A C Ó R D Ã O
Tribunal Pleno
GPACV/iao
REPRESENTATIVO PARA REAFIRMAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. INCIDENTE DE RECURSO REPETITIVO. TESOUREIRO. CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. CARGO DE CONFIANÇA. NÃO CONFIGURAÇÃO. Diante da manifestação de todas as Turmas do Tribunal Superior do Trabalho e da C. SBDI-1 indica-se a matéria a ter a jurisprudência reafirmada, em face da seguinte questão jurídica: Os tesoureiros de retaguarda e os tesoureiros executivos da Caixa Econômica Federal exercem cargo de confiança para os fins do art. 224, § 2º, da CLT? Para o fim de consolidar a jurisprudência pacificada no Tribunal Superior do Trabalho, deve ser acolhido o Incidente de Recurso de Revista para o fim de fixar a seguinte tese vinculante: Os empregados da Caixa Econômica Federal que exercem função de tesoureiro de retaguarda ou tesoureiro executivo desempenham atribuições técnicas que não configuram fidúcia especial apta a enquadrá-los como ocupantes de cargo de confiança bancária a que alude o art. 224, § 2º, da CLT .
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista com Agravo nº TST- RRAg - 1000803-77.2022.5.02.0433 , em que é AGRAVANTE VANESSA DA SILVA CARVALHO HOCIHARA e é AGRAVADO CAIXA ECONOMICA FEDERAL , é RECORRENTE VANESSA DA SILVA CARVALHO HOCIHARA e é RECORRIDO CAIXA ECONOMICA FEDERAL .
O presente recurso é representativo de controvérsia que, a despeito de estar pacificada nas oito turmas e na Subseção I de Dissídios Individuais do TST , ainda enseja elevada recorribilidade, em razão de resistente divergência entre os Tribunais Regionais, colocando em risco a segurança jurídica e a missão constitucional deste Tribunal Superior, enquanto Corte de Precedentes responsável pela unidade nacional do direito, nas matérias de sua competência.
A utilização da sistemática de demandas repetitivas tem por finalidade aumentar a segurança jurídica proporcionada ao jurisdicionado, pois consolida a jurisprudência e reduz, consequentemente, a litigiosidade nas Cortes superiores.
Apresentada, portanto, a presente proposta de afetação do processo RRAg - 1000803-77.2022.5.02.0433 como Incidente de Recurso Repetitivo junto a este Tribunal Pleno, a fim de examinar a possibilidade de reafirmação de jurisprudência da Corte, nos termos do art. 132-A e parágrafos, do RITST, com o fim de dirimir a seguinte questão jurídica:
Os tesoureiros de retaguarda e os tesoureiros executivos da Caixa Econômica Federal exercem cargo de confiança para os fins do art. 224, § 2º, da CLT?
No caso em exame, se trata de tema a ser reafirmado no recurso de revista da parte reclamante, em que consta a matéria acima delimitada (INCIDENTE DE RECURSO REPETITIVO. TESOUREIROS. CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. CARGO DE CONFIANÇA.)
Consta, também, agravo de instrumento interposto pela reclamante em que se busca o exame dos temas: “ANTECIPAÇÃO DE TUTELA /TUTELA ESPECÍFICA (8961)/EFEITO SUSPENSIVO A RECURSO”, “HORAS EXTRAS/INTERVALO INTRAJORNADA.”, “INTERVALO INTRAJORNADA (13772) / INTERVALO 15 MINUTOS MULHER”, “VERBAS REMUNERATÓRIAS, INDENIZATÓRIAS E BENEFÍCIOS (13831) / ADICIONAL QUEBRA DE CAIXA” e “HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS (10655) / SUSPENSÃO DA COBRANÇA – DEVEDOR BENEFICIÁRIO DE ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA”.
É o relatório.
