A C Ó R D Ã O

(5ª Turma)

GMMAR/arcs/pat

AGRAVO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. ACIDENTE DE TRABALHO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO EMPREGADOR. ATIVIDADE DE RISCO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. COBRADORA DE ÔNIBUS. OLHO ATINGIDO POR ESTILHAÇO PROVENIENTE DE ACIDENTE DE TRÂNSITO ENVOLVENDO VEÍCULO DIVERSO DO QUE TRABALHAVA. CEGUEIRA DO OLHO DIREITO. TRANSCENDÊNCIA NÃO RECONHECIDA. 1. A responsabilidade civil por acidente de trabalho, no caso de atividades de risco, é objetiva, pelo risco criado, nos termos do art. 927, parágrafo único, do Código Civil: requer a demonstração apenas do dano e do nexo de causalidade. Isso porque, há uma violação do dever de segurança, quando a atividade da empresa expõe o empregado a risco acima da média. 2. O caso fortuito, como excludente do nexo, pode ser interno ou externo, a exigir perscrutar se o evento danoso seria ou não inerente ao risco da atividade. Na lição de Sérgio Cavalieri Filho, o fortuito interno é o fato imprevisível, inevitável, que se liga aos riscos do empreendimento. Fortuito externo, por outro lado, é aquele que "não guarda relação de causalidade com a atividade", sendo "absolutamente estranho" ao serviço (Programa de responsabilidade civil. 15. ed. Barueri: Atlas, 2022, p. 253). No transporte de pessoas, até mesmo o fato de terceiro é considerado fortuito interno, a atrair a responsabilidade, ainda que com direito de regresso (art. 735 do CC). 3. Na hipótese dos autos, o Tribunal Regional afirmou, "em que pese o ônibus da reclamada, no qual a reclamante laborava, não ter se envolvido no acidente de trânsito, fato é que a reclamante foi atingida por estilhaços de vidro decorrentes da batida de ônibus de outra empresa". Com efeito, a dinâmica do evento, que resultou em cegueira do olho direito, não permite verificar fortuito externo apto a excluir a responsabilidade objetiva. Também, a função de cobrador de ônibus é considerada atividade de risco pela exposição do trabalhador a infortúnios, em grau mais elevado que os demais membros da coletividade. Acidentes de trânsito, ainda que o veículo da autora não estivesse diretamente envolvido, estão englobados pelo risco criado pela atividade de transporte rodoviário. 4. Nesse contexto, presentes o dano e o nexo causal, e sendo desnecessária a averiguação de culpa da reclamada, pela incidência da teoria da responsabilidade civil objetiva, é devido o deferimento das indenizações por danos morais e materiais. Mantém-se a decisão recorrida. Agravo conhecido e desprovido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo em Agravo de Instrumento em Recurso de Revista n° TST-Ag-AIRR-11094-11.2016.5.03.0022 , em que é Agravante VIAÇÃO NOVO RETIRO LTDA. e é Agravada SUELI VIEIRA PEREIRA.

Por meio da decisão monocrática ora atacada, neguei provimento ao agravo de instrumento.

Irresignada, a reclamada interpôs agravo.

Intimada, a agravada apresentou impugnação.

É o relatório.

V O T O

ADMISSIBILIDADE

Presentes os requisitos legais de admissibilidade, conheço do agravo.

MÉRITO

ACIDENTE DE TRABALHO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO EMPREGADOR. ATIVIDADE DE RISCO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. COBRADORA DE ÔNIBUS. OLHO ATINGIDO POR ESTILHAÇO PROVENIENTE DE ACIDENTE DE TRÂNSITO ENVOLVENDO VEÍCULO DIVERSO DO QUE TRABALHAVA. CEGUEIRA DO OLHO DIREITO

Por meio da decisão monocrática ora atacada, neguei provimento ao agravo de instrumento, por ausência de transcendência da questão invocada em recurso de revista, na esteira dos seguintes fundamentos:

"D E C I S Ã O

Trata-se de agravo de instrumento interposto contra despacho proferido pelo Eg. Tribunal Regional, que denegou seguimento a recurso de revista, na esteira dos seguintes fundamentos:

PRESSUPOSTOS EXTRÍNSECOS

O recurso é próprio, tempestivo (acórdão publicado em    20.06.2022; recurso de revista interposto em       30.06.2022), devidamente preparado (depósito recursal - Id     7107aa6; custas - Id    76c7b97 ), sendo regular a representação processual.

PRESSUPOSTOS INTRÍNSECOS

TRANSCENDÊNCIA

Nos termos do artigo 896-A, § 6º da CLT, cabe ao Tribunal Superior do Trabalho analisar se a causa oferece transcendência em relação aos reflexos gerais de natureza econômica, política, social ou jurídica.

Responsabilidade Civil do Empregador / Indenização por Dano Material / Acidente de Trabalho.

