A C Ó R D Ã O

SDI-1 PLENA (SDI-1)

JOD/vm/fv

INCIDENTE DE RECURSO DE REVISTA REPETITIVO. TEMA Nº 0006. CONTRATO DE EMPREITADA. DONO DA OBRA. RESPONSABILIDADE. ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL Nº 191 DA SbDI-1 DO TST VERSUS SÚMULA Nº 42 DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA TERCEIRA REGIÃO

1 . A exclusão de responsabilidade solidária ou subsidiária por obrigação trabalhista, a que se refere a Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1 do TST, não se restringe a pessoa física ou micro e pequenas empresas. Compreende igualmente empresas de médio e grande porte e entes públicos.

2. A excepcional responsabilidade por obrigações trabalhistas, prevista na parte final da Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1 do TST, por aplicação analógica do artigo 455 da CLT, alcança os casos em que o dono da obra de construção civil é construtor ou incorporador e, portanto, desenvolve a mesma atividade econômica do empreiteiro.

3. Não é compatível com a diretriz sufragada na Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1 do TST jurisprudência de Tribunal Regional do Trabalho que amplia a responsabilidade trabalhista do dono da obra, excepcionando apenas " a pessoa física ou micro e pequenas empresas, na forma da lei, que não exerçam atividade econômica vinculada ao objeto contratado ".

4. Exceto ente público da Administração direta e indireta, se houver inadimplemento das obrigações trabalhistas contraídas por empreiteiro que contratar, sem idoneidade econômico-financeira, o dono da obra responderá subsidiariamente por tais obrigações, em face de aplicação analógica do art. 455 da CLT e de culpa in eligendo .

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Incidente de Recurso de Revista Repetitivo n° TST-IRRR-190-53.2015.5.03.0090 , em que é Recorrente ANGLO AMERICAN MINÉRIO DE FERRO BRASIL S.A. , são Recorridos ALEXANDER MAGNUS PRIMUS CARVALHO DE OLIVEIRA e MONTCALM MONTAGENS INDUSTRIAIS LTDA. e Amici Curiae COMPANHIA DE DESENVOLVIMENTO HABITACIONAL E URBANO DO ESTADO DE SÃO PAULO - CDHU, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DOS PRODUTORES INDEPENDENTES DE ENERGIA ELÉTRICA - APINE, CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA INDÚSTRIA - CNI e ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DO AGRONEGÓCIO - ABAG .

Trata-se de recurso de revista interposto por ANGLO AMERICAN MINÉRIO DE FERRO BRASIL S.A. em face do v. acórdão regional de fls. 666/674 da visualização eletrônica, por meio do qual o Eg. Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, com fundamento na Súmula nº 42 daquela Corte , manteve a r. sentença que condenara subsidiariamente a Reclamada ao pagamento de parcelas decorrentes do contrato de trabalho firmado com a empreiteira, no caso a Reclamada MONTCALM MONTAGENS INDUSTRIAIS LTDA.

Originalmente distribuído o recurso de revista no âmbito da Sexta Turma do TST, o Exmo. Ministro Aloysio Corrêa da Veiga, Relator, propôs a instauração de Incidente de Recurso de Revista Repetitivo, com fulcro nos artigos 896-B e 896-C da CLT e na Instrução Normativa nº 38/2015 do TST .

Acolhida a proposição formulada pelo Exmo. Ministro Relator originário (fls. 724/729), o processo foi submetido à Eg. SbDI-1 para " decisão de afetação na questão alusiva à controvérsia, em relação à Súmula nº 42 do TRT da 3ª Região, quanto à responsabilidade subsidiária — dono da obra, em confronto com as decisões do Tribunal Superior do Trabalho ".

Em sessão realizada em 5 de maio de 2016, a Eg. SbDI-1 decidiu, por maioria, " afetar à SbDI-1 Plena a questão relativa à ‘restrição do conceito de dono da obra, previsto na OJ 191 da SBDI-1, para efeitos de exclusão de responsabilidade solidária ou subsidiária trabalhista, à pessoa física ou micro e pequenas empresas, matéria objeto da Súmula nº 42 do eg. TRT da 3ª Região . (fl. 732).

