A C Ó R D Ã O

(3ª Turma)

GMABB/jc/rt

RECURSO DE REVISTA. LEIS NºS 13.015/2014 E 13.467/2017 .

JUSTIÇA GRATUITA. REQUISITOS. DECLARAÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. SÚMULA 463 DO TST. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA RECONHECIDA. 1. A Súmula 463, item I, do TST, preconiza que "A partir de 26.06.2017, para a concessão da assistência judiciária gratuita à pessoa natural, basta a declaração de hipossuficiência econômica firmada pela parte ou por seu advogado, desde que munido de procuração com poderes específicos para esse fim (art. 105 do CPC de 2015)". Nesses termos, a mera declaração da parte de que não possui condições de arcar com as despesas do processo, afigura-se suficiente para demonstrar a hipossuficiência econômica, e, via de consequência, para a concessão da assistência judiciária gratuita, mesmo com as alterações conferidas pela Lei 13.467/2017. Precedentes.

Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento.

HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS. BENEFICIÁRIO DA JUSTIÇA GRATUITA. ART. 791-A, § 4º, DA CLT. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Nº 5.766/DF. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA RECONHECIDA.

1. Este Relator vinha entendendo pela inconstitucionalidade integral dos dispositivos relativos à cobrança de honorários advocatícios do beneficiário da gratuidade judiciária, com base na certidão de julgamento da ADI 5.766/DF, julgada em 20/10/2021.

2. Contudo, advinda a publicação do acórdão, em 03/05/2022, restou claro que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da referida ação, declarou a inconstitucionalidade do trecho " desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo " do art. 791-A, § 4º, e do trecho " ainda que beneficiária da justiça gratuita" , constante do caput do art. 790-B, e da integralidade do § 4º do mesmo dispositivo, todos da CLT.

3. Em sede de embargos de declaração o Supremo Tribunal Federal reafirmou a extensão da declaração de inconstitucionalidade desses dispositivos, nos termos em que fixada no acórdão embargado, em razão da existência de congruência com o pedido formulado pelo Procurador-Geral da República.

4. A inteligência do precedente firmado pelo Supremo Tribunal Federal não autoriza a exclusão da possibilidade de que, na Justiça do Trabalho, com o advento da Lei nº 13.467/17, o beneficiário da justiça gratuita tenha obrigações decorrentes da sucumbência que restem sob condição suspensiva de exigibilidade; o que o Supremo Tribunal Federal reputou inconstitucional foi a presunção legal, iure et de iure , de que a obtenção de créditos na mesma ou em outra ação, por si só, exclua a condição de hipossuficiente do devedor. 

5. Vedada, pois, é a compensação automática insculpida na redação original dos dispositivos; prevalece, contudo, a possibilidade de que, no prazo de suspensão de exigibilidade, o credor demonstre a alteração do estado de insuficiência de recursos do devedor, por qualquer meio lícito, circunstância que autorizará a execução das obrigações decorrentes da sucumbência.

6. Assim, os honorários de advogado sucumbenciais devidos pela parte reclamante ficam sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executados se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que os certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos do devedor, que, contudo, não poderá decorrer da mera obtenção de outros créditos na presente ação ou em outras. Passado esse prazo, extingue-se essa obrigação do beneficiário.

7. A Corte de origem, ao aplicar a literalidade do art. 791-A, § 4º, da CLT, decidiu em desconformidade com o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal.

Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR-1000838-66.2020.5.02.0446 , em que é Recorrente JORGE LUIZ OLIVEIRA DE AZEVEDO e é Recorrida MARIMEX DESPACHOS TRANSPORTES E SERVIÇOS LTDA. .

Irresignado, o reclamante interpõe recurso de revista, buscando reformar a decisão proferida pelo Tribunal Regional no tocante aos seguintes temas: "Assistência Judiciária Gratuita" e "Honorários Advocatícios Sucumbenciais". Aponta ofensa a dispositivos de lei, da Constituição da República, bem como transcreve arestos para confronto de teses (fls. 692/704).

O recurso foi admitido mediante o despacho de fls. 705/709 .

Foram oferecidas contrarrazões às fls. 715/723.

Dispensado o Parecer do Ministério Público do Trabalho (art. 95 do RITST) .

É o relatório.

V O T O

Trata-se de recurso interposto contra acórdão publicado após a vigência da Lei nº 13.015/2014 (art. 896, § 1º-A, da CLT) e da Lei nº 13.467/2017 (demonstração prévia de transcendência da causa, conforme estabelecido nos artigos 896-A da CLT e 246 e 247 do Regimento Interno desta Corte Superior).

Por divisar desrespeito da instância recorrida à jurisprudência desta Corte, conclui-se que a questão oferece transcendência política hábil a viabilizar sua apreciação (artigo 896-A, § 1º, II, da CLT).

Satisfeitos os pressupostos comuns de admissibilidade do recurso de revista, prossigo no exame dos pressupostos específicos, nos termos do art. 896 da CLT.

1. CONHECIMENTO

1.1. JUSTIÇA GRATUITA. REQUISITOS. DECLARAÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. SÚMULA 463 DO TST

O Tribunal Regional deu provimento ao recurso interposto pela reclamada, sob os seguintes fundamentos, transcritos nas razões do recurso de revista, a teor do que dispõe o art. 896, § 1º-A, I, da CLT:

"Prospera a insurgência patronal contra a concessão da gratuidade da justiça ao reclamante.

A concessão dessa benesse se pauta pelos critérios objetivos contidos nos §§ 3º e 4º, do art. 790 da CLT, que preveem a concessão da gratuidade aos que perceberem salário igual ou inferior a 40% do limite máximo dos benefícios do Regime de Previdência Social" (§ 3º), podendo ser deferida também o benefício àquele que ‘comprovar insuficiência de recursos para o pagamento das custas do processo’ (§ 4º).

No caso, o último salário do autor foi de R$ 3.335,77 (fl. 356), não se enquadrando no limite legal mencionado.

Competia, portanto, a ele comprovar a alegada insuficiência de recursos para o pagamento das custas do processo, encargo do qual ele não se desvencilhou. Isso porque não basta, para tanto, a apresentação de declaração de pobreza (fl. 22), pois o art. 99, §3º, do CPC não se aplica em âmbito processual trabalhista, por existência de regra específica no diploma celetista (art. 790).

Provejo o recurso para revogar a concessão da gratuidade da justiça ao autor" (fls. 694).

O reclamante pretende a reforma do julgado. Sustenta que "a comprovação da capacidade econômica, porém, não pode simplesmente se limitar a seguir critérios rigidamente fixados no texto da lei. Tampouco, há como resumir tudo ao valor da renda do necessitado" (fls. 695). Aduz também que "a simples a afirmação de pobreza, para fins de obtenção da gratuidade de justiça, goza de presunção relativa de veracidade, justificando a concessão do benefício, conforme inteligência da Súmula 463, I do TST " (fls. 696). Aponta violação ao art. 5º, LXXIV, da Constituição da República, contrariedade à Súmula 463, I, do TST, bem como colaciona arestos para confronto de teses.

Conforme se verifica, o Tribunal Regional indeferiu o benefício de assistência judiciária gratuita ao reclamante, em razão de não ter sido comprovada a insuficiência de recursos, uma vez que "no caso, o último salário do autor foi de R$ 3.335,77 (fl. 356), não se enquadrando no limite legal mencionado. Competia, portanto, a ele comprovar a alegada insuficiência de recursos para o pagamento das custas do processo, encargo do qual ele não se desvencilhou. Isso porque não basta, para tanto, a apresentação de declaração de pobreza (fl. 22), pois o art. 99, §3º, do CPC não se aplica em âmbito processual trabalhista, por existência de regra específica no diploma celetista (art. 790)" (fls. 687).

