A C Ó R D Ã O

Tribunal Pleno

GPACV/vc/sp

REPRESENTATIVO PARA REAFIRMAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. INCIDENTE DE RECURSO DE REVISTA REPETITIVO . CARTEIRO (AGENTE POSTAL). ROUBO. DANO MORAL. ATIVIDADE DE RISCO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO EMPREGADOR. ART. 927, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO . Diante da manifestação de todas as Turmas e da Subseção I da Seção Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho, indica-se a matéria a ter a jurisprudência reafirmada, em face da seguinte questão jurídica: Deve ser reconhecida a responsabilidade civil objetiva do empregador pela reparação do dano causado ao empregado, na hipótese em que o carteiro (agente postal) é vítima de roubo no desempenho da atividade de entrega de correspondências e encomendas? Para o fim de consolidar a jurisprudência pacificada no C. Tribunal Superior do Trabalho e, caso acolhida a proposta de instauração do Incidente de Recurso de Revista Repetitivo, propõe-se a seguinte tese vinculante: Em caso de roubo sofrido por carteiro (agente postal) durante o trabalho, é objetiva a responsabilidade civil do empregador pela reparação do dano moral, uma vez que a atividade de entrega de correspondências e mercadorias envolve risco diferenciado em relação aos trabalhadores em geral.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista nº TST- RR - 1000403-39.2023.5.02.0462 , em que é RECORRENTE ELTON VIEIRA DE FREITAS e é RECORRIDA EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS .

O presente recurso é representativo da controvérsia que, a despeito de estar pacificada nas oito Turmas e na Subseção I da Seção Especializada em Dissídios Individuais (SbDI-1) do Tribunal Superior do Trabalho, ainda enseja elevada recorribilidade, em razão de resistente divergência entre os Tribunais Regionais do Trabalho, colocando em risco a segurança jurídica e a missão constitucional deste Tribunal Superior, enquanto Corte de Precedentes responsável pela unidade nacional do direito, nas matérias de sua competência.

A utilização da sistemática de demandas repetitivas tem por finalidade aumentar a segurança jurídica proporcionada ao jurisdicionado, pois consolida a jurisprudência e reduz, consequentemente, a litigiosidade nas Cortes superiores.

Apresentada, portanto, a proposta de afetação do recurso TST- RR- 1000403-39.2023.5.02.0462 ao rito do Recurso Repetitivo junto a este Tribunal Pleno, a fim de examinar a possibilidade de reafirmação de jurisprudência da Corte, nos termos do art. 132-A e parágrafos, do RITST, com o fim de dirimir a seguinte questão jurídica:

Deve ser reconhecida a responsabilidade civil objetiva do empregador pela reparação do dano causado ao empregado, na hipótese em que o carteiro (agente postal) é vítima de roubo no desempenho da atividade de entrega de correspondências e encomendas?

É o relatório.

V O T O

ADMISSIBILIDADE DE INCIDENTE DE RECURSO DE REVISTA REPETITIVO PARA REAFIRMAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO TST

A formação de precedentes obrigatórios constitui um dos principais mecanismos de gestão processual introduzidos pelo legislador nas últimas décadas. É essencial para que seja enfrentado de forma célere, coerente e isonômica o exponencial crescimento da demanda – que saltou de 430.850 processos recebidos em 2023, para 530.021 processos em 2024, a despeito de reiterados recordes de produtividade. São números incompatíveis com a estruturação do Poder Judiciário, cujas cortes de vértice são funcionalmente destinadas a dirimir as novas controvérsias nacionais, sem repetição do mesmo labor já realizado nas instâncias ordinárias, sob pena de comprometimento da isonomia, segurança jurídica e razoável duração do processo (CF, art. 5º, caput e LXXVIII).