Examinados os fundamentos do acórdão, constato que o recurso, em seus temas e desdobramentos, não demonstra divergência jurisprudencial válida e específica, nem contrariedade com Súmula de jurisprudência uniforme do TST ou Súmula Vinculante do STF, tampouco violação literal e direta de qualquer dispositivo de lei federal e/ou da Constituição da República, como exigem as alíneas ‘a’ e ‘c’ do art. 896 da CLT.

O deslinde da controvérsia acerca da responsabilidade civil do empregador/acidente do trabalho/responsabilidade objetiva e indenização por dano material transpõe os limites da literalidade dos preceitos legais invocados, uma vez que a matéria em discussão é eminentemente interpretativa, não se podendo afirmar que a própria letra dos dispositivos tenha sofrido ofensa pelo acórdão.

São inespecíficos os arestos válidos colacionados, porque não abordam todos os fundamentos salientados pela Turma julgadora, notadamente no que tange ... ‘(...)A fundamentação adotada no v. acórdão é clara ao deferir os danos materiais à reclamante porque, pela prova pericial produzida, o ocorrido gerou cegueira (legal) em seu olho direito, com invalidez parcial e definitiva de 30% e prejuízos para as atividades da vida cotidiana, embora estivesse apta para o trabalho (o que foi expressamente colocado no v. acórdão, sendo totalmente descabida a argumentação da reclamada no sentido de que deixou-se de transcrever no v. acórdão parte do laudo que se referia à capacidade laboral da reclamante). Assim, nos termos do artigo 950 do CCB, segundo o qual ‘Se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido não possa exercer o seu ofício ou profissão, ou se lhe diminua a capacidade de trabalho, a indenização, além das despesas do tratamento e lucros cessantes até ao fim da convalescença, incluirá pensão correspondente à importância do trabalho para que se inabilitou, ou da depreciação que ele sofreu’, restou cristalino o direito da reclamante à reparação material pretendida, porquanto teve sua capacidade reduzida de forma parcial e definitiva. (...)para fins da reparação material de ordem civil, diferentemente do âmbito previdenciário, basta que se demonstre a incapacidade para a profissão que o trabalhador exercia quando acometido pela mazela ocupacional’  (Súmulas 23 e 296 do TST).

A alegada ofensa ao artigo 5º, inciso II, da Constituição Federal, que consagra o princípio da legalidade, não se caracteriza diretamente, como exige o artigo 896 da CLT. Eventual afronta ao dispositivo constitucional seria apenas reflexa, o que não enseja a admissibilidade do recurso de revista.

Observa-se que o entendimento manifestado pela Turma está assentado no substrato fático-probatório existente nos autos. Para se concluir de forma diversa seria necessário revolver fatos e provas, propósito insuscetível de ser alcançado nesta fase processual, à luz da Súmula nº 126 do TST.

CONCLUSÃO

DENEGO seguimento ao recurso de revista.

Pretende a parte recorrente o destrancamento e regular processamento de seu apelo.

Publicado o acórdão recorrido sob a vigência da Lei nº 13.467/2017, submete-se o apelo à disciplina trazida pelo art. 896-A da CLT, segundo o qual ‘ O Tribunal Superior do Trabalho, no recurso de revista, examinará previamente se a causa oferece transcendência com relação aos reflexos gerais de natureza econômica, política, social ou jurídica ’.

De plano, contudo, verifica-se que o valor da causa não representa patamar monetário elevado a ponto de, por si só, atrair a intervenção desta Corte. Não configurada a transcendência econômica .

Além disso, as matérias submetidas a debate não trazem questões de direito novas ou controvertidas em torno de interpretação da legislação trabalhista. Inexiste transcendência jurídica .

O cotejo entre fatos e teses jurídicas releva, por um lado, a inexistência de afronta manifesta aos direitos sociais constitucionalmente protegidos pelos arts. 6º a 11 da CF/88 ( não caracterizada a transcendência social ) e, sob outro viés, não demonstrada contrariedade à jurisprudência pacificada no âmbito desta Corte Superior e do Supremo Tribunal Federal. Logo, da mesma forma, ausente a transcendência política .

Em suma, a falta de transcendência da questão debatida, em qualquer de suas vertentes, constitui óbice ao conhecimento do recurso de revista.

Por tudo quanto dito, com esteio no art. 896-A, § 2º, da CLT, nego provimento ao agravo de instrumento ."

A parte insiste que a causa possui transcendência econômica, jurídica e social. Aduz que a responsabilidade do empregador, em caso como dos autos, é subjetiva, na medida em que o dano foi causado por acidente de trânsito que não lhe envolveu. Alega que " a Agravante, empresa de transporte público, apenas passou pelo local do acidente, momento em que a agravada, que trabalhava como cobradora de ônibus, fora atingida pelo estilhaço de vidro, resquício do referido acidente de trânsito " (fl. 826). Sustenta a existência de fato exclusivamente de terceiro e caso fortuito que elidem a responsabilidade, ainda que objetiva. Indica ofensa aos arts. 5º, II, da Constituição Federal e 186, 393 e 927 do Código Civil. Apresenta divergência jurisprudencial.

Sem razão.