O art. 5º, LXXIV, da Constituição da República preconiza que "o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos" e a Súmula 463, I, do TST estabelece:

"ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. COMPROVAÇÃO (conversão da Orientação Jurisprudencial nº 304 da SBDI-1, com alterações decorrentes do CPC de 2015) - Res. 219/2017, DEJT divulgado em 28, 29 e 30.06.2017 – republicada - DEJT divulgado em 12, 13 e 14.07.2017

I – A partir de 26.06.2017, para a concessão da assistência judiciária gratuita à pessoa natural, basta a declaração de hipossuficiência econômica firmada pela parte ou por seu advogado, desde que munido de procuração com poderes específicos para esse fim (art. 105 do CPC de 2015);"

Nesses termos, a mera declaração da parte afirmando que não possui condições de arcar com as despesas do processo, afigura-se suficiente para demonstrar a hipossuficiência econômica, e, via de consequência, para a concessão da assistência judiciária gratuita, mesmo com as alterações conferidas pela Lei 13.467/2017.

A corroborar esse entendimento, são os seguintes julgados desta Corte:

"RECURSO DE REVISTA. LEI Nº 13.467/17. JUSTIÇA GRATUITA. REQUISITOS. DECLARAÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. SÚMULA 463 DO TST. AUSÊNCIA DE TRANSCENDÊNCIA. A Súmula 463, item I, do TST, preconiza que ‘A partir de 26.06.2017, para a concessão da assistência judiciária gratuita à pessoa natural, basta a declaração de hipossuficiência econômica firmada pela parte ou por seu advogado, desde que munido de procuração com poderes específicos para esse fim (art. 105 do CPC de 2015)’ . Nesses termos, a mera declaração da parte afirmando que não possui condições de arcar com as despesas do processo, afigura-se suficiente para demonstrar a hipossuficiência econômica, e, via de consequência, para a concessão da assistência judiciária gratuita, mesmo com as alterações conferidas pela Lei 13.467/2017. Precedentes. Recurso de revista de que não se conhece" (RR-11121-72.2019.5.15.0048, 3ª Turma, Relator Ministro Alberto Bastos Balazeiro, DEJT 01/04/2022).

"RECURSO DE REVISTA - BENEFÍCIOS DA JUSTIÇA GRATUITA. DECLARAÇÃO DE MISERABILIDADE JURÍDICA. PROVA SUFICIENTE. RECLAMAÇÃO TRABALHISTA AJUIZADA NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. A comprovação de insuficiência de recursos para a concessão dos benefícios da justiça gratuita, prevista no art. 790, § 4º, da CLT, pode ser realizada por meio de mera declaração de hipossuficiência (art. 99, § 3º, do CPC), já que a presunção dela extraída é tida como típico meio de prova jurídica (art. 212, IV, do Código Civil c/c 408, caput, do CPC). Recurso de revista conhecido e provido" (RR-1001069-19.2018.5.02.0073, 2ª Turma, Relator Desembargador Convocado Sergio Torres Teixeira, DEJT 02/08/2021).

"RECURSO DE REVISTA. JUSTIÇA GRATUITA AO TRABALHADOR. CABIMENTO. Na Justiça do Trabalho, para a concessão dos benefícios da justiça gratuita, revela-se bastante a declaração de miserabilidade jurídica firmada pela parte (inteligência da Súmula 463, I, do TST). Recurso de revista conhecido e provido" (RR-950-77.2018.5.12.0047, 3ª Turma, Rel. Min. Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, DEJT 26/6/2020).

"1. BENEFÍCIOS DA JUSTIÇA GRATUITA. RECLAMANTE. AÇÃO AJUIZADA ANTES DA ENTRADA EM VIGOR DA LEI Nº 13.467/2017. DECLARAÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. CONTRARIEDADE À SÚMULA Nº 463, I, DO TST. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA RECONHECIDA. CONHECIMENTO E PROVIMENTO. I. Ao interpretar o disposto no art. 790, § 4º, da CLT, cujo texto foi incluído pela Lei nº 13.467/2017, esta Corte Superior tem decidido que, nas ações ajuizadas antes da entrada em vigor do referido dispositivo legal, não se aplica a exigência de comprovação de insuficiência de recursos para o pagamento das custas do processo. II. Isso porque, antes da reforma trabalhista instituída pela Lei nº 13.467/2017, estava em vigor o § 3º do art. 790, na redação dada pela Lei nº 10.537/2002, em que se estabelece que " é facultado aos juízes, órgãos julgadores e presidentes dos tribunais do trabalho de qualquer instância conceder, a requerimento ou de ofício, o benefício da justiça gratuita, inclusive quanto a traslados e instrumentos, àqueles que perceberem salário igual ou inferior ao dobro do mínimo legal, ou declararem, sob as penas da lei, que não estão em condições de pagar as custas do processo sem prejuízo do sustento próprio ou de sua família ". Ademais, prevalece nesta Corte Superior o entendimento de que basta a juntada de declaração de hipossuficiência econômica a fim de se deferir a justiça gratuita. Esse é o teor da Súmula nº 463, I, do TST. III. No caso em apreço , o Tribunal Regional consignou que o Reclamante ajuizou a presente reclamação trabalhista antes da entrada em vigor da Lei nº 13.467/2017 e que, além disso, juntou declaração de hipossuficiência econômica, sem que haja nos autos informação de que a referida declaração tivesse sido impugnada. IV. Nesse contexto, ao indeferir o pedido de concessão dos benefícios da justiça gratuita sob o fundamento de que a juntada de declaração de hipossuficiência econômica não é bastante para demonstrar a incapacidade da Reclamante de arcar com as custas do processo, o Tribunal Regional decidiu a matéria de forma contrária à jurisprudência atual e notória desta Corte, sedimentada na Súmula nº 463, I, do TST, razão pela qual se reconhece a transcendência política da causa (art. 896-A, § 1º, II, da CLT), no particular. V. Recurso de revista de que se conhece, por contrariedade à Súmula nº 463, I, do TST, e a que se dá provimento" (RR-11807-75.2017.5.03.0078, 4ª Turma, Rel. Min. Alexandre Luiz Ramos, DEJT 27/3/2020).

"RECURSO DE REVISTA. LEI 13.467/2017 (...) ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. DECLARAÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA. RECLAMAÇÃO TRABALHISTA AJUIZADA NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. TRANSCENDÊNCIA. A causa possui transcendência jurídica, nos termos do art. 896-A, §1º, IV, da CLT, uma vez que a questão debatida trata de matéria nova em torno da interpretação do art. 790, § 3º, da CLT, trazido pela Lei 13.467/2017. O entendimento desta c. 6ª Turma é no sentido de que a mera declaração da parte quanto ao fato de não possuir condições de arcar com as despesas do processo, nos termos da Súmula nº 463, I, do c. TST, mesmo após as alterações promovidas pela Lei 13.467/2017, é suficiente para o fim de demonstrar sua hipossuficiência econômica, c om ressalva de entendimento pessoal do Ministro Relator. No caso, o eg. TRT indeferiu o benefício de assistência judiciária gratuita à reclamante, em razão de não ter sido comprovada a insuficiência de recursos para pagamento das custas do processo, bem como diante da percepção de benefícios em valor superior a 40% do limite máximo dos benefícios do RGPS, ou seja, R$ 5.645,80. Não obstante, em adoção ao entendimento prevalecente na c. 6ª Turma, tendo a reclamante firmado atestado de pobreza, faz-se necessária a reforma da decisão regional, a fim de que seja concedida a assistência judiciária gratuita. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-433-39.2018.5.17.0013, 6ª Turma, Rel. Min. Aloysio Correa da Veiga, DEJT 14/2/2020).

