A C Ó R D Ã O
(SDI-2)
GMABL/ gc
RECURSO ORDINÁRIO EM AÇÃO RESCISÓRIA INTERPOSTO ANTERIORMENTE À VIGÊNCIA DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. APLICABILIDADE DO CPC DE 1973. I - Não obstante a vigência do novo Código de Processo Civil tenha iniciado no dia 18/03/2016, conforme definido pelo plenário do Superior Tribunal de Justiça e do Conselho Nacional de Justiça, aplicam-se ao presente feito as disposições contidas no CPC de 1973. II - Isso porque, embora as normas processuais tenham aplicação imediata aos processos pendentes, não têm efeito retroativo, por conta da regra de direito intertemporal, que as preside, segundo a qual tempus regit actum . III - Aqui vem a calhar o que escreve Humberto Theodoro Júnior, págs. 26/27, do seu Processo de Conhecimento, Vol. I, no sentido de que "mesmo quando a lei nova atinge um processo em andamento, nenhum efeito tem sobre os fatos ou atos ocorridos sob o império da lei revogada. Alcança o processo no estado em que se achava no momento de sua entrada em vigor, mas respeita os efeitos dos atos já praticados, que continuam regulados pela lei do tempo em que foram consumados". IV - E conclui, salientando, com propriedade, que "as leis processuais são de efeito imediato frente aos feitos pendentes, mas não são retroativas, pois só os atos posteriores à sua entrada em vigor é que se regularão por seus preceitos. Tempus regit actum ". DEPÓSITO PRÉVIO. RECOLHIMENTO EM GUIA IMPRÓPRIA. INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 31/2007 DO TST. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSTRUMENTALIDADE DOS ATOS PROCESSUAIS. I - Analisando a guia GFIP, utilizada pela autora para efetuar o depósito prévio, ainda que não seja o modelo previsto pela Instrução Normativa 31/2007 do TST, vê-se que daquela constara o número do processo ao qual se refere o acórdão rescindendo, os nomes do autor e do réu da ação rescisória, o código de recolhimento, e a autenticação bancária, sendo possível extrair, ainda, a compatibilidade da data de seu recolhimento com a do ajuizamento da rescisória. II - A partir dessa digressão factual, percebe-se que a utilização de guia imprópria não se revela suficiente para infirmar a higidez formal do respectivo recolhimento, na conformidade da norma paradigmática do artigo 244 do CPC, na qual se abre para o Magistrado a possibilidade de avaliar se a ausência da guia de depósito judicial trabalhista compromete, ou não, a prática do ato processual. III - Nesse sentido, o princípio da instrumentalidade dos atos processuais, instituído no artigo 244 do CPC, preceitua que nenhuma nulidade seja declarada sem que exista um efetivo prejuízo. IV - Aliás, esse é o ensinamento ministrado por Cândido Rangel Dinamarco: "Não basta afirmar o caráter instrumental do processo sem praticá-lo, ou seja, sem extrair desse princípio fundamental e da sua afirmação os desdobramentos teóricos e práticos convenientes. Pretende-se que em torno do princípio da instrumentalidade do processo se estabeleça um novo método do pensamento do processualista e do profissional do foro. O que importa acima de tudo é colocar o processo no seu devido lugar, evitando os males do exagerado processualismo e ao mesmo tempo cuidar de predispor o processo e o seu uso de modo tal que os objetivos sejam convenientemente conciliados e realizados tanto quanto possível. O processo há de ser, nesse contexto, instrumento eficaz para o acesso à ordem jurídica justa" (A instrumentalidade do processo, Malheiros, 2001). V - Nessa esteira, saliente-se, também, o repertório doutrinário de Nelson Nery Junior e Rosa Maria Andrade Nery, com dicção assim articulada: "O juiz deve desapegar-se do formalismo, procurando agir de modo a propiciar às partes o atingimento da finalidade do processo. Mas deve obedecer às formalidades do processo, garantia do estado de direito (...) O Código adotou o princípio da instrumentalidade das formas, segundo o qual que importa é a finalidade do ato e não ele em si mesmo considerado. Se puder atingir sua finalidade, ainda que irregular na forma, não se deve anulá-lo" (Código de Processo Civil comentado, RT, 2003, pp. 618 e 620). VI – Considerando o princípio da instrumentalidade dos atos processuais, insculpido no art. 244 do CPC, é possível, assim, reconhecer atendida a exigência de depósito prévio efetuado por meio de guia GFIP, visto que apto para a averiguação do cumprimento do requisito de admissibilidade atinente ao preparo da rescisória e seu regular desenvolvimento, devendo ser afastada sua deserção. VII – Recurso ordinário a que se dá provimento.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Ordinário n° TST-RO-679-88.2010.5.05.0000 , em que é Recorrente TETRA PAK LTDA. e Recorrido ESPÓLIO DE JADER GAMA DE ALMEIDA .
