A C Ó R D Ã O

Tribunal Pleno

ACV/accd/sp/pp

REPRESENTATIVO PARA REAFIRMAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. INCIDENTE DE RECURSO REPETITIVO. AUSÊNCIA OU IRREGULARIDADE DOS DEPÓSITOS DE FGTS. RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO. CARACTERIZAÇÃO. DESNECESSIDADE DO REQUISITO DA IMEDIATIDADE. Diante da manifestação de todas as Turmas do Tribunal Superior do Trabalho e da C. SBDI-1 indica-se a matéria a ter a jurisprudência reafirmada, em face da seguinte questão jurídica: Definir se o descumprimento da obrigação contratual de recolhimento dos depósitos de FGTS constitui justo motivo para a rescisão indireta do contrato de trabalho, nos termos do art. 483, "d", da CLT? Para o fim de consolidar a jurisprudência pacificada no Tribunal Superior do Trabalho, deve ser acolhido o Incidente de Recurso de Revista para o fim de fixar a seguinte tese vinculante: A ausência ou irregularidade no recolhimento dos depósitos de FGTS caracteriza descumprimento de obrigação contratual, nos termos do art. 483, "d", da CLT, suficiente para configurar a rescisão indireta do contrato de trabalho, sendo desnecessário o requisito da imediatidade.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RRAg-1000063-90.2024.5.02.0032 , em que esta PRESIDÊNCIA DO TST suscita Proposta de Instauração de Incidente de Recurso Repetitivo (IncJulgRREmbRep) para reafirmação da jurisprudência do TST, na forma dos arts. 41, XLVII, e 132-A, § 5º, do Regimento interno, sendo Recorrente e Agravada SILVANIA APARECIDA BATISTA RAMALHO e Recorrida e Agravante IRMANDADE DA SANTA CASA DE MISERICÓRDIA DE SÃO PAULO .

O presente recurso é representativo de controvérsia que, a despeito de estar pacificada nas oito turmas e na Subseção 1 de Dissídios Individuais do TST , ainda enseja elevada recorribilidade, em razão de resistente divergência entre os Tribunais Regionais, colocando em risco a segurança jurídica e a missão constitucional deste Tribunal Superior, enquanto Corte de Precedentes responsável pela unidade nacional do direito, nas matérias de sua competência.

A utilização da sistemática de demandas repetitivas tem por finalidade aumentar a segurança jurídica proporcionada ao jurisdicionado, pois consolida a jurisprudência e reduz, consequentemente, a litigiosidade nas Cortes superiores.

Apresentada, portanto, proposta pela afetação do processo RRAg-1000063-90.2024.5.02.0032 como Incidente de Recurso Repetitivo junto a este Tribunal Pleno, a fim de examinar a possibilidade de reafirmação de jurisprudência da Corte, nos termos do art. 131-A e parágrafos, do RITST, com o fim de dirimir a seguinte questão jurídica.

O descumprimento da obrigação contratual de recolhimento dos depósitos de FGTS, seja pela ausência ou pela irregularidade, configura falta grave suficiente para caracterização da rescisão indireta do contrato de trabalho, mesmo se não houver a imediatidade?

É o relatório.

V O T O

ADMISSIBILIDADE DE INCIDENTE DE RECURSO DE REVISTA REPETITIVO PARA REAFIRMAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO TST

A formação de precedentes obrigatórios constitui um dos principais mecanismos de gestão processual introduzidos pelo legislador nas últimas décadas. É essencial para que seja enfrentado de forma célere, coerente e isonômica o exponencial crescimento da demanda – que saltou de 430.850 processos recebidos em 2023, para 530.021 processos em 2024, a despeito de reiterados recordes de produtividade. São números incompatíveis com a estruturação do Poder Judiciário, cujas cortes de vértice são funcionalmente destinadas a dirimir as novas controvérsias nacionais, sem repetição do mesmo labor já realizado nas instâncias ordinárias, sob pena de comprometimento da isonomia, segurança jurídica e razoável duração do processo (CF, art. 5º, caput e LXXVIII).