"AÇÃO TRABALHISTA AJUIZADA NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/17. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA DO AUTOR. BENEFÍCIO DA JUSTIÇA GRATUITA. COMPROVAÇÃO DE INSUFICIÊNCIA DE RECURSOS POR SIMPLES DECLARAÇÃO. CUSTAS PROCESSUAIS E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA. Constata-se que há transcendência jurídica da causa, considerando que a discussão recai sobre a interpretação do artigo 790, § 4º, da CLT, introduzido à ordem jurídica pela Lei nº 13.467/2017, a justificar que se prossiga no exame do apelo. Agravo de instrumento a que se dá provimento para determinar o processamento do recurso de revista, em face de haver sido demonstrada possível violação do artigo 5º, LXXIV, da Constituição Federal. RECURSO DE REVISTA DO AUTOR. BENEFÍCIO DA JUSTIÇA GRATUITA. COMPROVAÇÃO DE INSUFICIÊNCIA DE RECURSOS POR SIMPLES DECLARAÇÃO. CUSTAS PROCESSUAIS E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA. Cinge-se a controvérsia a definir se a simples declaração de hipossuficiência econômica é suficiente para a comprovação do estado de pobreza do reclamante, para fins de deferimento dos benefícios da justiça gratuita, em ação ajuizada após a vigência da Lei n° 13.467/2017. Segundo o artigo 790, §§ 3º e 4º, da CLT, com as alterações impostas pela Lei nº 13.467/2017, o benefício da gratuidade da Justiça será concedido àqueles que perceberem salário igual ou inferior a 40% do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social, ou àqueles que comprovarem insuficiência de recursos. Já o artigo 5º, LXXIV, da Constituição Federal consagra o dever do Estado de prestar assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos e o artigo 99, §3º, do CPC, de aplicação supletiva ao processo do trabalho, consoante autorização expressa no artigo 15 do mesmo Diploma, dispõe presumir-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida por pessoa natural. A partir da interpretação sistemática desses preceitos, não é possível exigir dos trabalhadores que buscam seus direitos na Justiça do Trabalho - na sua maioria, desempregados - a comprovação de estarem sem recursos para o pagamento das custas do processo. Deve-se presumir verdadeira a declaração de pobreza firmada pelo autor, na petição inicial, ou feita por seu advogado, com poderes específicos para tanto. No tocante aos honorários advocatícios, além dessa compreensão, é certo que artigo 98, caput e § 1º, do CPC os inclui entre as despesas abarcadas pelo beneficiário da gratuidade da justiça. Ainda que o § 2º do mencionado preceito disponha que a concessão da gratuidade não afasta a responsabilidade do beneficiário pelos honorários advocatícios decorrentes de sua sucumbência, o § 3º determina que tal obrigação fique sob condição suspensiva, pelo prazo de 5 anos, e somente poderá ser exigida se o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos justificadora da concessão da gratuidade de justiça, extinguindo-se, após o decurso do prazo mencionado. Essa regra foi incorporada na sua quase totalidade à CLT por meio da introdução do artigo 791-A, especificamente no seu § 4º, muito embora o prazo da condição suspensiva seja fixado em dois anos e contenha esdrúxula previsão de possibilidade de cobrança, se o devedor obtiver créditos em outro processo aptos a suportar as despesas. Diz-se esdrúxula pelo conteúdo genérico da autorização e por não especificar a natureza do crédito obtido, que, em regra, no processo do trabalho, resulta do descumprimento de obrigações comezinhas do contrato de trabalho, primordialmente de natureza alimentar, circunstância que o torna impenhorável, na forma prevista no artigo 833, IV, do CPC, com a ressalva contida no seu § 2º. Nesse contexto, o beneficiário da justiça gratuita somente suportará as despesas decorrentes dos honorários advocatícios caso o credor demonstre a existência de créditos cujo montante promova indiscutível e substancial alteração de sua condição socioeconômica e, para tanto, não se pode considerar de modo genérico o percebimento de quaisquer créditos em outros processos, pois, neste caso, em última análise se autorizaria a constrição de verba de natureza alimentar. Precedentes. Por fim, deve ser reduzido o percentual arbitrado, para o mínimo previsto em lei, considerando-se que o autor desistiu da ação antes mesmo da habilitação dos advogados das rés e da realização da denominada audiência inaugural, de modo a evitar o deslocamento das partes e consequente incremento das despesas processuais, pleito homologado pelo juiz. Em tal caso, não houve maiores gastos pelas demandadas e o julgador não pode deixar de observar tais elementos fáticos ao definir o percentual a incidir, a teor da regra contida no § 2º do artigo 791-A da CLT. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-10520-91.2018.5.03.0062, 7ª Turma, Rel. Min. Claudio Mascarenhas Brandao, DEJT 30/6/2020).

"AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. (...) 2. JUSTIÇA GRATUITA. O Tribunal de origem consignou que " a percepção de remuneração acima de 40% do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social, não constitui óbice ao deferimento da gratuidade da justiça, pois o § 4º do art. 790 da CLT prevê que o benefício da Justiça Gratuita será concedido à parte que comprovar a insuficiência de recursos ". E, nesse aspecto, o Regional solucionou a controvérsia em sintonia com a jurisprudência desta Corte, por sua Súmula nº 463, I, do TST, segundo a qual, para a pessoa natural, a declaração de hipossuficiência econômica firmada pela parte ou pelo advogado é bastante para a comprovação da impossibilidade de a parte arcar com as despesas do processo, caso dos autos. Agravo de instrumento conhecido e não provido" (AIRR-1685-87.2017.5.19.0003, 8ª Turma, Rel. Min. Dora Maria da Costa, DEJT 25/10/2019).

Desse modo, deve ser assegurada a prestação do benefício da assistência justiça gratuita, pelo Estado, aos reclamantes que declararem insuficiência de recurso para arcar com as despesas do processo.

Logo, CONHEÇO do recurso de revista, por contrariedade à Súmula 463, I, do TST.

1.2. HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS. BENEFICIÁRIO DA JUSTIÇA GRATUITA. ART. 791-A, § 4º, DA CLT. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Nº 5.766/DF. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA RECONHECIDA

O Tribunal Regional negou provimento ao recurso interposto pela reclamada e pelo reclamante, sob os seguintes fundamentos, transcritos nas razões do recurso de revista, a teor do que dispõe o art. 896, § 1º-A, I, da CLT:

"A reclamada pretende a majoração dos honorários sucumbenciais a que foi condenado o autor; ao passo que o obreiro pugna pelo afastamento da condenação, destacando ser beneficiário da justiça gratuita e alegando a inconstitucionalidade do art. 791-A, §4º, da CLT.

Passo ao exame.

Tendo em vista a revogação da gratuidade da justiça concedida ao autor, resta prejudicada a análise da alegação de inconstitucionalidade do art. 791-A, §4º, da CLT, razão pela qual mantenho a condenação da parte reclamante ao pagamento da verba honorária .

Por outro lado, considerando o grau de zelo do profissional, o lugar de prestação do serviço, a natureza e a importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço, entendo que o percentual fixado na origem (5%) é razoável para remunerar o patrono da ré, não merecendo reparo a decisão de origem.

Destarte, rejeito ambos os apelos no particular" (fls. 698).

O reclamante pretende a reforma do julgado. Sustenta que a condenação a pagamento dos honorários sucumbenciais do beneficiário da Justiça Gratuita viola ao art . 5º, LXXIV, da Constituição da República, bem como transcreve arestos para confronto de teses.

Ao exame.

Na hipótese, o Tribunal Regional entendeu que, "tendo em vista a revogação da gratuidade da justiça concedida ao autor, resta prejudicada a análise da alegação de inconstitucionalidade do art. 791-A, §4º, da CLT, razão pela qual mantenho a condenação da parte reclamante ao pagamento da verba honorária" (fls. 688).