O Tribunal Regional negou provimento ao recurso ordinário da reclamada, com estes fundamentos (art. 896, §1º-A, I, da CLT):

‘‘Dentro desse enfoque, têm-se como atividades ensejadoras da aplicação da teoria do risco aquelas em que há maior probabilidade de ocorrência de acidentes ou de doenças para o empregado, em razão de sua própria natureza, da forma ou dos métodos utilizados para sua execução.

Nesse passo, a leitura sistemática do parágrafo único do art. 927 do CC, conjuntamente com o art. 5º da LICC e os diversos princípios constitucionais (valor social do trabalho, dignidade da pessoa humana, preservação do meio ambiente laboral, etc), leva à conclusão de que a responsabilidade objetiva não foi estabelecida apenas para os casos de empresas que desenvolvem atividade de ‘alto risco’, mas sim, atividades podem causar a uma determinada pessoa um ônus maior do que aos demais membros da coletividade, como no caso dos motoristas e cobradores.

Nesse sentido, é o Enunciado 38 da I Jornada de Direito Civil:

Art. 927: a responsabilidade fundada no risco da atividade, como prevista na segunda parte do parágrafo único do art. 927 do novo Código Civil, configura-se quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano causar a pessoa determinada um ônus maior do que aos demais membros da coletividade.

(...)

A propósito, o E. STF sedimentou o entendimento de aplicação da responsabilidade objetiva às relações de emprego em tese de repercussão geral (tema 932) fixada no julgamento do RE 828040:

‘O artigo 927, parágrafo único, do Código Civil é compatível com o artigo 7º, XXVIII, da Constituição Federal, sendo constitucional a responsabilização objetiva do empregador por danos decorrentes de acidentes de trabalho, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida, por sua natureza, apresentar exposição habitual a risco especial, com potencialidade lesiva e implicar ao trabalhador ônus maior do que aos demais membros da coletividade’, nos termos do voto do Ministro Alexandre de Moraes(Relator), vencido o Ministro Marco Aurélio. Ausente, por motivo de licença médica, o Ministro Celso de Mello. Presidência do Ministro Dias Toffoli. Plenário, 12.03.2020."

No julgamento dos embargos de declaração, o Tribunal regional esclareceu (art. 896, § 1º-A, I, da CLT):

"Para auxiliar a embargante na leitura, compreensão e interpretação do v. acórdão, esclareça-se que a narrativa lá posta, que corresponde à verdade dos fatos segundo o acervo de provas dos autos, noticia que o ônibus em que a reclamante laborava, embora não estivesse diretamente inserido na dinâmica do acidente de trânsito (frise-se: acidente de trânsito este que decorreu do fato de que outro ônibus se chocou com um poste), estava envolvido indiretamente, na medida em que foi atingido por estilhaços de vidros provenientes da batida anteriormente relatada.

Assim, a reclamante, de fato, envolveu-se em acidente de trânsito (enquadrado como acidente laboral no v. acórdão), muito embora o ônibus no qual laborava não tenha sido aquele que efetivamente colidiu com o poste, mas sim o que foi atingido por estilhaços de vidros provenientes da batida anteriormente descrita (repita-se para que não haja nenhuma dúvida quanto aos fatos dos autos)."

A responsabilidade civil por acidente de trabalho, no caso de atividades de risco, é objetiva, pelo risco criado, nos termos do art. 927, parágrafo único, do Código Civil: requer a demonstração apenas do dano e do nexo de causalidade.

Isso porque, há uma violação do dever de segurança, quando a atividade da empresa expõe o empregado a risco acima da média.

Quanto à possibilidade de aplicação da responsabilidade objetiva nas relações de trabalho, o Supremo Tribunal Federal fixou tese de repercussão geral, no Tema 932, de que " o artigo 927, parágrafo único, do Código Civil é compatível com o artigo 7º, XXVIII, da Constituição Federal, sendo constitucional a responsabilização objetiva do empregador por danos decorrentes de acidentes de trabalho, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida, por sua natureza, apresentar exposição habitual a risco especial, com potencialidade lesiva e implicar ao trabalhador ônus maior do que aos demais membros da coletividade " (RE nº 828.040).

A função de cobrador de ônibus é considerada de risco pela exposição do trabalhador a infortúnios, em grau mais elevado que os demais membros da coletividade.

Cito precedentes:

"RECURSO DE REVISTA REGIDO PELA LEI 13.015/2014. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. ATIVIDADE DE RISCO. COBRADOR DE ÔNIBUS. TRANSPORTE COLETIVO. ASSALTO. DANO MORAL. A insuficiência da teoria da culpabilidade para dar solução aos inúmeros casos de vítimas de acidentes levou à criação da teoria do risco, que sustenta que o dono do negócio é o responsável por riscos ou perigos que sua atividade promova, ainda que empregue toda diligência para evitar o dano. Trata-se da denominada teoria do risco criado, segundo a qual, em sendo o empregador responsável pela organização da atividade produtiva, beneficiando-se do lucro do empreendimento, nada mais razoável e justo do que lhe imputar a responsabilidade pelo ressarcimento ao obreiro dos danos decorrentes de sua exposição ao risco, independentemente da verificação acerca da imprudência, negligência ou imperícia. Assim, exercendo a trabalhadora atividade de cobrador de ônibus coletivo, promovendo o transporte de valores, e sabendo-se que os índices de criminalidade vêm aumentando significativamente nos últimos anos, a situação autoriza a responsabilização objetiva da empregadora, nos termos da regra inserta no parágrafo único do artigo 927 do Código Civil. Precedentes. Recurso de revista conhecido e provido." (RR-520-94.2016.5.20.0008, Ac. 5ª Turma, Relator Ministro Douglas Alencar Rodrigues, DEJT 17/08/2018).