Assim é que esta Corte Superior, com inspiração na prática já tradicional no Supremo Tribunal Federal, para fins de maior celeridade na formação de precedentes obrigatórios em matérias já conhecidas e sedimentadas, adotou fluxo procedimental (cf. Emenda Regimental n. 7, de 25/11/2024 ), segundo o qual:

“Art. 132-A. A proposta de afetação do incidente de recurso repetitivo (...) será necessariamente incluída em pauta de sessão virtual e deverá conter o tema a ser afetado.

§ 2º As disposições dos arts. 133 e 134 do Regimento Interno são aplicáveis, no que couber, ao procedimento de afetação do incidente de recurso repetitivo, vedada em qualquer caso a remessa do processo inserido em sessão virtual à sessão presencial , para os fins previstos no caput deste artigo. (...)

§ 5º O julgamento de mérito do incidente de recurso repetitivo, no caso de mera reafirmação de jurisprudência dominante da Corte, também será realizado por meio do Plenário Eletrônico, na mesma sessão virtual que decide sobre a proposta de afetação.

§ 6º Quando designada sessão virtual para afetação de incidente de recursos repetitivos, com proposta de reafirmação de jurisprudência, eventuais sustentações orais quanto ao mérito deverão ser necessariamente juntadas por meio eletrônico , após a publicação da pauta e até 48 horas antes de iniciado o julgamento em ambiente virtual.”

Compete ao Presidente do Tribunal “ indicar recurso representativo da controvérsia, dentre aqueles ainda não distribuídos, submetendo-o ao Tribunal Pleno para fins de afetação de IRR (...) , inclusive mediante reafirmação de jurisprudência ” (RITST, art. 41, XLVII), quando houver “ multiplicidade de recursos de revista (...) fundados em idêntica questão de direito , (...) considerando a relevância da matéria ou a existência de entendimentos divergentes entre os Ministros da Subseção ou das Turmas do Tribunal ”.

Quanto à multiplicidade da discussão de tal questão no Tribunal Superior do Trabalho, a despeito de já estar aqui sedimentada, veja-se que simples consulta ao acervo jurisprudencial do TST a partir dos termos “ depósitos de FGTS ”, “ rescisão indireta ” e “ falta grave” revelou, para os últimos 12 meses, 41 acórdãos e 463 decisões monocráticas sobre a questão jurídica em exame.

Já quanto à relevância da formação de precedente obrigatório sobre o tema, esta se dá justamente pelo fato de que a jurisprudência persuasiva desta Corte não se mostrou, até o presente, suficiente para garantir a unidade do Direito nacional em relação a tal matéria, havendo entendimentos dissonantes nos Regionais, os quais ainda fomentam elevada recorribilidade.

Quanto à posição do Tribunal Superior do Trabalho , esta pode ser sintetizada no sentido de que a irregularidade no recolhimento dos depósitos de FGTS configura falta grave suficiente para caracterização da rescisão indireta, nos termos do art. 483, “d”, da CLT. Em tal sentido os seguintes exemplos de todas as suas Turmas:

"AGRAVO INTERNO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. INTERPOSIÇÃO NA VIGÊNCIA DA LEI N.º 13.467/2017. RITO SUMARÍSSIMO. [...] RESCISÃO INDIRETA. AUSÊNCIA DE DEPÓSITOS DE FGTS. DECISÃO EM CONSONÂNCIA COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. O Tribunal Regional, soberano na análise dos fatos e das provas, firmou a premissa fática de que houve irregularidades no recolhimento do FGTS da reclamante, razão pela qual manteve a sentença que reconheceu a rescisão indireta do contrato de trabalho nos termos do art. 483, "d", da CLT. Entendimento diverso demandaria reexame de fatos e provas, vedado pela Súmula n.º 126 do TST. Na hipótese, a iterativa e notória jurisprudência deste Tribunal Superior se firmou no sentido de que a ausência ou irregularidade nos depósitos do FGTS importa em falta grave apta a configurar rescisão indireta. No tema, o apelo que encontra óbice no art. 896, § 7.º, da CLT e na Súmula n.º 333 do TST. Agravo conhecido e não provido, no tema. [...]" (Ag-AIRR-1001226-19.2019.5.02.0085, 1ª Turma , Relator Ministro Luiz Jose Dezena da Silva, DEJT 15/10/2024).