Assim é que esta Corte Superior, com inspiração na prática já tradicional no Supremo Tribunal Federal, para fins de maior celeridade na formação de precedentes obrigatórios em matérias já conhecidas e sedimentadas, adotou fluxo procedimental (cf. Emenda Regimental n. 7, de 25/11/2024), segundo o qual:

“Art. 132-A. A proposta de afetação do incidente de recurso repetitivo (...) será necessariamente incluída em pauta de sessão virtual e deverá conter o tema a ser afetado.

[...]

§ 2º As disposições dos arts. 133 e 134 do Regimento Interno são aplicáveis, no que couber, ao procedimento de afetação do incidente de recurso repetitivo, vedada em qualquer caso a remessa do processo inserido em sessão virtual à sessão presencial , para os fins previstos no caput deste artigo. (...)

[...]

§ 5º O julgamento de mérito do incidente de recurso repetitivo, no caso de mera reafirmação de jurisprudência dominante da Corte, também será realizado por meio do Plenário Eletrônico, na mesma sessão virtual que decide sobre a proposta de afetação.

§ 6º Quando designada sessão virtual para afetação de incidente de recursos repetitivos, com proposta de reafirmação de jurisprudência, eventuais sustentações orais quanto ao mérito deverão ser necessariamente juntadas por meio eletrônico , após a publicação da pauta e até 48 horas antes de iniciado o julgamento em ambiente virtual.”

Compete ao Presidente do Tribunal “indicar recurso representativo da controvérsia, dentre aqueles ainda não distribuídos, submetendo-o ao Tribunal Pleno para fins de afetação de IRR (...), inclusive mediante reafirmação de jurisprudência” (RITST, art. 41, XLVII), quando houver multiplicidade de recursos de revista (...) fundados em idêntica questão de direit o, (...) considerando a relevância da matéria ou a existência de entendimentos divergentes entre os Ministros da Subseção ou das Turmas do Tribunal”.

Quanto à multiplicidade do debate sobre tal questão no Tribunal Superior do Trabalho, a despeito de já estar aqui sedimentada, veja-se que simples consulta ao acervo jurisprudencial do TST a partir dos termos “carteiro” e “assalto” e “responsabilidade” revelou, para os últimos 12 meses, 118 acórdãos e 211 decisões monocráticas sobre o tema jurídico em exame.

No tocante à relevância da formação de precedente obrigatório sobre o tema, se configura justamente pelo fato de que a jurisprudência persuasiva desta Corte não se mostrou, até o presente, suficiente para garantir a unidade do Direito nacional em relação a tal matéria, havendo entendimentos dissonantes nos Tribunais Regionais, os quais ainda fomentam elevada recorribilidade.

O posicionamento do Tribunal Superior do Trabalho sobre o tema pode ser sintetizado no sentido de que a atividade de carteiro (agente postal), por envolver a entrega de correspondências e objetos de valor, expõe o trabalhador a riscos superiores àqueles aos quais estão submetidos os trabalhadores comuns, de sorte que, em caso de assalto sofrido pelo empregado durante o trabalho, a responsabilidade do empregador é objetiva.

Elencam-se os seguintes exemplos de todas as suas Turmas e da SbDI-1:

"AGRAVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI N.º 13.467/2017. ECT. CARTEIRO. ENTREGA DE CORRESPONDÊNCIAS E MERCADORIAS. ASSALTOS. ATIVIDADE DE RISCO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. INDENIZAÇÃO POR DANO EXTRAPATRIMONIAL. TRANSCENDÊNCIA NÃO RECONHECIDA. 1. Confirma-se a decisão agravada que negou seguimento ao agravo de instrumento interposto pela ré. 2. Na hipótese, o Tribunal Regional do Trabalho consignou que “ constitui fato notório que a atividade exercida pelo demandante - de agente postal -, consistente na entrega de mercadorias e valores, é caracterizada como de risco, o que traz, para o empregador, a possibilidade de ser responsabilizado objetivamente caso ocorra um evento daninho como os já apontados ”. Pontuou que “ restou incontroverso, além de ter sido demonstrado, que o trabalhador foi vítima de diversos assaltos no exercício de sua função ”. Concluiu, num tal contexto, que “ nessa hipótese, a prova do dano moral é in re ipsa, ou seja, há presunção de ocorrência do abalo psicológico sofrido pela vítima a partir da prova do fato descrito, praticado pelo agente. A presunção decorre da percepção do sentimento médio do ser humano”. 3. A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que a função de carteiro (agente postal), envolvendo a entrega de correspondências e objetos de valor, expõe o trabalhador a riscos superiores àqueles aos quais estão submetidos os trabalhadores comuns, o que, no caso de assaltos, implica responsabilidade civil objetiva do empregador prevista no art. 927, parágrafo único, do Código Civil. Incidência do art. 896, § 7º, da CLT e da Súmula n.º 333 do TST. Agravo a que se nega provimento . [...]" (Ag-AIRR-100829-25.2021.5.01.0058, 1ª Turma , Relator Ministro Amaury Rodrigues Pinto Junior, DEJT 12/04/2024). (Destaquei)

"AGRAVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. CARTEIRO VÍTIMA DE ASSALTOS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. Cuida-se, na hipótese, de pedido indenizatório em decorrência de assaltos sofridos pelo reclamante enquanto exercia a sua função de carteiro. Nos termos da jurisprudência do TST, em se tratando de carteiro vítima de assaltos, a responsabilidade da empregadora é objetiva, nos termos do art. 927, parágrafo único, do CC. Precedentes. Incidência da Súmula 333/TST. Agravo não provido. [...] " (Ag-AIRR-1000915-75.2019.5.02.0231, 2ª Turma , Relatora Ministra Maria Helena Mallmann, DEJT 01/03/2024). (Destaquei)

"AGRAVO. RECURSO DE REVISTA. PROCESSO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.015/2014. RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.467/2017. 1. CARTEIRO. DANOS MORAIS. ASSALTOS SOFRIDOS DURANTE O TRABALHO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR. ATIVIDADE DE RISCO (ART. 927, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CÓDIGO CIVIL DE 2002). 2. VALOR ARBITRADO À INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. A indenização por danos morais é devida quando presentes os requisitos essenciais para a responsabilização empresarial. É necessária, de maneira geral, a configuração da culpa do empregador ou de suas chefias pelo ato ou situação que provocou o dano ao empregado. É que a responsabilidade civil de particulares, no Direito Brasileiro, ainda se funda, predominantemente, no critério da culpa (negligência, imprudência ou imperícia), nos moldes do art. 186 do CCB, que dispõe: " Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito". Contudo, por exceção, o art. 927 do CCB, em seu parágrafo único, trata da responsabilidade objetiva independentemente de culpa - "quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem". Nessa hipótese excepcional, a regra objetivadora do Código Civil também se aplica ao Direito do Trabalho, uma vez que a Constituição da República manifestamente adota, no mesmo cenário normativo, o princípio da norma mais favorável (art. 7º, caput : "... além de outros que visem à melhoria de sua condição social "), permitindo a incidência de regras infraconstitucionais que aperfeiçoem a condição social dos trabalhadores. A jurisprudência do TST é nesse sentido e considera objetiva a responsabilidade por dano moral resultante do evento "assalto" e seus consectários, relativamente a empregados que exerçam atividade de alto risco, tais como bancários, motoristas de carga, motoristas de transporte coletivo e outros (art. 927, parágrafo único, CCB). Enquadrando-se a situação dos autos nessa hipótese extensiva de responsabilização - o Autor trabalhava com entrega de mercadorias como Agente dos Correios -, conforme reiteradamente tem compreendido a jurisprudência desta Corte (julgados citados), deve ser reconhecida a responsabilização da Reclamada pelo pagamento de indenização por danos morais, em conformidade com os arts. 1º, III, 5º, V e X, da CF; e 927, parágrafo único, do Código Civil. Julgados desta Corte. Assim sendo, a decisão agravada foi proferida em estrita observância às normas processuais (art. 557, caput , do CPC/1973; arts. 14 e 932, III e IV, "a ", do CPC/2015), razão pela qual é insuscetível de reforma ou reconsideração. Agravo desprovido" (Ag-ED-RR-100472-07.2019.5.01.0061, 3ª Turma , Relator Ministro Mauricio Godinho Delgado, DEJT 26/08/2022). (Destaquei)