O Supremo Tribunal Federal, em 20 de outubro de 2021, julgou parcialmente procedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5.766/DF, mediante os seguintes fundamentos:

Ementa: CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI 13.467/2017. REFORMA TRABALHISTA. REGRAS SOBRE GRATUIDADE DE JUSTIÇA. RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO DE ÔNUS SUCUMBENCIAIS EM HIPÓTESES ESPECÍFICAS. ALEGAÇÕES DE VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA ISONOMIA, INAFASTABILIDADE DA JURISDIÇÃO, ACESSO À JUSTIÇA, SOLIDARIEDADE SOCIAL E DIREITO SOCIAL À ASSISTÊNCIA JURÍDICA GRATUITA. MARGEM DE CONFORMAÇÃO DO LEGISLADOR. CRITÉRIOS DE RACIONALIZAÇÃO DA PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. AÇÃO DIRETA JULGADA PARCIALMENTE PROCEDENTE.

1. É inconstitucional a legislação que presume a perda da condição de hipossuficiência econômica para efeito de aplicação do benefício de gratuidade de justiça, apenas em razão da apuração de créditos em favor do trabalhador em outra relação processual, dispensado o empregador do ônus processual de comprovar eventual modificação na capacidade econômica do beneficiário.

2. A ausência injustificada à audiência de julgamento frustra o exercício da jurisdição e acarreta prejuízos materiais para o órgão judiciário e para a parte reclamada, o que não se coaduna com deveres mínimos de boa-fé, cooperação e lealdade processual, mostrando-se proporcional a restrição do benefício de gratuidade de justiça nessa hipótese. 3. Ação Direta julgada parcialmente procedente.

(ADI 5766, Relator(a): ROBERTO BARROSO, Relator(a) p/ Acórdão: ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 20/10/2021, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-084 DIVULG 02-05-2022 PUBLIC 03-05-2022)

Este Relator vinha entendendo pela inconstitucionalidade integral dos dispositivos relativos à cobrança de honorários advocatícios do beneficiário da gratuidade judiciária, com base na certidão de julgamento da ADI 5.766/DF, julgada em 20/10/2021.

Este era o posicionamento amplamente majoritário no âmbito deste Tribunal, enquanto não publicado pelo Supremo Tribunal Federal o acórdão proferido na ADI 5.766/DF:

"AGRAVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS. BENEFICIÁRIO DA JUSTIÇA GRATUITA. ADI 5.766/DF. Em razão da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 5.766/DF), impõe-se o provimento do agravo para melhor análise do agravo de instrumento. Agravo conhecido e provido. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROVIMENTO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS. BENEFICIÁRIO DA JUSTIÇA GRATUITA. ADI 5.766/DF. Dá-se provimento ao agravo de instrumento ante a potencial violação do art. 5º, LXXIV, da Constituição Federal. Agravo de instrumento conhecido e provido. RECURSO DE REVISTA. VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS. BENEFICIÁRIO DA JUSTIÇA GRATUITA. ADI 5.766/DF. TRANSCENDÊNCIA RECONHECIDA. 1. É entendimento pessoal deste Relator que a declaração de inconstitucionalidade do art. 791-A, § 4º, da CLT ficou restrita à possibilidade de cobrança dos honorários sucumbenciais devidos pelo beneficiário da justiça gratuita quando este obtiver créditos em juízo, motivo pelo qual prevaleceria a condenação e o provimento do recurso ficaria restrito à suspensão da exigibilidade do crédito pelo período de dois anos. 2. A Primeira Turma, no entanto, firmou entendimento de que a decisão do Supremo Tribunal Federal no julgamento da ADI 5.766/DF resultou na impossibilidade da condenação do beneficiário da justiça gratuita em honorários sucumbenciais. 3. Precedentes de outras turmas no mesmo sentido. Recurso de revista conhecido e provido para excluir da condenação os honorários sucumbenciais impostos à parte autora" (RRAg-1000315-44.2019.5.02.0202, 1ª Turma, Relator Ministro Amaury Rodrigues Pinto Junior, DEJT 06/05/2022).

"I - AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA - PROVIMENTO. HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA. BENEFICIÁRIO DA JUSTIÇA GRATUITA. INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 791-A, § 4º, DA CLT. ADI 5.766/DF. A possível ofensa aos incisos XXXV e LXXIV do art. 5º da Constituição Federal viabiliza o processamento do recurso de revista. Agravo de instrumento conhecido e provido. II - RECURSO DE REVISTA. HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA. BENEFICIÁRIO DA JUSTIÇA GRATUITA. INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 791-A, § 4º, DA CLT. ADI 5.766/DF. O Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento da ADI 5.766/DF, declarou, com eficácia erga omnes e efeito vinculante, a inconstitucionalidade do art. 791-A, § 4º, da CLT. Assim, obstaculizada a condenação do beneficiário da justiça gratuita ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-523-31.2020.5.09.0003, 2ª Turma, Relatora Ministra Morgana de Almeida Richa, DEJT 06/05/2022).

"HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DE SUCUMBÊNCIA. BENEFICIÁRIO DA JUSTIÇA GRATUITA. CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE E DE CONVENCIONALIDADE DO § 4º DO ARTIGO 791-A DA CLT. AÇÃO AJUIZADA POSTERIORMENTE AO INÍCIO DE VIGÊNCIA DA LEI N º 13.467/2017. 1. A proteção jurídica e judiciária dos indivíduos representa um dos pilares centrais do Estado de Direito, não podendo tal sistema institucional e jurídico limitar-se ao reconhecimento dos direitos fundamentais da pessoa humana, cabendo-lhe mais e, sobretudo, torná-los efetivos, não só em face do próprio poder estatal, diante de sua eficácia vertical, mas também dos particulares, em sintonia com a doutrina moderna das eficácias horizontal e diagonal dos direitos fundamentais, aplicáveis de forma direta e imediata (art. 5º, § 1º, da Constituição Federal). 2. Nesse passo, deve ser assegurado um conjunto de garantias processuais e procedimentais, seja de natureza judiciária, seja de natureza administrativa, como é o caso da criação e da organização de um sistema de acesso à Justiça efetivo , entre os quais se destacam, no ordenamento jurídico, as garantias de acesso ao Poder Judiciário e de prestação, pelo Estado, da "assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos", insculpidas, respectivamente, nos incs. XXXV e LXXIV do art. 5º da CF. 3. É cediço que um dos principais obstáculos comumente associados ao acesso à Justiça é o de ordem econômica, conforme já apregoavam Mauro Cappelletti e Bryant Garth em sua clássica obra "Acesso à justiça", desenvolvida a partir de pesquisas que demonstraram que uma das primeiras barreiras à sua efetivação são os gastos econômicos do processo, relativos ao alto custo das despesas processuais sucumbenciais, como custas judiciais e honorários. Isso acarretou a primeira onda dos movimentos renovatórios do acesso à Justiça no curso do século XX, caracterizada pela assistência jurídica integral e gratuita aos pobres. Com isso, percebe-se que o benefício da gratuidade da Justiça visa dar máxima efetividade ao próprio direito de acesso à Justiça, ao viabilizar a sua concretização aos necessitados. 4. O direito de acesso à Justiça também é reconhecido na ordem jurídica internacional como direito humano, sendo garantido pelos arts. 8 e 25 da Convenção Americana de Direitos Humanos de 1969 (CADH), conhecida como Pacto de São José da Costa Rica, em especial pelo seu art. 8.1. Disposições similares são encontradas nos arts. 8 e 10 da Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948 (DUDH) e no art. 14.1 do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos de 1966 (PIDCP). 5. É preciso, ainda, salientar que, conforme aponta a doutrina, o art. 5º, LXXIV, da CF dispõe sobre três institutos distintos, quais sejam: a Justiça gratuita, a assistência judiciária e a assistência jurídica. Enquanto a assistência judiciária implica a gratuidade da representação técnica para a defesa em Juízo do assistido, a Justiça gratuita refere-se às despesas do processo, significando a isenção de toda e qualquer despesa necessária ao pleno exercício das faculdades processuais, ainda que a parte esteja assistida por advogado particular. Oportuna, nessa perspectiva, a lição de Pontes de Miranda. Já a assistência jurídica integral e gratuita, de caráter mais amplo, compreende não só a Justiça e a assistência judiciária gratuitas, já mencionadas, mas também o assessoramento jurídico extrajudicial. Nesse sentido são os ensinamentos de José Carlos Barbosa Moreira. 6. A par das assinaladas diferenças entre tais institutos, registra-se que a concessão dos benefícios da Justiça gratuita tem fulcro unicamente no pressuposto do estado de miserabilidade da parte, garantindo-lhe a isenção de todas as despesas processuais, como custas, honorários periciais e honorários advocatícios sucumbenciais. 7. Depreende-se, no entanto, do § 4º do art. 791-A da CLT, introduzido pela Lei nº 13.467/2017, que ele estende a aplicação da regra da sucumbência ao beneficiário da Justiça gratuita, determinando a compensação de créditos capazes de suportar a despesa no processo em comento com aqueles obtidos nele mesmo ou em outro processo, sendo que, na hipótese de inexistência de créditos suficientes para compensar o ônus da sucumbência, as obrigações dela decorrentes ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade. 8. Ocorre que a mera existência de créditos judiciais, obtidos em processos trabalhistas ou de outra natureza, não é suficiente para afastar a situação de pobreza em que se encontrava a parte autora, no momento em que foram reconhecidas as condições para o exercício do seu direito fundamental à gratuidade da Justiça, constituindo a medida imposta pelo mencionado dispositivo celetista verdadeira inibição processual à fruição, pelo trabalhador, de seus direitos sociais assegurados pela ordem jurídica, sobretudo considerando que a Justiça do Trabalho ampara, em grande parte, a classe dos trabalhadores que justamente estão em situação de desemprego. 9. Portanto, a imposição ao beneficiário da Justiça gratuita do pagamento de despesas processuais de sucumbência, inclusive com empenho de créditos auferidos no feito ou em outro processo trabalhista, sem que esteja descartada a condição de pobreza que justificou a concessão do benefício, resulta em flagrante ofensa aos direitos fundamentais e aos princípios do acesso à Justiça e da assistência jurídica integral e gratuita, insculpidos nos incs. XXXV e LXXIV do art. 5º da CF, e aos direitos humanos sufragados nas normas internacionais já mencionadas. 10. De igual modo, a norma do § 4º do art. 791-A da CLT viola os princípios da isonomia e da não discriminação, consagrados nos arts . 3º, III e IV, e 5º, caput, da CF, e também em diversos diplomas internacionais (arts . 1, 2 e 7 da DUDH; arts . 2.1, 3 e 26 do PIDCP; arts . 2.2 e 3 do PIDESC - Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos; art . 2 da Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem; arts . 1.1 e 24 da CADH; art . 3 do Protocolo Adicional à Convenção Americana sobre Direitos Humanos em Matéria de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais de 1988 - Protocolo de São Salvador), ao conferir um tratamento desigual, de caráter infundado ou baseado em um critério injustamente desqualificante, ao beneficiário da Justiça gratuita que busca a prestação jurisdicional na Justiça do Trabalho em contraposição àqueles que acessam a Justiça comum. 11. Nas palavras de Helder Santos Amorim, as disposições trazidas pelo § 4º do art. 791-A da CLT, ao restringirem o acesso à Justiça dos trabalhadores beneficiários da Justiça gratuita, violam ainda o seu direito ao mínimo existencial, núcleo irredutível do princípio da dignidade da pessoa humana (art . 1º, III, da CF) e consubstanciado na satisfação de prestações materiais essenciais e imprescindíveis à sobrevivência do trabalhador e de sua família. 12. Ademais, malgrado a maior parte da doutrina sufrague a tese de que, no Estado Democrático de Direito, não há direitos de natureza absoluta, pelo que os direitos fundamentais são suscetíveis de restrições nas hipóteses de reserva constitucional expressa, de reserva legal fundamentada em valor constitucional ou de colisão de direitos fundamentais, o certo é que o princípio da proporcionalidade, do qual emana a proibição de excesso, constitui vetor axiológico para a identificação da legitimidade dessas restrições. 13. Isso à luz da teoria dos limites dos limites, que visa precipuamente controlar e identificar os obstáculos da relativização pelo Poder Público de direitos fundamentais, a fim de que não se elimine ou se restrinja seu núcleo essencial intangível, de forma que qualquer limitação de direitos fundamentais decorrente da atividade legislativa do Estado deve obedecer aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, sob pena de inconstitucionalidade, em virtude de constituírem um limite constitucional à liberdade de conformação do legislador. 14. Todavia, a justificativa do Poder Legiferante, para a imposição das restrições contidas no § 4º do artigo 791-A da CLT, introduzido pela Lei nº 13.467/2017, de assegurar uma maior responsabilidade na litigância para a defesa dos direitos trabalhistas não passa pelo crivo do princípio da proporcionalidade, especialmente à luz de seus subprincípios da necessidade (na medida em que já existem no ordenamento jurídico meios menos restritivos ou gravosos para alcançar a finalidade proposta, como as sanções jurídicas ou penalidades em casos de litigância de má-fé) e da proporcionalidade em sentido estrito (visto que não se sustenta a relação de custo-benefício, diante da constatação de que o referido dispositivo gera uma imposição de barreiras que inviabilizam a acessibilidade e a concretização de direitos fundamentais dos trabalhadores). 15 . Assim, deve ser afastada qualquer interpretação que implique vulneração ou esvaziamento dos princípios fundamentais insculpidos no caput e incs . XXXV e LXXIV do art. 5º da CF, que, como direitos e garantias individuais, integram as chamadas cláusulas pétreas da Constituição, as quais são insuscetíveis de modificação até mesmo mediante emenda constitucional (art . 60, § 4º, IV, da CF). 16. Também não se pode admitir um resultado flagrantemente inconstitucional na interpretação do dispositivo da Reforma Trabalhista à luz de todas as normas constitucionais já mencionadas, em decorrência da chamada "Eficácia Objetiva das Normas Constitucionais", pela qual essas têm um efeito irradiante, projetando-se sobre todo o ordenamento jurídico e estabelecem, em sua dimensão objetiva, diretrizes para a atuação não apenas dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, mas também dos próprios particulares. A aplicabilidade imediata desses dispositivos constitucionais, principalmente aqueles que definem direitos fundamentais, além de decorrer diretamente do que estabelece o § 1º do art. 5º da CF, tem como base o princípio da máxima efetividade dos preceitos constitucionais, de modo que sejam atendidos em sua máxima extensão possível. 17. Frisa-se, ainda, a recente decisão proferida pelo Pleno do STF, em 20/10/2021, nos autos da ADI nº 5766, que julgou, por 6 votos a 4, parcialmente procedente o pedido formulado na ação direta para declarar inconstitucional o art . 791-A, § 4º, da CLT. 18. Com relação ao exame da compatibilidade do aludido dispositivo celetista com os tratados e convenções internacionais de direitos humanos incorporados ao nosso ordenamento jurídico com status supralegal (art. 5º, § 2º, da CF e Recurso Extraordinário 466.343 do STF), registra-se que a Corte Interamericana de Direitos Humanos, órgão jurisdicional ao qual compete aplicar as disposições da Convenção Americana sobre Direitos Humanos de 1969 aos Estados-Partes, incluindo o Brasil (que expressamente reconheceu sua jurisdição), passou a exigir, a partir de 2006, por ocasião do julgamento do Caso Almonacid Arellano e outros versus Chile, que o Poder Judiciário dos Estados-partes da Convenção Americana sobre Direitos Humanos exerça o controle de convencionalidade das normas jurídicas internas aplicáveis aos casos concretos submetidos à sua jurisdição, sob pena de responsabilização internacional do Estado. Esse dever, a propósito, é incumbido de forma ampla a todas as instâncias e agentes estatais (Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, Ministério Público, Defensoria Pública, entre outros) e, ao contrário do controle de constitucionalidade, não se aplica a cláusula de reserva de plenário. 19. Dessa forma, constatada a condição de hipossuficiência econômica da parte reclamante, com a respectiva concessão dos benefícios da Justiça gratuita, deve ser excluída a sua condenação ao pagamento dos honorários advocatícios de sucumbência ao patrono da reclamada. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-1000004-56.2018.5.02.0471, 3ª Turma, Relator Ministro Jose Roberto Freire Pimenta, DEJT 06/05/2022).