V O T O
ADMISSIBILIDADE DE INCIDENTE DE RECURSO DE REVISTA REPETITIVO PARA REAFIRMAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO TST
A formação de precedentes obrigatórios constitui um dos principais mecanismos de gestão processual introduzidos pelo legislador nas últimas décadas. A despeito de reiterados recordes de produtividade, é essencial que seja enfrentado de forma célere, coerente e isonômica o exponencial crescimento da demanda, conforme demonstram as estatísticas do Tribunal Superior do Trabalho, que vem recebendo um volume maior de novos processos em comparação com os últimos anos. São números incompatíveis com a estruturação do Poder Judiciário, cujas cortes de vértice são funcionalmente destinadas a dirimir as novas controvérsias nacionais, sem repetição do mesmo labor já realizado nas instâncias ordinárias, sob pena de comprometimento da isonomia, segurança jurídica e razoável duração do processo (CF, art. 5º, caput e LXXVIII).
Assim é que esta Corte Superior, com inspiração na prática já tradicional no Supremo Tribunal Federal, para fins de maior celeridade na formação de precedentes obrigatórios em matérias já conhecidas e sedimentadas, adotou fluxo procedimental (cf. Emenda Regimental n. 7, de 25/11/2024 ), segundo o qual:
“Art. 132-A. A proposta de afetação do incidente de recurso repetitivo (...) será necessariamente incluída em pauta de sessão virtual e deverá conter o tema a ser afetado.
§ 2º As disposições dos arts. 133 e 134 do Regimento Interno são aplicáveis, no que couber, ao procedimento de afetação do incidente de recurso repetitivo, vedada em qualquer caso a remessa do processo inserido em sessão virtual à sessão presencial , para os fins previstos no caput deste artigo. (...)
§ 5º O julgamento de mérito do incidente de recurso repetitivo, no caso de mera reafirmação de jurisprudência dominante da Corte, também será realizado por meio do Plenário Eletrônico, na mesma sessão virtual que decide sobre a proposta de afetação.
§ 6º Quando designada sessão virtual para afetação de incidente de recursos repetitivos, com proposta de reafirmação de jurisprudência, eventuais sustentações orais quanto ao mérito deverão ser necessariamente juntadas por meio eletrônico , após a publicação da pauta e até 48 horas antes de iniciado o julgamento em ambiente virtual.”
Compete ao Presidente do Tribunal “ indicar recurso representativo da controvérsia, dentre aqueles ainda não distribuídos, submetendo-o ao Tribunal Pleno para fins de afetação de IRR (...), inclusive mediante reafirmação de jurisprudência” (RITST, art. 41, XLVII), quando houver “ multiplicidade de recursos de revista (...) fundados em idêntica questão de direito , (...) considerando a relevância da matéria ou a existência de entendimentos divergentes entre os Ministros da Subseção ou das Turmas do Tribunal ”.
Quanto à multiplicidade de recursos sobre o debate da questão jurídica no Tribunal Superior do Trabalho, a despeito de já estar aqui sedimentado, veja-se que simples consulta ao acervo jurisprudencial do TST, a partir da temática ora em exame, revelou 423 acórdãos e 451 decisões monocráticas , nos últimos 12 meses (pesquisa realizada em 12/03/2025 no sítio www.tst.jus.br).
A relevância da formação de precedente obrigatório sobre o tema se configura justamente pelo fato de que a jurisprudência persuasiva desta Corte não se mostrou, até o presente, suficiente para garantir a unidade do Direito nacional em relação a tal matéria, havendo entendimentos dissonantes nos Tribunais Regionais, os quais ainda fomentam elevada recorribilidade.
O posicionamento do Tribunal Superior do Trabalho pode ser sintetizado no sentido de que os tesoureiros de retaguarda e os tesoureiros executivos da Caixa Econômica Federal desempenham funções meramente técnicas, não detendo fidúcia especial apta a enquadrá-los como ocupantes de cargo de confiança para os fins do art. 224, § 2.º, da CLT.