O TRT da 5ª Região, pelo acórdão de fls. 665/671 (doc.seq.1), extinguiu o processo, sem resolução de mérito, nos termos dos artigos 267, I, 295, I, 488, II, e 490, I e II, do CPC, em razão da inadequação da guia utilizada para realização do depósito prévio.
A Autora interpôs recurso ordinário às fls. 677/687 (doc.seq.1), sustentando que o depósito prévio foi realizado em valor superior ao devido, e que, por isso, não há que se falar em inobservância do artigo 836 da CLT pela mera utilização da Guia de Recolhimento do FGTS e Informações à Previdência Social(GFIP) .
Contrarrazões foram apresentadas, nas quais arguiu-se preliminares de deserção e decadência.
Dispensada a remessa dos autos à Procuradoria Geral do Trabalho.
É o relatório.
V O T O
O recurso ordinário foi interposto em 21/03/2012 contra o acórdão que julgou improcedente a ação rescisória, publicado em 15/03/2012 .
Não obstante a vigência do novo Código de Processo Civil tenha iniciado no dia 18/03/2016, conforme definido pelo plenário do Superior Tribunal de Justiça e do Conselho Nacional de Justiça, aplicam-se ao presente feito as disposições contidas no CPC de 1973.
Isso porque, embora as normas processuais tenham aplicação imediata aos processos pendentes, não têm efeito retroativo, por conta da regra de direito intertemporal, que as preside, segundo a qual tempus regit actum .
Aqui vem a calhar o que escreve Humberto Theodoro Júnior, págs. 26/27, do seu Processo de Conhecimento, Vol. I, no sentido de que " mesmo quando a lei nova atinge um processo em andamento, nenhum efeito tem sobre os fatos ou atos ocorridos sob o império da lei revogada. Alcança o processo no estado em que se achava no momento de sua entrada em vigor, mas respeita os efeitos dos atos já praticados, que continuam regulados pela lei do tempo em que foram consumados ".
E conclui, salientando, com propriedade, que " as leis processuais são de efeito imediato frente aos feitos pendentes, mas não são retroativas, pois só os atos posteriores à sua entrada em vigor é que se regularão por seus preceitos. Tempus regit actum " .
Feitas essas considerações, não se sustenta a preliminar de " irregularidade da correção monetária" suscitada nas contrarrazões, sob o argumento de que o cálculo do depósito prévio fora efetuado apenas pela TR, ao invés de se aplicar o índice INPC/IBGE.
Pois bem, não é demais lembrar que, na conformidade do artigo 836 da CLT, com a redação dada pela Lei nº 11.495/2007, o ajuizamento da ação rescisória sujeita-se ao depósito prévio de 20% (vinte por cento) do valor da causa, salvo prova de miserabilidade jurídica do autor.
A Instrução Normativa nº 31/2007, ao regulamentar a forma de realização do depósito prévio prevista no referido dispositivo da CLT, estabelece em seu artigo 2º que o valor da causa da ação rescisória que vise desconstituir decisão da fase de conhecimento corresponderá, no caso de procedência total ou parcial, ao valor arbitrado à condenação e, no caso de improcedência, ao valor dado à causa no processo originário ou fixado pelo juiz.
Já o artigo 4º da mesma Instrução Normativa determina que "O valor da causa da ação rescisória, quer objetive desconstituir decisão da fase de conhecimento ou decisão da fase de execução, será reajustado pela variação cumulada do INPC do IBGE até a data do seu ajuizamento" .