"AGRAVO EM RECURSO DE REVISTA - AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE DESACERTO DO DESPACHO AGRAVADO - DESPROVIMENTO - MULTA. 1. Na decisão ora agravada , reconheceu-se a transcendência política da questão relativa aos honorários advocatícios sucumbenciais e deu-se provimento a revista autoral, para afastar a condenação do Autor, que litiga sob o pálio da justiça gratuita, ao pagamento da verba honorária, prestigiando-se a decisão proferida na ADI 5 . 766 pelo STF, que reputou inconstitucional, frente ao art. 5º, LXXIV, da CF, o § 4º do art. 791-A da CLT, acrescentado pela Lei 13.467/17, que admitia a imposição de honorários sucumbenciais ao beneficiário da justiça gratuita, quando obtivesse em juízo, mesmo que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa. 2. No agravo, a Reclamada não trouxe nenhum argumento que infirmasse os fundamentos do despacho hostilizado, motivo pelo qual este merece ser mantido. Agravo desprovido, com aplicação de multa" (Ag-RR-12806-85.2018.5.15.0069, 4ª Turma, Relator Ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho, DEJT 06/05/2022).

"(...) RECURSO DE REVISTA. APELO INTERPOSTO A ACÓRDÃO PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI N.º 13.467/2017. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. BENEFICIÁRIO DA JUSTIÇA GRATUITA. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA RECONHECIDA. 1. Cuida-se de controvérsia acerca da possibilidade de condenação de empregado beneficiário da justiça gratuita em honorários advocatícios, tratando-se de reclamação trabalhista ajuizada após a vigência da Lei n.º 13.467/2017. 2. O Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade n.º 5.766, ocorrido em 20/10/2021, declarou a inconstitucionalidade do artigo 791-A, § 4º, da CLT, advindo da Lei n.º 13.467/2017. Assentou a Suprema Corte, naquela oportunidade, que a condenação de beneficiário da justiça gratuita em honorários advocatícios vulnera a assistência jurídica integral e gratuita devida pelo Estado em favor da parte hipossuficiente, em detrimento inclusive do direito fundamental de acesso ao Poder Judiciário. 3. Na hipótese dos autos, o Tribunal Regional, ao condenar a parte beneficiária da justiça gratuita em honorários advocatícios, com fundamento em dispositivo declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, afrontou o artigo 5º, XXXV e LXXIV, da Constituição da República, resultando evidenciada a transcendência política da causa. 4. Recurso de Revista conhecido e provido" (RRAg-1000636-37.2019.5.02.0022, 6ª Turma, Relator Ministro Lelio Bentes Correa, DEJT 06/05/2022).

"AGRAVO EM RECURSO DE REVISTA COM AGRAVO DO AUTOR. LEI Nº 13.015/2014. CPC/2015. INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 40 DO TST. LEI Nº 13.467/2017. CERCEAMENTO DE DEFESA. PRODUÇÃO DE NOVA PERÍCIA. DANOS MORAIS. NÃO CARACTERIZAÇÃO. NÃO RECONHECIMENTO PELA PERÍCIA DO NEXO CAUSAL ENTRE A DOENÇA OCUPACIONAL E AS ATIVIDADES REALIZADAS. AUSÊNCIA DE TRANSCENDÊNCIA DA CAUSA. PRECEDENTE ESPECÍFICO DA 7ª TURMA. Não se constata a transcendência da causa, no aspecto econômico, político, jurídico ou social. Agravo interno conhecido e não provido, por ausência de transcendência da causa. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS. JUSTIÇA GRATUITA. IMPROCEDÊNCIA TOTAL DOS PEDIDOS. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA. INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 791-A, § 4º, DA CLT. DECISÃO DO STF PROFERIDA NA ADI 5766/DF. Constatado equívoco na decisão agravada, dá-se provimento ao agravo, para determinar o processamento do agravo de instrumento. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA DO AUTOR. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS. JUSTIÇA GRATUITA. IMPROCEDÊNCIA TOTAL DOS PEDIDOS. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA. INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 791-A, § 4º, DA CLT. DECISÃO DO STF PROFERIDA NA ADI 5766/DF. Agravo de instrumento a que se dá provimento, para determinar o processamento do recurso de revista, em face de haver sido demonstrada possível afronta ao artigo 5º, LXXIV, da Constituição Federal. RECURSO DE REVISTA DO AUTOR. LEI Nº 13.467/2017 . HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS. JUSTIÇA GRATUITA. IMPROCEDÊNCIA TOTAL DOS PEDIDOS. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA. INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 791-A, § 4º, DA CLT. DECISÃO DO STF PROFERIDA NA ADI 5766/DF. Reconhecida a transcendência jurídica, nesse aspecto. O Supremo Tribunal Federal, no recente julgamento da ADI 5766/DF, em 20/10/2021 (Ata de Julgamento Publicada no DJE de 5/11/2021), declarou a inconstitucionalidade do artigo 791-A, § 4º, da CLT, introduzido pela Lei nº 13.467/2017, que impõe ao beneficiário da justiça gratuita o pagamento de honorários de sucumbência. Assim, é indevido o pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais por beneficiário da gratuidade de justiça, ainda que, em outro processo, obtenha créditos suficientes para suportar obrigações decorrentes de sua sucumbência. Precedentes do TST. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-10920-58.2019.5.15.0023, 7ª Turma, Relator Ministro Claudio Mascarenhas Brandao, DEJT 06/05/2022).

"A) AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. RITO SUMARÍSSIMO. HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA. BENEFICIÁRIO DA JUSTIÇA GRATUITA. INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 791-A, § 4°, DA CLT. O presente agravo de instrumento merece provimento, com consequente processamento do recurso de revista, haja vista que o reclamante logrou demonstrar a configuração de possível ofensa ao art. 5°, LXXIV, da CF. Agravo de instrumento conhecido e provido. B) RECURSO DE REVISTA. RITO SUMARÍSSIMO. HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA. BENEFICIÁRIO DA JUSTIÇA GRATUITA. INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 791-A, § 4°, DA CLT. 1. Consoante o disposto no art. 791-A, § 4°, da CLT, comando legal introduzido pela Reforma Trabalhista, o empregado, embora beneficiário da Justiça gratuita, será condenado ao pagamento de honorários de sucumbência, se sucumbente no processo. 2. Por sua vez, o Supremo Tribunal Federal, ao julgar a ADI-5766, declarou a inconstitucionalidade do referido comando consolidado, ao fundamento de que é inconstitucional obstaculizar o acesso à Justiça do Trabalho pelos hipossuficientes. 3. Dentro desse contexto, a presente revista logra êxito para extirpar a condenação do reclamante, beneficiário da Justiça gratuita, ao pagamento dos honorários de sucumbência. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-652-93.2019.5.13.0024, 8ª Turma, Relatora Ministra Dora Maria da Costa, DEJT 11/04/2022).

Todavia, após a publicação do acórdão relativo à ADI sob comento, em 3/5/2022, verifiquei que, do dispositivo do julgado, extrai-se terem prevalecido os termos do voto do Exmo. Ministro Alexandre de Moraes, que declarou a inconstitucionalidade de trechos dos arts. 790-B, caput , e 791-A, § 4º, da CLT, além da integralidade do parágrafo 4º do art. 790-B. Observe-se:

"(...) Em vista do exposto, CONHEÇO da Ação Direta e, no mérito, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido para declarar a inconstitucionalidade da expressão "ainda que beneficiária da justiça gratuita", constante do caput do art. 790-B ; para declarar a inconstitucionalidade do § 4º do mesmo art. 790-B; declarar a inconstitucionalidade da expressão "desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa", constante do § 4º do art. 791-A".