Nesse sentido, a jurisprudência de todas as Turmas desta Corte Superior:
“RECURSO DE REVISTA. APELO INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI N.º 13.467/2017. CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. TESOUREIRO EXECUTIVO. HORAS EXTRAS. CARGO DE CONFIANÇA BANCÁRIO. NÃO CONFIGURAÇÃO. Em conformidade com o entendimento pacífico desta Corte, o tesoureiro da Caixa Econômica Federal desempenha funções meramente técnicas, não sendo, portanto, detentor de fidúcia especial apta a enquadrá-lo na exceção do art. 224, § 2.º, da CLT. Precedentes. Nessa senda, deve ser reformada a decisão regional, a fim de adequá-la à jurisprudência deste Tribunal Superior. Recurso de Revista conhecido e provido" (RR-10589-38.2014.5.01.0283, 1ª Turma , Relator Ministro Luiz Jose Dezena da Silva, DEJT 30/09/2024).
"AGRAVO INTERNO EM RECURSO DE REVISTA DA CEF- TESOUREIRO EXECUTIVO - DE FIDÚCIA ESPECIAL - FUNÇÃO DE CONFIANÇA NÃO CARACTERIZADA - JORNADA DE SEIS HORAS DIÁRIAS - 7ª E 8ª HORAS COMO EXTRAORDINÁRIAS. Esta Corte superior pacificou entendimento de que os empregados que atuam na função de tesoureiro executivo não exercem cargo de confiança bancário, estando, desse modo, sujeitos à jornada disposta no caput do artigo 224 da CLT, qual seja 6 horas, uma vez que as atividades desempenhadas são essencialmente técnicas, sem poderes de natureza hierárquica e sem especial fidúcia. Precedentes. Agravo interno desprovido.” (Ag-RR-20693-82.2018.5.04.0601, 2ª Turma , Relatora Desembargadora Convocada Margareth Rodrigues Costa, DEJT 15/12/2023).
CARGO DE CONFIANÇA. TESOUREIRO EXECUTIVO. É entendimento deste Tribunal Superior do Trabalho que o cargo de tesoureiro ocupado na CEF não configura cargo de confiança bancário nos termos do art. 224, § 2º, pois as funções desse profissional são meramente técnicas e não demandam um grau maior de fidúcia. Diversos julgados do TST confirmam que, apesar das atribuições complexas, o cargo de tesoureiro executivo não detém a fidúcia especial necessária para se enquadrar como cargo de confiança bancário. Portanto os empregados nessa função têm direito a cumprir jornada de seis horas e ao pagamento de horas extras além da sexta hora diária. A decisão se apresenta em conformidade com a jurisprudência notória, atual e reiterada do TST, o que torna inviável o exame das indicadas violações de dispositivo legal e/ou constitucional, bem como superada a eventual divergência jurisprudencial (Súmula 333 do TST e art. 896, § 7º, da CLT). Assim sendo, a decisão agravada foi proferida em estrita observância às normas processuais (art. 557, caput , do CPC/1973; arts. 14 e 932, IV, "a ", do CPC/2015), razão pela qual é insuscetível de reforma ou reconsideração . Agravo desprovido" (Ag-RRAg-10637-12.2019.5.03.0074, 3ª Turma , Relator Ministro Mauricio Godinho Delgado, DEJT 13/09/2024).
AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 13.467/2017 – HORAS EXTRAS – BANCÁRIO – TESOUREIRO DE RETAGUARDA E GERENTE DE ATENDIMENTO DE AGÊNCIA – CARGO DE CONFIANÇA – NÃO CARACTERIZADO As atribuições de Tesoureiro de Retaguarda revelam o exercício de função meramente técnica, desprovida da fidúcia especial a que alude o art. 224, § 2º, da CLT. Quanto à função de gerente de atendimento , o TRT fixou a premissa de execução de tarefas meramente técnicas, e o gozo do padrão de confiança inerente a qualquer empregado bancário. Incide a Súmula nº 102, I, do TST. (RRAg-10544-17.2015.5.01.0342, 4ª Turma , Relatora Ministra Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, DEJT 09/02/2024).
“RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. CEF. BANCÁRIO. TESOUREIRO EXECUTIVO/RETAGUARDA. CARGO DE CONFIANÇA NÃO CARACTERIZADO. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA RECONHECIDA. 1. No caso, o Tribunal Regional considerou que a função de tesoureiro executivo possuía fidúcia especial, para fins de enquadramento no art. 224, § 2º, da CLT. 2. Entretanto, a jurisprudência desta Corte segue no sentido de que as atribuições do tesoureiro executivo são de natureza técnica, sem fidúcia especial, na medida em que o manuseio de numerário é ínsito ao serviço bancário. Precedentes. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-11024-12.2015.5.01.0013, 5ª Turma , Relatora Ministra Morgana de Almeida Richa, DEJT 28/06/2024)
“RECURSO DE REVISTA SOB A ÉGIDE DA LEI 13.467/2017. HORAS EXTRAS. BANCÁRIO. EMPREGADO DA CEF. TESOUREIRO EXECUTIVO. CARGO DE CONFIANÇA NÃO CONFIGURADO. REQUISITOS DO ART. 896, §1º-A, DA CLT, ATENDIDOS. Extrai-se do acórdão regional que as atribuições da reclamante enquanto "tesoureiro executivo", apontadas pelo TRT como caracterizadoras de função de confiança, evidenciam, na realidade, o exercício de função meramente técnica, desprovida da fidúcia especial a que alude o art. 224, § 2º, da CLT. Ademais, a jurisprudência iterativa e notória desta Corte Superior é no sentido de que as funções desempenhadas pelo bancário exercente do cargo de tesoureiro executivo são eminentemente técnicas, sem qualquer fidúcia que justifique o enquadramento na exceção do § 2º do art. 224 da CLT. Precedentes. Assim, o acórdão regional, ao manter a sentença que julgou improcedente o pedido da 7ª e 8ª horas como extras, violou o art. 224, § 2º, da CLT. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-101186-74.2017.5.01.0242, 6ª Turma , Relator Ministro Augusto Cesar Leite de Carvalho, DEJT 01/12/2023).
“RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014 E ANTERIOR À LEI Nº 13.467/2017. HORAS EXTRAORDINÁRIAS. FUNÇÃO DE CONFIANÇA. TESOUREIRO. I . A jurisprudência desta Corte possui o entendimento de que os empregados que atuam na função de Tesoureiro Executivo ou de Retaguarda da Caixa Econômica Federal não exercem cargo de confiança bancário, estando, desse modo, sujeitos à jornada disposta no caput do artigo 224 da CLT, qual seja 6 horas. II . No caso dos autos, ao concluir que "o reclamante, exercendo as funções de "Tesoureiro de Retaguarda", tinha fidúcia na atividade desempenhada, afastando a alegação de atividade eminentemente técnica.", o Tribunal de Origem contrariou o entendimento desta Corte. III . Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento" (RRAg-10357-29.2015.5.18.0053, 7ª Turma , Relator Ministro Evandro Pereira Valadao Lopes, DEJT 30/08/2024).
“RECURSO DE REVISTA. BANCÁRIO. CARGO DE CONFIANÇA. TESOUREIRO. A jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho se posiciona no sentido de que o tesoureiro de retaguarda e o tesoureiro executivo da Caixa Econômica Federal, embora desempenhem atribuições mais complexas, não detêm a fidúcia especial prevista no art. 224, § 2º, da CLT. In casu , o acórdão regional está em desconformidade com o entendimento desta Corte Superior Trabalhista. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-1058-92.2015.5.02.0014, 8ª Turma , Relatora Ministra Dora Maria da Costa, DEJT 11/12/2024).
A C. Subseção I Especializada em Dissídios Individuais posicionou-se no mesmo sentido:
HORAS EXTRAS. BANCÁRIO. EXERCÍCIO DE CARGO DE CONFIANÇA. TESOUREIRO DE RETAGUARDA. As atribuições inerentes à função de tesoureiro de retaguarda do quadro de carreira da CEF são eminentemente técnicas, não se lhe podendo atribuir a fidúcia necessária à configuração do cargo de confiança bancário de que trata o art. 224, § 2º, da CLT. Precedentes da SBDI-1. Recurso de embargos conhecido, por divergência jurisprudencial, e provido" (E-ED-RR-1589-29.2012.5.03.0024, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Alexandre de Souza Agra Belmonte, DEJT 27/10/2017).