Sorteado Relator, mediante despacho de fls. 736/738 (DEJT de 7/6/2016), em observância ao disposto no artigo 5º, inciso I, da Instrução Normativa nº 38/2015, fixei a questão jurídica controvertida, nos seguintes termos:

" O conceito de ‘dono da obra’, previsto na OJ nº 191 da SBDI-1/TST, para efeitos de exclusão de responsabilidade solidária ou subsidiária trabalhista, restringe-se a pessoa física ou micro e pequenas empresas, na forma da lei, que não exerçam atividade econômica vinculada ao objeto contratado? "

Na mesma assentada, amparado nas disposições dos artigos 896-C e 5º da Instrução Normativa nº 38/2015 do TST, adotei as providências cabíveis. Dispensei a realização de audiência pública, tendo em vista a natureza eminentemente jurídica da controvérsia.

Várias entidades requereram o ingresso na relação processual, na condição de "Amici Curiae".

Deferi a intervenção , na relação processual, nessa qualidade, das seguintes Pessoas Jurídicas: COMPANHIA DE DESENVOLVIMENTO HABITACIONAL E URBANO DO ESTADO DE SÃO PAULO — CDHU, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DOS PRODUTORES INDEPENDENTES DE ENERGIA ELÉTRICA — APINE, CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA INDÚSTRIA — CNI e ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DO AGRONEGÓCIO (ABAG).

A COMPANHIA DE DESENVOLVIMENTO HABITACIONAL E URBANO DO ESTADO DE SÃO PAULO — CDHU, às fls. 827/836, asseverou que, " como sociedade de economia mista componente da Administração Pública Indireta do Estado de São Paulo, ligada ao Sistema Financeiro de Habitação ", atua " como fomentadora de programas de habitação urbana para a população de baixa renda ". Ressaltou sua intenção de " prestar esclarecimentos sobre questões essenciais ao processo e auxiliar esta Corte Superior no julgamento da matéria controvertida ". Posteriormente , intimada para apresentar memoriais escritos e/ou informações pertinentes, já na qualidade de "Amicus Curiae", às fls. 3.176/3.186, requereu a ratificação dos termos da Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1 do TST. Ao impugnar o teor da Súmula nº 42 do TRT da 3ª Região, consignou que " a imposição de restrição pura e simples do conceito de ‘dono da obra’ a pessoas físicas, micro e pequenas empresas, é arbitrária e discriminatória, já que não vislumbra todas as situações em que há empresas cujas atividades não são diretamente ligadas à construção civil e que não são economicamente vinculadas ao objeto contratado, mas que possuem uma constituição de sociedade de economia mista, como é o caso da CDHU ".

O ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, às fls. 855/861, preliminarmente argumentou que " poderá trazer dados que contribuam para o deslinde da controvérsia ", uma vez que, não raro, atua como "dono da obra" na execução de obras públicas, mediante contratos de empreitada. Posteriormente, reiterou " sua manifestação no sentido da manutenção do teor da Orientação Jurisprudencial nº 191, de modo que não seja reduzido o conceito de ‘dono da obra’, por ela previsto, ao menos no que se refere à Administração Pública ." Argumentou que " sua eventual exclusão do conceito causará um grande impacto financeiro ao Estado do Rio Grande do Sul, suas autarquias e fundações, e aos demais entes públicos, os quais se veem obrigados a contratar, por meio de licitação, a execução de uma série de obras, como a construção de presídios, Fóruns, etc . , atividade que não está vinculada ao seu objetivo principal, sendo descabida a contratação de servidores públicos para tanto " (fls. 3.148/3.149) .

A ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DO AGRONEGÓCIO (ABAG), mediante petição de fls. 863/890, postulou, em nome do ramo empresarial ligado ao agronegócio, a manutenção do entendimento sufragado na Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1 do TST. A referida entidade não apresentou memoriais escritos e/ou informações pertinentes, muito embora devidamente intimada para tanto (certidão de fl. 3.188).

A CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA INDÚSTRIA — CNI, às fls. 910/926, justificou o requerimento de ingresso na relação processual, na condição de "amicus curiae", em virtude " da extensão das consequências do presente tema à categoria econômica industrial ". Intimada para apresentar memoriais escritos, limitou-se a endossar os fundamentos expendidos na petição em que postulou a sua intervenção como amicus curiae (fl. 3.146).

A ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DOS PRODUTORES INDEPENDENTES DE ENERGIA ELÉTRICA — APINE, às fls. 984/998, sustentou que pode contribuir " ativamente para o debate acerca da responsabilização do dono da obra ". Segundo alegou, as empresas as quais representa, do ramo de geração de energia elétrica, ostentam a condição de "donas da obra" em relevantes empreendimentos de porte nacional, de grande importância econômica e social, como, por exemplo, na construção de usinas hidrelétricas. Intimada para apresentar memoriais escritos e/ou informações pertinentes, às fls. 3.151/3.174, trouxe a lume conceitos doutrinários e legislação pertinente ao contrato de empreitada. Rememorou o histórico que permeou a edição e a alteração de redação da Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1 do TST. Invocou o princípio da legalidade como limite para a atividade jurisprudencial dos Tribunais, a fim de rechaçar o teor da Súmula nº 42 do TRT da Terceira Região. Segundo alegou, " ainda que eventualmente premido de boa intenção (...), aquele E. Tribunal acabou invadindo a esfera legislativa e impondo às empresas que contratam obras de construção civil junto a empreiteiras obrigações que não estão previstas em nossa legislação " . Aduziu que o TRT da Terceira Região, ao editar a Súmula nº 42, " sobrepôs-se ao processo democrático legislativo e estabeleceu obrigações ao dono da obra ao arrepio do art. 5º, II, da Constituição Federal ". Realçou o desequilíbrio contratual e a insegurança jurídica gerados a partir da edição da Súmula regional nº 42 do TRT da Terceira Região. Invocou o princípio da isonomia. Em síntese, requereu a manutenção integral da diretriz presentemente sufragada na Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1 do TST. Por fim, pleiteou que haja modulação dos efeitos de eventual decisão, no presente incidente, que porventura promova a alteração da diretriz sufragada na Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1 do TST. Os critérios de modulação sugeridos pelo amicus curiae contemplam duas possibilidades: (a) " que os efeitos do julgado apenas alcancem os contratos de empreitada que forem celebrados a partir da data da sua publicação " ou (b) " que a modulação atinja os créditos trabalhistas contraídos a partir da data do julgamento ".

Recebi como memoriais as petições protocolizadas por CONFEDERAÇÃO NACIONAL DO COMÉRCIO DE BENS, SERVIÇOS E TURISMO (CNC) , EMPRESA DE TRANSMISSÃO SERRANA S.A. — ETSE e IGREJA MESSIÂNICA MUNDIAL DO BRASIL (fls. 1.528/1.534, 3.119/3.020 e 3.129) .

Em atenção aos ofícios encaminhados, os Tribunais Regionais do Trabalho da 3ª, da 15ª e da 16ª Regiões indicaram processos para possível afetação como representativos da controvérsia (certidão de fls. 1.525/1.526).

Além do processo em que suscitado o presente incidente (RR-190-53.2015.5.03.0090), admiti, como representativos da controvérsia , os quatro processos seguintes, oriundos dos Tribunais Regionais do Trabalho da 3ª e da 15ª Regiões: RT-10119-76.2015.5.03.0069 (3ª Região); RO-706-13.2013.5.15.0154 (15ª Região); RO-10965-29.2014.5.15.0123 (15ª Região).