"RECURSO DE REVISTA. PROCESSO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.015/2014 E ANTERIOR À LEI 13.467/2017. COBRADOR DE ÔNIBUS. DANOS MORAL E MATERIAL. ACIDENTE DO TRABALHO. RECLAMANTE ATINGIDA POR OBJETO ARREMESSADO CONTRA O ÔNIBUS (PERDA DO GLOBO OCULAR DIREITO). ASSALTOS SOFRIDOS DURANTE O TRABALHO (DANOS PSÍQUICOS). RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR. ATIVIDADE DE RISCO (ART. 927, PARÁGRAFO ÚNICO DO CÓDIGO CIVIL DE 2002). Há de considerar que a indenização por danos morais é devida quando presentes os requisitos essenciais para a responsabilização empresarial. É necessária, de maneira geral, a configuração da culpa do empregador ou de suas chefias pelo ato ou situação que provocou o dano ao empregado. É que a responsabilidade civil de particulares, no Direito Brasileiro, ainda se funda, predominantemente, no critério da culpa (negligência, imprudência ou imperícia), nos moldes do art. 186 do CCB, que dispõe: ‘Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito‘. Contudo, por exceção, o art. 927 do CCB, em seu parágrafo único, trata da responsabilidade objetiva independentemente de culpa - ‘quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem‘. Ora, tratando-se de atividade empresarial fixadora de risco para os trabalhadores envolvidos, desponta a exceção ressaltada pelo parágrafo único do art. 927 do CCB, tornando objetiva a responsabilidade empresarial por danos acidentários (responsabilidade em face do risco). Nessa hipótese excepcional, a regra objetivadora do Código Civil também se aplica ao Direito do Trabalho, uma vez que a Constituição da República manifestamente adota, no mesmo cenário normativo, o princípio da norma mais favorável (art. 7º, caput : ‘... além de outros que visem à melhoria de sua condição social ‘), permitindo a incidência de regras infraconstitucionais que aperfeiçoem a condição social dos trabalhadores. A Constituição Federal de 1988 assegura que todos têm direito ao meio ambiente do trabalho ecologicamente equilibrado, porque essencial à sadia qualidade de vida, razão pela qual incumbe ao Poder Público e à coletividade, na qual se inclui o empregador, o dever de defendê-lo e preservá-lo (arts. 200, VII, e 225, caput ). Não é por outra razão que Raimundo Simão de Melo alerta que a prevenção dos riscos ambientais e/ou eliminação de riscos laborais, mediante adoção de medidas coletivas e individuais, é imprescindível para que o empregador evite danos ao meio ambiente do trabalho e à saúde do trabalhador. Acidentes do trabalho e/ou doença profissional ou ocupacional, na maioria das vezes, ‘são eventos perfeitamente previsíveis e preveníveis, porquanto suas causas são identificáveis e podem ser neutralizadas ou mesmo eliminadas; são, porém, imprevistos quanto ao momento e grau de agravo para a vítima‘ (MELO, Raimundo Simão de. Direito ambiental do trabalho e a saúde do trabalhador. 5.ed. São Paulo: Ltr, 2013, p. 316). Registre-se que tanto a higidez física como a mental, inclusive emocional, do ser humano são bens fundamentais de sua vida, privada e pública, de sua intimidade, de sua autoestima e afirmação social e, nesta medida, também de sua honra. São bens, portanto, inquestionavelmente tutelados, regra geral, pela Constituição (art. 5º, V e X). Assim, agredidos em face de circunstâncias laborativas, passam a merecer tutela ainda mais forte e específica da Constituição da República, que se agrega à genérica anterior (art. 7º, XXVIII, CF/88). Frise-se que é do empregador, evidentemente, a responsabilidade pelas indenizações por dano moral, material ou estético decorrentes de lesões vinculadas à infortunística do trabalho, sem prejuízo do pagamento pelo INSS do seguro social. Em razão de a atividade de cobrador de ônibus implicar um risco acentuado para os trabalhadores - haja vista o quadro atual da profissão, que é, com relevante frequência, alvo de condutas criminosas, expondo os trabalhadores dessa área a situações de vulnerabilidade -, incide a responsabilidade objetiva fixada pelo Direito (art. 927, parágrafo único, CCB/2002). No caso dos autos , conforme se extrai da decisão recorrida, a Obreira se enquadrava justamente nessa hipótese de risco acentuado, situação que - uma vez caracterizado o acidente de trabalho - geraria o direito à indenização por danos morais, em consonância com o citado dispositivo do Código Civil e na linha do atual entendimento desta Corte Superior sobre a matéria. Consta do acórdão recorrido, que restaram comprovados os danos sofridos pela Reclamante, decorrentes de acidente do trabalho, ocorrido em 21/12/2013 (quando, contra o ônibus coletivo, onde laborava como cobradora, foi arremessado, da via pública, um saco de lixo que atingiu o seu rosto, causando-lhe a evisceração e perda do globo ocular direito), bem como dos assaltos sofridos (em um total de dez), no cumprimento de suas atividades laborais . A perda do globo ocular direito culminou na redução da capacidade laborativa da Reclamante e os assaltos ocorridos no decorrer das suas atividades laborais causaram-lhe danos psíquicos e emocionais - premissas fáticas incontestes à luz da Súmula 126/TST. Do acórdão recorrido se extrai, ainda, que ‘pela própria visão monocular, torna-se presumível ante o que ordinariamente se observa (art. 375, CPC) que tal situação gera substanciais reflexos no dia a dia da reclamante, a qual não poderá dirigir e ainda perde qualidade de vida em sentido amplo, especialmente em decorrência da perda de percepção visual de profundidade ‘. Quanto ao elemento culpa, essa emergiu da conduta negligente da Reclamada em relação ao dever de cuidado à saúde, higiene, segurança e integridade física do trabalhador (art. 6º e 7º, XXII, da CF, 186 do CCB/02), ao não adotar medidas aptas a prevenir a ocorrência dos assaltos e a garantir a segurança física de seus trabalhadores, especialmente quando submetidos a rotas em que era necessária a passagem por locais perigosos. Nessa situação, presume-se a culpa da Empregadora pelo acidente e os assaltos sofridos pela Reclamante e era da Reclamada o ônus de comprovar a adoção das necessárias medidas preventivas exigidas pela ordem jurídica em matéria de segurança e saúde no trabalho - deveres anexos ao contrato de trabalho -, a fim de evitar o infortúnio ocorrido, ônus do qual não se desonerou. No mesmo sentido, tem-se a jurisprudência do TST, que considera objetiva a responsabilidade por danos morais resultantes do evento ‘assalto’ e seus consectários, relativamente a empregados que exerçam atividade de alto risco, tais como bancários, motoristas de carga, motoristas de transporte coletivo e outros (art. 927, parágrafo único, CCB). Logo, enquadrando-se a situação dos autos nessa hipótese extensiva de responsabilização - a Autora trabalhava como cobradora de ônibus -, deve ser restabelecido o capítulo da sentença em que se reconheceu a responsabilidade civil objetiva da Reclamada. Recurso de revista conhecido e provido." (RR-876-36.2014.5.06.0142, Ac. 3ª Turma, Relator Ministro Mauricio Godinho Delgado, DEJT 07/06/2021, destaque acrescido).