Com efeito, vê-se que a recorrente cumpriu o disposto nos artigos 2.º, II, e 4.º, da Instrução Normativa em epígrafe, tanto que o Regional registrara ter a autora efetuado o recolhimento do depósito prévio a maior, no valor de R$5.000,00, quando este seria de R$ 3.598,03, na data do ajuizamento da ação rescisória.
Rejeitada a referida preliminar, verifica-se que o Regional extinguiu o processo, sem resolução de mérito, em virtude de o depósito realizado não ter sido feito de acordo com a IN 31/2007 do TST, uma vez que efetuado na conta vinculada do FGTS. Para tanto, consignou os seguintes fundamentos:
(...)
Por consequência, o depósito de fl. 129, na quantia de R$ 5.000,00, foi realizado em valor superior ao devido. Corrijo, de ofício, o valor atribuído à causa para R$ 17.990,16.
Ocorre que para realização do mencionado depósito prévio, a Requerente utilizou guia de recolhimento do FGTS e Informações à Previdência Social (GFIP), em desacordo com a supracitada IN 31/2007, a qual em seu art. 1º prevê:
‘O depósito prévio em ação rescisória de que trata o art. 836 da CLT, com redação dada pela Lei nº 11.495, de 22 de junho de 2007, deverá ser realizado na forma preconizada na Instrução Normativa nº 21 desta Corte, observando-se as seguintes peculiaridades quanto ao preenchimento da guia de acolhimento de depósito judicial:
1º I - nos campos relativos à identificação do processo deverão ser informados os dados do processo em que foi proferida a decisão rescindenda;
2º II - o campo "Tipo de Depósito" deverá ser preenchido com o número 1 (primeiro depósito), ainda que outros depósitos judiciais tenham sido efetuados no processo originário ;
3º III - o campo "Motivo do Depósito" deverá ser preenchido com o número 4 (Outros) . (grifei)
Por sua vez, a IN 21/2002 do c. TST: "Estabelece, na Justiça do Trabalho, modelo único de guia de depósito judicial para pagamentos, garantia de execução, encargos processuais e levantamento de valores, excetuados os depósitos recursais.", determina que, com exceção dos depósitos recursais, todos os demais recolhimentos deverão ser realizados em guia de depósito judicial trabalhista, inclusive constando em seu anexo I o modelo adequado.
Note-se, inclusive, que na guia GFIP – utilizada pela Acionante - não há campo para preenchimento dos itens "tipo do depósito" e "motivo do depósito", conforme mencionado pelos incisos II e III do art. 1º da IN 31/2007, acima transcrito, estando, portanto, o recolhimento do depósito prévio irregular.
(...)
Não verifico qualquer inconstitucionalidade do art. 836 da CLT e das disposições da IN 31/2007, restando rechaçadas as alegações na vestibular, no particular.
Assim, a Vestibular apresenta irregularidade insanável, o que impede seu conhecimento.
ACOLHO a preliminar suscitada, INDEFIRO A INICIAL e EXTINGO A AÇÃO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, nos termos dos arts. 267, inciso IV, 295, inciso I, c/c arts. 488, inciso II e 490, incisos I e II, todos do CPC.
Inconformada, a autora sustenta que não há que se falar em inobservância do artigo 836 Consolidado pela mera utilização da Guia de Recolhimento do FGTS e Informações à Previdência Social (GFIP) , uma vez que é possível a identificação das partes, assim como do presente processo e do motivo do depósito. Cita o artigo 5º, incisos II, XXXV e LV, da Constituição Federal, 422 do Código Civil, 126, 284, caput e parágrafo único, e 511, § 2º, do CPC.