O Ministério Público do Trabalho, em parecer de fls. 1.513/1.524, opinou por que prevaleça o entendimento jurídico perfilhado na Súmula nº 42 do TRT da 3ª Região.

O Parquet invocou os princípios protetivo e da dignidade da pessoa humana como os pilares de sustentação da tese jurídica encampada na Súmula regional nº 42. Reputou pertinente uma "releitura jurisprudencial" do tema concernente à responsabilidade trabalhista do dono da obra, tendo em vista a " complexidade das novas relações entre instituições e/ou empresas entre si, em detrimento aos direitos trabalhistas que devem ser, de todo, preservados, sendo este o objeto do Direito do Trabalho. " Aludiu ao desamparo do trabalhador frente ao inadimplemento de seus haveres trabalhistas por ocasião da dissolução do contrato de trabalho. Teceu crítica à aplicação literal da diretriz da Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1, cujo efeito, no entender do Parquet , é o de que " continuarão impagáveis os processos executórios trabalhistas onde as instituições públicas ou privadas foram caracterizadas como dono (sic) da obra e suas responsabilidades afastadas " . Ao final, o Exmo. Subprocurador-Geral do Trabalho, Dr. Aluísio Aldo da Silva Junior, opinou " por se consagrar o entendimento jurídico posto na Súmula nº 42, do C. Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região " .

É o relatório.

MÉRITO DO INCIDENTE DE RECURSO DE REVISTA REPETITIVO

1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS. SÚMULA Nº 42 DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA TERCEIRA REGIÃO. ANÁLISE OBJETIVA DE ALGUNS DOS JULGADOS QUE RESPALDARAM A SUA EDIÇÃO

O Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, por meio da Resolução Administrativa nº 189, de 13 de agosto de 2015, editou a Súmula nº 42 no âmbito daquela Corte, em que abraçou a seguinte tese jurídica:

" OJ 191 DA SBDI-I DO TST. DONO DA OBRA. PESSOA FÍSICA OU MICRO E PEQUENAS EMPRESAS. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA OU SUBSIDIÁRIA .

O conceito de ‘dono da obra’, previsto na OJ n. 191 da SBDI-I/TST, para efeitos de exclusão de responsabilidade solidária ou subsidiária trabalhista, restringe-se a pessoa física ou micro e pequenas empresas, na forma da lei, que não exerçam atividade econômica vinculada ao objeto contratado."

A meu sentir, o ponto de partida para o julgamento do presente incidente é, sem sombra de dúvida, a compreensão das razões que ensejaram a edição da Súmula nº 42 , no âmbito do TRT da Terceira Região.

A jurisprudência consolidada em apreço é fruto de julgados oriundos da 1ª, 3ª, 4ª, 5ª, 6ª, 7ª e 10ª Turmas do TRT da Terceira Região.

Como condição um tanto necessária, analiso, para logo, alguns desses julgados, por amostragem, conforme informações extraídas do site oficial do Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região na Internet ( www.trt3.jus.br ):

1º) Processo nº 00083-2011 . 156 . 03 .00. 4-RO (7ª Turma, publicação: DEJT 24/4/2015) , cuja ementa é a seguinte:

"RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA – DONO DA OBRA – A circunstância se amolda à Súmula 331 do TST, pois a 2.ª ré, como cliente, contratou a 1.ª, para realização de serviços inseridos no objeto social da empresa . Nesse caso, sendo o objeto de tal pactuação de primordial importância para o desenvolvimento de suas atividades econômicas, tem-se que a terceirização se deu em relação a atividades de caráter comercial/industrial, não sendo o caso de aplicação da mencionada OJ 191 da SBDI-1 do TST , mas, sim, da Súmula 331, IV e VI, do mesmo Tribunal." (grifamos)

No caso retratado no referido julgado, a Reclamada Usina Frutal Açúcar e Álcool S.A. firmou contrato civil com a empresa Zama Serviços de Solda Ltda. para " realização de serviços de obras civis nas suas dependências, visando a expansão de sua planta industrial ". Tais serviços consistiam na " manutenção em equipamentos industriais do seu parque industrial ".

