A C Ó R D Ã O
2ª Turma
GMRLP/cm/ial
AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. HORAS EXTRAS – TURNOS ININTERRUPTOS DE REVEZAMENTO. HORAS EXTRAS - MINUTOS RESIDUAIS. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. REFLEXOS DO ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. Nega-se provimento a agravo de instrumento que visa liberar recurso despido dos pressupostos de cabimento. Agravo desprovido.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento em Recurso de Revista n° TST-AIRR-52.783/2002-900-03-00.4 , em que é Agravante FIAT AUTOMÓVEIS S.A. e Agravado CARLOS RENE DE AGUIAR .
Agrava do r. despacho de fls. 327/328, originário do Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, que denegou seguimento ao recurso de revista interposto, sustentando, em suas razões de agravo de fls. 331/339, que o seu recurso merecia seguimento. Agravo processado nos autos principais. Contraminuta apresentada às fls. 341/349. Dispensado o parecer da d. Procuradoria-Geral, nos termos do artigo 82, § 2º, II, do RITST.
É o relatório.
V O T O
Conheço do agravo de instrumento, posto que presentes os pressupostos de admissibilidade.
Primeiramente, há de se afastar a alegação de que o Tribunal Regional, ao denegar seguimento ao recurso de revista, excedeu sua competência, percorrendo o mérito da demanda, agindo como tribunal de exceção e violando os artigos 896 da Consolidação das Leis do Trabalho e 5º, II, XXXV, XXXVI, LIV e LV, da Constituição Federal. É que o juízo de admissibilidade a quo , embora precário, tem por competência funcional o exame dos pressupostos de admissibilidade do recurso de revista, extrínsecos e intrínsecos, como ocorreu no presente caso.
1 - HORAS EXTRAS – TURNOS ININTERRUPTOS DE REVEZAMENTO
Insurge-se a agravante, em suas razões recursais, contra o despacho que denegou seguimento ao seu recurso de revista, sustentando que logrou demonstrar violação de preceito constitucional. Em suas razões de recurso de revista, alegou que não há que se falar em trabalho em turnos de revezamento, haja vista a existência de intervalos para refeição e descanso, além dos repousos semanais. Apontou violação do artigo 7º, incisos XIII e XIV, da Constituição da República, defendeu a inaplicabilidade da Súmula nº 360 do TST e transcreveu jurisprudência.
O Tribunal Regional, ao analisar o tema, deixou consignado, in verbis :
“Razão não assiste à recorrente quando alega que o reclamante não trabalhou em turnos ininterruptos de revezamento e que as jornadas do autor sempre foram objetos de negociação coletiva com o Sindicato Profissional, o que, segundo ela, retiraria do reclamante o direito à jornada reduzida de 6 horas.
Com efeito, os acordos coletivos firmados entre a recorrente e o Sindicato Profissional não se referem à situação funcional do recorrido, como bem observado pelo douto Juízo a quo .
O fato de o recorrido gozar de intervalo intrajornada e de descanso semanal não lhe retira o direito à jornada reduzida prevista na norma constitucional supracitada (ENUNCIADO Nº 360 do TST).
Portanto, analisados os instrumentos normativos anexos, chega-se à conclusão que a negociação coletiva, prevista no artigo 7º, inciso XIV, da Constituição Federal, para ressalvar a jornada de 6 horas no trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento, não se coaduna com a jornada efetiva praticada pelo recorrido.
Desprovejo.” (fls. 301/302)
Não prospera a alegação de divergência jurisprudencial, eis que os arestos de fls. 307 do recurso de revista não são adequados à demonstração do dissenso, porquanto a decisão regional se encontra em consonância com a Súmula/TST nº 360, a saber:
"TURNOS ININTERRUPTOS DE REVEZAMENTO INTERVALOS INTRAJORNADA E SEMANAL - A interrupção do trabalho destinada a repouso e alimentação, dentro de cada turno, ou o intervalo para repouso semanal, não descaracteriza o turno de revezamento com jornada de 6 horas prevista no art. 7º, inciso XIV, da Constituição da República de 1988"
Inviável, pois, o recurso de revista, na forma do §4º do art. 896 da Consolidação das Leis do Trabalho, com a redação dada pela Lei nº 9.756, de 17.12.98, e do disposto na Súmula nº 333.
Também não vislumbro afronta direta e literal do artigo 7º, incisos XIII e XVI, da Carta Magna, como exige a alínea “c” do artigo 896 do diploma consolidado, pois o Tribunal Regional deu a exata subsunção da descrição dos fatos ao conceito contido no art. 7º, inciso XIV, da Constituição da República de 1988, de acordo com a supratranscrita Súmula nº 360, tendo em vista que a concessão de intervalos intrajornada e o gozo de repousos semanais remunerados não descaracteriza o labor em turnos ininterruptos de revezamento.