HORAS EXTRAS. BANCÁRIO. EXERCÍCIO DE CARGO DE CONFIANÇA. TESOUREIRO DE RETAGUARDA. As atribuições inerentes à função de tesoureiro de retaguarda do quadro de carreira da CEF são eminentemente técnicas, não se lhe podendo atribuir a fidúcia necessária à configuração do cargo de confiança bancário de que trata o art. 224, § 2º, da CLT. Precedentes da SBDI-1. Recurso de embargos conhecido, por divergência jurisprudencial, e provido" (E-ED-RR-1589-29.2012.5.03.0024, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Alexandre de Souza Agra Belmonte, DEJT 27/10/2017).
A despeito da uniformização da jurisprudência no âmbito do Tribunal Superior do Trabalho, verificou-se que ainda remanescem recentes divergências nos Tribunais Regionais quanto ao tema, conforme se infere das seguintes ementas:
“TESOUREIRO. CARGO DE CONFIANÇA. FIDÚCIA ESPECIAL. A confiança do § 2º do art. 224 da CLT diferencia-se daquela ordinariamente outorgada aos demais bancários, categoria profissional que em razão das peculiaridades já pressupõe um grau de confiança diferenciado. A fidúcia exigida para o cargo de tesoureiro se sobressai dentre as demais, por assimilar poderes de administração objetivos, ainda que tópicos, mas direcionados ao fim do empreendimento, não se equiparando à do caixa, tendo em conta que este se responsabiliza apenas pelo numerário que está em seu poder no decorrer da jornada e não tem responsabilidade pelo recolhimento, conferência, guarda e distribuição de todo o numerário da agência, bem como abastecer os caixas eletrônicos e presenciais.” (Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (07ª Turma). Acórdão: 0010896-37.2023.5.03.0148. Relator(a): Mauro Cesar Silva. Data de julgamento: 26/04/2024. Juntado aos autos em 02/05/2024. Disponível em: https://link.jt.jus.br/SdWF4g)
“HORAS EXTRAS. TESOUREIRO. CEF FUNÇÃO DE CONFIANÇA. ARTIGO 224, §2º, DA CLT. NÃO CONFIGURAÇÃO. O cargo de confiança do art. 224, §2º, da CLT, não exige amplos poderes de mando e gestão ou a existência de subordinados, como ocorre com aquele que ocupa função na forma do art. 62 do mesmo diploma legal. O cargo de confiança bancária aplica-se "(...) aos que exercem funções de direção, gerência, fiscalização, chefia e equivalentes ou que desempenhem outros cargos de confiança (...)." Exige-se a percepção de gratificação superior a 1/3 do salário do cargo efetivo e o desempenho de atribuições que extrapolem a tarefas meramente técnicas. As funções de Tesoureiro, Tesoureiro Executivo, Técnico de Operações de Retaguarda ou DE Tesoureiro de Retaguarda, conforme a denominação atribuída no Plano de Cargos e Salários da CEF, são meramente técnicas. A fidúcia depositada em tais empregados é aquela natural a qualquer relação de emprego e não ultrapassa a mesma confiança atribuída a outros cargos que lidam como numerário, como os Caixas, por exemplo. Desse modo, os empregados que ocupam tais cargos sujeitam-se à jornada comum do bancário, fazendo jus ao pagamento das sétima e oitava horas laboradas.” (Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (10ª Turma). Acórdão: 0100598-92.2016.5.01.0051. Relator(a): CELIO JUACABA CAVALCANTE. Data de julgamento: 01/12/2022. Juntado aos autos em 11/01/2023. Disponível em: https://link.jt.jus.br/YbvBPz)
Feitos tais registros, verifico que o representativo definido para alçar o tema a debate foi interposto em face de acórdão do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região que, adotando entendimento diverso deste C. Tribunal Superior do Trabalho decidiu que o exercício do cargo de tesoureiro executivo pela reclamante configura cargo de confiança para os fins do art. 224, § 2º, do CPC. Oportuna a transcrição da decisão de admissibilidade do recurso de revista, nesse tópico:
“Sustenta que deve ser afastado o cargo de confiança tendo em vista o exercício da função de Tesoureira Executiva.