Com efeito, da atenta leitura do voto prevalecente, observa-se que o cerne da discussão reside na constitucionalidade da compensação das obrigações decorrentes da sucumbência do beneficiário de justiça gratuita com créditos obtidos em juízo, no mesmo ou em outro processo. Explicita o Exmo. Ministro Alexandre de Moraes em seu voto:

Nesse ponto, Presidente, já adianto que não entendo razoáveis os arts 790-B, § 4º, e 791-A, § 4º. Não entendo razoável a responsabilização nua e crua, sem análise se a hipossuficiência do beneficiário da justiça gratuita pelo pagamento de honorários periciais deixou ou não de existir, inclusive com créditos obtidos em outro processo. Da mesma forma, não entendo razoável e proporcional o pagamento de honorários de sucumbência pelo beneficiário da justiça gratuita, sem demonstrar-se que ele deixou de ser hipossuficiente, ou seja, essa compensação processual sem se verificar se a hipossuficiência permanece ou não. A deferência de tratamento permitida pela Constituição se baseia exatamente nessa admissão de hipossuficiência. Simplesmente entender que, por ser vencedor em um outro processo ou nesse, pode pagar a perícia, e, só por ser vencedor no processo, já o torna suficiente, autossuficiente, seria uma presunção absoluta da lei que, no meu entendimento, fere a razoabilidade e o art. 5º, XXIV .

(...)

Uma eventual vitória judicial em outro ambiente processual não descaracteriza, por si só, a condição de hipossuficiência. Não há nenhuma razão para entender que o proveito econômico apurado no outro processo seja suficiente para alterar a condição econômica do jurisdicionado , em vista da infinidade de situações a se verificar em cada caso. Nessa hipótese em que se pretende utilizar o proveito de uma ação para arcar com a sucumbência de outro processo – uma "compensação" -, o resultado prático é mitigar a sua vitória e manter a sua condição de hipossuficiência. Ora, onde está a prova de que cessou a hipossuficiência para afastar os benefícios da justiça gratuita? A forma como a lei estabeleceu a incidência de encargos quanto a honorários de perícia e da sucumbência - como bem destacado pelo Ministro EDSON FACHIN em seu voto divergente, e também no parecer da Procuradoria-Geral da República - feriu a razoabilidade e a proporcionalidade e estipulam restrições inconstitucionais, inclusive pela sua forma absoluta de aplicação da garantia da gratuidade judiciária aos que comprovam insuficiência de recurso. Então, Presidente, entendo inconstitucionais os arts. 790-B, caput e o § 4º, 791-A, § 4º. Nesse aspecto, julgo procedente a ação por serem inconstitucionais.

Trata-se, a propósito, da extensão do próprio pedido formulado pela Procuradoria-Geral da República em sua petição inicial naquela ação, onde se lê, verbis :

Requer que, ao final, seja julgado procedente o pedido, para declarar inconstitucionalidade das seguintes normas, todas introduzidas pela Lei 13.467, de 13 de julho de 2017: 

a) da expressão "ainda que beneficiária da justiça gratuita", do caput, e do § 4 o do art. 790-B da CLT;

b) da expressão "desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa," do § 4 o do art. 791-A da CLT;

Aliás, os embargos de declaração opostos a essa decisão pelo Advogado-Geral da União foram rejeitados em acórdão publicado no DJE em 29/6/2022, havendo o Ministro Relator, Alexandre de Moraes, consignado:

"Veja-se que, em relação aos arts. 790-B, caput e § 4º, e 79-A, § 4º, da CLT, parcela da Ação Direta em relação a qual a compreensão majoritária da CORTE foi pela PROCEDÊNCIA, há perfeita congruência com os pedido formulado pelo Procurador-Geral da República (doc. 1, pág. 71-72), assim redigido:

Requer que, ao final, seja julgado procedente o pedido, para declarar inconstitucionalidade das seguintes normas, todas introduzidas pela Lei 13.467, de 13 de julho de 2017:

a) da expressão "ainda que beneficiária da justiça gratuita", do caput, e do § 4 o do art. 790-B da CLT;

b) da expressão "desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa," do § 4 o do art. 791-A da CLT;

c) da expressão "ainda que beneficiário da justiça gratuita," do § 2 o do art. 844 da CLT.

Assim, seria estranho ao objeto do julgamento tratar a constitucionalidade do texto restante do caput do art. 790-B e do § 4º do art. 791-A, da CLT. Mesmo os Ministros que votaram pela procedência total do pedido – Ministros EDSON FACHIN, RICARDO LEWANDOWSKI e ROSA WEBER – declararam a inconstitucionalidade desses dispositivos na mesma extensão que consta da conclusão do acórdão.

Assim, a pretexto de evidenciar contradição do acórdão embargado, as ponderações lançadas pelo Embargante traduzem, em rigor, mero inconformismo com a decisão tomada, pretendendo rediscutir o que já foi decidido ou inovar no objeto do julgamento, objetivo que, como sabido, é alheio às hipóteses de cabimento típicas dos embargos declaratórios."

Didaticamente, julgados inconstitucionais os excertos indicados, os dispositivos de lei permanecem gramaticalmente inteligíveis e passam a vigorar com a seguinte redação, em termos objetivos, já introduzidas elipses:

Art. 790-B. A responsabilidade pelo pagamento dos honorários periciais é da parte sucumbente na pretensão objeto da perícia (...).

§ 4º Somente no caso em que o beneficiário da justiça gratuita não tenha obtido em juízo créditos capazes de suportar a despesa referida no caput, (...), a União responderá pelo encargo.

(...)

Art. 791-A. Ao advogado, ainda que atue em causa própria, serão devidos honorários de sucumbência, fixados entre o mínimo de 5% e o máximo de 15% sobre o valor que resultar da liquidação da sentença, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa.

(...) § 4º Vencido o beneficiário da justiça gratuita, (...), as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário.

Assim, a inteligência do precedente firmado pelo Supremo Tribunal Federal não autoriza a exclusão da possibilidade de que, na Justiça do Trabalho, com o advento da Lei 13.467/17, o beneficiário da justiça gratuita tenha obrigações decorrentes da sucumbência que restem sob condição suspensiva de exigibilidade; o que o Supremo Tribunal Federal reputou inconstitucional foi a presunção legal, iure et de iure , de que a obtenção de créditos na mesma ou em outra ação, por si só, exclua a condição de hipossuficiente do devedor. 

Vedada, pois, é a compensação automática insculpida na redação original dos dispositivos; prevalece, contudo, a possibilidade de que, no prazo de suspensão de exigibilidade, o credor demonstre a alteração do estado de insuficiência de recursos do devedor, por qualquer meio lícito, circunstância que autorizará a execução das obrigações decorrentes da sucumbência.

Assim, os honorários de advogado sucumbenciais devidos pela parte reclamante ficam sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executados se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que os certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos do devedor, que, contudo, não poderá decorrer da mera obtenção de outros créditos na presente ação ou em outras. Passado esse prazo, extingue-se essa obrigação do beneficiário.

Em termos práticos, o Supremo Tribunal Federal igualou a disciplina de execução de obrigações decorrentes da sucumbência no processo do trabalho ao processo comum, com a singular diferença de que, neste, a condição suspensiva de exigibilidade das obrigações perdura por cinco anos (art. 98, § 3º, do CPC), e não por dois.