Pois bem, a Instrução Normativa nº 31 deste Tribunal regulamenta a forma de realização do depósito prévio em ação rescisória de que trata o art. 836 da CLT, com redação dada pela Lei nº 11.495, de 22 de junho de 2007. O seu art. 1º dispõe, in verbis :
Art. 1º O depósito prévio em ação rescisória de que trata o art. 836 da CLT, com redação dada pela Lei nº 11.495, de 22 de junho de 2007, deverá ser realizado na forma preconizada na Instrução Normativa nº 21 desta Corte , observando-se as seguintes peculiaridades quanto ao preenchimento da guia de acolhimento de depósito judicial:
I - nos campos relativos à identificação do processo deverão ser informados os dados do processo em que foi proferida a decisão rescindenda;
II - o campo "Tipo de Depósito" deverá ser preenchido com o número 1 (primeiro depósito), ainda que outros depósitos judiciais tenham sido efetuados no processo originário;
III - o campo "Motivo do Depósito" deverá ser preenchido com o número 4 (Outros).
A Instrução Normativa 21/2002 desta Corte, no item I, por sua vez, estabelece " modelo único de guia de depósito judicial para pagamentos, garantia de execução, encargos processuais e levantamento de valores, excetuados os depósitos recursais ", que deverão ser recolhidos em guia de depósito judicial trabalhista, conforme modelo constante de seu anexo I.
Compulsando os autos, constata-se que a recorrente utilizou guia de recolhimento do FGTS e Informações à Previdência Social (GFIP), em desacordo com a Instrução Normativa nº 31 do TST. E que, por esta razão, o Regional extinguiu o processo, sem resolução de mérito, ao fundamento de que, não obstante o valor depositado tenha sido efetuado em importe maior ao devido, a utilização da guia GFIP está em desalinho com a referida Instrução Normativa, restando inobservado o artigo 836 da CLT.
No entanto, embora a autora não tenha utilizado o modelo da guia prevista pela Instrução Normativa 31/2007 do TST para efetuar o depósito prévio, o certo é que, no preenchimento desta, indicara o número do processo ao qual se refere o acórdão rescindendo, os nomes do autor e do réu da ação rescisória, o código de recolhimento, e a autenticação bancária, sendo possível constatar, ainda, a compatibilidade da data de seu recolhimento com a do ajuizamento da rescisória .
A partir dessa digressão factual, percebe-se que a utilização de guia imprópria não se revela suficiente para infirmar a higidez formal do respectivo recolhimento, na conformidade da norma paradigmática do artigo 244 do CPC, na qual se abre para o Magistrado a possibilidade de avaliar se a ausência da guia de depósito judicial trabalhista compromete, ou não, a prática do ato processual.
Nesse sentido, o princípio da instrumentalidade dos atos processuais, instituído no artigo 244 do CPC, preceitua que nenhuma nulidade seja declarada sem que exista um efetivo prejuízo. Aliás, esse é o ensinamento ministrado por Cândido Rangel Dinamarco:
"Não basta afirmar o caráter instrumental do processo sem praticá-lo, ou seja, sem extrair desse princípio fundamental e da sua afirmação os desdobramentos teóricos e práticos convenientes. Pretende-se que em torno do princípio da instrumentalidade do processo se estabeleça um novo método do pensamento do processualista e do profissional do foro. O que importa acima de tudo é colocar o processo no seu devido lugar, evitando os males do exagerado processualismo e ao mesmo tempo cuidar de predispor o processo e o seu uso de modo tal que os objetivos sejam convenientemente conciliados e realizados tanto quanto possível. O processo há de ser, nesse contexto, instrumento eficaz para o acesso à ordem jurídica justa" (A instrumentalidade do processo, Malheiros, 2001).
Nessa esteira, saliente-se, também, o repertório doutrinário de Nelson Nery Junior e Rosa Maria Andrade Nery, com dicção assim articulada:
"O juiz deve desapegar-se do formalismo, procurando agir de modo a propiciar às partes o atingimento da finalidade do processo. Mas deve obedecer às formalidades do processo, garantia do estado de direito (...) O Código adotou o princípio da instrumentalidade das formas, segundo o qual que importa é a finalidade do ato e não ele em si mesmo considerado. Se puder atingir sua finalidade, ainda que irregular na forma, não se deve anulá-lo" (Código de Processo Civil comentado, RT, 2003, pp. 618 e 620).
Considerando o princípio da instrumentalidade dos atos processuais, insculpido no art. 244 do CPC, é possível, assim, reconhecer atendida a exigência de depósito prévio efetuado por meio de guia GFIP, visto que apto para a averiguação do cumprimento do requisito de admissibilidade atinente ao preparo da rescisória e seu regular desenvolvimento, devendo ser afastada sua deserção.