Nego provimento.
2 - HORAS EXTRAS - MINUTOS RESIDUAIS
Insurge-se a agravante, em suas razões recursais, contra o despacho que denegou seguimento ao seu recurso de revista, sustentando que logrou demonstrar violação de lei federal e de preceito constitucional bem como divergência jurisprudencial. Em suas razões de recurso de revista, alegou que os minutos que antecedem e os que sucedem a jornada normal eram utilizados para afazeres pessoais do empregado. Afirmou que o Tribunal Regional transferiu à empresa o dever de provar que estes minutos constituíam tempo à disposição do empregador, ônus este que, por lei, é do autor, o qual não restou provado. Asseverou que o tempo que o empregado leva se preparando para ocupar seu posto de trabalho não constitui tempo à disposição da empresa. Acrescentou que a permissividade da recorrente no que concerne ao exercício das atividades pessoais dos seus empregados tem como finalidade proporcionar aos obreiros condições de trabalho mais benéficas. Apontou violação aos artigos 3º, I, e 5º, II, da Constituição Federal, 4º e 818 da Consolidação das Leis do Trabalho e 333, I, do Código de Processo Civil. Colacionou arestos.
O Tribunal Regional, ao analisar o tema, deixou consignado, in verbis :
“Sustenta a reclamada que a pequena oscilação dos horários de entrada e saída justificam-se pela impossibilidade de que todos marquem o ponto no mesmo instante.
Em tese, os minutos que antecedem e sucedem à jornada de trabalho implicam em estar o empregado à disposição do empregador, cabendo a este o ônus de provar o contrário, para afastar-se da abrangência daquela presunção. Inteligência da OJ Nº 23, da SDI/TST.
E em coro com a súmula de jurisprudência recente deste Tribunal, entendo que não assiste razão à reclamada. Visto que a recorrente não se desincumbiu do ônus que lhe competia, provar que o autor não permanecia à sua disposição naqueles minutos. Cabendo à reclamada adotar as medidas administrativas necessárias para que os horários de trabalhos apontado nos controles de ponto sempre reflitam a realidade da jornada laboral prestada pelo empregado.” (fls. 301)
Primeiramente, há de se afastar a alegação de afronta direta e literal ao artigo 5º, II, da Constituição da República, bem como violação literal do artigo 4º da Consolidação das Leis do Trabalho, como exige a alínea “c” do artigo 896 da Consolidação das Leis do Trabalho. É que a discussão acerca das horas extras relativas aos poucos minutos que antecedem e que sucedem a jornada de trabalho dos empregados não merece maiores debates, uma vez que já se encontra pacificada no âmbito desta colenda Corte, no sentido de que devem ser considerados como limite de tolerância os cinco minutos residuais trabalhados antes e/ou depois da jornada.
Com efeito, é razoável que dentro desse limite o trabalhador exerça atividades preparatórias para o início ou término de sua jornada de trabalho, como por exemplo, a marcação dos cartões-de-ponto, troca de roupa etc. Todavia, uma vez ultrapassado tal lapso, é de se reconhecer o elastecimento da jornada, porquanto configura-se como tempo à disposição do empregador.
Cumpre, ainda, observar que o princípio da legalidade insculpido no inciso II do artigo 5º da Constituição da República, mostra-se como norma constitucional correspondente a princípio geral do nosso ordenamento jurídico, pelo que a violação ao preceito invocado não será direta e literal, como exige a alínea "c" do artigo 896 da Consolidação das Leis do Trabalho, em face da subjetividade que cerca o seu conceito.
No particular, já decidiu o STF:
"É firme o entendimento desta Corte no sentido de que não cabe recurso extraordinário quando a alegada ofensa à Constituição é reflexa ou indireta, porquanto, a prevalecer o entendimento contrário, toda a alegação de negativa de vigência de lei ou até de má-interpretação desta passa a ser ofensa a princípios constitucionais genéricos como o da reserva legal, o do devido processo legal ou o da ampla defesa, tornando-se, assim, o recurso extraordinário - ao contrário do que pretende a Constituição - meio de ataque à aplicação da legislação infraconstitucional (STF, Ag.-AI 146.611-2-RJ, Moreira Alves, Ac. 1ª T.)."