"AGRAVO INTERNO. RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/17. [...] RESCISÃO INDIRETA – IRREGULARIDADE DE RECOLHIMENTO DOS DEPÓSITOS DE FGTS. Na hipótese, o acórdão regional manteve a sentença que reconheceu a rescisão indireta em hipótese na qual restou incontroversa a ocorrência de irregularidades no recolhimento dos depósitos do FGTS. A jurisprudência desta Corte Superior firmou-se no sentido de que a ausência ou irregularidades nos depósitos de FGTS implica falta grave do empregador, hábil a configurar hipótese de rescisão indireta, nos termos do artigo 483, "d", da CLT. Precedentes. Incidência da Súmula nº 333 do TST e do artigo 896, § 7º, da CLT. Agravo interno a que se nega provimento" (AIRR-0010169-11.2023.5.18.0003, 2ª Turma , Relatora Ministra Liana Chaib, DEJT 19/12/2024).

"[...] III - RECURSOS DE REVISTA. RESCISÃO INDIRETA. IRREGULARIDADE NO RECOLHIMENTO DOS DEPÓSITOS DO FGTS. FALTA GRAVE. JUSTA CAUSA DO EMPREGADOR. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA RECONHECIDA. A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que a irregularidade no recolhimento dos depósitos do FGTS (mora contumaz e/ou ausência de recolhimento), por si só, constitui falta grave suficiente para a caracterização da rescisão indireta disciplinada no art. 483, "d", da CLT. Dessa forma, reconhecida a irregularidade no recolhimento do FGTS pelo Tribunal Regional, resta configurado o descumprimento, pelo empregador, das suas obrigações contratuais. Precedentes. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento" (RRAg-0000156-83.2023.5.17.0001, 3ª Turma , Relator Ministro Alberto Bastos Balazeiro, DEJT 19/12/2024).

"I - AGRAVO – AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA DO RECLAMANTE INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 13.467/2017 – RESCISÃO INDIRETA - AUSÊNCIA DE RECOLHIMENTO DOS DEPÓSITOS DO FGTS. Diante de aparente ofensa artigo 483, ‘‘d’’, da CLT, dá-se provimento ao Agravo e, desde logo, ao Agravo de Instrumento para mandar processar o Recurso de Revista. II - RECURSO DE REVISTA DO RECLAMANTE INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 13.467/2017 - RESCISÃO INDIRETA - CONFIGURAÇÃO - AUSÊNCIA DE RECOLHIMENTO DOS DEPÓSITOS DO FGTS - TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA RECONHECIDA. Esta Eg. Corte Superior firmou jurisprudência no sentido de que o descumprimento contratual concernente à ausência de recolhimento dos depósitos de FGTS constitui falta grave do empregador, suficiente para configurar a rescisão indireta do contrato de trabalho, forte nos artigos 7º, inciso III, da Constituição da República e 483, “d”, da CLT. Recurso de Revista conhecido e provido" (RR-Ag-AIRR-646-59.2021.5.21.0003, 4ª Turma , Relatora Ministra Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, DEJT 08/11/2024).

"AGRAVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. REGIDO PELA LEI 13.467/2017. [...] 2. RESCISÃO INDIRETA. IRREGULARIDADE NO RECOLHIMENTO DOS DEPÓSITOS PARA O FGTS. ART. 483, “D”, DA CLT. TRANSCENDÊNCIA NÃO RECONHECIDA NA DECISÃO AGRAVADA. Caso em que o Tribunal Regional manteve a sentença em que se reconheceu a rescisão indireta do contrato de trabalho. Restou consignado no acórdão regional a irregularidade no recolhimento do FGTS. Com efeito, o artigo 483 da CLT, ao estabelecer as hipóteses autorizadoras da rescisão indireta do contrato de trabalho, preceitua, dentre outras, o descumprimento das obrigações contratuais por parte do empregador. Ao interpretar o referido dispositivo, esta Corte consolidou o entendimento de que a insuficiência do recolhimento dos depósitos de FGTS, configuram falta grave patronal, suficiente para ensejar o reconhecimento da rescisão indireta do contrato de trabalho, nos termos do art. 483, “d”, da CLT. Julgados. Logo, o posicionamento adotado pelo Tribunal Regional encontra-se em plena consonância com a jurisprudência reiterada dessa Corte. Exsurgem, assim, em óbice à admissibilidade do recurso de revista que se visa a destrancar, o entendimento consagrado na Súmula 333/TST e o disposto no art. 896, § 7º, da CLT. Nesse contexto, não afastados os fundamentos da decisão agravada, nenhum reparo enseja a decisão. Agravo não provido. [...]" (RRAg-1000801-36.2021.5.02.0371, 5ª Turma , Relator Ministro Douglas Alencar Rodrigues, DEJT 04/12/2024).

