. 149, C.F. - contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse de categorias profissionais ou econômicas – posto estarem sujeitas à lei complementar do art. 146, III, C.F., isto não quer dizer que deverão ser instituídas por lei complementar. A contribuição social do art. 195, § 4º, C.F., decorrente de "outras fontes", é que, para a sua instituição, será observada a técnica da competência residual da União: C.F., art. 154, I, ex vi do disposto no art. 195, § 4º. A contribuição não é imposto. Por isso, não se exige que a lei complementar defina a sua hipótese de incidência, a base imponível e contribuintes: C.F., art. 146, III, a. Precedentes: RE 138.284/CE, Ministro Carlos Velloso, RTJ 143/313; RE 146.733/SP, Ministro Moreira Alves, RTJ 143/684." (RE 396.266, Pleno, Rel. Carlos Velloso, DJ 27/2/2004)

"EMENTAS: 1. RECURSO. Extraordinário. Inadmissibilidade. Contribuição previdenciária. Fato gerador. Mês de competência do pagamento de salários. Art. 30, I, "b", da Lei nº 8.212/91. Alegação de ofensa ao art. 195, I, "a", da Constituição Federal. Ofensa constitucional indireta. Agravo regimental não provido. Não cabe recurso extraordinário que teria por objeto alegação de ofensa que, irradiando-se de má interpretação, aplicação, ou, até, de inobservância de normas infraconstitucionais, seria apenas indireta à Constituição da República. 2. RECURSO. Agravo. Regimental. Jurisprudência assentada sobre a matéria. Caráter meramente abusivo. Litigância de má-fé. Imposição de multa. Aplicação do art. 557, § 2º, cc. arts. 14, II e III, e 17, VII, do CPC. Quando abusiva a interposição de agravo, manifestamente inadmissível ou infundado, deve o Tribunal condenar o agravante a pagar multa ao agravado." (AG.REG.NO AGRAVO DE INSTRUMENTO - AI 545124 AgR / SC - SANTA CATARINA, Relator(a): Min. CEZAR PELUSO, DJ 11/11/2005)

"CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS. CONTRIBUIÇÕES INCIDENTES SOBRE O LUCRO DAS PESSOAS JURIDICAS. Lei 7.689, de 15-12-1988. Contribuições parafiscais: contribuições sociais, contribuições de intervenção e contribuições corporativas. CF, art. 149. Contribuições sociais de seguridade social. CF, arts. 149 e 195. As diversas espécies de contribuições sociais. A contribuição da Lei 7.689, de 15-12-1988, é uma contribuição social instituída com base no art. 195, I, da Constituição. As contribuições do art. 195, I, II, III, da Constituição, não exigem, para a sua instituição, lei complementar. Apenas a contribuição do parágrafo 4º do mesmo art. 195 é que exige, para a sua instituição, lei complementar, dado que essa instituição deverá observar a técnica da competência residual da União (C.F., art. 195, parag. 4º; C.F., art. 154, I). Posto estarem sujeitas à lei complementar do art. 146, III, da Constituição, porque não são impostos, não há necessidade de que a lei complementar defina o seu fato gerador, base de cálculo e contribuintes." (RE 138.284, Rel. Min. Carlos Velloso, julgamento em 1º-7-1992, Plenário, DJ de 28/8/1992/.)

"RE 723259 / DF - DISTRITO FEDERAL

RECURSO EXTRAORDINÁRIO

Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA

Julgamento: 27/11/2012

Publicação

PROCESSO ELETRÔNICO

DJe-239 DIVULG 05/12/2012 PUBLIC 06/12/2012

Partes

RECTE.(S): BANCO DO BRASIL S.A.

ADV.(A/S): FLÁVIO RENATO FANCHINI TERRASAN

RECDO.(A/S): REINALDO CÍCERO CAMINHA

ADV.(A/S): VILSON MARIOT

RECDO.(A/S): UNIÃO

PROC.(A/S)(ES): PROCURADOR-GERAL FEDERAL

DECISÃO

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. FATO GERADOR. MOMENTO DA INCIDÊNCIA DE JUROS DE MORA E MULTA: MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL. OFENSA CONSTITUCIONAL INDIRETA. RECURSO AO QUAL SE NEGA SEGUIMENTO.

Relatório

1. Recurso extraordinário interposto com base na alínea a do inc. III do art. 102 da Constituição da República contra julgado do Tribunal Superior do Trabalho:

"AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. EXECUÇÃO. NÃO SATISFEITA A COMPROVAÇÃO DE VIOLAÇÃO DIRETA DE PRECEITO DE NATUREZA CONSTITUCIONAL. NÃO PROVIMENTO. Nega-se provimento ao Agravo de Instrumento em processo de execução, quando não demonstrada violação direta a dispositivo de natureza constitucional. Aplicação do disposto no art. 896, § 2.º, da CLT e da Súmula n.º 266 do TST. Agravo de Instrumento não provido".

Os embargos de declaração opostos pelo Recorrente foram rejeitados.

2. O Recorrente alega que o Tribunal a quo teria contrariado os arts. 5º, inc. II, 150, inc. I, e 195, inc. I, alínea a, da Constituição da República.

Argumenta que, "se a Constituição Federal determina que o fato gerador da contribuição previdenciária se dá sobre folha de pagamento e demais rendimentos PAGOS OU CREDITADOS, a qualquer título, não pode criar o legislador infraconstitucional ou o próprio executivo (…) novo fato imponível, sob pena de malferir a norma hierarquicamente superior" (grifos no original).

Afirma que, "somente da data do pagamento ao trabalhador é que o empregador tem até o dia dois do mês subsequente para que, sem qualquer acréscimo legal, recolha as contribuições previdenciárias devidas, consoante prevê o art. 276 do Decreto n. 3.048/99, ou então, no prazo previsto do art. 30, I, da Lei n° 8.212/91. Assim, a mora só se configura após esse prazo, devendo por isso incidir atualização monetária, juros e multas sobre as parcelas previdenciárias devidas e não pagas" (grifos no original).

Examinados os elementos do processo, DECIDO.

3. Razão jurídica não assiste ao Recorrente.

4. A assentada jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de que a controvérsia sobre o momento de ocorrência do fato gerador da contribuição previdenciária tem natureza infraconstitucional, o que não viabiliza o processamento do recurso extraordinário. A pretensa contrariedade à Constituição, se tivesse ocorrido, seria indireta. Nesse sentido:

" TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA A CARGO DO EMPREGADOR SOBRE A FOLHA DE SALÁRIOS. MOMENTO DE OCORRÊNCIA DO FATO GERADOR. MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL. PRECEDENTES . 1. O Supremo Tribunal Federal possui entendimento consolidado de que possui caráter infraconstitucional a discussão acerca do momento em que ocorre o fato gerador e a exigibilidade da contribuição previdenciária devida pelo empregador e incidente sobre a folha de salários. Precedentes. 2. Agravo regimental improvido"(RE 437.642-AgR/RS, Rel. Min. Ellen Gracie , Segunda Turma, DJ 3.9.2010, grifos nossos).

" EMENTA: TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. FATO GERADOR. LEI 8.212/91. MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL. SÚMULA 283. A matéria versada nos autos, tal como decidida pelo acórdão regional, envolve exclusiva análise de normas infraconstitucionais, o que é vedado em recurso extraordinário. O STJ, em sede própria, julgou a causa em desfavor da ora agravante, o que atrai a incidência da Súmula 283/STF. Agravo regimental a que se nega provimento"(AI 545.122-AgR/SC, Rel. Min. Joaquim Barbosa , Segunda Turma, DJ 8.10.2010, grifos nossos).

" EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA DO EMPREGADOR. FATO GERADOR. PRAZO PARA RECOLHIMENTO. MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL. OFENSA REFLEXA À CONSTITUIÇÃO FEDERAL. 1. No caso, afronta à Carta Magna de 1988, se existente, ocorreria de modo reflexo ou indireto, o que impede a abertura da via extraordinária. 2. Agravo regimental desprovido" (AI 555.265-AgR/SC, Rel. Min. Ayres Britto , Primeira Turma, DJ 7.5.2010, grifos nossos).

"EMENTA: TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA DO EMPREGADOR. RECOLHIMENTO. FATO GERADOR. CONTROVÉRSIA INFRACONSTITUCIONAL. OFENSA INDIRETA À CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO"(AI 533.602-AgR/SC, de minha relatoria, Primeira Turma, DJ 9.2.2007, grifos nossos).

E: RE 705.780 e RE 681.099, ambos de minha relatoria, transitados em julgado.

5. Pelo exposto, nego seguimento ao presente recurso extraordinário (art. 557, caput, do Código de Processo Civil e art. 21, § 1º, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal).

Publique-se.

Brasília, 27 de novembro de 2012.

Ministra CÁRMEN LÚCIA"

"ARE 677480 / MG - MINAS GERAIS

RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO

Relator(a): Min. ROSA WEBER

Julgamento: 19/10/2012

Publicação

DJe-212 DIVULG 26/10/2012 PUBLIC 29/10/2012

Partes

RECTE.(S): HOSPITAL MUNICIPAL ODILON BEHRENS

ADV.(A/S): GABRIELA FONTES DE PÁDUA E OUTRO(A/S)

RECDO.(A/S ELIZABETH MARTINS BOSCO

ADV.(A/S): ROGÉRIA GONZAGA JAYME E OUTRO(A/S)

RECDO.(A/S): UNIÃO

PROC.(A/S)(ES): PROCURADOR-GERAL FEDERAL

ADV.(A/S): JULIANA NARCÍSIO DE OLIVEIRA

ADV.(A/S): JURANDIR VAZ DO NASCIMENTO

Decisão

Vistos etc.