"RECURSO DE REVISTA DO AUTOR – INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 13.467/2017 - EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS – ECT - RESPONSABILIDADE CIVIL – DANOS MORAIS – CARTEIRO – ASSALTOS SOFRIDOS NO EXERCÍCIO DAS ATIVIDADES PROFISSIONAIS – RESPONSABILIDADE OBJETIVA – TEMA Nº 932 DE REPERCUSSÃO GERAL - TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA RECONHECIDA A comprovada ocorrência de assaltos no desempenho das atividades revela que os carteiros (frequentemente portadores de mercadorias de elevado valor) se expõem a maior risco que outros trabalhadores. A jurisprudência desta Corte consolidou-se no sentido de que às questões de responsabilidade civil que envolvam tais profissionais, aplica-se a teoria da responsabilidade objetiva da empregadora, extraída do parágrafo único, do artigo 927, do, Código Civil. Vale frisar que o Supremo Tribunal Federal, ao julgar o Recurso Extraordinário nº STF-RE-828040/DF, no qual foi reconhecida repercussão geral (Tema nº 932), decidiu pela compatibilidade do artigo 927, parágrafo único, do Código Civil com o disposto no artigo 7º, XXVIII, da Constituição da República. Julgados. Recurso de Revista conhecido e provido" (RR-1000407-64.2023.5.02.0466, 4ª Turma , Relatora Ministra Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, DEJT 14/02/2025). (Destaquei)

"AGRAVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. ECT. CARTEIRO MOTORIZADO. ASSALTO EM VIA PÚBLICA. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. DECISÃO EM CONFORMIDADE COM A ITERATIVA JURISPRUDÊNCIA DO TST. AUSÊNCIA DE TRANSCENDÊNCIA. Esta Corte tem firme jurisprudência no sentido de que a atividade de carteiro motorizado, desenvolvida na rua, envolve a entrega de correspondências e encomendas, muitas vezes, de alto valor, o que expõe o trabalhador a riscos notadamente superiores àqueles aos quais estão submetidos os trabalhadores comuns, o que, no caso de assalto, atrai ao empregador a incidência da responsabilidade objetiva prevista no art. 927, parágrafo único, do Código Civil . Precedentes de todas as Turmas do TST. Estando a decisão regional em consonância este entendimento, incidem a Súmula nº 333 desta Corte e o art. 896, 7º, da CLT, como óbices ao processamento da revista. A existência de obstáculo processual apto a inviabilizar o exame da matéria de fundo veiculada, como no caso , acaba por evidenciar, em última análise, a própria ausência de transcendência do recurso de revista, em qualquer das suas modalidades. Agravo não provido " (Ag-AIRR-684-36.2020.5.23.0008, 5ª Turma , Relator Ministro Breno Medeiros, DEJT 17/03/2023). (Destaquei)

"RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA EFICÁCIA DA LEI 13.467/2017. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO EMPREGADOR. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. DANO IN RE IPSA . CARTEIRO. ASSALTOS. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA. REQUISITOS DO ARTIGO 896, § 1º-A, DA CLT, ATENDIDOS. O Regional excluiu a indenização deferida na sentença, por considerar inaplicável a responsabilidade objetiva do empregador, sob o argumento de que a reclamada não exerce atividade passível de gerar prejuízo e/ou dano aos indivíduos e à coletividade, pois teria como atividade principal a exploração de serviços postais e telegráficos. Ainda, entendeu que não houve demonstração pelo reclamante de dano, transtorno ou repercussão em seu íntimo, ocasionados pelo infortúnio, tampouco a ocorrência de sequelas psicológicas traumáticas ou constrangimento de tal ordem capaz de gerar um prejuízo moral ressarcível. Percebe-se que a decisão recorrida contraria entendimento desta Corte, circunstância apta a demonstrar o indicador de transcendência política, nos termos do art. 896-A, § 1º, II, da CLT. Com efeito, esta Corte que reconhece ser objetiva a reponsabilidade do empregador, em caso de empregado que labore como carteiro e sofra assaltos realizando a entrega de mercadorias, sendo devida, portanto, a indenização por dano moral. Ademais, a condenação prescinde de prova do efetivo dano experimentado pelo empregado, bastando a demonstração da conduta ilícita praticada pelo empregador, o que efetivamente ocorreu no caso concreto. Há precedentes. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-1000766-89.2021.5.02.0302, 6ª Turma , Relator Ministro Augusto Cesar Leite de Carvalho, DEJT 26/11/2024). (Destaquei)

"AGRAVO INTERNO. RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. CARTEIRO. ASSALTO. RISCO DA ATIVIDADE. TRANSCENDÊNCIA JÁ RECONHECIDA NA DECISÃO MONOCRÁTICA. I. Não merece reparos a decisão unipessoal em que provido o recurso de revista da parte reclamante para condenar a parte reclamada ao pagamento de indenização por dano moral, uma vez que a jurisprudência pacificada desta Corte Superior é no sentido de que o empregador, em razão do risco da atividade, deve responder objetivamente pelo dano moral suportado pelo empregado que, na função de carteiro, é vítima de assaltos no desempenho do labor de entrega de encomendas nas vias públicas . II. Agravo interno de que se conhece e a que se nega provimento" (Ag-RR-100114-38.2021.5.01.0072, 7ª Turma , Relator Ministro Evandro Pereira Valadão Lopes, DEJT 26/04/2024). (Destaquei)

"AGRAVO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA - REGÊNCIA PELA LEI Nº 13.467/2017 - DANO MORAL. ECT. CARTEIRO MOTORIZADO. ASSALTO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. SÚMULA 333 DO TST. TRANSCENDÊNCIA NÃO RECONHECIDA. A jurisprudência desta Corte é no sentido de que, nas hipóteses em que a atividade do trabalhador envolve riscos que vão além do ordinário, como no caso, a responsabilidade pelo dano decorrente de assalto a empregado que exerce função de carteiro é objetiva, ressalvado entendimento pessoal . Firmou-se, ademais, o entendimento no sentido de que, para responsabilização do empregador, não é necessária a demonstração do resultado lesivo, na medida em que o dano caracteriza-se in re ipsa . Agravo a que se nega provimento. [...]" (Ag-AIRR-100497-22.2021.5.01.0070, 8ª Turma , Relator Ministro Sergio Pinto Martins, DEJT 01/12/2023). (Destaquei)

"I - AGRAVO INTERNO EM EMBARGOS. DANOS MORAIS. CARTEIRO. ENTREGA DE MERCADORIAS. VIAS PÚBLICAS. DEZ ASSALTOS. USO DE VIOLÊNCIA E DE ARMA DE FOGO. ATIVIDADE DE RISCO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. DIVERGÊNCIA SUPERADA POR ITERATIVA, NOTÓRIA E ATUAL JURISPRUDÊNCIA DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO. A ocorrência de assaltos, mormente os violentos, evidencia a exposição do carteiro que porta mercadorias ou valores expressivos a maior risco que outros trabalhadores, razão pela qual esta Corte tem firme jurisprudência no sentido de que se aplica a responsabilidade civil objetiva da empregadora prevista no art. 927, parágrafo único, do Código Civil, afastando a ocorrência de fato de terceiro excludente de responsabilidade. Incidência do art. 894, § 2º, da CLT. Agravo interno a que nega provimento. [...]" (Ag-E-RR-11281-11.2015.5.01.0054, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais , Relator Ministro Marcio Eurico Vitral Amaro, DEJT 28/09/2018).