A propósito, vem a calhar os dois precedentes abaixo, proferidos pela SBDI-II do TST:
AGRAVO. AÇÃO RESCISÓRIA. DEPÓSITO PRÉVIO. FORMA DE RECOLHIMENTO. 1 - Considerando o princípio da instrumentalidade dos atos processuais, insculpido no art. 244 do CPC, o comprovante bancário de recolhimento alusivo ao depósito prévio, não obstante não seja aquele previsto na Instrução Normativa 31/2007 do TST, pode ser considerado apto para a averiguação do cumprimento do requisito de admissibilidade atinente ao preparo, quando consigna valor a maior do que o devido, indica o número do processo ao qual se refere a decisão rescindenda, além de constar o nome e o número do CPF do autor. 2 - Precedentes. Agravo conhecido e provido. (TST-Ag-AR-6704-19.2014.5.00.0000, Rel. Min. Delaíde Miranda Arantes, SBDI-II, DEJT: 12/12/2014)
"RECURSO ORDINÁRIO EM AÇÃO RESCISÓRIA. DEPÓSITO PRÉVIO. DESERÇÃO. PREENCHIMENTO INCORRETO DA GUIA. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DO NÚMERO DO PROCESSO EM QUE PROFERIDA A DECISÃO RESCINDENDA. A forma é a segurança dos atos processuais, normalmente solenes, em função dos requisitos a que expostos pela Lei. Ocorre que a razoabilidade não pode abandonar o legislador e, por razões mais fortes, o aplicador do direito, valorizando-se um padrão, quando o ato em si resta, manifestamente, concretizado. Inquestionável a efetividade do recolhimento do depósito prévio, não se mostra relevante defeito de formalização da guia própria, quando, não detectada má-fé, faz-se possível a constatação de que o pagamento se refere à ação em curso. Recurso ordinário conhecido e provido." (RO-841-83.2010.5.05.0000, Rel. Min. Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, DEJT 24/5/2013)
Afastado o motivo para extinção do processo adotado pelo Regional, tampouco se configura a decadência alegada em contrarrazões, suscitada com base nos itens II e III da Súmula 100 do TST.
Com efeitos, não há maiores dificuldades em identificar o termo inicial do prazo de decadência do art. 495 do CPC, na hipótese de o Tribunal conhecer e julgar o recurso da parte sucumbente, posto que o será, no âmbito do processo trabalhista, ao fim do octídio legal, época em que terão se consumado as coisas julgadas formal e material.
A dúvida, ao contrário, cinge-se à hipótese de o juízo a quo não conhecer dos embargos declaratórios por intempestivos, invocada amiúde para sustentar a tese de o termo inicial remontar ao último dia do prazo recursal do acórdão relativo ao recurso ordinário, isto é, 25/01/2007.
Embora seja inerente à ação rescisória a desconstituição da coisa julgada material, nem sempre essa ocorre simultaneamente com a coisa julgada formal, caracterizada pelo fato de não caber, ou não mais caber, recurso contra a decisão definitiva.
Sendo assim, é de rigor identificar a ocorrência da coisa julgada formal nos casos de não conhecimento do recurso, a fim de bem se posicionar sobre a fluência do prazo de decadência para propositura da ação rescisória.
Ciente de que essa se materializa quando da sentença não cabe ou já não cabe mais qualquer recurso, vem à mente, de pronto, a irrecorribilidade das decisões proferidas nas causas de alçada e a interposição de recurso intempestivo ou incabível.
No primeiro caso, a coisa julgada formal terá coincidido com a data de publicação da sentença e no segundo, com o último dia do prazo do recurso cabível, erigidos uma e outro em termo inicial do prazo de decadência, insuscetível de ser postergado pela interposição de agravo de instrumento contra o despacho que tenha denegado seguimento ao recurso eventualmente manifestado, visto que, segundo ensina Moacyr Amaral Santos, nessas circunstâncias eles são considerados inexistentes.