"[...] II - RECURSO DE REVISTA SOB A ÉGIDE DA LEI 13.467/2017. RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABAHO. AUSÊNCIA DE RECOLHIMENTO DE FGTS. ARTIGO 483, "D", DA CLT. RITO SUMARÍSSIMO. Convém pontuar, ab initio , que o processo tramita sob o rito sumaríssimo, de modo que a admissibilidade do recurso de revista fica adstrita à configuração de violação a dispositivos da Constituição e de contrariedade a súmula do TST ou súmula vinculante do Supremo Tribunal, na forma do artigo 896, § 9º, da CLT. No caso, a Corte Regional não reconheceu que a irregularidade no recolhimento dos depósitos do FGTS, no curso do contrato de trabalho, ensejava falta suficientemente grave , a justificar o pedido de rescisão indireta pelo empregado. Todavia, ao revés da ilação exarada pelo Tribunal de origem, a jurisprudência desta Corte Superior firmou-se no sentido de que a irregularidade nos depósitos do FGTS configura descumprimento de obrigações contratuais, cuja gravidade autoriza o empregado a rescindir o contrato de trabalho, com fundamento no art. 483, "d", da CLT. A seu turno, conquanto a Sexta Turma já tenha se posicionado de modo diverso, passou a adotar o posicionamento da maioria das Turmas desta Corte Superior, para reconhecer que, em casos como o dos autos, vislumbra-se violação do art. 7º, III, da Constituição Federal, apta a ensejar o conhecimento do apelo, nos termos do art. 896, §9º, da CLT. Precedentes. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-10081-33.2023.5.03.0021, 6ª Turma , Relator Ministro Augusto Cesar Leite de Carvalho, DEJT 25/10/2024).

"[...] RECURSO DE REVISTA DA PARTE AUTORA. LEI Nº 13.467/2017. CONVERSÃO DO PEDIDO DE DEMISSÃO EM RESCISÃO INDIRETA. IRREGULARIDADE NOS RECOLHIMENTOS DOS DEPÓSITOS DO FGTS. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA CONSTATADA. Esta Corte Superior tem trilhado o entendimento no sentido de que a ausência ou irregularidade no recolhimento dos depósitos do FGTS constitui motivo suficiente para dar ensejo à rescisão indireta do contrato de trabalho, nos termos do artigo 483, "d", da CLT. Sentença restabelecida. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-10615-19.2021.5.15.0051, 7ª Turma , Relator Ministro Claudio Mascarenhas Brandao, DEJT 06/12/2024).

"RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELA RECLAMANTE - ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017 [...] RESCISÃO INDIRETA. FALTA GRAVE DO EMPREGADOR. AUSÊNCIA DE RECOLHIMENTO DE FGTS. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA RECONHECIDA. No caso, o Tribunal Regional afastou a configuração de justa causa patronal, fundamentando que as irregularidades no recolhimento do FGTS e os atrasos no pagamento das férias não apresentariam gravidade suficiente para inviabilizar a continuidade do vínculo empregatício. No entanto, a jurisprudência pacífica do TST considera que a ausência ou irregularidade nos depósitos de FGTS constitui falta grave do empregador, apta a autorizar a rescisão indireta do contrato de trabalho, nos termos da alínea "d" do art. 483 da CLT. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento" (RR-1161-43.2019.5.12.0059, 8ª Turma , Relator Ministro Sergio Pinto Martins, DEJT 02/12/2024).

