A C Ó R D Ã O
Tribunal Pleno
GPACV/lmnb/rdc
REPRESENTATIVO PARA REAFIRMAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. INCIDENTE DE RECURSO REPETITIVO. BANCÁRIO. JORNADA DE TRABALHO. GERENTE GERAL. MATÉRIA PACIFICADA NA SÚMULA Nº 287. CONTEÚDO PERSUASIVO. RECORRIBILIDADE. NECESSIDADE DE QUALIFICAÇÃO DA MATÉRIA PARA O FIM DE VINCULAÇÃO DE TESE JURÍDICA. Cinge-se a controvérsia em determinar qual o enquadramento, para fins de fixação de jornada, do gerente-geral de agência bancária. No caso dos autos, o Tribunal Regional entendeu que restou caracterizada a fidúcia especial, fazendo incidir ao caso o disposto no art. 62, II, da CLT e na Súmula nº 287. O recurso interposto trata acerca de matéria que já restou pacificada nesta Corte, cristalizada no verbete da Súmula 287. Ainda que retrate a jurisprudência pacificada no Tribunal Superior do Trabalho, ainda vem sendo objeto de recorribilidade. O Sistema Nacional de Precedentes Judiciais Obrigatórios tem por fim trazer coerência às decisões e, para tal fim, a uniformização da jurisprudência deve ocorrer, inclusive, naqueles casos em que a Súmula, por não ser vinculante, não tem surtido o desejável efeito de pacificação nacional e de redução da recorribilidade. De tal modo, diante da necessidade de trazer a integridade da jurisprudência em face do entendimento consagrado na Súmula em questão, deve ser acolhido o Incidente de Recurso de Revista para o fim de reafirmar a respectiva tese: A jornada de trabalho do empregado de banco gerente de agência é regida pelo art. 224, § 2º, da CLT. Quanto ao gerente-geral de agência bancária, presume-se o exercício de encargo de gestão, aplicando-se-lhe o art. 62 da CLT. Recurso de revista representativo da controvérsia não conhecido, por incidência da tese ora fixada.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de nº TST-RRAg- 0011312-53.2023.5.15.0024, em que é recorrente e agravado WILSON ADRIANO DE CASTRO e recorrido e agravante BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A.
O presente recurso é representativo de controvérsia que, a despeito de ter sido pacificada nesta Corte a ponto de atingir os rígidos pressupostos para a aprovação de Súmula, sob o nº 287 , ainda vem sendo objeto de recorribilidade, colocando em risco a celeridade processual, segurança jurídica e a própria missão constitucional deste Tribunal Superior, enquanto Corte de Precedentes, responsável pela unidade nacional do direito nas matérias de sua competência.
Em tal contexto, faz-se necessária a utilização da sistemática dos incidentes de recursos repetitivos (IRR), com o trâmite preconizado pelo art. 132-A do Regimento Interno para os casos de reafirmação da jurisprudência pacificada. De tal forma, com a celeridade necessária, eleva-se à eficácia vinculante o tradicional entendimento deste Tribunal Superior, com a finalidade aumentar a segurança jurídica proporcionada ao jurisdicionado, reduzindo-se a litigiosidade através de dinâmica que impede a interposição de recursos infundados.
Apresentada, portanto, a presente proposta de afetação do processo TST-RR-0011312-53.2023.5.15.0024 como Incidente de Recurso Repetitivo junto a este Tribunal Pleno, a fim de examinar a possibilidade de reafirmação de jurisprudência da Corte, nos termos do art. 132-A e parágrafos, do RITST, em matéria que já restou pacificada nesta Corte e está cristalizada no verbete da Súm. nº 287 , de seguinte teor:
A jornada de trabalho do empregado de banco gerente de agência é regida pelo art. 224, § 2º, da CLT. Quanto ao gerente-geral de agência bancária, presume-se o exercício de encargo de gestão, aplicando-se-lhe o art. 62 da CLT.
No caso em exame, as razões de decidir da linha jurisprudencial subjacente à Súmula devem ser objeto de análise, para o fim de verificar se a tese ali firmada, de natureza jurídica persuasiva, deve ser reafirmada de forma vinculante no julgamento do presente caso, diante da renitência das partes que interpõem recurso contra decisão que foi objeto de pacificação na Corte Superior.