"AGRAVO INTERNO EM RECURSO DE REVISTA. INTERPOSIÇÃO ANTERIOMENTE À VIGÊNCIA DA LEI N.º 13.015/2014 E DO NOVO CPC. Diante do atendimento aos pressupostos do art. 896, ‘a’ e ‘c’, da CLT, dá-se provimento ao Agravo Interno. Agravo conhecido e provido. RECURSO DE REVISTA. [...]. DANO MORAL. COBRADOR DE ÔNIBUS. ASSALTOS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO EMPREGADOR. A regra geral no Direito Brasileiro é a responsabilidade subjetiva, que pressupõe a ocorrência concomitante do dano, do nexo causal e da culpa do empregador. Sem a conjugação de todos esses requisitos não há falar-se em responsabilidade. É o que se extrai da exegese do art. 186 do Código Civil. Em se tratando, todavia, de dano decorrente de atividade de risco, há norma específica para que seja aplicada a responsabilidade objetiva (independentemente de culpa), conforme se extrai do parágrafo único do art. 927 do Código Civil. Desse modo, cuidando-se de atividade empresarial que implique risco acentuado aos empregados, a responsabilidade é objetiva, ou seja, independe de culpa do empregador. No caso em tela, o reclamante, cobrador de ônibus, trabalhava em situação de risco acentuado, o que possibilita a aplicação do parágrafo único do art. 927 do Código Civil a fim de deferir o pedido de indenização por danos morais. Precedentes da Corte. Recurso de Revista conhecido e provido, no tema." (RR-1476-78.2014.5.09.0011, Ac. 1ª Turma, Relator Ministro Luiz José Dezena da Silva, DEJT 29/11/2019).