A c. SDI1, em decisão unânime, traz o mesmo entendimento:

"RECURSO DE EMBARGOS EM RECURSO DE REVISTA COM AGRAVO. ACÓRDÃO PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. RESCISÃO INDIRETA. AUSÊNCIA DE RECOLHIMENTO DO FGTS. O Tribunal Regional reformou a sentença em que declarada a rescisão indireta do contrato de trabalho, ao entendimento de que a "conduta da ré no que se refere ao não recolhimento do FGTS "não é justificativa" a ensejar a justa causa imputada ao empregador, irregularidades que podem ser corrigidas com o ajuizamento de reclamação trabalhista", pelo que "não houve (...) a incidência da reclamada nas hipóteses do artigo 483 da CLT". A c. Terceira Turma conheceu e deu provimento ao recurso de revista da parte reclamante para reformar o acórdão regional e restabelecer a r. sentença que declarou a rescisão indireta do contrato de trabalho, com fundamento no art. 483, "d", da CLT, porquanto a ausência ou irregularidade dos depósitos do FGTS implica falta grave do empregador. A decisão embargada, tal como proferida, encontra-se em conformidade com a compreensão do órgão uniformizador interno deste TST. Precedentes. Alcançada a finalidade precípua deste Colegiado quanto à matéria, o apelo esbarra no óbice do art. 894, § 2.º, da CLT, segundo o qual a divergência apta a ensejar os embargos deve ser atual, não se considerando tal a ultrapassada por súmula do Tribunal Superior do Trabalho ou do Supremo Tribunal Federal, ou superada por iterativa e notória jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho. Recurso de embargos não conhecido" (E-ARR-10352-59.2017.5.03.0051, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais , Relator Ministro Breno Medeiros, DEJT 21/05/2021).

"RECURSO DE EMBARGOS REGIDO PELA LEI 11.496/2007. RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO. AUSÊNCIA DE RECOLHIMENTO DO FGTS E DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. ARTIGO 483 DA CLT. O artigo 483, d, da CLT faculta ao empregado, no caso de descumprimento das obrigações contratuais por parte do empregador, a rescisão indireta do contrato de trabalho. Nesse sentido, o fato de não recolher os depósitos do FGTS, ou seu recolhimento irregular, e das contribuições previdenciárias, configura ato faltoso do empregador, cuja gravidade é suficiente para acarretar a rescisão indireta do contrato de trabalho. Por outro lado, esta Corte tem reiteradamente decidido pela relativização do requisito da imediatidade no tocante à rescisão indireta, em observância aos princípios da continuidade da prestação laboral e da proteção ao hipossuficiente. O artigo 483, caput e § 3º, da CLT, faculta ao empregado considerar rescindido o contrato de trabalho antes de pleitear em juízo as verbas decorrentes da rescisão indireta. Todavia, o referido dispositivo não estabelece o procedimento a ser adotado pelo empregado quando o empregador incidir em uma das hipóteses de justa causa. Vale dizer, não há qualquer exigência formal para o exercício da opção de se afastar do emprego antes do ajuizamento da respectiva ação trabalhista. Comprovada em juízo a justa causa do empregador, presume-se a relação entre a falta patronal e a iniciativa do empregado de rescindir o contrato de trabalho. Esse é o entendimento assente na jurisprudência majoritária desta Corte Superior, em julgados da Subseção 1 Especializada em Dissídios Individuais, bem como das Turmas, é no sentido de que a ausência de recolhimento de valores devidos a título de FGTS, por parte do empregador, no curso do contrato de trabalho autoriza a rescisão indireta. E esse entendimento ampara-se justamente no artigo 483, d, da CLT, segundo o qual o empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização quando o empregador não cumprir as obrigações do contrato. Recurso de embargos conhecido e não provido" (E-ED-ED-RR-1902-80.2010.5.02.0058, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais , Relator Ministro Augusto Cesar Leite de Carvalho, DEJT 10/03/2017).

Ocorre que, após levantamento, verificou-se que há divergência nos Tribunais Regionais quanto ao tema, conforme se transcreve:

RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO. AUSÊNCIA DE DEPÓSITOS DO FGTS. NÃO CONFIGURAÇÃO. O entendimento consolidado neste Tribunal Regional é no sentido de que a ausência ou atraso nos depósitos do FGTS não configura motivo ensejador da ruptura contratual por justa causa do empregador. Recurso desprovido. ( TRT da 12ª Região – ROT 0001702-69.2023.5.12.0016, 3ª Turma, Relator Hélio Henrique Garcia Romero, publicado no DEJT em 11/12/2024)