Nesse sentido é o inciso III da Súmula nº 100 desta Corte, segundo o qual "Salvo se houver dúvida razoável, a interposição de recurso intempestivo ou a interposição de recurso incabível não protrai o termo inicial do prazo decadencial" .
Feitas essas considerações, verifica-se que o acórdão rescindendo (TRT-RO-32872/06) foi proferido em 16/01/2007, tendo sido interpostos embargos declaratórios, os quais não foram conhecidos por intempestivos, em 27 de fevereiro do mesmo ano.
O recurso de revista, apresentado em 06/03/2007, não logrou admissibilidade, nos termos da Súmula 126 do TST, e, em 05/09/2008, a Terceira Turma desta Corte negou provimento ao agravo de instrumento da recorrente, mantendo os fundamentos do despacho denegatório do recurso de revista, que transitou em julgado no dia 23/09/2008, conforme certidão de fl. 263(doc.seq.1).
Constatado que os embargos declaratórios, interpostos contra o acórdão regional (acórdão rescindendo), não foram conhecidos por intempestivos, o recurso de revista que se seguiu estaria intempestivo, por não ter havido interrupção do prazo recursal. Ocorre que o Vice-Presidente do TRT da 5ª Região, ao fazer o primeiro juízo de admissibilidade do recurso de revista, não detectou a intempestividade deste, muito menos a Terceira Turma desta Corte, quando do exame do agravo de instrumento.
Dessa forma, não cabe a este relator, para declarar eventual decadência da ação rescisória, rever o pressuposto extrínseco de admissibilidade do recurso de revista, consubstanciado na tempestividade. Isso porque, tal procedimento afrontaria tanto as regras de distribuição de competência funcional, como o princípio do isolamento dos atos processuais.
Convém registrar que o recorrido, naquele momento processual oportuno, não arguiu a intempestividade do recurso de revista, seja nas contrarrazões, seja na contraminuta do agravo de instrumento, operando-se a preclusão.
Assim, qualquer declaração de intempestividade do recurso de revista nos autos da ação rescisória violaria, também, os princípios do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório, uma vez que surpreenderia a autora, que já teve decisão de mérito transitada em julgada.
Feito esse histórico factual, depara-se com a inaplicabilidade da orientação contida na Súmula nº 100, itens II e III, do TST, sendo que, para efeito de contagem do prazo decadencial e constituição da coisa julgada material, considera-se o exaurimento do prazo para interposição de recurso da decisão que negou provimento ao agravo de instrumento.
E uma vez que, consoante se infere da certidão de trânsito em julgado, este ocorreu 23/09/2008, infirma-se a decadência da ação rescisória ajuizada em 27/07/2010, porque respeitado o biênio do art. 495 do CPC.
Nesse sentido é o precedente abaixo, oriundo desta SBDI-II, in verbis :
RECURSO ORDINÁRIO EM AÇÃO RESCISÓRIA - DECADÊNCIA - INTEMPESTIVIDADE DO RECURSO ORDINÁRIO INTERPOSTO NO PROCESSO PRINCIPAL - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO OPOSTOS CONTRA SENTENÇA CONSIDERADOS INTEMPESTIVOS - IMPOSSIBILIDADE DE SE REAPRECIAR OS PRESSUPOSTOS EXTRÍNSECOS DE ADMISSIBILIDADE DOS ACLARATÓRIOS OPOSTOS CONTRA A SENTENÇA - INAPLICABILIDADE DA SÚMULA Nº 100, III, DESTA CORTE. Na presente hipótese, para efeito de contagem do prazo decadencial, verifica-se que não é o caso de aplicação da Súmula nº 100, III, do TST que segue no sentido de que "Salvo se houver dúvida razoável, a interposição de recurso intempestivo ou a interposição de recurso incabível não protrai o termo inicial do prazo decadencial". Isso porque, o fato de o Tribunal Regional, nos autos principais, para reconhecer a intempestividade do recurso ordinário, ter adentrado na análise de pressuposto de admissibilidade que refoge da sua competência e surpreendido a parte com uma declaração de intempestividade dos embargos de declaração conhecidos e analisados pela instância inferior é motivo para protrair o termo inicial da contagem do prazo decadencial, sob pena de se negar a parte o pleno acesso à jurisdição nestes autos e de afrontar os princípios da ampla defesa e do contraditório. Dessa forma, considerando que há nos autos certidão informando que na data de 10/12/2012 transcorreu o prazo legal sem interposição de recurso, o trânsito em julgado da decisão rescindenda se deu em 11/12/2012, de modo que a ação rescisória ajuizada em 30/9/2014 encontra-se dentro do prazo decadencial do art. 495 do CPC. Recurso ordinário provido. (TST-RO- 443-70.2014.5.06.0000; Data de Julgamento: 16/02/2016; Relator Ministro: Luiz Philippe Vieira de Mello Filho; Subseção II Especializada em Dissídios Individuais; Data de Publicação: DEJT 19/02/2016).