Necessário, portanto, solucionar a controvérsia objeto do recurso de revista da parte WILSON ADRIANO DE CASTRO, reclamante, em que consta a matéria acima delimitada, “JORNADA DE TRABALHO. GERENTE BANCÁRIO.” além de: “HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS. BENEFICIÁRIO DA GRATUIDADE DA JUSTIÇA.” Destaque-se que, no caso concreto, consta ainda recurso de revista da parte BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A., reclamado , que discute os temas “LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES INDICADOS NA INICIAL.”, “PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. LEI Nº 14.010/2020.” e “BENEFÍCIO DA JUSTIÇA GRATUITA. AÇÃO AJUIZADA APÓS A LEI Nº 13.467/17. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS.”
No Juízo primeiro de admissibilidade, todos esses temas tiveram seguimento denegado, contudo as partes interpuseram agravo de instrumento que foram providos monocraticamente por este Relator, viabilizando o processamento dos Recursos de Revista.
É o relatório.
V O T O
ADMISSIBILIDADE DE INCIDENTE DE RECURSO DE REVISTA REPETITIVO PARA REAFIRMAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA – TEMA PACIFICADO POR SÚMULA DE NATUREZA PERSUASIVA.
A formação de precedentes obrigatórios constitui um dos principais mecanismos de gestão processual introduzidos pelo legislador nas últimas décadas. A despeito de reiterados recordes de produtividade, é essencial que seja enfrentado de forma célere, coerente e isonômica o exponencial crescimento da demanda, conforme demonstram as estatísticas do Tribunal Superior do Trabalho, que vem recebendo um volume maior de novos processos em comparação com os últimos anos. São números incompatíveis com a estruturação do Poder Judiciário, cujas cortes de vértice são funcionalmente destinadas a dirimir as novas controvérsias nacionais, sem repetição do mesmo labor já realizado nas instâncias ordinárias, sob pena de comprometimento da isonomia, segurança jurídica e razoável duração do processo (CF, art. 5º, caput e LXXVIII).
Assim é que esta Corte Superior, com inspiração na prática já tradicional no Supremo Tribunal Federal, para fins de maior celeridade na formação de precedentes obrigatórios em matérias já conhecidas e sedimentadas, adotou fluxo procedimental (cf. Emenda Regimental n. 7, de 25/11/2024 ), segundo o qual:
“Art. 132-A. A proposta de afetação do incidente de recurso repetitivo (...) será necessariamente incluída em pauta de sessão virtual e deverá conter o tema a ser afetado.
§ 2º As disposições dos arts. 133 e 134 do Regimento Interno são aplicáveis, no que couber, ao procedimento de afetação do incidente de recurso repetitivo, vedada em qualquer caso a remessa do processo inserido em sessão virtual à sessão presencial , para os fins previstos no caput deste artigo. (...)
§ 5º O julgamento de mérito do incidente de recurso repetitivo, no caso de mera reafirmação de jurisprudência dominante da Corte, também será realizado por meio do Plenário Eletrônico, na mesma sessão virtual que decide sobre a proposta de afetação.
§ 6º Quando designada sessão virtual para afetação de incidente de recursos repetitivos, com proposta de reafirmação de jurisprudência, eventuais sustentações orais quanto ao mérito deverão ser necessariamente juntadas por meio eletrônico , após a publicação da pauta e até 48 horas antes de iniciado o julgamento em ambiente virtual.”
Compete ao Presidente do Tribunal “ indicar recurso representativo da controvérsia, dentre aqueles ainda não distribuídos, submetendo-o ao Tribunal Pleno para fins de afetação de IRR (...), inclusive mediante reafirmação de jurisprudência” (RITST, art. 41, XLVII), quando houver “ multiplicidade de recursos de revista (...) fundados em idêntica questão de direito , (...) considerando a relevância da matéria ou a existência de entendimentos divergentes entre os Ministros da Subseção ou das Turmas do Tribunal ”.
Cabe destacar que as Súmulas do Tribunal Superior do Trabalho, bem como as Orientações Jurisprudenciais, historicamente se traduzem em importante função de uniformização da jurisprudência trabalhista.