RESCISÃO INDIRETA A reclamante postulou a rescisão indireta do contrato de trabalho por três fundamentos: 1) atrasos no recolhimento de FGTS, 2) atraso na quitação das férias de 2021/2022 e 2022/2023, e 3) irregularidade no pagamento das disciplinas modulares. O julgador de origem reconheceu a rescisão indireta apenas com base no atraso dos recolhimentos de FGTS, sem analisar os demais argumentos suscitados pela trabalhadora. A rescisão indireta do contrato de trabalho exige prova robusta da falta grave cometida pelo empregador, suficiente para impossibilitar a continuidade do vínculo de emprego. A hipótese legal não trata de qualquer descumprimento de obrigação contratual, mas daquela que torne insustentável a continuidade da relação, visto que a falta cometida deve ser grave a ponto de acarretar a rescisão contratual, considerada a penalidade mais severa no contrato de trabalho. Assim como a justa causa aplicada ao empregado, a rescisão contratual pela via oblíqua, por ser medida de exceção, deve atender a certos requisitos objetivos, subjetivos e circunstanciais, dentre estes a gravidade da falta e a ausência de perdão tácito. A ausência de recolhimento de FGTS não constitui falta grave, apta a respaldar a rescisão contratual oblíqua, já que passível de reparação pela via judicial. Além disso, não implica rompimento da fidúcia de forma a tornar insustentável a relação de emprego. No mesmo sentido, cito os seguintes precedentes da Turma [...] ( TRT da 3ª Região – ROT 0010301-23.2024.5.03.0077, 10ª Turma, Relator Marcus Moura Ferreira, publicado no DEJT em 27/11/2024)

[...] 2.1.6 - Rescisão contratual (análise conjunta) [...] A julgadora de origem, no ponto, utilizou como fundamento para o reconhecimento da rescisão indireta a não realização dos depósitos de FGTS de modo regular durante a vigência do contrato de trabalho. Ocorre que, no entendimento desta Turma Recursal, a falta de recolhimento do FGTS no curso do contrato de trabalho não constitui falta grave apta a justificar a imputação de justa causa ao empregador, por se tratar de direito que o trabalhador só pode dispor em algumas situações específicas, como nos casos de demissão sem justa causa, no financiamento imobiliário. Partindo dessas premissas, entendo que a ausência de depósitos do FGTS, por si só, não ocasiona prejuízo imediato capaz de justificar o pedido de rescisão indireta, já que o obreiro pode valer-se de ação trabalhista interposta no curso do contrato de trabalho para ter a situação regularizada. [...] ( TRT da 21ª Região – ROT 0000377-33.2020.5.21.0010, 2ª Turma, Relator Ronaldo Medeiros de Souza, publicado no DEJT em 03/02/2023)

[...] Da rescisão contratual. A reclamante, ao pretender a rescisão indireta do seu contrato de trabalho, deveria comprovar a execução de ato grave pelo empregador ou pelo seu preposto tornando insustentável a continuidade do vínculo empregatício, ônus do qual não se desincumbiu. Nesse contexto, ressalvando entendimento pessoal esposado em decisões transatas, em homenagem à celeridade processual, curvo-me à posição majoritária desta E. Turma e reputo que a ausência de depósitos de FGTS - o que, na hipótese ocorreu em alguns meses do pacto laboral -, não constitui motivo apto a comprometer o contrato a ponto de torná-lo insuportável, sendo forçoso concluir que a rescisão contratual ocorrera por iniciativa da empregada (pedido de demissão), devendo ser excluídas da condenação as verbas rescisórias decorrentes da rescisão por culpa da empregadora, bem como o fornecimento das guias para levantamento do FGTS e SD. Dou provimento. ( TRT da 2ª Região – RORSum 1000712-86.2024.5.02.0442, 2ª Turma, Relatora Marta Casadei Momezzo, publicado no DEJT em 27/1/2025)