Contra o juízo negativo de admissibilidade do recurso extraordinário, exarado pela Presidência do Tribunal a quo , maneja agravo o Hospital Municipal Odilon Behrens. Na minuta, sustenta que o recurso extraordinário reúne todos os requisitos para sua admissão. Aponta violação direta dos arts. 5º, LV, 150, III, 154, I, e 195, I e II, da Constituição Federal .

Contraminuta da União.

É o relatório.

Decido.

Preenchidos os pressupostos extrínsecos.

Da detida análise dos fundamentos da decisão denegatória de seguimento do recurso extraordinário, bem como à luz das razões de decidir adotadas pelo Tribunal de origem, por ocasião do julgamento do recurso veiculado na instância ordinária, concluo que nada colhe o agravo.

Não há falar em afronta aos preceitos constitucionais indicados nas razões recursais, porquanto, no caso, a suposta ofensa somente poderia ser constatada a partir da análise da legislação infraconstitucional apontada no apelo extremo, o que torna oblíqua e reflexa eventual ofensa, insuscetível, portanto, de viabilizar o conhecimento do recurso extraordinário .

Dessarte, desatendida a exigência do art. 102, III, "a", da Lei Maior, nos termos da remansosa jurisprudência deste egrégio Supremo Tribunal Federal. Aplicação da Súmula 280/STF: "Por ofensa a direito local não cabe recurso extraordinário". Nesse sentido: AI 555.265-AgR/SC, Rel. Min. Ayres Britto, 1ª Turma, DJe 07.5.2010; AI 533.602-AgR/SC, Rel. Min. Cármen Lúcia, 1ª Turma, DJ 09.02.2007; AI 679.695-AgR/PE, Rel. Min. Luiz Fux, 1ª Turma, DJe 26.4.2012; AI 545.122-AgR/SC, Rel. Min. Joaquim Barbosa, 2ª Turma, DJe 08.10.2010; e RE 437.642-AgR/RS, Rel. Min. Ellen Gracie, 2ª Turma, DJe 03.9.2010, cuja ementa transcrevo: " TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA A CARGO DO EMPREGADOR SOBRE A FOLHA DE SALÁRIOS. MOMENTO DE OCORRÊNCIA DO FATO GERADOR. MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL. PRECEDENTES . 1. O Supremo Tribunal Federal possui entendimento consolidado de que possui caráter infraconstitucional a discussão acerca do momento em que ocorre o fato gerador e a exigibilidade da contribuição previdenciária devida pelo empregador e incidente sobre a folha de salários. Precedentes. 2. Agravo regimental improvido.".

O exame de eventual ofensa ao preceito constitucional indicado nas razões recursais, consagrador dos princípios da proteção ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa (art. 5º da Lei Maior), demanda, em primeiro plano, a interpretação das normas infraconstitucionais aplicáveis à espécie, de tal modo que, se afronta ocorresse, seria indireta, o que não atende à exigência do art. 102, III, "a", da Lei Maior, nos termos da remansosa jurisprudência deste egrégio Supremo Tribunal Federal, verbis :

"RECURSO. Extraordinário. Inadmissibilidade. Alegação de ofensa ao art. 5º, XXII, XXIII, XXIV, LIV e LV, da Constituição Federal. Violações dependentes de reexame prévio de normas inferiores. Ofensa constitucional indireta. Matéria fática. Súmula 279. Agravo regimental não provido. É pacífica a jurisprudência desta Corte, no sentido de não tolerar, em recurso extraordinário, alegação de ofensa que, irradiando-se de má interpretação, aplicação, ou, até, inobservância de normas infraconstitucionais, seria apenas indireta à Constituição da República, e, muito menos, de reexame de provas" (STF-AI-AgR-495.880/SP, Relator Ministro Cezar Peluso, 1ª Turma, DJ 05.8.2005).

"Recurso extraordinário: descabimento: acórdão recorrido, do Tribunal Superior do Trabalho, que decidiu a questão à luz de legislação infraconstitucional: alegada violação ao texto constitucional que, se ocorresse, seria reflexa ou indireta; ausência de negativa de prestação jurisdicional ou de defesa aos princípios compreendidos nos arts. 5º, II, XXXV, LIV e LV e 93, IX, da Constituição Federal." (STF-AI-AgR-436.911/SE, Relator Ministro Sepúlveda Pertence, 1ª Turma, DJ 17.6.2005)

"CONSTITUCIONAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO: ALEGAÇÃO DE OFENSA À C.F., art. 5º, II, XXXV, XXXVI, LIV e LV. I. - Ao Judiciário cabe, no conflito de interesses, fazer valer a vontade concreta da lei, interpretando-a. Se, em tal operação, interpreta razoavelmente ou desarrazoadamente a lei, a questão fica no campo da legalidade, inocorrendo o contencioso constitucional. II. - Decisão contrária ao interesse da parte não configura negativa de prestação jurisdicional (C.F., art. 5º, XXXV). III. – A verificação, no caso concreto, da existência, ou não, do direito adquirido, situa-se no campo infraconstitucional. IV. - Alegação de ofensa ao devido processo legal: C.F., art. 5º, LIV e LV: se ofensa tivesse havido, seria ela indireta, reflexa, dado que a ofensa direta seria a normas processuais. E a ofensa a preceito constitucional que autoriza a admissão do recurso extraordinário é a ofensa direta, frontal. V. - Agravo não provido" (STF-RE-AgR-154.158/SP, Relator Ministro Carlos Velloso, 2ª Turma, DJ 20.9.2002).

Nesse sentir, não merece processamento o apelo extremo, consoante também se denota dos fundamentos da decisão que desafiou o recurso, aos quais me reporto e cuja detida análise conduz à conclusão pela ausência de ofensa direta e literal a preceito da Constituição da República.

Conheço do agravo para negar-lhe provimento (art. 544, § 4º, II, "a", do CPC).

Publique-se.

Brasília, 19 de outubro de 2012.

Ministra Rosa Weber."

Levando-se em conta, portanto, o entendimento do Supremo Tribunal Federal de que o estabelecimento do momento em que ocorrem o fato gerador e a exigibilidade da contribuição social devida pelo empregador, incidente sobre a folha de salários, são questões a serem reguladas mediante legislação ordinária, que não integra o contencioso constitucional, não há como se entender que o artigo 195 da Constituição Federal estabelece o fato gerador das contribuições previdenciárias.

Com efeito, o artigo 195 da Constituição Federal não define o fato gerador das contribuições previdenciárias, mas apenas sinaliza suas fontes de custeio, a fim de evitar que o legislador infraconstitucional institua outro tributo de natureza semelhante se amparando nos mesmos indicadores ou fontes, prática coibida pela Lei Maior, conforme se infere do seu artigo 154, inciso I, ao cuidar da instituição de impostos não previstos no Texto Constitucional.

A par disso, reportando-se à legislação infraconstitucional, verifica-se que o Código Tributário Nacional, que estabelece normas gerais em matéria tributária, em seu artigo 114 define , como fato gerador da obrigação tributária principal , "a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência" , enquanto que o artigo 113, § 1º, preceitua que a obrigação tributária principal "surge com a ocorrência do fato gerador, tem por objeto o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária e extingue-se juntamente com o crédito dela decorrente" .

Cabe trazer à lume os ensinamentos de Yoshiaki Ichiara, de que , "existindo na lei a descrição do fato gerador, a que denominamos de ‘hipótese de incidência’, quando alguém (contribuinte do tributo) realizar, no mundo concreto, o comportamento típico e idêntico ao da descrição legal – esta última que denominamos de ‘fato imponível’ -, nesse momento ocorre o fato gerador que, por conseguinte, gera a obrigação de pagar o tributo" ( in DIREITO TRIBUTÁRIO, Editora Atlas S.A, SP, 3ª edição, 1989, pág. 120).

No caso, o § 2º do artigo 43 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, acrescido pela Lei nº 11.941, de 27 de maio de 2009, prevê expressamente que o fato gerador das contribuições sociais se considera ocorrido na data da prestação do serviço, a partir da qual, portanto, conforme dicção dos citados artigos 113, § 1º, e 114 do CTN, surge a obrigação tributária principal, ou obrigação trabalhista acessória.

Por outro lado, prescreve o artigo 394 do Código Civil, incluído no Título que cuida do Inadimplemento das Obrigações, que " considera-se em mora o devedor que não efetuar o pagamento , e o credor que o não quiser recebê-lo no tempo, lugar e forma que a lei ou a convenção estabelecer " (grifou-se e destacou-se), e, nesse aspecto, os artigos 20 e 22, inciso I, da Lei nº 8.212/91 estabelecem expressamente os parâmetros para o recolhimento das contribuições previdenciárias a cargo do empregado e do empregador, como alíquotas, bases de cálculo e percentuais, entre outros, descartando-se, com isso, o argumento, por vezes utilizado para fundamentar a postergação do fato gerador para a liquidação dos créditos, do desconhecimento pelo empregador da correta dimensão das contribuições devidas.

Por sua vez, com relação ao fator tempo para o adimplemento da obrigação, o artigo 30 da mesma Lei nº 8.212/91 prevê , como época própria para esse recolhimento previdenciário , o dia 20 (vinte) do mês subsequente ao da competência, conforme redação dada pela Lei nº 11.933/2009 (antes da edição da Lei nº 11.933/2009, o prazo era o dia 2 do mês seguinte ao da competência), in verbis :

"Art. 30. A arrecadação e o recolhimento das contribuições ou de outras importâncias devidas à Seguridade Social obedecem às seguintes normas: (Redação dada pela Lei n° 8.620, de 5.1.93):

I - a empresa é obrigada a:

a) arrecadar as contribuições dos segurados empregados e trabalhadores avulsos a seu serviço, descontando-as da respectiva remuneração;

b) recolher os valores arrecadados na forma da alínea a deste inciso, a contribuição a que se refere o inciso IV do art. 22 desta Lei, assim como as contribuições a seu cargo incidentes sobre as remunerações pagas, devidas ou creditadas, a qualquer título, aos segurados empregados, trabalhadores avulsos e contribuintes individuais a seu serviço até o dia 20 (vinte) do mês subsequente ao da competência ; (Redação dada pela Lei nº 11.933, de 2009). (Produção de efeitos)". (grifou-se e destacou-se)

Aprofundando a análise da questão do fato gerador da obrigação tributária previdenciária e da mora tributária do empregador, José Geraldo da Fonseca, Desembargador do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região, em seu artigo Fato Gerador da Obrigação Tributária Previdenciária , publicado na Revista do TRT/EMATRA da 1ª Região, JAN/JUN 2007, escreve o seguinte:

"§ 2º - Fato gerador da obrigação tributária previdenciária

[...]