Nesse sentido, inclusive, entende a Quinta Turma:

"I. AGRAVO DO RECLAMANTE. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA REGIDO PELA LEI 13.467/2017. HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA. RECLAMANTE BENEFICIÁRIO DA JUSTIÇA GRATUITA. ARTIGO 791-A, § 4º, DA CLT. INCONSTITUCIONALIDADE. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA. Em razão da recente decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal na ADI 5766, em 20/10/2021, na qual foi declarada a inconstitucionalidade do art. 791-A, § 4º, da CLT, torna-se impositivo o provimento do presente agravo, em razão da possível violação do artigo 5º, LXXIV, da CF. Agravo provido. II. RECURSO DE REVISTA DA RECLAMADA. INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI 13.467/2017. HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA. RECLAMANTE BENEFICIÁRIO DA JUSTIÇA GRATUITA. ARTIGO 791-A, § 4º, DA CLT. INCONSTITUCIONALIDADE. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA CARACTERIZADA. O Tribunal Regional decidiu que, por ser a Reclamante beneficiária da justiça gratuita, deve ser suspensa a exigibilidade da cobrança dos honorários sucumbenciais que lhe foram atribuídos, independentemente da obtenção de créditos em Juízo. A ação foi proposta em 28/12/2018, portanto, após a vigência da Lei 13.467/2017. Na sessão de julgamento do dia 20/10/2021, o Tribunal Pleno do STF, julgou a ADI 5766, declarando inconstitucionais os artigos 790-B, caput, e § 4º, e 791-A, § 4º, da CLT. Nesse contexto, em face da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal, é devida a suspensão da exigibilidade do pagamento dos honorários sucumbenciais. Assim, deve ser mantida a decisão regional em que determinada a suspensão do pagamento dos honorários de sucumbência. Recurso de revista não conhecido" (Ag-RR-20742-75.2018.5.04.0811, 5ª Turma, Relator Ministro Douglas Alencar Rodrigues, DEJT 29/04/2022).

No mais, verifica-se que a Suprema Corte, mediante análise de reclamações constitucionais propostas por reclamantes, beneficiários da justiça gratuita, acerca da extensão do julgamento proferido na ação direta supracitada, tem, em obter dictum , reforçado essa fundamentação:

Reclamação Constitucional . Alegado descumprimento do quanto decidido pelo STF nas ADI’s 2.418 e  5.766 . Inexigibilidade dos honorários de sucumbência devidos por beneficiário da justiça gratuita. Ato reclamado que indefere penhora de créditos obtidos em processo diverso, tendo em vista o julgamento da ADI  5.766 . Fase de execução. Ausente modulação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade. Aplicação imediata. Não verificada afronta aos paradigmas apontados. Negativa de seguimento. Vistos etc. (...)

4. A seu turno, ao julgamento da ADI 5.766, esta Suprema Corte declarou, por maioria, a inconstitucionalidade dos arts. 790-B, caput e § 4º, e 791-A, § 4º, da Consolidação das Leis do Trabalho, que exigiam a cobrança de honorários periciais e sucumbenciais do beneficiário da justiça gratuita.

O Plenário assentou, também por maioria, a constitucionalidade do art. 844, § 2º, da CLT (ADI 5.766, Rel. Min. Roberto Barroso, Redator para o acórdão Min. Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, Sessão de 20.10.2021, acórdão pendente de publicação).

Desse modo, a responsabilidade pelo pagamento dos honorários periciais cabe à parte sucumbente, sendo referidas despesas suportadas pela União se a parte for beneficiária da justiça gratuita.

Já no que diz com os honorários de sucumbência, restou mantida a suspensão da exigibilidade do pagamento da verba pelo prazo de dois anos, afastada a possibilidade de utilização de créditos obtidos em juízo, em processo diverso, capazes de suportar a despesa.

Importante registrar que a decisão proferida na ADI 5.766 tem aplicação imediata, ausente modulação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade.

(Reclamação nº 51063 Relator(a): Min. ROSA WEBER Julgamento: 17/12/2021 Publicação: 10/01/2022)

DECISÃO  RECLAMAÇÃO. CONSTITUCIONAL . ALEGADO DESCUMPRIMENTO DA DECISÃO PROFERIDA NA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N.  5.766 : INOCORRÊNCIA. EXECUÇÃO DE COISA JULGADA: IMPOSSIBILIDADE DE REDISCUSSÃO EM  RECLAMAÇÃO   DE MATÉRIA TRANSITADA EM JULGADO: SÚMULA N. 734 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.  RECLAMAÇÃO   À QUAL SE NEGA SEGUIMENTO. Relatório 1.  Reclamação , com requerimento de medida liminar, ajuizada por Sergio Buba, em 14.4.2022, contra decisão do Juízo da Vara do Trabalho de Curitibanos/SC no Processo n. 0000291-49.2019.5.12.0042, pela qual teria sido desrespeitada a decisão proferida na Ação Direta de Inconstitucionalidade n.  5.766 /DF.

(...)

Na espécie em exame, o Juízo da Vara do Trabalho de Curitibanos/SC determinou a execução dos honorários advocatícios de sucumbências aos seguintes fundamentos: a) existência de coisa julgada antes da decisão proferida na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 5.766/DF, b) comprovada a modificação da situação que ensejou a concessão dos benefícios da justiça gratuita: (...).

Essa decisão não descumpre aquela proferida pelo Supremo Tribunal Federal na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 5.766/DF, pois não se tem a presunção da perda da condição de hipossuficiência econômica, mas a comprovação da modificação da capacidade econômica do beneficiário da gratuidade de justiça.

(...).

Pelo exposto, nego seguimento à presente reclamação (§ 1º do art. 21 e parágrafo único do art. 161 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal), prejudicada a medida liminar requerida.

(Reclamação nº 52870/SC Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA Julgamento: 19/04/2022 Publicação: 20/04/2022)

Na presente hipótese, a Corte de origem, tendo em vista a revogação da gratuidade da justiça concedida ao reclamante, entendeu estar prejudicada a análise da alegação de inconstitucionalidade do art. 791-A, §4º, da CLT.

Ocorre que de acordo com a jurisprudência dominante desta Corte, a aplicação literal do art. 791-A, § 4º, da CLT está em desconformidade com o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal.

Ante o exposto, CONHEÇO do recurso de revista por ofensa ao art. 5º, LXXIV, da Constituição da República.

2. MÉRITO

2.1. JUSTIÇA GRATUITA. REQUISITOS. DECLARAÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. SÚMULA 463 DO TST

Conhecido o recurso de revista por contrariedade à Súmula 463, I, do TST, DOU-LHE PROVIMENTO para conceder o benefício da justiça gratuita ao reclamante, e isentá-lo do pagamento de custas processuais.

2.2. HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS. BENEFICIÁRIO DA JUSTIÇA GRATUITA. ART. 791-A, § 4º, DA CLT. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Nº 5.766/DF. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA RECONHECIDA

Conhecido o recurso de revista, por violação do art. 5º, LXXIV, da Constituição da República, DOU-LHE PROVIMENTO para, nos termos da jurisprudência fixada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da ADI 5.766/DF, determinar que os honorários de advogado sucumbenciais devidos pela parte reclamante ficam sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executados se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que os certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos do devedor, que, contudo, não poderá decorrer da mera obtenção de outros créditos na presente ação ou em outras. Passado esse prazo, extingue-se essa obrigação do beneficiário.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer do recurso de revista quanto aos temas "Assistência Judiciária Gratuita" , por contrariedade à Súmula 463, I, do TST e "Honorários Sucumbenciais" , por violação ao art. 5º, LXXIV, da Constituição da República, e, no mérito, dar-lhe provimento para conceder o benefício da justiça gratuita ao reclamante, e isentá-lo do pagamento de custas processuais e, nos termos da jurisprudência fixada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da ADI 5.766/DF, determinar que os honorários de advogado sucumbenciais devidos pela parte reclamante ficam sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executados se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que os certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos do devedor, que, contudo, não poderá decorrer da mera obtenção de outros créditos na presente ação ou em outras. Passado esse prazo, extingue-se essa obrigação do beneficiário.

Brasília, 9 de novembro de 2022.

Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)

ALBERTO BASTOS BALAZEIRO

Ministro Relator