Contudo, numa leitura atenta do objetivo do atual Sistema Nacional de Precedentes, torna-se necessária uma interpretação teleológica da origem das Súmulas e OJs no TST, do seu papel histórico, em confronto com a realidade atual, em que todos os atores sociais se unem, num espírito de cooperação e busca do ideal de justiça.
Enquanto há um elemento nodal e comum no objetivo de entregar a jurisdição plena, além da coerência e da integridade, deve ser observada, por todos que dignificam a esfera do “dizer o direito”, a razão de ser dos amplos e efetivos debates que trazem a conclusão de uma tese jurídica: a previsibilidade a que se vinculam as decisões judiciais.
Hoje não há como, no volume estratosférico de processos tramitando na Justiça do Trabalho, podermos deixar a jurisdição caminhar ao largo dos princípios que norteiam a razoável duração do processo. Se há, pelos jurisdicionados, dúvida quanto à persuasão que se entrega na edição de uma Súmula, é preciso rever os critérios da entrega da jurisdição para que as Cortes Superiores possam dar a verdadeira razão dos debates que elevam um entendimento reiteradamente debatido nas instâncias inferiores a um precedente qualificado e vinculante.
A multiplicidade da temática e sua relevância já foram amplamente demonstrados, tendo esta Corte reconhecido como presentes os rígidos pressupostos regimentais para a edição do respectivo verbete, o qual, todavia, não se mostrou suficiente para pacificar a correspondente recorribilidade, comprometendo a isonomia e a segurança jurídica, nacionalmente.
RECURSO DE REVISTA REPRESENTATIVO AFETADO COMO INCIDENTE DE RECURSOS REPETITIVOS PARA REAFIRMAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. DELINEAMENTO DO CASO CONCRETO SUBMETIDO A JULGAMENTO.
O recurso de revista ora afetado como incidente de recursos repetitivos foi interposto pela parte WILSON ADRIANO DE CASTRO, em face do acórdão proferido pelo Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, quanto à matéria ora afetada, nos seguintes termos:
JORNADA DE TRABALHO - CARGO DE GESTÃO - HORAS EXTRAS - INTERVALO INTRAJORNADA
O reclamante alegou, na inicial, que durante a contratualidade sempre laborou em regime de sobrejornada, de segunda a sexta-feira, das 7h30/8h00 às 19h00/19h30, com intervalo para alimentação e descanso reduzido para 30/40 minutos.
Nesse sentido, requereu a condenação do reclamado ao pagamento de horas extras que excedessem a 8ª diária, e intervalo intrajornada suprimido, tudo com adicional e reflexos.
Em defesa, o reclamado sustenta que o reclamante está enquadrado na exceção do artigo 62, inciso II da CLT, não havendo necessidade de controle de jornada. Informou, ainda, que o autor sempre usufruiu uma hora de intervalo para refeição e descanso.
O r. Juízo acolheu a tese da defesa quanto ao enquadramento do reclamante como exercente do cargo de gerente-geral da agência de Dois Córregos e, como tal, o enquadrou no disposto no artigo 62, inciso II, da CLT. Com isso, julgou improcedentes os pedidos de pagamento das horas extras e intervalo intrajornada.
O reclamante insurge-se contra o decidido alegando, em síntese, que nunca teve poderes de mando e gestão com autonomia inerente a empregador, razão pela qual faz jus às horas extras prestadas. Aduz que o gerente administrativo e o gerente geral se reportavam ao gerente regional; que o sistema recusava operações de crédito; que não podia aprovar sozinho operação negada pelo sistema; não admitia ou demitia funcionários e não tinha qualquer alçada de crédito. Sustenta, ainda, que havia controle da sua jornada por parte dos seus superiores.
De início, deve-se fixar que o exercício de cargo de confiança bancária para configuração da exceção contida no parágrafo 2º do artigo 224 da CLT não exige os mesmos requisitos do item II do artigo 62 da CLT, ou seja, amplos poderes de mando e gestão.
No cargo de confiança bancária, o empregado não exerce funções meramente técnicas, pois já assume certas responsabilidades na dinâmica do banco, mas não chega a responder pela agência. Nesse caso, o bancário fica submetido à jornada de 08 horas diárias, caso definido na sentença.