NULIDADE DO PEDIDO DE DEMISSÃO Insurge-se o reclamante, inconformado com a sentença, no que tange ao pedido para que seja reconhecida a rescisão indireta do contrato de trabalho. Sustenta que foi reconhecida na sentença irregularidade no pagamento dos salários e no recolhimento do FGTS desde janeiro de 2019, o que enseja o reconhecimento da falta grave do empregador. [...] Na peça de ingresso, o reclamante alegou que "não recebia os depósitos de FGTS desde que começou a trabalhar", tendo o contrato iniciado em 17/1/2019. Alega tratar-se de motivo suficiente para o reconhecimento da rescisão indireta do contrato (fl. 04). Pediu, então, a declaração de nulidade do pedido de demissão e a sua conversão em rescisão indireta do contrato de trabalho. [...] Prevalece na jurisprudência desta Câmara o entendimento pela inexistência do direito à mera conversão de pedido de demissão em rescisão indireta. Além dos casos de efetivo vício no pedido de demissão, no entendimento desta relatora, há casos em que cabe o reconhecimento da rescisão indireta do contrato, quando o trabalhador tenha manifestado a demissão embora notoriamente pretendendo a rescisão indireta, medida que vem à Justiça postular, logo em seguida, diante da violações que vinha sofrendo (inclusive a falta de recolhimentos do FGTS). No caso vertente, não há alegação de vício e também não houve reação imediata e atual do empregado, diante de falta praticada pelo empregador, não se podendo reconhecer o nexo causal entre a omissão nos recolhimentos e o rompimento do contrato de trabalho, nos termos do artigo 483 da CLT, inclusive seu §3º. Concretiza-se, assim, o mero arrependimento tardio do trabalhador, em relação ao pedido de demissão regularmente manifestado. Ao afirmar, com certa impropriedade, que "não recebia os depósitos do FGTS desde que começou a trabalhar", o reclamante faz crer que sempre soube da irregularidade, mas, ainda que assim não fosse, é certo que teve conhecimento do fato ao menos no início de 2023. Distribuída a ação somente em 2024, não se pode admitir regular o pedido de rescisão indireta do contrato de trabalho. Fica, portanto, mantida a sentença. Nego provimento ao recurso. ( TRT da 15ª Região – ROT 0010105-10.2024.5.15.0048, 6ª Câmara, Relatora Rita de Cássia Scagliusi do Carmo, publicado no DEJT em 18/12/2024)

Por meio de Incidente de Uniformização de Jurisprudência, no julgamento do processo nº 0001116-74.2017.5.09.0000, publicado no DEJT em 17/11/2017, o TRT da 9ª Região editou a Súmula nº 68 segundo a qual “ a ausência de depósitos, assim como a reiterada mora ou insuficiência no recolhimento dos valores alusivos ao FGTS constituem, por si sós, motivo relevante para justificar a rescisão indireta do contrato de trabalho, com base no art. 483, ‘d’, da CLT ”.

Por sua vez, o TRT da 24ª Região, no julgamento do IRDR nº 0024212-91.2023.5.24.0000, publicado no DEJT em 31/07/2023, firmou as seguintes teses: “ a.1) A ausência ou irregularidade nos depósitos para o FGTS constitui falta grave a justificar a rescisão indireta do contrato de trabalho por iniciativa do empregado, em razão da justa causa dada pelo empregador, com fulcro no art. 483, ‘d’ da CLT; a.2) É desnecessária a imediatidade para rescisão indireta do contrato de trabalho pelo empregado, desde que a falta praticada pelo empregador, consistente na ausência ou irregularidade no recolhimento do FGTS, seja habitual, o que significa a renovação, mês a mês, da ilicitude, de forma inescusável ”.

O representativo definido para alçar o tema a debate, que cumpre os requisitos para ensejar o exame de mérito do tema, evidencia dissenso em relação à posição do TST, sendo que a questão trazida encontra-se definida de modo diverso desta Corte Superior.

No caso, o TRT da 2ª Região concluiu que ausência dos depósitos de FGTS, por si só, não configura motivo suficiente para a rescisão contratual por justa causa.

O recurso de revista no tema ora afetado, portanto, deve ser conhecido por violação do art. 483, “d” , da CLT.

Dessa forma, demonstrado que a jurisprudência pacífica desta Corte encontra resistência nas instâncias ordinárias, forçoso reconhecer a necessidade de uniformizar a matéria, através do presente Incidente de Recurso de Revista, para reafirmação da jurisprudência do c. TST.