Esse, também, é o entendimento da SBDI-I desta Corte, que dispõe:
RECURSO DE EMBARGOS REGIDO PELA LEI 11.496/2007. AGRAVO DE INSTRUMENTO. INTEMPESTIVIDADE. CONSTATAÇÃO, DE OFÍCIO, PELA TURMA DO TST, CONSIDERANDO A INTEMPESTIVIDADE DOS EMBARGOS DECLARATÓRIOS OPOSTOS PERANTE O TRT, ANTE A AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE FERIADO LOCAL. Hipótese em que a Turma do TST com amparo na Súmula 385 declarou, de ofício, a intempestividade do agravo de instrumento obreiro, após constatar a intempestividade dos embargos declaratórios opostos perante o Tribunal Regional, ante a ausência de comprovação de feriado local, apesar de aquela Corte haver conhecido dos aludidos declaratórios. Cabível o recurso de embargos, nos termos da Súmula 353, alínea "a", do TST. A jurisprudência desta Subseção Especializada firmou-se no sentido de não caber ao TST, de ofício, a revisão da admissibilidade de recurso interposto e já julgado pelo Tribunal Regional, sob pena de afronta ao princípio do isolamento dos atos processuais que fundamenta a preclusão quanto ao preenchimento dos pressupostos de admissibilidade dos aludidos embargos declaratórios. Ressalte-se que a parte recorrida não arguiu em momento algum a intempestividade de quaisquer dos apelos - embargos de declaração julgado perante o Regional ou agravo de instrumento apreciado pela Turma do TST. Assim, houve invasão da competência da Corte a quo, em afronta ao princípio do devido processo legal, porquanto a parte que já tivera decisão de mérito dos embargos declaratórios foi surpreendida com a declaração superveniente de intempestividade desse apelo. Constatação de má-aplicação da Súmula 385 do TST. Há precedentes. Recurso de embargos conhecido provido. (TST-E-AIRR - 109440-17.2003.5.01.0019 , Relator Ministro: Augusto César Leite de Carvalho, Data de Julgamento: 18/12/2014, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, DEJT de 6/2/2015)
Do exposto, rejeito a preliminar de "irregularidade da correção monetária" e a prejudicial de decadência, suscitadas em contrarrazões, e, no mérito, dou provimento ao recurso ordinário para afastar a conclusão de ausência de pressuposto de constituição válida e regular do processo, e determinar o regular prosseguimento da ação rescisória com o retorno dos autos ao TRT da 5ª Região, a fim de que prossiga no seu exame, como de direito, ficando a recorrente autorizada a pleitear, junto à Receita Federal, a restituição do valor recolhido a título de custas processuais.
ISTO POSTO
ACORDAM os Ministros da Subseção II Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, I - rejeitar a preliminar de "irregularidade da correção monetária", e II- rejeitar a prejudicial de decadência, suscitadas em contrarrazões; e, no mérito, III- dar provimento ao recurso ordinário para afastar a conclusão de ausência de pressuposto de constituição válida e regular do processo, e determinar o regular prosseguimento da ação rescisória com o retorno dos autos ao TRT da 5ª Região, a fim de que prossiga no seu exame, como de direito, ficando a recorrente autorizada a pleitear, junto à Receita Federal, a restituição do valor recolhido a título de custas processuais.
Brasília, 17 de Maio de 2016.
Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)
Ministro BARROS LEVENHAGEN
Relator