No segundo caso, típico do "gerente-geral de agência bancária", o empregado assume a autoridade máxima no estabelecimento e responde como alter ego do empregador, razão pela qual não lhes são aplicáveis as regras sobre duração do trabalho. É o que estabelece a Súmula nº 287 do TST.
Em síntese, nos termos da Súmula nº 287 do TST, presume-se o exercício de cargo de gestão, nos moldes do artigo 62 da CLT, para o ocupante de cargo de gerente-geral de agência bancária, como é o caso dos autos.
Na ficha cadastral do autor consta que ele era o gerente geral da agência, conforme fl. 679, e auferiu salário de R$8.918,59 a partir de setembro de 2022, além de uma gratificação de função no valor de R$4.905,22 (fl. 708).
Do depoimento da Sra. Letícia colhido em audiência, constata-se que ela era subordinada ao gerente administrativo (Sr. Paolo), e ao gerente geral (que era o reclamante). Aduziu que apenas assinou documentos em nome da reclamada "quando foi backup do reclamante" e, quando ia embora da agência, por volta das 18hs, 18h30, o autor ainda estava lá pois "fechava tudo na agência". Mencionou, ainda, que o obreiro autorizava a liberação de horas extras, no sistema, para serem prestadas pela depoente, e era ele quem lhe dava "feedbacks".
Da mesma forma, a testemunha Guilherme aduziu que o reclamante era seu superior hierárquico, e o ele se reportava ao gerente regional. Confirmou que o autor aprovava as horas extras solicitadas no sistema e fazia o fechamento da agência, e disse, ainda, que na agência, todos eram subordinados ao reclamante.
Sopesando os depoimentos acima, denota-se que o efetivo exercício do cargo de gestão foi corroborado pela prova oral, ainda que o reclamante tivesse um superior regional, pois a supervisão externa não retira a fidúcia atribuída ao gerente-geral, que era quem tinha maior poder dentro da agência bancária.
Desse modo, ainda que as metas a serem cumpridas na agência fossem estabelecidas pelo Banco, reputo demonstrado que o recorrente, efetivamente, possuía poderes típicos de gerente-geral de agência, ou seja, exercia cargo de gestão.
Observo, ainda, que o autor percebia gratificação de função superior a 40% do salário do cargo efetivo, nos termos do artigo 62, inciso II, da CLT, conforme fichas financeiras apresentadas com a contestação.
Assim sendo, mantenho a decisão original que reconheceu o enquadramento do autor na exceção do artigo 62, inciso II, da CLT e indeferiu o pedido de horas extras, intervalo intrajornada e reflexos.
Nego provimento ao recurso.
Conforme se verifica da transcrição acima, o acórdão regional registrou as mesmas premissas fáticas que deram base ao debate cristalizado na Súmula nº 287 aqui debatida, uma vez que fez incidir ao caso concreto a jornada definida no art. 62, II, da CLT, ao detentor do cargo de gerente geral de agência bancária, função cujo exercício impunha poderes de mando e de gestão.
No recurso de revista, a parte recorrente sustenta que os elementos ali aduzidos não autorizam o reconhecimento do cargo de gestão; que a jornada aplicável seria a do art. 224, § 2º, da CLT; e que a jornada do recorrente era passível de controle, o que não foi propriamente realizado. Fundamenta o recurso de revista na alegação de ofensa aos arts. 62, II e 224, § 2º, da CLT, e em divergência jurisprudencial.
Assim delineados os contornos fáticos e jurídicos do caso concreto em julgamento, passo à análise da jurisprudência pacífica desta Corte Superior ora submetida à reafirmação e suas repercussões no julgamento do caso.
REAFIRMAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA PACÍFICA DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO SOBRE A MATÉRIA SUBMETIDA À AFETAÇÃO.
O posicionamento do Tribunal Superior do Trabalho, conforme veiculado na Súm. nº 287, é que “A jornada de trabalho do empregado de banco gerente de agência é regida pelo art. 224, § 2º, da CLT. Quanto ao gerente-geral de agência bancária, presume-se o exercício de encargo de gestão, aplicando-se-lhe o art. 62 da CLT.”