O Eg. TRT da Terceira Região manteve a condenação subsidiária da empresa contratante, ante a invocação da Súmula nº 331, IV e VI, do TST. Ressaltou que " a tutela constitucional da dignidade da pessoa humana e do valor social do trabalho exige a releitura da Orientação Jurisprudencial 191 da SBDI-1 do TST , impedindo que pessoas jurídicas de grande porte valham-se da exceção legal preconizada no art. 455 da CLT para se furtar à fiscalização do cumprimento das obrigações trabalhistas pelo prestador de obras e serviços " (grifamos).

2º) No Processo nº 00323-2014 . 146 . 03 .00. 6-RO (3ª Turma, publicação: DEJT 26/1/2015), assim decidiu a Corte Regional:

"MUNICÍPIO. OBRAS DE INFRAESTRUTURA. OJ Nº 191/SDI-1/TST. NÃO APLICAÇÃO. Não se aplica a OJ 191 da SDI-1 do TST quando o município tem a obrigação estatal de oferecer à população obra de infra-estrutura e contrata empreiteira para a sua execução. Isto porque, referida Orientação Jurisprudencial somente é aplicável às hipóteses em que o dono da obra esporadicamente se dedica à construção civil e não àquele que tem a construção civil inserida em suas atividades institucionais ." (grifamos)

Em relação ao julgado em apreço, o ente público reclamado — Município de Umburatiba — firmou contrato de empreitada com a empresa Construtora Arte Minas Ltda., "para a construção da Escola Municipal Solivar F. Borges".

A Sétima Turma do Eg. TRT da Terceira Região manteve a responsabilidade subsidiária imputada em sentença ao ente público. Justificou o afastamento da diretriz contida na Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1 e a incidência da Súmula nº 331 do TST, haja vista que " o Município tem a obrigação de oferecer ensino à população e, para tanto, contrata empreiteira para a construção da escola onde prestará esse serviço público " .

3º) Relativamente ao Processo nº 0000026-79.2012.5.03.0030-RO (1ª Turma, publicação: DEJT 19/12/2014), a ementa do acórdão regional encontra-se vazada nos seguintes termos:

"RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. DONO DA OBRA. A responsabilidade subsidiária fundamenta-se no princípio da função social do contrato, que não se coaduna com a pretendida hermetização do contrato havido entre as rés, de modo a excluir qualquer responsabilidade social de um dos beneficiários dos serviços prestados pelo trabalhador. Tal contrato, sob a ótica desse princípio, não pode constituir instrumento de exclusão de responsabilidades, até porque o contrato de trabalho também não é hermeticamente fechado entre as partes contratantes, lançando efeitos e responsabilidades aos terceiros que dele se beneficiam. Dessa feita, a OJ 191 em questão só se aplica quando o dono da obra for uma pessoa física, sendo o empreendimento sem finalidade econômica, não sendo esta a hipótese dos autos ." (grifamos)

No caso em foco, a Reclamada Mineração Turmalina Ltda., empresa do ramo de extração de minério de metais preciosos, celebrou contrato de natureza civil com a empresa SETEM Serviços Técnicos de Montagens e Manutenção Ltda. O objeto do referido contrato consistiu na " prestação de serviços de desmontagem, fornecimento de materiais e montagens de estruturas metálicas (grades de piso, corrimão, escadas metálicas e guarda-corpo) para os prédios da eluição, CIP e lixiviação da planta metalúrgica da Mineração Turmalina ".

Na espécie, o Eg. TRT da Terceira Região também erigiu o entendimento de que " a OJ 191 em questão só se aplica quando o dono da obra for uma pessoa física, sendo o empreendimento sem finalidade econômica, não sendo esta a hipótese sob análise ". Por essa razão, aplicou ao caso a diretriz da Súmula nº 331, IV, do TST e imputou responsabilidade subsidiária à empresa contratante dos serviços especializados .