"AGRAVO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA SOB A ÉGIDE DA LEI 13.467/2017. TRANSCENDÊNCIA PREJUDICADA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. TRANSPORTE COLETIVO. COBRADOR DE ÔNIBUS. ATIVIDADE DE RISCO. ATO DE VANDALISMO. INCÊNDIO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO EMPREGADOR. O acórdão regional concluiu que ficou configurada a responsabilidade objetiva da reclamada pelos danos sofridos pelo reclamante no exercício de suas atividades, qual seja, cobrador de ônibus do transporte coletivo. Ressaltou que o empregado falecido foi vítima fatal de um ato de vandalismo em que agentes criminosos atearam fogo ao transporte coletivo em que se encontrava. O TRT aplicou o disposto no parágrafo único do artigo 927 do Código Civil que impõe o dever de indenizar, em face da responsabilidade objetiva, em decorrência do risco da atividade empresarial. Consignou, ainda, não haver motivo para configuração do ‘rompimento do nexo causal ou de fortuito externo’. Importa frisar que o STF, em 12/03/2020, fixou tese alusiva ao tema de repercussão geral 932, suscitado no RE 828040, tendo firmado entendimento no sentido de que ‘o artigo 927, parágrafo único, do Código Civil é compatível com o artigo 7º, XXVIII, da Constituição Federal, sendo constitucional a responsabilização objetiva do empregador por danos decorrentes de acidentes de trabalho, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida, por sua natureza, apresentar exposição habitual a risco especial, com potencialidade lesiva e implicar ao trabalhador ônus maior do que aos demais membros da coletividade’, tese convergente àquela fixada na decisão regional. Ademais, no âmbito do Tribunal Pleno desta Corte, a matéria foi objeto de amplo debate, quando se definiu que é de risco a atividade de trabalhador que executa suas tarefas em transporte coletivo urbano, aplicando-se ao caso a teoria da responsabilidade civil objetiva. Precedentes. Decisão regional em consonância com a jurisprudência pacificada do TST acerca da matéria. Não ficou demonstrado o desacerto da decisão monocrática que negou provimento ao agravo de instrumento. Agravo não provido, sem incidência de multa, ante os esclarecimentos prestados." (Ag-AIRR-950-53.2018.5.07.0003, Ac. 6ª Turma, Relator Ministro Augusto Cesar Leite de Carvalho, DEJT 18/03/2022).

"[...]. II - RECURSO DE REVISTA DO RECLAMANTE. INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI N.º 13.467/2017. MOTORISTA E COBRADOR DE ÔNIBUS. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. ASSALTOS SOFRIDOS DURANTE O TRABALHO. DOENÇA OCUPACIONAL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. ATIVIDADE DE RISCO. Nos termos da jurisprudência desta Eg. Corte, o trabalho em transporte coletivo urbano implica risco potencial à incolumidade física e psíquica do trabalhador, a ensejar a responsabilização objetiva da empresa por dano decorrente de assalto, nos termos do art. 927, parágrafo único, do Código Civil. No caso em tela, extrai-se do acórdão regional que o reclamante, motorista e cobrador de ônibus, teve diagnóstico de transtorno de ansiedade por reação ao estresse, em razão da ocorrência, durante sua jornada de trabalho, de roubo sofrido mediante uso de arma de fogo, seguido de incêndio criminoso ao ônibus que conduzia. O TRT, no entanto, reformou a sentença excluindo da condenação a indenização por danos morais, ao argumento de que ‘ainda que se tratem de ocorrências traumatizantes e inaceitáveis sob o aspecto da insegurança que é comum a todos os usuários do transporte público indistintamente, não situam o empregador como responsável, omissivo ou comissivo, direta ou indiretamente relacionado com o dano assim infligido ao recorrente‘. Como se vê, não foi reconhecida a responsabilização objetiva da reclamada, em total descompasso com a jurisprudência desta Corte, razão pela qual o recurso de revista merece ser conhecido e provido para que seja declarada a responsabilidade civil da empresa em razão de assaltos a motorista e cobrador de ônibus. Precedentes. Realce-se, por fim, que o dano, ao contrário do que foi fundamentado pelo TRT, é in re ipsa, pois decorre do próprio ato lesivo, bastando a prova da ofensa para se configurar o dano moral. Recurso de revista conhecido e provido." (RR-2623-48.2013.5.02.0051, Ac. 2ª Turma, Relatora Ministra Maria Helena Mallmann, DEJT 28/10/2022).

"AGRAVO - AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DA LEI N° 13.467/2017 - DANOS MORAIS E MATERIAIS - CARACTERIZAÇÃO - RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA - COBRADOR - ATIVIDADE DE RISCO A decisão agravada observou os artigos 932, incisos III, IV e VIII, do CPC e 5º, inciso LXXVIII, da Constituição da República, não comportando reconsideração ou reforma. Agravo a que se nega provimento, com aplicação de multa." (Ag-AIRR-11186-52.2016.5.15.0087, Ac. 4ª Turma, Relatora Ministra Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, DEJT 24/06/2022).