O teor do verbete diz respeito aos debates que envolvem a aplicação do previsto no art. 62, II, da CLT ao ocupante de cargo de gerente-geral de agência bancária, considerando-se presumida a fidúcia especial aos detentores do respectivo cargo, ainda que inexista mandato específico para tal.
Nesse particular, pertinente a análise do que foi fixado nos autos do E-AIRReRR-770918-18.2001.5.12.5555, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Redator Ministro João Oreste Dalazen, DEJT 06/06/2003, precedente indicado da Súmula nº 287. Naquele caso, a Egrégia 5ª Turma havia decidido no seguinte sentido:
“Despiciendo o exame da questão da possibilidade jurídica de aplicação do art. 62, II, da CLT, a empregado bancário, porquanto, no caso concreto, não está demonstrado o preenchimento dos requisitos do referido dispositivo legal, mas, sim, do art. 224 da CLT.
O gerente a que se refere o art. 62, II, da CLT, é aquele que exerce amplos poderes de mando e gestão, entendendo-se como tais, entre outros, os poderes de demitir e admitir subordinados, adverti-los, puni-los, suspendê-los, administrar o empreendimento como se fosse o próprio empregador, exercendo encargos e prerrogativas do próprio empregador.
No caso sob exame, merece leitura contextualizada a afirmação da Corte de origem no sentido de que o Autor tinha amplos poderes de administração ou representação do réu, haja vista que o universo bancário possui escala administrativa específica .
O TRT referiu-se a amplos poderes de administração ou representação, DENTRO DA ESCALA ADMINISTRATIVA ESPECÍFICA NO UNIVERSO BANCÁRIO , sendo certo que a porção do universo bancário examinada pelo Órgão jurisdicional diz respeito a uma agência bancária.
A observação colocada pela Corte de origem logo após a vírgula ( haja vista que o universo bancário possui escala administrativa específica ), deixa claro que os amplos poderes de administração ou representação referem-se aos poderes que têm os gerentes-gerais bancários - enquanto autoridades máximas das agências (na escala administrativa específica) - de dirigir o trabalho dos subordinados, dirigir a rotina dos serviços, tomar providências que visem a solucionar os problemas do dia-a-dia verificados na agência etc.
Do delineamento fático do acórdão recorrido, depreende-se que, mandato, se havia, era para o desempenho dos amplos poderes de gerente-geral bancário , e não dos amplos poderes de mando e gestão do art. 62, II, da CLT.
Sendo este o delineamento fático assentado pelo TRT, somente se poderia chegar a conclusão contrária mediante o revolvimento do conjunto fático-probatório, o que é vedado em sede de RR, nos termos do Enunciado nº 126/TST.
De outro lado, ao contrário do que alega o Recorrente, o TRT não disse que o Reclamante estava dispensado do controle de jornada nem, tampouco, que teria havido confissão do Reclamante acerca de seu enquadramento na hipótese do art. 62, II, da CLT. Incidência do Enunciado nº 297/TST” (fls. 972/973).
Extrai-se do referido trecho, portanto, que a Turma entendeu que, a despeito de haver o exercício do cargo de gerente geral, o mandato ali firmado não abrangeria os poderes de mando e gestão, a teor do que exige o art. 62, II, da CLT. A colenda SbDI-1, por sua vez, ao apreciar a questão, determinou:
(...) Com efeito, do delineamento fático feito na instância regional, a outra conclusão não se chega senão a de que o Reclamante efetivamente desempenhava a função de gerente geral, tal como prevista no artigo 62 da CLT.
No que se refere à outorga de mandato, a que alude a Súmula nº 287 do TST, sobreleva notar que a Eg. Corte Regional não negou a sua existência, o que nos leva a entender que, no mínimo, o Autor detinha mandato tácito para agir em nome e por conta do Banco.
A esse respeito, a Eg. Subseção Especializada em Dissídios Individuais do TST vem, inclusive, firmando posicionamento no sentido de que a existência de mandato tácito não descaracteriza, de per si, o exercício do cargo de confiança do gerente bancário, contanto que presentes os demais elementos que levem à aplicação do artigo 62 da CLT . Nesse sentido, citem-se, dentre outros, os seguintes precedentes: E-RR-197.015/95; RR-387.253/97; RR-607.156/99; e RR-319.154/96.