4 - O fato tributário previdenciário dimana da lei. A obrigação tributária previdenciária constitui-se independentemente de lançamento e o seu fato gerador não pressupõe sentença trabalhista, mas a contraprestação do trabalho ou serviço sujeito à retenção previdenciária. O fato gerador da obrigação tributária previdenciária é o momento em que o salário ou qualquer contraprestação em dinheiro deva ser paga ao trabalhador ou ao prestador do serviço, ainda que essa contraprestação em pecúnia não tenha sido paga ou creditada, ou o tenha sido a destempo . Assim é porque o art. 195, I, ‘a’, e II da CF/88 fala em contribuição social incidente sobre a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício. Os arts. 22 e 28 da Lei n. 8.212/91 ampliam o alcance da cobrança previdenciária quando falam em incidência sobre os salários devidos, isto é, sobre qualquer forma de pagamento devido como contraprestação do trabalho, ainda que não tenha sido feito.

§ 3º - Lançamento como modo de constituição da obrigação tributária

5 – O E. STF entende que a contribuição previdenciária tem natureza jurídica de tributo. Em regra, todo crédito tributário, para ser executado, deve ser precedido do correspondente lançamento. Lançamento é o procedimento administrativo por meio do qual a autoridade administrativa verifica a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determina a matéria tributável, calcula o montante, identifica o sujeito passivo e propõe penalidades. O lançamento constitui pleno jure a obrigação tributária e é ato privativo da autoridade administrativa. Embora o lançamento seja o modo usual de constituição da obrigação tributária, não quer isso dizer que o tributo somente se constitua com o lançamento, ou, dito por outras palavras, que não haja outro modo de constituição da obrigação tributária, senão pelo lançamento. O que o art. 142 do CTN prevê é o modo pelo qual a obrigação tributária se constitui pelo lançamento, e não que somente o lançamento constitua a obrigação tributária. Conquanto ao alterar a redação do art. 897, § 8º, da CLT a Lei n. 10.035/2000 tenha investido o juiz do trabalho de poderes semelhantes aos da autoridade administrativa, essa condição não vai além da aparência porque o crédito previdenciário é devido independentemente de lançamento, que não é suprido pela sentença, nem é necessário que o seja porque a sua exigência decorre da própria lei. Trata-se – se se pode usar da expressão – de um lançamento presumido.

[...]

§ 4º - Efeito declaratório da sentença trabalhista

7 – Conquanto haja divergência da doutrina, é certo que a sentença trabalhista apenas declara a incidência da cota previdenciária, mas não a constitui. A obrigação preexiste à sua declaração por sentença. Não há necessidade de lançamento, contraditório ou notificação porque tudo isso decorre automaticamente da lei. Quando a CF/88 e a lei falam em salários e demais rendimentos devidos, pagos ou creditados ao trabalhador, querem significar que o fato gerador da obrigação tributária previdenciária é a contraprestação do trabalho, e não a declaração do débito por sentença. Admitir que a obrigação previdenciária se constitua com a sentença não resolve aquelas situações, comuns no foro, em que o empregado quer, apenas, o reconhecimento jurídico do vínculo de emprego, mas não cobra qualquer parcela salarial em atraso. Nesses casos, não havendo obrigação salarial de pagar, o crédito previdenciário jamais seria cobrável, embora os salários e outras quantias tributáveis tenham sido pagas ao empregado ao longo da relação de emprego.

[...]

§ 6º - Mora

11 – Assentado que o fato gerador da obrigação tributária previdenciária é o salário ou qualquer outro rendimento tributável e a época própria, segundo a lei previdenciária, o décimo dia do mês subsequente ao de competência, é hora de definir-se mora, ou, mais precisamente, desde quando o devedor da obrigação tributária previdenciária está incurso em mora. [...]

[...]

12 – Está em Giorgi que mora é o retardamento culposo no pagamento daquilo que se deve ou no recebimento do que nos é devido ( mora est dilatio culpa non carens debiti solvendi, vel credito accipiendi ). A essa ilação tantas vezes lida – de que mora é todo inadimplemento culposo – opõe-se Agostinho Alvim afirmando que tal conceito não corresponde ao que em nosso direito se trata por mora porque somente leva em conta o retardamento ( dilatio ), e definir mora apenas pelo fato do retardamento é inexato porque o Código Civil põe em mora tanto o devedor que não paga quanto o credor que não recebe no tempo, lugar e forma combinados, e, depois, porque supõe culpa ( culpa non carens ), seja na mora do devedor, seja na do credor, quando é certo que a culpa só é imprescindível na mora debitoris (do devedor), mas não o é na accipiendi (do credor). [...]

13 – A mora é culpável ou não é imputável, diz a doutrina. O credor previdenciário não precisa alegar nem provar prejuízo para cobrar o devedor por sua mora. É um desserviço à inteligência alegar que o recolhimento previdenciário não foi feito porque nem mesmo o registro do contrato em carteira era desejado pelo empregado. A questão é de ordem pública e a transação sobre os encargos previdenciários não está nos limites da disposição das partes. De antemão, a lei já diz quem é o responsável tributário pelo seu recolhimento, e as consequências desse descumprimento. A lei presume o prejuízo pela demora culposa do patrão ao conservar em seu poder a prestação devia à autarquia previdenciária . Se a culpa é essencial na mora do devedor, mas se presume no retardamento nas dívidas de dinheiro, e cai em mora não apenas o que retarda o pagamento da obrigação mas o que quita o débito de modo imperfeito ou incompleto, ou fora do lugar, tempo e modo ajustados, o devedor previdenciário estará em mora sempre que fizer o depósito fora da época própria em que a obrigação era devida e não foi paga, ou sempre que, tendo cumprido a obrigação pelo depósito, não a tiver acrescido da correção monetária entre o vencimento e o depósito, e dos juros contados desde o nascimento da obrigação tributária previdenciária.

[...]

16 – Vencida e não paga dívida de dinheiro, os juros da mora correm desde logo, mas a mora cessa pelo pagamento em tempo e lugar oportunos. O depósito faz cessar os juros da dívida dali por diante, mas não exonera o devedor dos juros devidos até o momento em que é feito. A culpa é sempre presumível, cabendo ao devedor a prova de que nenhum fato ou omissão a ele imputado, e sim uma impossibilidade momentânea criada pelo credor. Tanto quanto na dívida trabalhista, na previdenciária a mora é ex re , isto é, vige o princípio dies interpellat pro homine , onde o ‘transcurso do tempo encarrega-se de interpelar o devedor " (grifou-se e destacou-se).

Nesse passo, a liquidação da sentença e o acordo homologado judicialmente equivalem à mera exequibilidade do crédito por meio de um título executivo judicial, ao passo que a exigibilidade e a mora podem ser identificadas desde a ocorrência do fato gerador e do inadimplemento da obrigação tributária, que aconteceu desde a prestação dos serviços pelo trabalhador sem a respectiva contraprestação pelo empregador e cumprimento da obrigação trabalhista acessória, ou obrigação tributária principal, de recolhimento da respectiva contribuição previdenciária.

De fato, a apuração do débito previdenciário e o pagamento da remuneração se referem a uma situação pretérita, relativa à prestação de serviços do trabalhador, em que a decisão do Judiciário Trabalhista apenas reconhece a existência de uma dívida tributária/previdenciária que não foi paga na época própria, à época da prestação dos serviços pelo trabalhador (grifou-se e destacou-se), pois a natureza das sentenças e dos acordos homologados judicialmente é declaratória ou condenatória, e não constitutiva, apenas reconhecendo a mora do empregador quando descumpre a obrigação na época própria.

A par dessa natureza jurídica das decisões judiciais, lecionam com acuidade os doutrinadores Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari, in Manual de Direito Previdenciário, 5ª ed., LTr, pp. 280-281, o seguinte:

"Acertando, pois, as arestas da má redação das precipitadas normas de custeio, tem-se que, toda vez que uma decisão judicial definitiva, julgando o mérito da causa, ou homologando transação judicial, declarar que o empregador pagará verbas que são base de cálculo da incidência de contribuição à Seguridade Social, esta é devida, não por conta da sentença, mas pelo fato de que, nos termos da legislação de custeio, é fato gerador da obrigação de recolher contribuição à Seguridade Social o simples fato de ser devido o pagamento de remuneração ao segurado empregado (arts. 20 e 22, I, da Lei n. 8.212/91)

[...]

A contribuição já era devida no momento em que o direito do empregado – por exemplo, as horas extras, ou diferenças salariais – foi violado [...] E não há que se falar em novo vencimento, uma vez que, como já analisado no início, a sentença judicial não é fato gerador de contribuição previdenciária, tampouco a sua liquidação ." (grifou-se e destacou-se)

Na mesma linha de raciocínio, Ivan Kertzman – mestre em Direito Público pela UFBA, especialista em Finanças Empresariais pela USP, professor de Direito Previdenciário e Auditor Fiscal da Receita Federal do Brasil – esclarece que:

" O raciocínio que motiva certos Juízes Trabalhistas a entender que o fato gerador é o pagamento ou a sentença é, quase sempre, mais pragmático que teórico. Eles argumentam que, muitas vezes, da dívida de determinadas parcelas, o empregador só toma conhecimento com a leitura da sentença, não sendo possível exigir o cumprimento da obrigação previdenciária no ato da prestação do serviço.