4º) Processo nº 02486-2013-138-03-00-8-RO (4ª Turma, publicação: DEJT 23/3/2015) , cuja ementa é a seguinte:

"EMPRESA TOMADORA DOS SERVIÇOS. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. Beneficiária da prestação de serviços do reclamante, fato incontroverso nos autos, responde a segunda reclamada, subsidiariamente, pela satisfação dos créditos deferidos na decisão de origem. Inteligência da Súmula 331, IV, do TST."

Emerge desse processo que a Reclamada Vale S.A. celebrou contrato de empreitada de construção civil com a litisconsorte passiva EGESA Engenharia S.A., tendo por objetivo " a execução de obras de terraplenagem, contenções e drenagens ".

O Eg. Regional assentou que se tratava de contrato " que não se relaciona com a atividade fim da recorrente, não havendo ilicitude no caso ". Manteve a condenação subsidiária da Reclamada Vale S.A., com fundamento na Súmula nº 331, IV, do TST. Ressaltou, também, que " a OJ 191 da SDI-1 do TST deve ser direcionada apenas às pessoas físicas que reservam algumas economias para construir ou reformar seu imóvel residencial, não possuindo, obviamente, condições para acompanhar o atendimento dos deveres trabalhistas pelo empreiteiro ". Concluiu, assim, que " o dono da obra é desonerado de obrigação, a teor da mencionada OJ, quando o contrato de empreitada ou prestação de serviços é pactuado perante terceiros por pessoa física, como essencial valor de uso (construção de casas para residência e lazer, sem caráter lucrativo, por exemplo) " .

1.1. CONCLUSÕES SOBRE OS PRECEDENTES DA SÚMULA Nº 42 DO TRT DA 3ª REGIÃO

O exame conjunto dos quatro aludidos precedentes , que originaram a Súmula regional nº 42, permite-nos extrair as seguintes conclusões:

1ª) em alguns dos processos, cuidou-se de contrato de empreitada de construção civil. Em outros, celebrou-se contrato para a prestação de serviços consistentes, em geral, na instalação ou manutenção de equipamentos do parque industrial da empresa contratante;

2ª) referidos julgados têm em comum, também, o fato de figurarem, no polo passivo da relação processual , empresas privadas de grande porte (mineradoras e usina de beneficiamento de cana-de-açúcar) ou ente público;

3ª) nos processos examinados, prevaleceu perante a Corte Regional o reconhecimento da responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto às obrigações trabalhistas da empreiteira, na forma da Súmula nº 331, IV, do TST;

4ª) nos julgados mencionados, o Eg. TRT da Terceira Região assentou a tese jurídica que delimita a incidência da Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1 do TST aos casos em que o dono da obra seja pessoa física cujo empreendimento não ostente vinculação econômica .

5ª) em alguns casos, invocou-se o princípio da dignidade da pessoa humana, ou o valor social do trabalho, ou a função social do contrato como razão determinante da decisão, mas sem confrontar tais princípios com outros de igual hierarquia.

2. PROCESSOS REPRESENTATIVOS DA CONTROVÉRSIA

Cabe, agora, examinar os processos selecionados como representativos da controvérsia no presente incidente.

São quatro os processos eleitos como representativos da controvérsia, oriundos dos Tribunais Regionais do Trabalho da Terceira e da Décima Quinta Região, para efeito de julgamento do presente incidente.

Decerto que a análise de tais processos contribuirá para o equacionamento e a fixação das teses jurídicas no presente IRRR .

Eis os aspectos relevantes de cada processo representativo da controvérsia:

1º) No Processo principal nº TST-RR-190-53.2015.5.03.0090 , proveniente do TRT da Terceira Região, cuida-se de reclamação trabalhista ajuizada em face da ex-empregadora, MONTCALM, empresa especializada em montagem eletromecânica em minas de extração de minério de ferro , e da empresa Anglo American Minério de Ferro Brasil S.A., cuja atividade econômica é a extração de minério de ferro.