Por todo o exposto, entendo que o v. acórdão turmário violou o artigo 896 da CLT quando, ao aplicar indevidamente o óbice inscrito na Súmula nº 126, não conheceu do recurso de revista do Reclamado, corretamente fundamentado em afronta ao artigo 62 da CLT e em contrariedade à Súmula nº 287 do TST.
A partir de análise da jurisprudência recente desta Corte, verifica-se que a mesma ratio continua sendo aplicada de forma reiterada, de modo que, nos casos em que constatado o exercício do cargo de gerente geral, é presumida a fidúcia especial, ainda que não haja mandato específico. É o aduzido em precedentes das Turmas:
(...) HORAS EXTRAS. CARGO DE CONFIANÇA. GERENTE GERAL DA AGÊNCIA. ÓBICE DA SÚMULA 287 DO TST. Hipótese em que o Tribunal Regional, amparado no laudo pericial e na prova testemunhal, concluiu que o reclamante desempenhava função de Gerente Geral da Agência, tendo a responsabilidade de geri-la, nos termos do artigo 62, II, da CLT. Sendo incontroverso que o reclamante ocupava cargo de gerente geral e era a autoridade máxima na agência, não sendo responsável apenas pela área comercial, a decisão está em consonância com a Súmula 287 do TST . Não merece reparos a decisão. Agravo não provido. (...) (Ag-AIRR-80500-45.2005.5.01.0060, 2ª Turma , Relatora Ministra Maria Helena Mallmann, DEJT 23/06/2023).
(...) 2. HORAS EXTRAS. PERÍODO EM QUE ATUOU COMO GERENTE-GERAL DE AGÊNCIA BANCÁRIA. ARTIGO 62, II, DA CLT. HORAS EXTRAS INDEVIDAS. CONTRARIEDADE À SÚMULA 287/TST. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA CONFIGURADA. O Tribunal Regional, embora tenha registrado que o Reclamante atuava como gerente geral de agência, concluiu pela impossibilidade de enquadrá-lo na exceção prevista no artigo 62, II, da CLT, uma vez que o exercício da função de gerência de agência ocorria de forma limitada, sem os mesmos poderes de mando e gestão que os superintendentes regionais. Este Tribunal Superior, conforme a diretriz contida na Súmula 287, já assentou o entendimento de que o exercício do cargo de Gerente-Geral de Agência implica a presunção relativa de que o bancário exerce encargo de gestão, aplicando-se lhe o disposto no artigo 62, II, da CLT. Importa ressaltar que a SbDI-1 do TST já definiu que eventuais limitações nos poderes de mando e gestão, assim como a subordinação ao superintendente ou à gerência regional, não descaracterizam o cargo de confiança para fins de aplicação do artigo 62, II, da CLT. Nesse sentido, constatado que o Reclamante detinha o cargo de gerente-geral de agência, autoriza-se a aplicação da exceção disposta no artigo 62, II, da CLT, não havendo, pois, falar em pagamento de horas extras. Contrariedade à Súmula 287/TST. Recurso de revista conhecido e provido. (RRAg-Ag-652-59.2014.5.12.0004, 5ª Turma , Relator Ministro Douglas Alencar Rodrigues, DEJT 06/09/2024).