Um exemplo apontado pelos que defendem essa tese é a condenação do empregador no pagamento de horas extras, provadas no processo por meio testemunhal. O Magistrado que entende que o fato gerador é o pagamento argumenta que o empregador só toma conhecimento de que aquelas horas extras são devidas após a leitura da sentença.

Outro exemplo seria a condenação do empregador no pagamento de diferença salarial por conta de deferimento de pedido de equiparação salarial. Nesse caso, também, advoga-se que o empregador não tinha conhecimento prévio dessa situação.

Não concordamos, contudo, com esse tipo de raciocínio, por entendermos que toda sentença trabalhista condenatória tem uma alta carga de declaração. Em verdade, ao condenar a empresa no pagamento de horas extras (não interessando, obviamente, o meio de prova que convenceu o magistrado), ou na equiparação salarial, a sentença declara que durante a relação laboral houve labor extraordinário não pago pelo empregador ou que houve situação de trabalho em que o trabalhador deveria estar percebendo igual remuneração àquela auferida pelo paradigma.

Declarando a existência dessas situações na sentença, nasce a ficção jurídica de que tais fatos declarados pelo juízo realmente ocorreram. Assim, tendo ocorrido, o empregador tinha ciência e deveria, por conseguinte, ter efetuado o recolhimento das contribuições previdenciárias ." ( in As contribuições Previdenciárias na Justiça do Trabalho. Brasília: Revista do Tribunal Superior do Trabalho. Vol. 78, nº 4, out/dez 2012, p. 138, grifou-se e destacou-se)

Secundando esse entendimento, o professor e advogado Fábio Zambitte Ibrahim, Doutor em Direito Público pela UERJ e Mestre em Direito Previdenciário pela PUC-SP, em sua obra Curso de Direito Previdenciário , 15ª edição, Niterói: Impetus, 2010, pp. 762 e 763, enfatiza que o fato gerador das contribuições previdenciárias, "por óbvio, não é o momento da decisão judicial, haja vista a inexistência em lei desta hipótese de incidência" , ressaltando que "o fato de a decisão judicial reconhecer o débito trabalhista não traz a obrigação previdenciária, pois esta surge desde o momento no qual a remuneração é devida, ou seja, na época de prestação do serviço (art. 22 da Lei nº 8.212/91). A sentença meramente declara tais valores, daí, portanto, o momento da prestação de serviço ser aquele no qual surge o ônus da cotização securitária".

Com isso, infirma-se a tese de que o crédito previdenciário reconhecido apenas em Juízo deveria ter tratamento jurídico diferenciado, ou seja, de que o desconhecimento pelo empregador da correta dimensão das contribuições devidas, diante de alegada indefinição contábil da sua base de cálculo, teria o condão de postergar a ocorrência do fato gerador e da mora para a liquidação dos créditos trabalhista ou para a data do seu pagamento.

De fato, a prestação de serviços é o fato gerador da contribuição previdenciária, mesmo na hipótese de existência de controvérsia acerca dos direitos trabalhistas devidos em decorrência do contrato de trabalho, visto que, repisa-se, as sentenças e os acordos homologados judicialmente possuem natureza meramente declaratória ou condenatória (que tem ínsita também uma declaração), com efeitos ex tunc , e não constitutiva, vindo apenas a reconhecer uma situação jurídica que já existia, além do que os parâmetros que o empregador deve levar em conta para a mensuração dos direitos trabalhistas e para o recolhimento das contribuições previdenciárias a seu cargo e a cargo do empregado, no curso do pacto laboral, estão, repita-se, expressa e previamente estabelecidos na lei.

Essa natureza declaratória da sentença de liquidação e dos acordos homologados judicialmente é confirmada pelo § 1º do artigo 113 do Código Tributário Nacional, que dispõe que a obrigação tributária nasce com a ocorrência do fato gerador (grifou-se e destacou-se), pelo que elas têm por escopo declarar uma situação já preexistente, qual seja, a do momento da ocorrência do fato gerador.

Nesse sentido é a lição do Professor Hugo de Brito Machado, que , ao tratar da natureza jurídica do lançamento, ao qual a sentença trabalhista é por vezes comparada por corrente contrária, ensina in verbis :

"[...] A natureza jurídica do lançamento tributário já foi objeto de grandes divergências doutrinárias. Hoje, porém, é praticamente pacífico o entendimento segundo o qual o lançamento não cria direito. Seu efeito é simplesmente declaratório . [...]" (MACHADO, H. B., Curso de Direito Tributário, São Paulo, Malheiros, 2009, 30ª ed., p. 121, grifou-se e destacou-se)

Dessa forma, o surgimento da obrigação tributária não ocorre somente após a sua liquidação no processo judicial, quando delimitados os valores da remuneração e do tributo daí decorrentes para os empregadores que não cumpriram com a obrigação na época própria. Com efeito, não se verifica da doutrina especializada que a obrigação tributária surja apenas com a apuração do seu quantum , com o seu lançamento, interpretação que esbarra no teor do citado artigo 113, § 1º, do CTN.

Por isso mesmo , não se sustenta também o entendimento de que o fato gerador das contribuições previdenciárias seja o pagamento dos salários, e não a prestação dos serviços, em relação ao qual prescreve Ivan Kertzman que "esse entendimento levava, em nossa opinião, à absurda conclusão de que se o empregador descumprisse a sua obrigação com o empregado, o Estado também estaria impedido de efetuar o lançamento da contribuição devida, pois não se teria aperfeiçoado o fato gerador da contribuição", arrematando que, com essa tese, "o Direito Público ficava subordinado ao Direito Privado, vez que, se o trabalhador não exigisse o pagamento de sua remuneração, o Estado jamais poderia exigir o recolhimento do tributo" (op. cit. p. 137).

Prossegue o referido autor, para sustentar a impossibilidade de se considerar o pagamento como fato gerador das contribuições previdenciárias, citando a título exemplificativo o seguinte caso:

"Um exemplo que pode deixar clara a incompatibilidade entre o entendimento de que o fato gerador da contribuição previdenciária é o pagamento é da empresa que deixa de pagar os últimos seis salários do seu empregado, e este vai buscar a satisfação do seu direito na Justiça Laboral. Antes de proferida a sentença, adentra a empresa um Auditor fiscal da Receita Federal do Brasil, com a missão de fiscalizar o correto cumprimento das obrigações previdenciárias. Detectando o Auditor a dívida da empresa de seis meses de remuneração de seu empregado, deve ele cobrar as contribuições devidas sobre estes valores, ressaltando-se que a dúvida sobre o fato gerador das contribuições previdenciárias é específica, apenas, aos processos trabalhistas.

Efetuado a cobrança do crédito, como o Juiz Trabalhista deve proceder no ato de execução das contribuições previdenciárias decorrentes de sua sentença? Obviamente, o juiz deve abster-se de executar as contribuições, vez que elas já foram exigidas pelo Fisco. Mas como, se o fato gerador somente se aperfeiçoou depois de efetuado o pagamento no âmbito da Justiça do Trabalho? Percebe-se, nesse exemplo, a falta de sustentação para a defesa de que o fato gerador é o pagamento." (op. cit. p. 142)

Com efeito, a própria Constituição Federal, em seu artigo 195, ao se referir aos salários e demais rendimentos do trabalho "pagos ou creditados" (grifou-se e destacou-se), a qualquer título, já sinaliza para a inviabilidade dessa interpretação, pois não se pode ter como sinônimos os vocábulos pagos e creditados, visto não haver na lei, sobretudo na Constituição Federal, palavras inúteis, princípio basilar de hermenêutica jurídica, secundado pelo brocardo jurídico verba cum effectu, sunt accipienda (as palavras devem ser entendidas com efeito).

Evidencia-se da expressão "pagos ou creditados" (grifou-se e destacou-se) ter o Constituinte, ao se valer da conjunção alternativa " ou ", expressado a clara intenção em atribuir aos vocábulos pagos e creditados conteúdo diverso. Nesse passo, deve-se considerar que remuneração "creditada" não significa "creditada na conta corrente do trabalhador" , pois isso importaria justamente em pagamento, sinonímia a ser evitada. Portanto, remuneração "creditada" significa remuneração da qual o trabalhador tem crédito, vale mencionar, da qual é credor, cujo direito subjetivo adquire-se com a realização do trabalho para o qual é contratado.

Nesse mesmo sentido dispõe o artigo 22, inciso I, da Lei nº 8.212/91, in verbis:

"Art. 22. A contribuição a cargo da empresa, destinada à Seguridade Social, além do disposto no art. 23, é de:

I - vinte por cento sobre o total das remunerações pagas, devidas ou creditadas a qualquer título, durante o mês, aos segurados empregados e trabalhadores avulsos que lhe prestem serviços, destinadas a retribuir o trabalho, qualquer que seja a sua forma, inclusive as gorjetas, os ganhos habituais sob a forma de utilidades e os adiantamentos decorrentes de reajuste salarial, quer pelos serviços efetivamente prestados, quer pelo tempo à disposição do empregador ou tomador de serviços, nos termos da lei ou do contrato ou, ainda, de convenção ou acordo coletivo de trabalho ou sentença normativa. (Redação dada pela Lei nº 9.876, de 1999 )" (grifou-se e destacou-se).