"RECURSO DE REVISTA. RECURSO INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 13.467/2017. RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR - ASSALTO - COBRADOR DE ÔNIBUS - ATIVIDADE DE RISCO. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA RECONHECIDA (alegação de violação aos artigos 1º, III, e 5º, V e X, da CF, 2º, caput , da CLT e 927, parágrafo único, do CC e divergência jurisprudencial ). Tratando-se de recurso de revista interposto em face de decisão regional que se mostra contrária à jurisprudência consolidada desta Corte, revela-se presente a transcendência política da causa , a justificar o prosseguimento do exame do apelo. Na questão de fundo, há a possibilidade de reconhecimento da responsabilidade objetiva em duas hipóteses: 1) naquelas especificadas em lei, a exemplo dos casos de relação de consumo, de seguro de acidente de trabalho, de danos nucleares, de danos causados ao meio ambiente, etc, e daqueles previstos no próprio Código Civil Brasileiro (como exemplo, os artigos 931, 932, 936, 937 e 938); 2) naquelas em que ‘a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, riscos para os direitos de outrem’. Trata-se, esta segunda hipótese, de cláusula geral de responsabilidade civil objetiva, mediante a adoção de conceitos jurídicos indeterminados. Assim, é necessário estabelecer-se, por ora, a possibilidade, ou não, de aplicação da teoria do risco, consagrada no parágrafo único do artigo 927 do Código Civil, às hipóteses de acidente do trabalho. In casu , esta Corte tem entendido que a atividade desenvolvida pela reclamada (transporte público de passageiros) enquadra-se perfeitamente no rol de atividades de risco, em razão da sua potencialidade de provocação de dano a outrem, atraindo a responsabilidade objetiva, na forma estabelecida pelo supracitado artigo 927, parágrafo único. Desse modo, a atividade de cobrador de ônibus exercida pela ex-empregada configura-se como atividade de risco, tendo em vista que a frequência do exercício de tal atividade expõe o trabalhador a maior probabilidade de sinistro, como ocorreu no presente caso, no qual resultou em prejuízos à reclamante. Assim, a responsabilidade do empregador é inerente por se tratar a função de cobrador de ônibus atividade de risco e sendo da reclamada o dever de cautela, uma vez que assumiu o risco do ramo de atividade, configurando-se sua conduta culposa, diante de sua omissão em promover ambiente de trabalho seguro à sua empregado, a teor do artigo 927, parágrafo único, do Código Civil. Precedentes. Recurso de revista conhecido e provido." (RR-20455-77.2012.5.20.0003, Ac. 7ª Turma, Relator Ministro Renato de Lacerda Paiva, DEJT 27/11/2020).

Fixada essa premissa e constatado o dano, examina-se se há causalidade adequada entre o acidente e a atividade exercida pela reclamante.

Ressalte-se que o caso fortuito, como excludente do nexo, pode ser interno ou externo, a exigir perscrutar se o evento danoso seria ou não inerente ao risco da atividade.

Na lição de Sérgio Cavalieri Filho, o fortuito interno é o fato imprevisível, inevitável, que se liga aos riscos do empreendimento. Fortuito externo, por outro lado, é aquele que "não guarda relação de causalidade com a atividade ", sendo "absolutamente estranho" ao serviço ( Programa de responsabilidade civil. 15. ed. Barueri: Atlas, 2022, p. 253).

No transporte de pessoas, até mesmo o fato de terceiro é considerado fortuito interno, a atrair a responsabilidade, ainda que com direito de regresso. Nesse sentido, o art. 735 do CC, segundo o qual "A responsabilidade contratual do transportador por acidente com o passageiro não é elidida por culpa de terceiro, contra o qual tem ação regressiva".

Sobre o fortuito interno, a título ilustrativo, observe-se o teor da Súmula 479 do STJ: "As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias".

No mesmo sentido, o Enunciado 443 aprovado na V Jornada de Direito Civil: "Arts. 393 e 927. O caso fortuito e a força maior somente serão considerados como excludentes de responsabilidade civil quando o fato gerador do dano não for conexo à atividade desenvolvida".

Na hipótese dos autos, o Tribunal Regional afirmou, " em que pese o ônibus da reclamada, no qual a reclamante laborava, não ter se envolvido no acidente de trânsito, fato é que a reclamante foi atingida por estilhaços de vidro decorrentes da batida de ônibus de outra empresa " (fl. 699).

Destacou, também, que " a autora sofreu cegueira (legal) do olho direito que gerou invalidez parcial definitiva de 30% e prejuízo para as atividades da vida cotidiana, encontrando-se, todavia, apta para o trabalho " (fl. 698).

Com efeito, a dinâmica do evento, que resultou em cegueira do olho direito, não permite verificar fortuito externo apto a romper o nexo causal, na medida em que a exposição aos efeitos deletérios de outro acidente de trânsito caracteriza fortuito interno, dada a natureza das atividades desempenhadas pela reclamante.

Acidentes de trânsito, ainda que o veículo da autora não estivesse diretamente envolvido, estão englobados pelo risco criado pela atividade de transporte rodoviário.