(...) II – RECURSO DE REVISTA. BANCÁRIO. CARGO DE CONFIANÇA. HORAS EXTRAS. GERENTE-GERAL DE AGÊNCIA. PERÍODO ENTRE AGOSTO/2011 e 5/11/2015. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA. A jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho consagra a presunção de poderes de mando, gestão e representação do empregado que exerce a função de gerente-geral de agência bancária, incidindo no caso a regra prevista no art. 62, II, da CLT no tocante à ausência de controle de jornada, não sendo devido, por consequência lógica, o pagamento de horas extras . Inteligência da Súmula 287 do c. TST. No caso, a Corte Regional, atenta ao princípio da primazia da realidade, qualificou o autor como empregado exercente de cargo de confiança, com poderes de gestão, nos moldes do art. 62, II, da CLT, quando desempenhou as funções de gerente-geral de agência, no período compreendido entre agosto de 2011 a 5/11/2015. Com lastro no acervo probatório dos autos, enfatizou de forma peremptória que o autor "efetivamente, desempenhava função com fidúcia especial no período ora em exame, sendo a autoridade máxima da agência de Nonoai, respondendo apenas à superintendência regional, com incremento de responsabilidade em muito superior àquela normalmente atribuída ao bancário comum" (pág. 974), ou seja, detinha fidúcia especial em relação aos demais empregados. No entanto, entendeu que todos os trabalhadores estão sujeitos à jornada de 8 horas diárias e 44 semanais, nos termos do art. 7º, XIII, da CF/88, razão pela qual condenou o banco ao pagamento das horas extras. Em tal contexto, a decisão regional contraria a Súmula 287 desta Corte Superior, parte final. Recurso de revista conhecido por contrariedade à Súmula 287 do TST, parte final e provido. CONCLUSÃO: Agravo de instrumento conhecido e desprovido e recurso de revista conhecido e provido. (ARR-21521-09.2015.5.04.0561, 7ª Turma , Relator Ministro Alexandre de Souza Agra Belmonte, DEJT 04/04/2025).
Nesse sentido, ainda, precedente de 25/10/2024, da Col. SbDI-1:
(...) RECURSO DE EMBARGOS REGIDO PELAS LEIS 13.015/2014 E 13.467/2017. HORAS EXTRAS. BANCÁRIO. GERENTE DE AGÊNCIA. Cinge-se a controvérsia ao enquadramento do empregado bancário no artigo 224, § 2º, ou no artigo 62, II, ambos da CLT, em caso no qual o Tribunal Regional afirma que o reclamante enquadrava-se na hipótese do artigo 224, § 2º, da CLT, notadamente porque as atribuições dele como gerente não tinham natureza de atos de gestão a atrair a exceção prevista no artigo 62, II, da CLT, inclusive porque este dispositivo não se aplicaria à categoria bancária. O TRT assenta ainda que, embora atuasse como gerente de agência, estava subordinado ao superintendente regional ou à diretoria do reclamado, e não detinha poderes para aplicar penalidades, conceder empréstimos, realizar financiamentos ou negociar taxas, sem procuração para atuar em nome do Banco para admissão, nomeação ou dispensa de empregados, e que suas transações deveriam ser aprovadas por um comitê de empregados da própria agência. Observa-se que o reclamante não tinha superior hierárquico na agência e não há qualquer elemento a demonstrar que ele estava submetido a controle de jornada, o que corrobora a constatação de ser ele a autoridade máxima na agência. Em se tratando, porém, de analisar-se a aplicação da Súmula n. 287 do TST, a presunção de estar o gerente geral de agência enquadrado no art. 62, II da CLT somente é elidida quando o controle de jornada está evidenciado, não tendo influência a decisão que não se revele conclusiva sobre o tema. A circunstância de o empregado não possuir autonomia absoluta ou todos os poderes de mando e de gestão já foi examinada nesta colenda SBDI I, prevalecendo o entendimento de que a autonomia a que se refere à Súmula 287 do TST não significa a condição de substituir em plenitude ao empregador, pois a circunstância de ser a autoridade máxima da agência é bastante para atrair a presunção, relativa embora, de ele autodeterminar a sua jornada . Precedentes. Impõe-se, pois, reconhecer o enquadramento do autor no artigo 62, II, da CLT e julgar improcedente o pedido de horas extras, excluindo da condenação as parcelas decorrentes. Recurso de embargos conhecido e provido. (E-ED-RRAg-113000-24.2010.5.17.0003, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais , Relator Ministro Augusto Cesar Leite de Carvalho, DEJT 25/10/2024).
A permanência da litigiosidade, mesmo em face de ampla pacificação da matéria neste Tribunal Superior, a ponto de ensejar a edição do verbete em comento, constitui disfunção de nossa sistemática recursal que permite que esta Corte tenha de desviar sua atenção das questões verdadeiramente novas, tendo de examinar recursos em matérias já pacificadas, com os quais não deveria mais ter de se ocupar. A presente controvérsia evidencia, justamente, que a jurisprudência meramente persuasiva não foi capaz de racionalizar o sistema recursal, detendo a desnecessária recorribilidade em temas já resolvidos pelas instâncias superiores.