Percebe-se , do teor desse dispositivo , que o legislador, ao utilizar o termo "devida", pretendeu que o fato gerador das contribuições sociais efetivamente ocorresse quando a remuneração do trabalhador passasse a ser devida, o que acontece com a prestação dos serviços, independentemente, portanto, do cumprimento das obrigações trabalhistas, ou seja, do pagamento, o que foi confirmado pela dicção expressa do artigo 43 da mesma Lei nº 8.212/91, com as alterações introduzidas pela Medida Provisória nº 449/2008, convertida na Lei nº 11.941/2009. Isso porque a única situação ou fato jurídico apto a propiciar, simultaneamente, a remunerações pagas, devidas ou creditadas como contraprestação pelo labor do trabalhador é a prestação de serviços.

A respeito, convém transcrever trechos do artigo Por uma Perspectiva Tributária do Fato Gerador e do Critério de Cálculo da Contribuição Previdenciária na Justiça do Trabalho , publicado na Revista Tributária e de Finanças Públicas, vol. 106, p. 73, set/2012, no qual o mestre em Direito Processual Civil, professor universitário e Procurador Federal Luciano Marinho Filho apreende com acuidade o alcance e sentido dessas expressões utilizadas pelo Poder Legiferante, in verbis :

"Se analisarmos as expressões empregadas no dispositivo constitucional, a exemplo de ‘incidentes sobre’ e ‘folha de salários’ que constam na fundamentação acima, parece-nos mais apropriado que, se de fato houve referência a algum elemento de tributo, não o fez em relação a fato gerador, porém, à base de cálculo. A alíquota (expressa em percentual) incide sobre um montante financeiro discriminado (folha de salários), o que resulta em um valor pecuniário correspondente à obrigação de pagamento e o objeto da obrigação tributária.

A nosso ver, o significado do vocábulo ‘pago’ ou ‘creditado’ tem uma acepção ampla e não somente de sentido jurídico estrito. O que é bastante natural, sobretudo em uma constituição analítico-dispositiva, porquanto representa a cristalização política de forças, resultado da intervenção de várias classes sociais, sem qualquer compromisso com o tecnicismo jurídico. Abrange, também, sentido contábil, de modo a corresponder a toda e qualquer incorporação que ocorra ao patrimônio do trabalhador (ampliando seu direito). Por isso, perfeitamente justificável a explicitação deste dispositivo constitucional quando por meio do art. 28, I, da Lei 8.212/1991 acrescentou-se a expressão ‘devida’ como retrato decorrente da dicção constitucional .

Art. 28 da Lei 8.212/1991:

‘Entende-se por salário de contribuição:

I – para o empregado e trabalhador avulso: a remuneração auferida em uma ou mais empresas, assim entendida a totalidade dos rendimentos pagos, devidos ou creditados a qualquer título, durante o mês, destinados a retribuir o trabalho, qualquer que seja a sua forma, inclusive as gorjetas, os ganhos habituais sob a forma de utilidades e os adiantamentos decorrentes de reajuste salarial, quer pelos serviços efetivamente prestados, quer pelo tempo à disposição do empregador ou tomador de serviços nos termos da lei ou do contrato ou, ainda, de convenção ou acordo coletivo de trabalho ou sentença normativa.’

O que, a nosso ver, o conteúdo da Lei de Custeio albergada nesse dispositivo acima, é uma verdadeira interpretação autêntica, traduzindo a potencialidade contida na norma constitucional. No momento em que um trabalhador presta um serviço remunerado, ainda que não lhe seja pago a correspondente parcela, ela se adiciona ao seu patrimônio jurídico, configurando crédito específico que lhe é devido e que se potencializa, podendo vir a ser dispensado pelo próprio obreiro, por ele transacionado, ou ainda, pago no futuro espontânea ou forçadamente. [...]" (grifou-se e destacou-se)

Corroborando esse entendimento, Ivan Kertzman escreve o seguinte:

"Se a própria lei definiu que a base de cálculo é o trabalho, ao utilizar a palavra ‘devido’, o que leva alguns magistrados trabalhistas a entender que pode ser diferente?

É que o texto constitucional, ao falar da contribuição previdenciária patronal, no art. 195, I, dispõe que haverá contribuição do empregador sobre ‘a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviços, mesmo sem vínculo empregatício’.

Alegam que os fatos geradores previstos na Constituição forma, pois, os rendimentos pagos ou creditados, não constando a expressão ‘devidos’ que aparece na Lei. Mas, o que, de fato, significa a expressão constitucional.

Defendem alguns que essa expressão faz alusão ao crédito contábil. Com essa interpretação, que, a nosso ver, não é compatível com o ordenamento jurídico vigente, o fato gerador só se aperfeiçoaria com o pagamento ou a contabilização dos valores.

Observe-se que, pelas normas e princípios contábeis, todos os valores devidos devem ser contabilizados nas contas de passivo da empresa. Tratamos, aqui, do Princípio da Competência, pilar das regras de contabilidade, que pode ser enunciado, de acordo com o professor Braulindo Costa da Cruz, da seguinte forma: ‘As receitas e despesas devem ser incluídas na apuração do resultado do período em que ocorrerem, sempre simultaneamente quando se correlacionarem, independentemente de recebimento ou pagamento’.

Entender que a empresa, ao não efetuar a contabilização da dívida, faria com que o fato gerador da contribuição previdenciária não nascesse, seria contemplar o infrator; seria dizer que é possível beneficiar-se com a própria torpeza; seria premiar o ato ilícito.

Assim, a única interpretação que consideramos plausível para a expressão ‘creditada’ é no sentido de que ela se refere ao crédito jurídico, ou seja, ao direito subjetivo do credor prestador de serviço de receber os valores devidos como contraprestação do trabalho executado.

Dessa forma, quando o inciso I da Lei nº 8.212/91 acrescentou, em relação ao texto da Constituição, na definição da base de cálculo previdenciária, a palavra ‘devidos’, ele não extrapolou os limites constitucionais, mas simplesmente regulamentou e explicou o conteúdo do dispositivo constitucional. Acreditamos, pois, que o inciso I do art. 28 da Lei nº 8.212/91 deve ser interpretado conforme a Constituição". (op. cit. pp. 139 e 140)

Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari, in Manual de Direito Previdenciário, São José: Conceito, 2009, p. 256, refletindo sobre essas expressões do texto constitucional e da lei previdenciária, explicitam, in verbis :

"Nota-se, pelo cotejo dos dispositivos constitucional e legal pertinentes, que a hipótese de incidência indicada na Constituição (importância paga ou creditada) mereceu, na Lei de Custeio, a inserção de mais um vocábulo (paga, devida ou creditada). Para alguns, tal inclusão seria inconstitucional, pois estar-se-ia estabelecendo nova hipótese, não contemplada no texto constitucional, por via de lei ordinária, vulnerando a exigência de lei complementar para tanto. Todavia, é nosso entendimento que a remuneração devida é a mesma que deve ser paga ou creditada ao segurado empregado, por se configurar em direito adquirido, tendo a norma legal apenas o condão de indicar que o fato imponível não se revela apenas no auferir remuneração, mas no fazer jus a ela, ainda que o empregador, violando a lei e o contrato de trabalho, deixe de remunerar corretamente o trabalhador, impedindo a invocação de que, não tendo o empregador feito qualquer pagamento de remuneração (como na hipótese de mora salarial), nenhuma contribuição seria devida, nem pelo mesmo, nem pelo segurado, em relação ao mês em que não houve pagamento".

Por sua vez, reforçando a tese de o fato gerador das contribuições previdenciárias ser a efetiva prestação de serviços, o renomado doutrinador Wladimir Novaes Martinez, em sua obra Manual de Direito Previdenciário , Tomo II – Previdência Social, São Paulo: LTR, 2003, pp. 232 e 233, de forma louvável, leciona:

"Em princípio, aquela medida é a remuneração, mas não se tem estabelecido a quitação de o valor ser o ato aperfeiçoador da obrigação fiscal. O pagamento, per se , não é geratriz do dever de contribuir. É, todavia, a situação mais comum, principalmente quando o contrato de trabalho flui naturalmente. Coincidem, então, o trabalho, o direito à remuneração e seu pagamento.

Essa histórica abstenção normativa deve-se à periodicidade institucional exacional evocada, cuidar-se de ônus de trato sucessivo institucionalizado há oito décadas a ser mensal, no mais comum dos casos.

Parte da contribuição, a do segurado, é descontada da remuneração auferida, e isso, usualmente, acontece quando do seu pagamento, sem, entretanto, isoladamente, o ato de desembolso da empresa definir a nuclearidade da hipótese de incidência."

Essa intenção do legislador de estabelecer como fato gerador das contribuições sociais a prestação dos serviços é claramente identificada na exposição de motivos da citada Lei nº 11.941/2009, resultante da conversão da Medida Provisória nº 449/2008, na qual o legislador justifica a alteração do artigo 43 da Lei nº 8.212/91 na "necessidade de se explicitar melhor a forma de execução das contribuições sociais incidentes sobre as verbas resultantes de decisões em Reclamatórias Trabalhistas" , esclarecendo, in verbis :

"a) a Constituição Federal de 1988 determina a execução das contribuições sociais pelo órgão da Justiça do Trabalho, nos termos do inciso VIII do art. 114. Diante do comando constitucional, demonstrou-se a necessidade de se verificar maior detalhamento por parte da norma (art. 43 da Lei nº 8.212, de 1991) para que a atribuição seja desempenhada sem as dúvidas que a redação atual da Lei tem gerado na prática. Faz-se necessário deixar claro que a obrigação de executar as contribuições sociais surge em decorrência de qualquer decisão trabalhista, seja cognitiva ou homologatória de acordo entre as partes, bem como àquelas proferidas nas Comissões de Conciliação Prévia de que trata a Lei nº 9.958, de 12 de janeiro de 2000. Afinal, a Constituição não restringiu a atribuição conferida aos órgãos da Justiça do Trabalho a qualquer espécie de decisão;

b) também imprescindível é determinar expressamente em que momento ocorre o fato gerador das contribuições sociais devidas e quando o contribuinte ou responsável pelo pagamento do tributo deve efetuar o recolhimento das contribuições executadas no âmbito trabalhista . Diante disso, o presente Projeto esclarece que o fato gerador das contribuições sociais ocorre no mês em que houver a prestação do serviço e que o recolhimento das importâncias devidas se dará no dia 10 (dez) do mês seguinte ao da liquidação da sentença ou da homologação do acordo;" (disponível em , grifou-se e destacou-se)

Nesse contexto, a Lei nº 11.941, de 27 de maio de 2009, resultante da conversão da Medida Provisória nº 449 de 2008, acresceu os § 2º e § 3º ao artigo 43 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, que passou a conter a seguinte redação:

"Art. 43. Nas ações trabalhistas de que resultar o pagamento de direitos sujeitos à incidência de contribuição previdenciária, o juiz, sob pena de responsabilidade, determinará o imediato recolhimento das importâncias devidas à Seguridade Social. (Redação dada pela Lei n° 8.620, de 5.1.93)

§ 1º Nas sentenças judiciais ou nos acordos homologados em que não figurarem, discriminadamente, as parcelas legais relativas às contribuições sociais, estas incidirão sobre o valor total apurado em liquidação de sentença ou sobre o valor do acordo homologado. (Incluído pela Lei nº 11.941, de 2009).