Consta do v. acórdão:
"Objetiva a recorrente a descaracterização do cargo de confiança do artigo 224, § 2º da CLT, com jornada de trabalho de 08 horas, de molde a condenar a reclamada em horas extras e reflexos, consideradas como as posteriores à 6ª hora trabalhada.
Analiso. Para a configuração do empregado no desempenho do cargo de confiança bancário (art. 224, § 2º, da CLT), não haverá a necessidade premente de o detentor desta fidúcia diferenciada possuir subordinados, poder de demitir e contratar, poder disciplinar ou, por outro viés o desempenho de tarefas passíveis de colocar em risco o próprio empreendimento, na forma do caput do artigo 2º da CLT, pois no contexto atual do cotidiano empresarial, sobretudo no sistema financeiro, tais condições são inerentes ao bancário exercente da função comissionada estabelecida no artigo 62, II da CLT.
De outro flanco, também não se pretende dizer que o bancário sob a égide do artigo 224, § 2º da CLT não possa vir a ter subordinados.
Porém, em algumas situações do cotidiano do trabalho é possível o reconhecimento da função de confiança de nível intermediário mediante a destinação de especial fidúcia a qual poderá ser aferida pela verificação do desempenho de tarefas diferenciadas, as quais são detectadas ante a complexidade técnica exigida para sua realização, se comparadas com as demais atividades normais, podendo ser executadas individualmente ou, noutra hipótese com grau relativo de liderança e auxílio de subordinados, compatível com o grau superior de responsabilidade.
Além desses requisitos fáticos, a remuneração deverá contar com gratificação de função não inferior a um terço do salário do cargo efetivo, conforme entendimento majoritário fixado nas Súmulas 102, I, II e 287 do C.TST, ou na ausência desta o valor salarial superior, quando comparado aos demais funcionários da reclamada, cujo encargo probatório pertence à reclamada.
Tais situações hodiernamente estão se tornando mais comuns e frequentes, principalmente dada a dinâmica da evolução tecnológica, possibilitando-se a multiplicidade de atribuições a serem desempenhadas pelo empregado conforme a necessidade de seu campo de atuação.
Na seara do processo do trabalho a distribuição do ônus da prova, o exercício de função de confiança pertence ao empregador, nos termos do artigo 373, II do CPC c.c. artigo 818 da CLT.
No caso em exame não há controvérsia quanto ao recebimento de gratificação de função.
Com relação às atividades desempenhadas, a própria reclamante em seu depoimento pessoal, a qual está consignada na fundamentação da sentença de mérito, assim se expressou:
"Quanto ao cargo de confiança, além da reclamante receber gratificação de função, o que é fato incontroverso, a tese da exordial beira ao absurdo.
A reclamante reconhece que tratava com numerário e malote de carro forte (quesito 17), que tem senha de retardo do cofre (quesito 21), senha de acesso para a chave do cofre (quesito 29), bem como senha e contrassenha para recebimento de malote de carro forte (quesito 31), funções obviamente de maior responsabilidade que as de um bancário comum." (id 73df88c)
Nas normas internas da reclamada, esta função é descrita nos seguintes termos:
"6.1.57 TESOUREIRO EXECUTIVO
6.1.57.1 Descrição da função gratificada
Sumário:
Responsável pela coordenação e execução das atividades de retaguarda e tesouraria da Agência, a fim de garantir a conformidade das operações observando os padrões, normas e prazos estabelecidos, contribuindo para a excelência do atendimento aos clientes e alcance dos resultados sustentáveis.