Nos termos do §5º do art. 132-A do Regimento Interno, procede-se à reafirmação da jurisprudência desta c. Corte:

Art. 132-A. A proposta de afetação do incidente de recurso repetitivo (...) será necessariamente incluída em pauta de sessão virtual e deverá conter o tema a ser afetado.

§ 5º O julgamento de mérito do incidente de recurso repetitivo, no caso de mera reafirmação de jurisprudência dominante da Corte, também será realizado por meio do Plenário Eletrônico, na mesma sessão virtual que decide sobre a proposta de afetação.

A atuação qualificada e célere do Tribunal Superior do Trabalho sob o rito dos recursos repetitivos converge para sua finalidade precípua como Corte de precedentes – ainda com mais razão nestes casos em que já produziu jurisprudência pacificada sobre a matéria, bastando que haja sua reafirmação sob rito destinado à conversão em precedente obrigatório, de modo a evitar a divergência de julgamentos nas instâncias ordinárias.

Como já mencionado supra, a posição consolidada do Tribunal Superior do Trabalho é no sentido de que a ausência ou irregularidade dos depósitos do FGTS implica falta grave do empregador, apta a justificar a rescisão indireta do contrato de trabalho, conforme precedentes de todas as suas Turmas, assim como da SBDI-1, já transcritos acima.

Por outro lado, a SBDI-1 do TST, no julgamento do E-ED-ED-RR-1902-80.2010.5.02.0058, decidiu pela “ relativização do requisito da imediatidade no tocante à rescisão indireta, em observância aos princípios da continuidade da prestação laboral e da proteção ao hipossuficiente. O artigo 483, caput e § 3º, da CLT, faculta ao empregado considerar rescindido o contrato de trabalho antes de pleitear em juízo as verbas decorrentes da rescisão indireta. Todavia, o referido dispositivo não estabelece o procedimento a ser adotado pelo empregado quando o empregador incidir em uma das hipóteses de justa causa. Vale dizer, não há qualquer exigência formal para o exercício da opção de se afastar do emprego antes do ajuizamento da respectiva ação trabalhista. Comprovada em juízo a justa causa do empregador, presume-se a relação entre a falta patronal e a iniciativa do empregado de rescindir o contrato de trabalho .” (DEJT de 10/03/2017, Rel. Min Augusto César Leite de Carvalho), sepultando dúvidas remanescentes quanto à ausência de imediatidade não constituir fato impeditivo ao reconhecimento da rescisão indireta do contrato de trabalho (no mesmo sentido, por exemplo, RR-813-52.2020.5.09.0195, 1ª Turma , Relator Amaury Rodrigues Pinto Junior, DEJT 28/06/2024).

Assim, do julgamento do caso concreto afetado, extrai-se a reafirmação da mesma ratio decidendi antes firmada no julgamento da SBDI-1 transcrito acima, cuja tese pode ser fixada nos seguintes termos:

A ausência ou irregularidade no recolhimento dos depósitos de FGTS caracteriza descumprimento de obrigação contratual, nos termos do art. 483, "d", da CLT, suficiente para configurar a rescisão indireta do contrato de trabalho, sendo desnecessário o requisito da imediatidade.

Pelo exposto, o recurso de revista ora afetado, no mérito, deve ser provido no tópico, para aplicar a tese ora reafirmada e reformar a decisão regional no tocante à caracterização da rescisão indireta, restabelecendo a sentença, no particular.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros do Tribunal Pleno do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade: I – Acolher a proposta de afetação do incidente de recurso de revista, para reafirmar a jurisprudência deste Tribunal, quanto à matéria, fixando a seguinte tese obrigatória para o presente Incidente de Recursos Repetitivos: A ausência ou irregularidade no recolhimento dos depósitos de FGTS caracteriza descumprimento de obrigação contratual, nos termos do art. 483, "d", da CLT, suficiente para configurar a rescisão indireta do contrato de trabalho, sendo desnecessário o requisito da imediatidade . II – Conhecer do recurso de revista no tema objeto do representativo, por divergência jurisprudencial e, no mérito, dar-lhe provimento, aplicando a tese ora reafirmada para restabelecer a sentença, no particular. III – Determinar a redistribuição a uma das Turmas desta Corte, na forma regimental, para fins do julgamento dos temas remanescentes.

Brasília, de de

ALOYSIO CORRÊA DA VEIGA

Ministro Presidente do TST