No entanto, após levantamento, verificou-se que há divergência nos Tribunais Regionais do Trabalho quanto tema, conforme se transcreve:

“DA INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. CARTEIRO. VÍTIMA DE ASSALTO. ATIVIDADE DE RISCO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO EMPREGADOR CARACTERIZADA. Em face do seu labor, o reclamante, carteiro responsável pela entrega de mercadorias de valor, sofreu assalto à mão armada, e, em razão de tais ocorrências, teve que se afastar de suas atividades. Nessa ordem, o exercício da função de carteiro, que envolve o transporte de mercadorias de valor, que o expõe a risco de roubos, atrai a incidência da responsabilidade objetiva, nos termos do parágrafo único do artigo 927 do Código Civil, devendo o empregador reparar o dano, ainda que não tenha culpa na ocorrência do infortúnio no trabalho, dado o risco profissional assumido. Recurso ordinário do Autor a que se dá provimento.” ( Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (1ª Turma). Acórdão: 0100731-22.2023.5.01.0203. Relator(a): JOSÉ NASCIMENTO ARAUJO NETTO. Data de julgamento: 20/02/2024. Juntado aos autos em 21/02/2024. Disponível em: https://link.jt.jus.br/lxzO4S) (Destaquei)

“DANOS MORAIS. INDENIZAÇÃO. CARTEIRO. ASSALTOS NA VIA PÚBLICA. Em que pese constitua dever do empregador, adotar medidas de saúde e segurança, com vistas a zelar pela saúde e segurança dos seus empregados (art. 157, I e II, da CLT e art. 7º, XXII, da CF), não há como lhe imputar culpa pela ocorrência de assaltos na via pública, pois, a segurança pública é dever do Estado. Não se pode exigir que a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos evite assaltos a empregados nas vias públicas, uma vez que nem mesmo o próprio Estado consegue fazê-lo. Tampouco se pode falar em responsabilidade objetiva do empregador, pois a atividade de entrega de correspondência não é inerentemente perigosa .” ( Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (11ª Turma). Acórdão: 1000536-53.2023.5.02.0342. Relator(a): FLAVIO VILLANI MACEDO. Data de julgamento: 19/02/2024. Juntado aos autos em 26/02/2024. Disponível em: https://link.jt.jus.br/GWh6xx) (Destaquei)

Como se percebe, enquanto a 1ª Turma do TRT da 1ª Região reconheceu a responsabilidade objetiva do empregador, em caso de assalto sofrido por carteiro no desempenho das suas atividades, a 11ª Turma do TRT da 2ª Região , em situação análoga, proferiu decisão diametralmente oposta.

Por outro lado, o representativo definido para alçar o tema a debate, que cumpre os requisitos para ensejar o exame de mérito do tema, também evidencia dissenso em relação à posição do TST .

No caso , o TRT da 2ª Região deu provimento ao recurso ordinário da Reclamada, “para excluir a indenização por danos morais arbitrada pela origem e, por conseguinte, julgar improcedente a ação” por considerar que não se aplica a responsabilidade objetiva bem como porque concluiu que “não houve culpa da reclamada na violência oriunda dos assaltos sofridos pelo reclamante”.

Por sua vez, o recurso de revista interposto pelo reclamante foi admitido por violação do art. 927, parágrafo único, do Código Civil.

Dessa forma, demonstrado que a jurisprudência pacífica desta Corte encontra resistência nas instâncias ordinárias, forçoso reconhecer a necessidade de uniformizar a matéria, por meio do presente Incidente de Recurso de Revista, para reafirmação da jurisprudência do c. TST.

Nos termos do § 5º do art. 132-A do Regimento Interno, procede-se à reafirmação da jurisprudência desta c. Corte:

Art. 132-A. A proposta de afetação do incidente de recurso repetitivo (...) será necessariamente incluída em pauta de sessão virtual e deverá conter o tema a ser afetado.