Nesse caso, as Reclamadas firmaram contrato civil de "prestação de serviços" para a execução de " serviços de montagem eletromecânica do pacote ME-00-02, partes 1 e 2 (tubulações, estruturas, usina de concentração, disposição de rejeitos, unidades e interconexões), parte integrante (sic) das obras de construção da Planta de Beneficiamento de Minério de Ferro (...)" (contrato de prestação de serviços, à fl. 506).

O Reclamante requereu a condenação solidária das Reclamadas ou, alternativamente, a condenação subsidiária da empresa mineradora ao pagamento de parcelas oriundas do contrato de trabalho firmado com a empresa de montagem industrial.

O Eg. TRT da Terceira Região invocou justamente a Súmula regional nº 42, objeto do presente incidente, para manter a responsabilidade subsidiária imposta à empresa contratante .

Ao afastar a incidência da Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1 do TST, a Corte Regional assentou que, " tratando-se a 2ª reclamada, ora recorrente, Anglo American Minério de Ferro Brasil S.A. de empresa de grande porte e contratante de outra (a empregadora do reclamante) para execução de empreendimento utilizado em sua produção, ou seja, vinculado à sua atividade econômica, a ela não se aplica a referida orientação jurisprudencial ".

2º) Relativamente ao Processo nº TST-RR-10119-76.2015.5.03.0069, também proveniente do TRT da Terceira Região, o Reclamante ajuizou reclamação trabalhista em face da ex-empregadora, APS Assessoria em Segurança do Trabalho e Meio Ambiente Ltda., e da empresa Samarco Mineração.

Emerge do referido processo que a Reclamada Samarco firmou contrato civil de empreitada com a litisconsorte passiva APS Assessoria, cujo objetivo consistiu na prestação de " serviços técnicos de gerenciamento da saúde e segurança do trabalho dos projetos nas instalações industriais " da mineradora SAMARCO " em Germano/MG, Ubu/ES e ao longo do Mineroduto " (fls. 2.638/2.666) .

O Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região manteve a responsabilidade subsidiária imposta em sentença à Reclamada SAMARCO, também com fundamento na Súmula regional nº 42. Posicionou-se no sentido de que " a Orientação Jurisprudencial 191, da SDI-1, do C. TST foi criada somente com o escopo de eximir de responsabilidade ‘o dono da obra pessoa física’, que constrói para si ou sua família, sem qualquer objetivo de exploração econômico-financeira, o que não se aplica, por óbvio, à recorrente " (fls. 2.755/2.756).

3º) No que tange ao Processo nº TST-RR-706-13.2013.5.15.0154, oriundo do Tribunal Regional do Trabalho da Décima Quinta Região, a Reclamada BRF Foods, empresa do ramo alimentício, celebrou contrato civil de "prestação de serviços" com a Reclamada GEA Westfalia Separator do Brasil Indústria de Centrífugas Ltda. Referido contrato objetivou o fornecimento de mão de obra especializada destinada à instalação de "planta industrial para extração de óleos vegetais" e de "planta de interesterificação e pós-tratamento". A Reclamada GEA, por sua vez, subcontratou a Reclamada MONTMAX Montagens Industriais Ltda. — EPP, empregadora do Reclamante.

O Eg. Tribunal Regional do Trabalho da Décima Quinta Região, no que interessa, reformou a sentença para declarar a responsabilidade subsidiária da Reclamada BRF — Brasil Foods S.A., com fundamento na diretriz da Súmula nº 331, IV, do TST. Afastou a incidência da Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1 do TST, aduzindo que " o conceito de dono da obra está limitado aos que, em condições normais, não seriam empregadores nem mesmo diante da contratação direta ", " vale dizer, pessoas físicas que não assumem o risco de qualquer tipo de atividade econômica " (fl. 2.418) .