Em tal contexto, faz-se imperativo que o presente recurso seja afetado a fim de que, em seu julgamento, se possa reafirmar de forma vinculante a tradicional corrente jurisprudencial representada pela Súm. nº 287.
Feitos tais registros, verifica-se que o representativo definido para alçar o tema a debate foi interposto em face de acórdão do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região que, adotando entendimento conforme aquele deste C. Tribunal Superior do Trabalho, decidiu no sentido de enquadrar o recorrente, detentor do cargo de gerente geral, no que dispõe o art. 62, II, da CLT, mantendo a sentença de piso que indeferiu o pedido de horas extras, intervalo intrajornada e reflexos.
Insta salientar que aquele juízo considerou comprovados os requisitos necessários à configuração do cargo de mando e de gestão, circunstâncias fáticas insuscetíveis de revisão nesta instância superior, por força do que dispõe a Súmula nº 126. Importa ainda mencionar que está superada a jurisprudência colacionada pelo recorrente no sentido de que o exercício de gerência compartilhada é incompatível com a aplicação da Súmula nº 287, conforme se infere dos seguintes julgados: E-RR-96-73.2010.5.09.0071, SBDI-1, Relator Ministro Jose Roberto Freire Pimenta, DEJT 01/12/2023 e RRAg-0020293-06.2021.5.04.0523, 1ª Turma, Relator Ministro Amaury Rodrigues Pinto Junior, DEJT 01/07/2025.
À vista da jurisprudência pacífica desta Corte, objeto de Súmula, enfrenta desnecessária e renitente recorribilidade, forçoso admitir a afetação do presente Incidente de Recurso de Revista, para reafirmação da jurisprudência, nos termos do § 5º do art. 132-A do Regimento Interno do TST, o qual autoriza que “o julgamento de mérito do incidente de recurso repetitivo, no caso de mera reafirmação de jurisprudência dominante da Corte, também será realizado por meio do Plenário Eletrônico, na mesma sessão virtual que decide sobre a proposta de afetação .”
A atuação qualificada e célere do Tribunal Superior do Trabalho sob o rito dos recursos repetitivos converge para sua finalidade precípua como Corte de precedentes – ainda com mais razão nestes casos em que já produziu jurisprudência pacificada sobre a matéria, bastando que haja sua reafirmação sob rito destinado à conversão em precedente obrigatório, de modo a evitar o inchaço do sistema recursal e o desnecessário prolongamento das lides.
Assim, do julgamento do caso concreto afetado, extrai-se a reafirmação da mesma ratio decidendi que permeou os precedentes que originaram a Súm. nº 287, firmando-se a tese jurídica do presente incidente de recursos repetitivos nos mesmos termos , a saber:
A jornada de trabalho do empregado de banco gerente de agência é regida pelo art. 224, § 2º, da CLT. Quanto ao gerente-geral de agência bancária, presume-se o exercício de encargo de gestão, aplicando-se-lhe o art. 62 da CLT.
No caso em exame, o recurso de revista de que trata o tema afetado para representativo de controvérsia não merece ser conhecido, por incidência da tese ora fixada.
Quanto aos demais temas recursais listados no relatório, determina-se o seu oportuno julgamento por uma das Turmas do Tribunal.
ISTO POSTO
ACORDAM os Ministros do Tribunal Pleno do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade: I – Acolher a proposta de afetação do incidente de recurso de revista, para reafirmar a jurisprudência deste Tribunal, quanto à matéria, fixando a seguinte tese obrigatória para o presente Incidente de Recursos Repetitivos: A jornada de trabalho do empregado de banco gerente de agência é regida pelo art. 224, § 2º, da CLT. Quanto ao gerente-geral de agência bancária, presume-se o exercício de encargo de gestão, aplicando-se-lhe o art. 62 da CLT. II – Não conhecer do recurso de revista no tema objeto do representativo, por incidência da tese ora fixada. III – Determinar a oportuna redistribuição a uma das Turmas desta Corte, na forma regimental, para fins do julgamento dos temas remanescentes.
Brasília, de de
Aloysio Silva Corrêa da Veiga
Ministro Presidente do TST