§ 5º O julgamento de mérito do incidente de recurso repetitivo, no caso de mera reafirmação de jurisprudência dominante da Corte, também será realizado por meio do Plenário Eletrônico, na mesma sessão virtual que decide sobre a proposta de afetação.

A atuação qualificada e célere do Tribunal Superior do Trabalho sob o rito dos recursos repetitivos converge para sua finalidade precípua como Corte de precedentes – ainda com mais razão nestes casos em que já produziu jurisprudência pacificada sobre a matéria, bastando que haja sua reafirmação sob rito destinado à conversão em precedente obrigatório, de modo a evitar a divergência de julgamentos nas instâncias ordinárias.

Como já mencionado, a posição consolidada do Tribunal Superior do Trabalho é no sentido de que a atividade de carteiro (agente postal), por envolver a entrega de correspondências e objetos de valor, expõe o trabalhador a riscos superiores àqueles aos quais estão submetidos os trabalhadores comuns, de sorte que, em caso de roubo sofrido pelo empregado durante o trabalho, a responsabilidade do empregador é objetiva, conforme precedentes de todas as suas Turmas, assim como da SBDI-1, já transcritos acima.

Com efeito, a jurisprudência entende que o roubo, a despeito de se identificar como ato de terceiro, em se tratando de fato corriqueiro e previsível, cujo dano poderia ter sido evitado pelo empregador, enseja a responsabilidade objetiva e o dever indenizar.

Nesse sentido, tem-se por presumida a culpa do empregador, na medida em que a lesão, na hipótese, tem como fonte o próprio trabalho exercido pelo empregado, o que determina a reparação, a teor do que dispõe o artigo 927, parágrafo único, do Código Civil.

Registra-se, ademais, que a teoria do risco profissional considera que o dever de indenizar advém da própria atividade profissional, e nela estão inseridas as atividades desenvolvidas pelo empregado que se constituem em risco acentuado ou excepcional por sua própria natureza, como no caso do trabalho com entregas de mercadorias pelo carteiro.

Assim, do julgamento do julgamento do caso concreto afetado, extrai-se a necessidade de reafirmação da mesma ratio decidendi antes firmada nos julgamentos da SBDI-1 e de todas as Turmas do TST transcritos acima, cuja tese pode ser fixada nos seguintes termos:

Em caso de roubo sofrido por carteiro (agente postal) durante o trabalho, é objetiva a responsabilidade civil do empregador pela reparação do dano moral, uma vez que a atividade de entrega de correspondências e mercadorias envolve risco diferenciado em relação aos trabalhadores em geral.

Quanto ao recurso de revista , no tópico afetado, dele conheço por violação do artigo 927, parágrafo único, do Código Civil .

No mérito, dou-lhe provimento para aplicar a tese ora reafirmada e restabelecer a sentença que condenou a Reclamada ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais).

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros do Tribunal Pleno, por unanimidade: I – Acolher a proposta de instauração do Incidente de Recurso de Revista Repetitivo, para reafirmar a jurisprudência deste Tribunal, quanto à matéria, fixando-se a seguinte tese obrigatória: Em caso de roubo sofrido por carteiro (agente postal) durante o trabalho, é objetiva a responsabilidade civil do empregador pela reparação do dano moral, uma vez que a atividade de entrega de correspondências e mercadorias envolve risco diferenciado em relação aos trabalhadores em geral. II – Conhecer do recurso de revista, por violação do artigo 927, parágrafo único, do Código Civil, e, no mérito, dar-lhe provimento quanto ao capítulo afetado, aplicando a tese ora reafirmada para restabelecer a sentença que condenou a Reclamada ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais). III – Determinar a redistribuição do processo a uma das Turmas desta Corte, na forma regimental, para fins do julgamento de temas remanescentes.

Brasília, de de

ALOYSIO SILVA CORRÊA DA VEIGA

Ministro Presidente do TST