§ 2º Considera-se ocorrido o fato gerador das contribuições sociais na data da prestação do serviço . (Incluído pela Lei nº 11.941, de 2009).

§ 3º As contribuições sociais serão apuradas mês a mês, com referência ao período da prestação de serviços, mediante a aplicação de alíquotas, limites máximos do salário-de-contribuição e acréscimos legais moratórios vigentes relativamente a cada uma das competências abrangidas , devendo o recolhimento ser efetuado no mesmo prazo em que devam ser pagos os créditos encontrados em liquidação de sentença ou em acordo homologado, sendo que nesse último caso o recolhimento será feito em tantas parcelas quantas as previstas no acordo, nas mesmas datas em que sejam exigíveis e proporcionalmente a cada uma delas. (Incluído pela Lei nº 11.941, de 2009).

§ 4º No caso de reconhecimento judicial da prestação de serviços em condições que permitam a aposentadoria especial após 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos de contribuição, serão devidos os acréscimos de contribuição de que trata o § 6o do art. 57 da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991. (Incluído pela Lei nº 11.941, de 2009).

§ 5º Na hipótese de acordo celebrado após ter sido proferida decisão de mérito, a contribuição será calculada com base no valor do acordo. (Incluído pela Lei nº 11.941, de 2009).

§ 6º Aplica-se o disposto neste artigo aos valores devidos ou pagos nas Comissões de Conciliação Prévia de que trata a Lei no 9.958, de 12 de janeiro de 2000. (Incluído pela Lei nº 11.941, de 2009)." (grifou-se e destacou-se)

Cumpre registrar, por outro lado, que o caput do artigo 276 do Decreto nº 3.048/99, segundo o qual , "nas ações trabalhistas de que resultar o pagamento de direitos sujeitos à incidência de contribuição previdenciária, o recolhimento das importâncias devidas à seguridade social será feito no dia dois do mês seguinte ao da liquidação da sentença", não modifica nem inova o texto da Lei nº 8.212/91.

Isso porque o citado dispositivo, geralmente invocado para embasar o termo inicial da aplicação dos juros pelos que defendem a tese de o fato gerador das contribuições previdenciárias ser a liquidação da sentença ou o pagamento, ao mencionar o dia dois do mês seguinte ao da liquidação da sentença, está a se reportar apenas à data em que deve ser efetivado o recolhimento das contribuições previdenciárias, vale dizer, à data do "vencimento desse recolhimento", sem a qual o banco não tem condições de concretizar a operação bancária, não dispondo, de forma alguma, sobre a data inicial da incidência dos juros relativos a esses descontos.

Sobre essa questão dos juros, a propósito, estabelece o § 4º do mencionado artigo 276 do Decreto nº 3.048/99 que "a contribuição do empregado no caso de ações trabalhistas será calculada, mês a mês, aplicando-se as alíquotas previstas no art. 198, observado o limite máximo do salário-de-contribuição" , especificando, por sua vez, o artigo 239, § 6º, do mesmo decreto, o seguinte:

"Art. 239. As contribuições sociais e outras importâncias arrecadadas pelo Instituto Nacional do Seguro Social, incluídas ou não em notificação fiscal de lançamento, pagas com atraso, objeto ou não de parcelamento, ficam sujeitas a:

[...]

§ 6º. À correção monetária e aos acréscimos legais de que trata este artigo aplicar-se-á a legislação vigente em cada competência a que se referirem. " (grifou-se e destacou-se)

Percebe-se , da leitura desses preceitos, que , efetivamente , o caput do artigo 276 do Decreto nº 3.048/99 não prevê o termo inicial de incidência de juros das contribuições previdenciárias, aplicando-se, conforme preconizam os demais dispositivos do citado decreto, a esses acréscimos legais, mesmo oriundos de descontos sobre parcelas objeto de condenação em sentença judicial trabalhista, a legislação vigente em cada competência, com cálculo mês a mês, descartando-se, assim, o argumento de que o termo inicial dos juros seria o dia dois do mês seguinte ao da liquidação da sentença.

E , mesmo que se considerasse a hipótese de o legislador ter previsto no caput do multicitado artigo 276 a data inicial de incidência dos juros das contribuições previdenciárias, seria forçoso concluir pela incompatibilidade desse preceito com os termos da Lei nº 8.212/91 e dos demais artigos citados do Decreto nº 3.048/99, que tratam do tema em questão, bem como com o Texto Constitucional, em seus artigos 5º, caput , e 150, inciso II, que garantem a observância do princípio da isonomia, sem tratamento diferenciado a contribuintes em situação equivalente, como será oportuna e detidamente analisado, em franca inobservância ao princípio da hierarquia das normas.

A própria Súmula nº 368 desta Corte, ao prever que o cálculo das contribuições previdenciárias , deve observar o regime de competência, considerando, em cada mês, as alíquotas então vigentes, bem como o teto do salário-de-contribuição então em vigor, implicitamente reconheceu que o fato gerador é a prestação dos serviços, sob pena de não levar em conta o disposto no artigo 144, caput , do CTN, que dispõe sobre a regra da aplicação da legislação tributária vigente à data do fato gerador.

A respeito do tema, cumpre citar os seguintes precedentes do Superior Tribunal de Justiça:

"CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA SOBRE O PAGAMENTO DE SALÁRIOS. FATO GERADOR.

1. O fato gerador da contribuição previdenciária do empregado não é o efetivo pagamento da remuneração, mas a relação laboral existente entre o empregador e o obreiro.

2. O alargamento do prazo conferido ao empregador pelo art. 459 da CLT para pagar a folha de salários até o dia cinco (05) do mês subseqüente ao laborado não influi na data do recolhimento da contribuição previdenciária, porquanto ambas as leis versam relações jurídicas distintas; a saber: a relação tributária e a relação trabalhista.

3. As normas de natureza trabalhista e previdenciária revelam nítida compatibilidade, devendo o recolhimento da contribuição previdenciária ser efetuado a cada mês, após vencida a atividade laboral do período, independentemente da data do pagamento do salário do empregado.

4. Em sede tributária, os eventuais favores fiscais devem estar expressos na norma de instituição da exação, em nome do princípio da legalidade.

5. Raciocínio inverso conduziria a uma liberação tributária não prevista em lei, toda vez que o empregador não adimplisse com as suas obrigações trabalhistas, o que se revela desarrazoado à luz da lógica jurídica.

6. Recurso desprovido." (RECURSO ESPECIAL Nº 419.667 - RS (2002/0028796-7), DJ 10/03/2003, RELATOR: MINISTRO LUIZ FUX. idem RECURSO ESPECIAL Nº 501.918 - SC (2003/0025496-4), DJ DATA:15/9/2003, RELATOR : MINISTRO LUIZ FUX)

"TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA SOBRE A FOLHA DE SALÁRIOS. PRAZO DE RECOLHIMENTO. MÊS SEGUINTE AO EFETIVAMENTE TRABALHADO. FATO GERADOR. RELAÇÃO LABORAL EXISTENTE ENTRE EMPREGADOR E OBREIRO.

1. ‘As contribuições previdenciárias a cargo das empresas devem ser recolhidas no mês seguinte ao trabalhado, e não no mês seguinte ao efetivo pagamento.’ (REsp 507.316/RS, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Segunda Turma, DJ 07.02.2007).

2. ‘O fato gerador da contribuição previdenciária é a relação laboral onerosa, da qual se origina a obrigação de pagar ao trabalhador (até o quinto dia subseqüente ao mês laborado) e a obrigação de recolher a contribuição previdenciária aos cofres da Previdência.’ (REsp 502.650-SC, Relatora Ministra Eliana Calmon, DJ de 25.2.2004).

3. Agravo Regimental não provido." (AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO - AgRg no Ag 587476/MG, Ministro HERMAN BENJAMIN, DJe 17/10/2008)

"TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA SOBRE O PAGAMENTO DE SALÁRIOS. FATO GERADOR. DATA DO RECOLHIMENTO.

I - O fato gerador da contribuição previdenciária não é o pagamento do salário, mas a relação laboral existente entre o empregador e o empregado, dessa forma o recolhimento da contribuição previdenciária deve ser efetuado a cada mês, após vencida a atividade laboral do período, independentemente da data do pagamento do salário.