Quanto ao artigo 3º, I, da Constituição Federal, sequer há prova do seu prequestionamento, na forma da Súmula nº 297 desta Corte, segundo a qual "1. Diz-se prequestionada a matéria ou questão quando na decisão impugnada haja sido adotada, explicitamente, tese a respeito; 2. Incumbe à parte interessada, desde que a matéria haja sido invocada no recurso principal, opor embargos declaratórios objetivando o pronunciamento sobre o tema, sob pena de preclusão; 3. Considera-se prequestionada a questão jurídica invocada no recurso principal sobre a qual se omite o Tribunal de pronunciar tese, não obstante opostos embargos de declaração".
Por outro lado, não há que se falar em ofensa aos artigos 818 da Consolidação das Leis do Trabalho e 333, I, do Código de Processo Civil, posto que o ônus da prova foi regularmente distribuído, conforme determinado pelos artigos 818 da Consolidação das Leis do Trabalho e 333, II, do Código de Processo Civil. No caso, houve, exatamente, a aplicação da lei à hipótese que ela rege. Dessa forma, inexistiu violação de lei federal. Note-se que a reclamada não se desincumbiu do dever de provar que o reclamante não permanecia à sua disposição nos minutos que antecedem e sucedem à jornada de trabalho, sendo que, conforme acrescentado pelo Tribunal Regional, cabia “à reclamada adotar as medidas administrativas necessárias para que os horários de trabalhos apontado nos controles de ponto sempre reflitam a realidade da jornada laboral prestada pelo empregado”.
Outrossim, nos termos da Orientação Jurisprudencial nº 336 da SBDI-1, não prospera a alegação de dissenso jurisprudencial e tampouco de afronta de norma infraconstitucional, eis que a decisão recorrida está em consonância com a Súmula nº 366 desta Corte, a saber:
“CARTÃO DE PONTO. REGISTRO. HORAS EXTRAS. MINUTOS QUE ANTECEDEM E SUCEDEM A JORNADA DE TRABALHO. (conversão das Orientações Jurisprudenciais nºs 23 e 326 da SDI-1) - Res. 129/2005 - DJ 20.04.05 Não serão descontadas nem computadas como jornada extraordinária as variações de horário do registro de ponto não excedentes de cinco minutos, observado o limite máximo de dez minutos diários. Se ultrapassado esse limite, será considerada como extra a totalidade do tempo que exceder a jornada normal. (ex-OJs nº 23 - Inserida em 03.06.1996 e nº 326 - DJ 09.12.2003)”
Nego provimento.
3 – ADICIONAL DE PERICULOSIDADE
Insurge-se a agravante, em suas razões recursais, contra o despacho que denegou seguimento ao seu recurso de revista, sustentando que logrou demonstrar violação de lei federal e divergência jurisprudencial. Em suas razões de recurso de revista, alegou que o autor não laborava em contato permanente com inflamáveis. Afirmou que o contato com o agente periculoso ocorria de forma eventual, não gerando direito ao adicional em epígrafe. No caso de não ser este o entendimento, postulou o pagamento de forma proporcional ao tempo de exposição. Apontou violação aos artigos 5º, II, da Constituição Federal e 193 da Consolidação das Leis do Trabalho e às Portarias nºs 12/1979, 3.311/89 e 3.214, NR 16, item I, do MTb e ao Decreto nº 93.412/85 e contrariedade à Orientação Jurisprudencial nº 04 da SBDI-1 desta Corte. Colacionou arestos.
O Tribunal Regional, ao analisar o tema, deixou consignado, in verbis :
“Irresigna-se a reclamada contra o deferimento de adicional de periculosidade e reflexos, ao argumento de que o contato do reclamante com agente periculoso era eventual, não estando caracterizado ‘risco acentuado’ nem ‘contato permanente’ exigido literalmente pelo art. 193 da CLT.
Em que pesem os argumentos utilizados pela empregadora, entendo inafastáveis as conclusões periciais, posto que tecnicamente constatou o louvado que ‘o reclamante dirigia-se habitualmente à central de tintas (galpão 07), onde permanecia por tempo aproximadamente de 40 minutos diários (informações do se ex. chefe), para realizar o controle de tintas necessário à programação do setor de pintura de carrocerias. A referida central possui diversos tanques para mistura de tintas e almoxerifados com grande quantidade de tambores e latões de tintas automotivas (perfazendo total de aproximadamente 80.000 litros de inflamáveis)’.
Deste modo, o contato do reclamante com os agentes periculosos não se dava de forma eventual conforme sustentou a reclamada. Logo, nada a se justificar no julgado nesse particular.” (fls. 302)
Primeiramente, há de se afastar a alegação de ofensa às Portarias e ao Decreto invocados. É que Portaria e Decreto não são leis, para fins de admissibilidade do recurso de revista, na forma do disposto na alínea “c” do artigo 896 da Consolidação das Leis do Trabalho.