Nesse sentido, registro os seguintes precedentes da SbDI-1:

"[...]. EMBARGOS EM RECURSO DE REVISTA. CONHECIMENTO. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL ESPECÍFICA. Constatado equívoco no exame dos pressupostos extrínsecos do recurso e comprovada a divergência jurisprudencial mediante aresto específico, cumpre acolher os embargos de declaração para superar a deserção declarada, e, constatada divergência jurisprudencial específica, atribuir efeitos modificativos ao julgado para conhecer dos embargos. MÉRITO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. ACIDENTE DO TRABALHO. MORTE DO EMPREGADO POR ACIDENTE DE TRÂNSITO. MOTORISTA DE TRANSPORTADORA. ATIVIDADE DE RISCO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA EMPREGADORA. CULPA EXCLUSIVA DE TERCEIRO. Por aplicação do parágrafo único do art. 927 do Código Civil, que prevê a responsabilidade objetiva em razão do risco do empreendimento, responde o empregador, nos termos do art. 2º, caput, da CLT, pelos danos advindos de acidente do trabalho sofrido pelo empregado no exercício de atividade que o expõe a tal risco. No caso dos autos, a atividade desenvolvida pelo empregado era a de motorista de transportadora, que o expunha a risco bem mais acentuado do que aquele a que estão sujeitos os demais membros da sociedade. A culpa exclusiva de terceiros não afasta a responsabilidade objetiva, na medida em que a conduta dos outros motoristas é intrínseca ao acidente de trânsito, sem que se possa cogitar de força maior ou caso fortuito. Precedentes. Embargos a que se nega provimento." (ED-E-ED-RR-881-92.2010.5.12.0025, Ac. Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Marcio Eurico Vitral Amaro, DEJT 24/10/2014).

"RECURSO DE EMBARGOS INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 11.496/2007 - INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - MOTORISTA DE ÔNIBUS – PERDA TOTAL DO OLHO ESQUERDO - EMPRESA DE TRANSPORTE - RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO EMPREGADOR - EXPOSIÇÃO DO EMPREGADO A ATIVIDADE DE ALTO RISCO – PREVISIBILIDADE DO INFORTÚNIO - ÔNUS QUE DEVE SER SUPORTADO POR AQUELE QUE SE BENEFICIA DA ATIVIDADE ECONÔMICA – VALOR SOCIAL DO TRABALHO E POSTULADO DA SOLIDARIEDADE – ARTS. 1º, IV, E 3º, I, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. Nos termos do art. 1º, IV, da Constituição Federal, constitui fundamento da República Federativa do Brasil o valor social do trabalho. A importância do referido valor é de tal monta que o constituinte originário o erigiu como pilar da ordem econômica, ou seja, não se afigura lícita a exploração do trabalho alheio que menoscabe a integridade daquele que o presta. Nessa senda, se o empregador coloca o seu empregado em atividade cujo risco é notoriamente conhecido, não pode, quando da ocorrência do infortúnio, esquivar-se de sua responsabilidade pelas lesões experimentadas pelo trabalhador. Do contrário, estar-se- ia negando o postulado da solidariedade elencado no art. 3º, I, da Carta Magna, pois é manifestamente injusto que aquele que tira proveito do trabalho alheio não repare os danos sofridos pelo empregado, enquanto inserido no empreendimento empresarial. Presentes, portanto, o dano e o nexo causal com atividade de risco, imputa-se ao empregador (criador de tal situação) a responsabilidade pelos danos morais suportados pelo empregado. Extrai-se do quanto transcrito no acórdão embargado ser incontroverso nos autos que o reclamante sofreu acidente com o ônibus que dirigia quando trafegava em estrada intermunicipal a serviço da reclamada. Também é certo que o trabalhador sofreu perfuração em seu olho esquerdo, causando perda total da visão desse órgão. São incontestes, portanto, o nexo de causalidade entre labor e acidente e o dano suportado pelo reclamante, que teve vulnerado seu direito personalíssimo à integridade física. Sucede que eventos como os que vitimaram o obreiro (imprudência dos motoristas que trafegam nas vias públicas) afiguram-se plenamente previsíveis para qualquer cidadão brasileiro, constituindo, infelizmente, parte do cotidiano de nosso País. Assim, por se tratar de fortuito interno (inerente à atividade desenvolvida pela reclamada), ele não se presta a afastar a responsabilidade da ré . Recurso de embargos conhecido e desprovido." (E-RR-39300-88.2006.5.17.0121, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, DEJT 26/09/2014).

Nesse contexto, presentes o dano e o nexo causal e sendo desnecessária a averiguação de culpa da reclamada, pela incidência da teoria da responsabilidade civil objetiva, é devido o deferimento das indenizações por danos morais e materiais decorrentes do acidente sofrido.

Ausente ofensa aos preceitos de lei e da Constituição indicados.

Os arestos apresentados no recurso de revista são inespecíficos na medida em que retratam situações em que não houve redução da capacidade laborativa. Incidência da Súmula 296/TST.

Mantenho a decisão agravada, com acréscimo de fundamentos.

Nego provimento ao agravo.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Quinta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer do agravo e, no mérito, negar-lhe provimento .

Brasília, 4 de outubro de 2023.

Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)

MORGANA DE ALMEIDA RICHA

Ministra Relatora