II - Agravo regimental improvido." (AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO - AgRg no Ag 618570/PR, Relator(a) Ministro FRANCISCO FALCÃO, DJ 14/3/2005)

Portanto, a interpretação no sentido de o fato gerador das contribuições previdenciárias ser a liquidação dos créditos ou o pagamento implica negar vigência ao que foi estabelecido pelo legislador, que elegeu expressamente a prestação de serviços como fato gerador do aludido tributo, o que, de modo algum, ofende o Texto Constitucional.

Por outro lado, não cabe, com o escopo de defender a tese de o fato gerador ser o pagamento ou a liquidação do crédito do trabalhador, invocar a interpretação conforme a Constituição Federal, pois esse tipo de exegese só é cabível quando a lei dá margem a duas ou mais interpretações diferentes, ou seja, quando o aplicador de determinado texto legal se deparar com normas de caráter polissêmico, ambíguo, flexível ou aberto, com base no que deve priorizar a interpretação que possua um sentido em conformidade com a Constituição Federal .

De fato, é imprescindível, no caso da interpretação conforme a Constituição Federal, a existência de um espaço de proposta interpretativa, sendo inadmissível que ela tenha como resultado uma decisão contra o texto e o sentido da lei - que no caso é clara em estabelecer a regra de que o fato gerador nasce com a prestação de serviços -, de forma a produzir uma regulação nova e distinta da vontade do Poder Legiferante, pois implicaria verdadeira invasão da esfera de competência do legislador, em nítida ofensa ao princípio fundamental da separação dos Poderes, insculpido no artigo 2º da Constituição Federal, e protegido como cláusula pétrea pelo artigo 60, § 4º, da Lei Maior.

Estar-se-ia, nessa hipótese, procedendo-se de forma contrária ao que ficou consagrado no célebre caso clássico "Marbury contra Madison", em que o juiz John Marshall da Suprema Corte Norte-Americana, em uma decisão histórica sobre o controle de constitucionalidade difuso, concluiu ser possível que o Judiciário, no exercício de sua função jurisdicional, deixe de aplicar uma lei ou uma norma infraconstitucional quando ela for contrária à Constituição, sem que isso implique ofensa ao princípio da separação dos Poderes. Entretanto, quando o Poder Judiciário deixa de aplicar uma norma legal aprovada regularmente (neste caso, editada pelo Presidente da República e submetida ao Congresso Nacional) sem declarar a sua inconstitucionalidade, afronta o princípio da Separação dos Poderes, pois está se sobrepondo ao Poder Executivo e ao Poder Legislativo em sua função legiferante, além de contrariar a própria ratio que levou à edição da Súmula Vinculante nº 10 do STF.

É exemplar, a esse respeito, o denso e erudito ensinamento de Luís Roberto Barroso, em sua obra Interpretação e Aplicação da Constituição , Editora Saraiva, 3ª edição, 1999, p. 181-185, verbis :

"A interpretação conforme a Constituição compreende sutilezas que se escondem atrás da designação truística de princípio. Cuida-se, por certo, da escolha de uma linha de interpretação de uma norma legal, em meio a outras que o Texto comportaria . Mas, se fosse somente isso, ela não se distinguiria da mera presunção de constitucionalidade dos atos legislativos, que também impõe o aproveitamento da norma sempre que possível. O conceito sugere mais: a necessidade de buscar uma interpretação que não seja a que decorre da leitura mais óbvia do dispositivo. É, ainda, da sua natureza excluir a interpretação ou as interpretações que contravenham a Constituição. À vista das dimensões diversas que sua formulação comporta, é possível e conveniente decompor didaticamente o processo de interpretação conforme a Constituição nos elementos seguintes:

1) Trata-se da escolha de uma interpretação da norma legal que a mantenha em harmonia com a Constituição, em meio a outra ou outras possibilidades interpretativas que o preceito admita .

2) Tal interpretação busca encontrar um sentido possível para a norma, que não é o que mais evidentemente resulta da leitura de seu texto.

3) Além da eleição de uma linha de interpretação, procede-se à exclusão expressa de outra ou outras interpretações possíveis, que conduziriam a resultado contrastante com a Constituição.

4) Por via de consequência, a interpretação conforme a Constituição não é mero preceito hermenêutico, mas, também um mecanismo de controle de constitucionalidade pelo qual se declara ilegítima uma determinada leitura da norma legal.

[...]

Foi objeto de menção anterior a constatação de Canotilho de que a interpretação conforme a Constituição só é legítima quando existe um espaço de decisão onde são admissíveis várias possibilidades interpretativas . Aí, embora mantida a primazia do legislador, sua manifestação é limitada, quando não adaptada pela interpretação do tribunal. Mas, naturalmente, não é possível ao intérprete torcer o sentido das palavras nem adulterar a clara intenção do legislador. Para salvar a lei, não é admissível fazer uma interpretação contra legem . Tampouco será legítima uma linha de entendimento que prive o preceito legal de qualquer função útil. Atente-se, por relevante, que o excesso na utilização do princípio pode deturpar sua razão de existir. Isso porque, ao declarar uma lei inconstitucional, o Judiciário devolve ao Legislativo a competência para reger a matéria. Mas, ao interpretar a lei estendendo-a ou restringindo-a além do razoável, estará mais intensamente interferindo nas competências do Legislativo, desempenhando função legislativa positiva. " (grifou-se e destacou-se)

De mais a mais, essa interpretação de o fato gerador das contribuições previdenciárias e de o termo inicial para a incidência dos juros de mora a elas relativos serem o pagamento ou a liquidação dos créditos despreza, data venia , os princípios da efetividade do direito material trabalhista e da duração razoável do processo, pois incentiva o descumprimento e a protelação das obrigações trabalhistas, tanto quanto a sua discussão em Juízo, porquanto a lide trabalhista passa a conferir vantagem tributária diante da supressão de alto quantitativo de juros e multas acumulados ao longo do tempo.

Com efeito, considerar que o fato gerador e o termo inicial dos juros moratórios concernentes às contribuições previdenciárias seja o pagamento ou a liquidação dos créditos decorrentes da sentença trabalhista implica premiar as empresas que não cumpriram a legislação trabalhista e tributária no momento oportuno, isentando-as dos encargos decorrentes do não recolhimento da contribuição previdenciária no seu vencimento, em detrimento daqueles empregadores que, não obstante em mora, espontaneamente dirigem-se ao Ente Previdenciário para o cumprimento dessas obrigações, com a obrigação de arcar com tais encargos.

Isso acarreta, aliás, nítida ofensa ao princípio da isonomia, consagrado no artigo 5º, caput , da Constituição Federal, e ao princípio da isonomia tributária, previsto no artigo 150, inciso II, também do Texto Constitucional, pois institui tratamento desigual entre contribuintes que se encontram em situação equivalente, ao aplicar, de forma distinta, os critérios da legislação previdenciária relativamente aos valores a serem pagos, para contribuintes que possuem débitos de mesma natureza, devidos à Previdência Social e referentes a períodos idênticos ou semelhantes.

É irrelevante, a propósito, a circunstância de haver a possibilidade de, em alguns casos, os débitos previdenciários alcançarem valor maior que os débitos trabalhistas - considerando a circunstância de o legislador, nos artigos 883 da CLT e 39, § 1º, da Lei nº 8.177/91, prever a contagem dos juros de mora incidentes sobre os débitos trabalhistas apenas a partir da data do ajuizamento da ação -, visto que, além de se tratar de leis diferentes, que regulam matérias diferentes, o favor legislativo concedido em matéria trabalhista não autoriza estendê-lo aos débitos previdenciários sem que a lei assim o preveja expressamente.

Dessa forma, não há inconstitucionalidade do artigo 43 da Lei nº 8.212/91 (grifou-se e destacou-se), diante das alterações introduzidas pela Medida Provisória nº 449/2008, convertida na Lei nº 11.941/2009, frente ao disposto no artigo 195, inciso I, alínea "a", da Constituição Federal, descartando-se, ainda, a tese de que os juros moratórios relativos às contribuições previdenciárias devem incidir a partir da liquidação e exigibilidade dos créditos devidos ao exequente em virtude de título executivo judicial.

Por outro lado, conforme disposto no artigo 195, § 6º, da Constituição Federal, as contribuições sociais só poderão ser exigidas após decorridos 90 dias da data da publicação da lei que as houver instituído ou modificado. Portanto, em virtude de a Lei nº 11.941, de 27/5/2009, ser originária da conversão da Medida Provisória nº 449, de 3/12/2008, publicada no DOU do dia 4/12/2008, o início da contagem do mencionado prazo de 90 dias deve ser feito da publicação da Medida Provisória, e não da lei resultante da sua conversão.