Principais atribuições:
Administrar caixa-forte/casa-forte e cofre-forte, efetuando a guarda das chaves e dos segredos das ATM/CD/DFC do cofre eletrônico e automático e das respectivas cópias;
Movimentar e controlar numerário, títulos e valores, efetuando o suprimento dos caixas convencionais, do autoatendimento da agência e do cofre-eletrônico;
Conferir autenticidade de documentos, assinaturas e impressões digitais;
Zelar pela conformidade das operações sob sua responsabilidade, mantendo a qualidade dos serviços executados e apontando as inconformidades das operações verificadas;
Efetuar a compensação de documentos, repasse e conciliação contábil;
Coordenar tecnicamente equipe de trabalho." (id 32185ba)
Infere-se, portanto, que a reclamante na função de Tesoureira Executiva, durante o período imprescrito, está inserida no artigo 224, § 2º da CLT, com jornada de trabalho de 08 horas.
Nego provimento. Prejudicada a análise do pedido de desconsideração da compensação dos valores percebidos por Gratificação de Função com a 7ª e 8ª horas, nos termos do Acordo Coletivo de Trabalho 2018 (cláusula 11ª)."
O Tribunal Superior do Trabalho firmou o entendimento de que as atribuições do bancário que exerce o cargo de tesoureiro executivo da Caixa Econômica Federal são meramente técnicas, não configurando função de confiança, nos moldes do art. 224, § 2º, da CLT.
Nesse sentido: E-ED-RR-16-79.2016.5.10.0004, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relatora Ministra Maria Helena Mallmann, DEJT 24/05/2024; RR-10589-38.2014.5.01.0283, 1ª Turma, Relator Ministro Luiz José Dezena da Silva, DEJT 30/09/2024; Ag-RR-102358-77.2017.5.01.0201, 2ª Turma, Relatora Ministra Liana Chaib, DEJT 16/08/2024; RR-12232-82.2017.5.15.0009, 3ª Turma, Relator Ministro Alberto Bastos Balazeiro, DEJT 21/06/2024; RR-101234-50.2018.5.01.0031, 4ª Turma, Relatora Ministra Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, DEJT 09/02/2024; RR-193-91.2020.5.05.0311, 5ª Turma, Relator Ministro Breno Medeiros, DEJT 14/06/2024; RR-1179-56.2018.5.09.0003, 6ª Turma, Relator Ministro Augusto César Leite de Carvalho, DEJT 09/08/2024; RRAg-10357-29.2015.5.18.0053, 7ª Turma, Relator Ministro Evandro Pereira Valadão Lopes, DEJT 30/08/2024; RR-0101369-95.2017.5.01.0581, 8ª Turma, Relator Ministro Sérgio Pinto Martins, DEJT 21/10/2024.
Pelo exposto, aconselhável o seguimento do apelo, para prevenir possível violação ao art. 224, § 2º da CLT.
RECEBO o recurso de revista.”
Nesse sentido, demonstrado que a jurisprudência pacífica desta Corte encontra resistência nas instâncias ordinárias, forçoso admitir a necessidade de uniformizar a matéria, por meio do presente Incidente de Recurso de Revista, para reafirmação da jurisprudência, nos termos do § 5º do art. 132-A do Regimento Interno do TST:
“Art. 132-A. A proposta de afetação do incidente de recurso repetitivo (...) será necessariamente incluída em pauta de sessão virtual e deverá conter o tema a ser afetado.
§ 5º O julgamento de mérito do incidente de recurso repetitivo, no caso de mera reafirmação de jurisprudência dominante da Corte, também será realizado por meio do Plenário Eletrônico, na mesma sessão virtual que decide sobre a proposta de afetação.”
A atuação qualificada e célere do Tribunal Superior do Trabalho sob o rito dos recursos repetitivos converge para sua finalidade precípua como Corte de precedentes – ainda com mais razão nestes casos em que já produziu jurisprudência pacificada sobre a matéria, bastando que haja sua reafirmação sob rito destinado à conversão em precedente obrigatório, de modo a evitar a divergência de julgamentos nas instâncias ordinárias.
Como já mencionado, a posição consolidada do Tribunal Superior do Trabalho é no sentido de que os tesoureiros de retaguarda e os tesoureiros executivos da Caixa Econômica Federal desempenham funções meramente técnicas, não detendo fidúcia especial apta a enquadrá-los como ocupantes de cargo de confiança para os fins do art. 224, § 2.º, da CLT.