Por outro lado, não vislumbro violação literal ao artigo 193 da Consolidação das Leis do Trabalho, como exige a alínea "c" do artigo 896 da Consolidação das Leis do Trabalho. É que, a par dos contornos nitidamente fático probatórios que envolvem a questão relativa ao tempo de exposição ao risco e que inviabilizam o recurso de revista, na forma preconizada pela Súmula/TST nº 126, o Tribunal Regional concluiu, com base na perícia técnica realizada, a qual constatou que “o reclamante dirigia-se habitualmente à central de tintas (galpão 07), onde permanecia por tempo aproximadamente de 40 minutos diários (informações do se ex. chefe)”, que “o contato do reclamante com os agentes periculosos não se dava de forma eventual conforme sustentou a reclamada”.
Nesse passo, a conclusão perfilhada pela Corte Regional encontra-se em plena consonância com a nova redação conferida à Súmula/TST nº 364, item I, primeira parte, a saber:
“ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. EXPOSIÇÃO EVENTUAL, PERMANENTE E INTERMITENTE. I – Faz jus ao adicional de periculosidade o empregado exposto permanentemente ou que, de forma intermitente, sujeita-se a condições de risco. Indevido, apenas, quando o contato dá-se de forma eventual, assim considerado o fortuito, ou que, sendo habitual, dá-se por tempo extremamente reduzido” (ex-OJ nº 05 – Inserida em 14.03.1994 e nº 280 – DJ 1.08.2003)”
Cumpre, ainda, observar que o princípio da legalidade insculpido no inciso II do artigo 5º da Constituição da República, mostra-se como norma constitucional correspondente a princípio geral do nosso ordenamento jurídico, pelo que a violação ao preceito invocado não será direta e literal, como exige a alínea "c" do artigo 896 da Consolidação das Leis do Trabalho, em face da subjetividade que cerca o seu conceito.
No particular, já decidiu o STF:
"É firme o entendimento desta Corte no sentido de que não cabe recurso extraordinário quando a alegada ofensa à Constituição é reflexa ou indireta, porquanto, a prevalecer o entendimento contrário, toda a alegação de negativa de vigência de lei ou até de má-interpretação desta passa a ser ofensa a princípios constitucionais genéricos como o da reserva legal, o do devido processo legal ou o da ampla defesa, tornando-se, assim, o recurso extraordinário - ao contrário do que pretende a Constituição - meio de ataque à aplicação da legislação infraconstitucional (STF, Ag.-AI 146.611-2-RJ, Moreira Alves, Ac. 1ª T.)."
Também não prospera a alegação de divergência jurisprudencial, tendo em vista que a conclusão acatada pela decisão recorrida encontra-se em plena consonância com a jurisprudência desta Corte (Súmula/TST nº 364, I, primeira parte).
Nego provimento.
4 – REFLEXOS DO ADICIONAL DE PERICULOSIDADE
Insurge-se a agravante, em suas razões recursais, contra o despacho que denegou seguimento ao seu recurso de revista, sustentando que logrou demonstrar divergência jurisprudencial. Em suas razões de recurso de revista, alegou que, com amparo na Súmula/TST nº 191, o adicional de periculosidade deve incidir sobre o salário-base, não gerando, por extensão, reflexo algum nas demais verbas ante a impossibilidade de aplicação de um adicional sobre outro. Apontou violação ao artigo 5º, II, da Constituição Federal e contrariedade à súmula supracitada. Colacionou arestos.
Todavia, o Tribunal Regional não tratou da matéria à luz dos reflexos do adicional de periculosidade. Sequer há prova do seu prequestionamento na forma da Súmula nº 297 desta Corte, segundo a qual "1. Diz-se prequestionada a matéria ou questão quando na decisão impugnada haja sido adotada, explicitamente, tese a respeito; 2. Incumbe à parte interessada, desde que a matéria haja sido invocada no recurso principal, opor embargos declaratórios objetivando o pronunciamento sobre o tema, sob pena de preclusão; 3. Considera-se prequestionada a questão jurídica invocada no recurso principal sobre a qual se omite o Tribunal de pronunciar tese, não obstante opostos embargos de declaração".
Nego provimento.
Do exposto, conheço do agravo de instrumento para negar-lhe provimento.
ISTO POSTO
ACORDAM os Ministros da Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer do agravo de instrumento para negar-lhe provimento.
Brasília, 13 de fevereiro de 2008.
Renato de Lacerda Paiva
Ministro Relator