Nesse sentido, citam-se os seguintes julgados do Supremo Tribunal Federal:

"EMENTA: I. PIS/COFINS: base de cálculo: L. 9.718/98, art. 3º, § 1º: inconstitucionalidade. Ao julgar os RREE 346.084, Ilmar; 357.950, 358.273 e 390.840, Marco Aurélio, Pleno, 9.11.2005 (Inf./STF 408), o Supremo Tribunal declarou a inconstitucionalidade do art. 3º, § 1º, da L. 9.718/98, por entender que a ampliação da base de cálculo da COFINS por lei ordinária violou a redação original do art. 195, I, da Constituição Federal, ainda vigente ao ser editada a mencionada norma legal. II. PIS/COFINS: aumento de alíquota por lei ordinária (L. 9.718/98, art. 8o): ausência de violação ao princípio da hierarquia das leis, cujo respeito exige seja observado o âmbito material reservado às espécies normativas previstas na Constituição Federal. Precedente: ADC 1, Moreira Alves, RTJ 156/721. III. PIS/COFINS: regime de compensação diferenciado: as alterações introduzidas pelo art. 8º da L. 9.718/98 disciplinaram situações distintas, razão pela qual é legítima a diferenciação no regime de compensação. Precedente: RE 336.134, Ilmar, RTJ 185/352. IV. Contribuição social: instituição ou aumento por medida provisória: prazo de anterioridade (CF., art. 195, § 6o). O termo a quo do prazo de anterioridade da contribuição social criada ou aumentada por medida provisória é a data de sua primitiva edição, e não daquela que – após sucessivas reedições – tenha sido convertida em lei. Precedentes." (RE 419010 AgR / RJ – Relator(a): Min. SEPÚLVEDA PERTENCE – Julgamento: 15.ago.2006 – Órgão Julgador: Primeira Turma – Publicação DJ 8/9/2006)

"EMENTA: CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL. MEDIDA PROVISÓRIA: REEDIÇÃO. PRAZO NONAGESIMAL: TERMO INICIAL. I. – Não perde eficácia a medida provisória, com força de lei, não apreciada pelo Congresso Nacional, mas reeditada, por meio de nova medida provisória, dentro de seu prazo de validade de trinta dias. II. – Princípio da anterioridade nonagesimal: C.F., art. 195, § 6º: contagem do prazo de noventa dias; medida provisória convertida em lei: conta-se o prazo de noventa dias a partir da veiculação da primeira medida provisória. III. – Precedentes do STF: RE 232.896/PA; ADI 1.417/DF; ADI 1.135/DF; RE 222.719/PB; RE 269.428-AgR/RR; RE 231.630- AgR/PR. IV. – Agravo não provido." (RE 412567 AgR / RJ – Relator(a): Min. CARLOS VELLOSO – Julgamento: 28.jun.2005 – Órgão Julgador: Segunda Turma – Publicação DJ 26/8/2005)

Desse modo, como a MP nº 449/2008 foi publicada em 4/12/2008, o marco para incidência dos acréscimos dos §§ 2º e 3º ao artigo 43 da Lei nº 8.212/91, por meio da Lei nº 11.941/2009, é 5/3/2009 (grifou-se e destacou-se), pelo que somente as prestações de serviços ocorridas a partir dessa data é que deverão ser consideradas como fato gerador da contribuição previdenciária para o cômputo dos juros moratórios então incidentes, sob pena de ofensa aos artigos 150, inciso III, alínea "a", e 195, § 6º, da Constituição Federal.

Registra-se que, diferentemente da atualização monetária das contribuições previdenciárias, que visa recompor o seu valor monetário e pela qual respondem tanto o empregador como o trabalhador, cada qual com sua cota parte - sem prejuízo para este último, visto que receberá seu crédito trabalhista igualmente atualizado -, os juros moratórios visam compensar o retardamento ou inadimplemento de uma obrigação, propiciando, no caso, o devido restabelecimento do equilíbrio atuarial mediante aporte financeiro para o pagamento dos benefícios previdenciários, pelo que a responsabilidade pelo seu pagamento deve ser imputada apenas ao empregador, que deu causa à mora.

Com relação à multa - igualmente imputável apenas ao empregador, já que é o responsável pelo recolhimento das contribuições previdenciárias -, cumpre assinalar que, tratando-se de uma sanção jurídica que visa a compelir o devedor ao cumprimento de uma obrigação a partir do seu reconhecimento, não incide desde a data da prestação dos serviços, mas sim a partir do exaurimento do prazo decorrente da citação para o pagamento dos créditos previdenciários apurados em Juízo, observado o limite de 20%, conforme se extrai da dicção dos artigos 61, § 1º e § 2º, da Lei nº 9.430/96 e 43, § 3º, da Lei nº 8.212/91, que dispõem, respectivamente:

"Art. 61. Os débitos para com a União, decorrentes de tributos e contribuições administrados pela Secretaria da Receita Federal, cujos fatos geradores ocorrerem a partir de 1º de janeiro de 1997, não pagos nos prazos previstos na legislação específica, serão acrescidos de multa de mora, calculada à taxa de trinta e três centésimos por cento, por dia de atraso. (Vide Decreto nº 7.212, de 2010)

§ 1º A multa de que trata este artigo será calculada a partir do primeiro dia subseqüente ao do vencimento do prazo previsto para o pagamento do tributo ou da contribuição até o dia em que ocorrer o seu pagamento.

§ 2º O percentual de multa a ser aplicado fica limitado a vinte por cento ." (grifou-se e destacou-se)

"Art. 43. Nas ações trabalhistas de que resultar o pagamento de direitos sujeitos à incidência de contribuição previdenciária, o juiz, sob pena de responsabilidade, determinará o imediato recolhimento das importâncias devidas à Seguridade Social. (Redação dada pela Lei n° 8.620, de 5.1.93)

[...]

§ 3º As contribuições sociais serão apuradas mês a mês, com referência ao período da prestação de serviços, mediante a aplicação de alíquotas, limites máximos do salário-de-contribuição e acréscimos legais moratórios vigentes relativamente a cada uma das competências abrangidas, devendo o recolhimento ser efetuado no mesmo prazo em que devam ser pagos os créditos encontrados em liquidação de sentença ou em acordo homologado , sendo que nesse último caso o recolhimento será feito em tantas parcelas quantas as previstas no acordo, nas mesmas datas em que sejam exigíveis e proporcionalmente a cada uma delas. (Incluído pela Lei nº 11.941, de 2009)". (grifou-se e destacou-se)

Acresça-se que essa matéria foi à deliberação do Pleno do Tribunal Superior do Trabalho , em decorrência de decisão da sua Subseção de Dissídios Individuais I, que deu aplicação imediata ao disposto na Lei nº 13.015/2014, que alterou a redação do artigo 896 da CLT, prevendo a possibilidade de afetação de matéria relevante para o Tribunal Pleno, em processos submetidos à apreciação daquela Subseção de Dissídios Individuais, sem necessidade de múltiplos processos em que a questão seja debatida, nos termos do § 13 da nova redação dada ao mencionado dispositivo e secundado pelo artigo 7º do Ato nº 491/ SEGJUD.GP /2014, que regulamentou aquela lei.

Em conformidade com o entendimento ora sufragado, o Tribunal Pleno, julgando a matéria afetada, decidiu, no julgamento do E-RR-1125-36.2010.5.06.0171, em sessão realizada em 20/10/2015, com acórdão da lavra do ministro Alexandre Agra Belmonte, ainda pendente de publicação, que o artigo 195 da Constituição Federal apenas dispõe sobre o financiamento das contribuições previdenciárias, ficando relegada a definição do momento em que ocorrem o fato gerador, a base de cálculo e a exigibilidade da contribuição previdenciária à disciplina por lei ordinária, em conformidade com as decisões recentes proferidas pelo Supremo Tribunal Federal.

Decidiu-se, igualmente, que em relação ao período em que passou a vigorar a nova redação do artigo 43 da Lei nº 8.212/91, aplicável às hipóteses em que a prestação do serviço ocorreu a partir do dia 5/3/2009, considera-se como fato gerador das contribuições previdenciárias, decorrentes de créditos trabalhistas reconhecidos em juízo, a data da efetiva prestação de serviço, devendo, portanto, os juros moratórios incidirem a partir desse momento, enquanto que a multa, diferentemente, deve ser aplicada a partir do exaurimento do prazo de citação para o pagamento, uma vez apurados os créditos previdenciários, se descumprida a obrigação, observado o limite legal de 20% (artigo 61, § 2º, da Lei nº 9.430/96).

Nesse sentido também já decidiu esta Segunda Turma, nos processos RR-1525-22.2012.5.02.0032 e RR-276700-54.2009.5.12.0003, relator ministro Renato de Lacerda Paiva, julgados na sessão de 16/11/2015, com acórdãos publicados no DEJT 27/11/2015.

Do exposto, conheço do recurso de revista por violação do artigo 43, § 2º, da Lei nº 8.212/91.

II - MÉRITO

A consequência lógica do conhecimento do recurso de revista por violação do artigo 43, § 2º, da Lei nº 8.212/91 é o seu provimento.

Considerando que o período da prestação de serviços objeto da condenação, no caso, foi de 2/10/2007 a 1/9/2011 , portanto, em período anterior e posterior a 5/3/2009, marco para incidência da nova redação do artigo 43 da Lei nº 8.212/91, dada pela Medida Provisória nº 449/2008, posteriormente convertida na Lei nº 11.941/2009, dou provimento parcial ao recurso de revista para determinar: a) que a partir de 5/3/2009 o fato gerador das contribuições previdenciárias e, portanto, o termo inicial da incidência dos juros de mora é a efetiva prestação dos serviços, conforme artigo 43, §§ 2º e 3º, da Lei nº 8.212/1991, mantendo-se, relativamente ao período anterior, a incidência de juros de mora sobre o crédito previdenciário somente a partir do dia 2 do mês seguinte ao da liquidação da sentença, nos termos do disposto no artigo 276, caput , do Decreto nº 3.048/99 ; e b) a aplicação de multa a partir do exaurimento do prazo decorrente da citação para o pagamento dos créditos previdenciários apurados em Juízo, observado o limite de 20%.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer do recurso de revista por violação do artigo 43, § 2º, da Lei nº 8.212/91 e, no mérito, dar-lhe parcial provimento para determinar: a) que a partir de 5/3/2009 o fato gerador das contribuições previdenciárias e, portanto, o termo inicial da incidência dos juros de mora é a efetiva prestação dos serviços, conforme artigo 43, §§ 2º e 3º, da Lei nº 8.212/1991, mantendo-se, relativamente ao período anterior, a incidência de juros de mora sobre o crédito previdenciário somente a partir do dia 2 do mês seguinte ao da liquidação da sentença, nos termos do disposto no artigo 276, caput , do Decreto nº 3.048/99; e b) a aplicação de multa a partir do exaurimento do prazo decorrente da citação para o pagamento dos créditos previdenciários apurados em Juízo, observado o limite de 20%.

Brasília, 06 de abril de 2016.

Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)

JOSÉ ROBERTO FREIRE PIMENTA

Ministro Relator