O art. 224, caput e § 2º, da CLT dispõe sobre o exercício do cargo de confiança bancário nos seguintes termos:
Art. 224 - A duração normal do trabalho dos empregados em bancos, casas bancárias e Caixa Econômica Federal será de 6 (seis) horas continuas nos dias úteis, com exceção dos sábados, perfazendo um total de 30 (trinta) horas de trabalho por semana.
§ 2º As disposições deste artigo não se aplicam aos que exercem funções de direção, gerência, fiscalização, chefia e equivalentes ou que desempenhem outros cargos de confiança desde que o valor da gratificação não seja inferior a um têrço do salário do cargo efetivo.
No julgamento de reiterados casos em face da mesma reclamada nestes autos, esta Corte Superior vem decidindo uniformemente no sentido de que o exercício do cargo de tesoureiro não configura cargo de confiança para os fins do art. 224, § 2º, da CLT, uma vez que têm atribuições puramente técnicas, sem a fidúcia especial necessária à incidência da norma.
No caso em exame, o recurso de revista de que trata o tema afetado para representativo de controvérsia merece ser conhecido, por violação do art. 224, § 2º, da CLT, já que a parte logrou demonstrar que o Tribunal Regional, ao considerar que o exercício da função de tesoureira pela reclamante configurou cargo de confiança, decidiu em desacordos com a jurisprudência desta Corte.
Assim, do julgamento do caso concreto afetado, extrai-se a reafirmação da mesma ratio decidendi antes firmada no julgamento da SBDI-1 transcrito acima, cuja tese pode ser fixada nos seguintes termos:
Os empregados da Caixa Econômica Federal que exercem função de tesoureiro de retaguarda ou tesoureiro executivo desempenham atribuições técnicas que não configuram fidúcia especial apta a enquadrá-los como ocupantes de cargo de confiança bancária a que alude o art. 224, § 2º, da CLT.
No mérito, quanto ao recurso de revista interposto pela parte reclamante, no tema ora afetado, dou-lhe provimento para julgar procedente o pedido e condenar a reclamada ao pagamento da 7ª e 8ª horas efetivamente trabalhadas como extras e respectivos reflexos, conforme se apurar em liquidação de sentença.
Quanto aos demais temas recursais listados no relatório, determina-se a redistribuição a uma das Turmas desta Corte, na forma regimental.
ISTO POSTO
ACORDAM os Ministros do Tribunal Pleno do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade: I – Acolher a proposta de afetação do incidente de recurso de revista, para reafirmar a jurisprudência deste Tribunal, quanto à matéria, fixando a seguinte tese obrigatória para o presente Incidente de Recursos Repetitivos: Os empregados da Caixa Econômica Federal que exercem função de tesoureiro de retaguarda ou tesoureiro executivo desempenham atribuições técnicas que não configuram fidúcia especial apta a enquadrá-los como ocupantes de cargo de confiança bancária a que alude o art. 224, § 2º, da CLT . II – Conhecer do recurso de revista no tema objeto do representativo, por violação do art. 224, § 2º, da CLT e, no mérito, dar-lhe provimento, aplicando a tese ora reafirmada para julgar procedente o pedido e condenar a reclamada ao pagamento da 7ª e 8ª horas efetivamente trabalhadas como extras e respectivos reflexos, conforme se apurar em liquidação de sentença. Observe-se a prescrição parcial declarada na sentença. Juros e correção monetária conforme critérios que serão fixados na fase de liquidação. Contribuições previdenciárias e fiscais na forma da Súmula 368 do TST e demais disposições legais aplicáveis. Honorários advocatícios no percentual de 10% sobre o valor da condenação apurado na liquidação. Custas pela reclamada no valor de R$1.000,00, calculadas sobre R$50.000,00, valor provisoriamente arbitrado à condenação. III – Determinar a redistribuição a uma das Turmas desta Corte, na forma regimental, para fins do julgamento dos temas remanescentes.
Brasília, de de
ALOYSIO SILVA CORRÊA DA VEIGA
Ministro Presidente do TST