4º) No tocante ao Processo nº TST-RR-10965-29.2014.5.15.0123, oriundo do TRT da Décima Quinta Região, as Reclamadas JWD Edificações Ltda.-ME e Margem Cia de Mineração firmaram contrato de empreitada de construção civil para a construção "de uma hospedaria" na sede da Reclamada Margem Cia de Mineração (fl. 2.922).

Extrai-se do Estatuto Social da Reclamada Margem Cia de Mineração que figuram, dentre seus objetivos, a "prestação de serviços de beneficiamento de minérios" e a "montagem e reparações de máquinas para a construção e indústria", entre outros (fl. 2.900) .

O Eg. Tribunal Regional do Trabalho da Décima Quinta Região, amparado na diretriz da Súmula nº 331, IV, do TST, reformou a sentença para declarar a responsabilidade subsidiária da Reclamada Margem Cia de Mineração pelo adimplemento das verbas decorrentes do contrato de trabalho firmado com a empreiteira.

Ao afastar a incidência da Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1 do TST, a Corte Regional registrou que " a escusa quanto a essa responsabilização diz respeito ao tomador dos serviços pessoa física cuja obra reflita valor essencial de uso (reforma de residência por exemplo) ". Observou, ainda, que " não é o que se verifica no caso em apreço, já que a obra assume caráter estrutural de apoio à dinâmica normal do seu empreendimento, o que atrai a responsabilidade subsidiária ora reconhecida ".

2.1. CONCLUSÕES SOBRE OS PROCESSOS REPRESENTATIVOS DA CONTROVÉRSIA

Conforme se observa, colhe-se dos quatro processos representativos da controvérsia que os Tribunais Regionais do Trabalho da Terceira e da Décima Quinta Regiões inseriram as empresas contratantes, em todos os casos, no conceito de tomador dos serviços, para efeito de incidência da Súmula nº 331, IV, do TST, e não da Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1 do TST .

Ambos os Tribunais Regionais do Trabalho, nos processos selecionados, abraçaram o fundamento jurídico segundo o qual a Orientação Jurisprudencial nº 191 incide apenas nos casos de contrato civil de empreitada celebrado por dono da obra pessoa física, cujo empreendimento não ostente finalidade econômica.

3. ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL Nº 191 DA SBDI-1 DO TST. RAZÕES DETERMINANTES. EXAME DA JURISPRUDÊNCIA DO TST

Cumpre, agora, examinar a origem e as razões determinantes da Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1 do TST .

A redação original da Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1 do TST, de 8/11/2000, como se recorda, reportava-se genericamente ao " contrato de empreitada entre o dono da obra e o empreiteiro " como fator excludente de responsabilidade solidária ou subsidiária do dono da obra em face das obrigações trabalhistas contraídas pelo empreiteiro, " salvo sendo o dono da obra uma empresa construtora ou incorporadora ".

Como se sabe , em maio de 2011, o Tribunal Pleno do TST reformulou parcialmente a Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1 do TST.

Na oportunidade, segundo registram as notas degravadas, houve ampla discussão acerca das múltiplas e instigantes facetas suscitadas pela questão jurídica ora em apreciação .

Debateu-se, inclusive, especificamente a possibilidade de restrição do alcance da Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1 às pessoas físicas . O Exmo. Ministro Maurício Godinho Delgado sustentou exatamente essa tese, que, no entanto, foi rejeitada pelo Tribunal.

Aventou-se, igualmente, a extensão da responsabilidade subsidiária do dono da obra, com fundamento na Súmula nº 331, IV, do TST, a empresas de grande porte e a entes públicos.

Questionou-se também, à luz da legislação civil e trabalhista, o fundamento legal a amparar eventual responsabilização trabalhista do "dono da obra".

Na ocasião, a rigor, cada Ministro externou um posicionamento acerca da revisão da Orientação Jurisprudencial nº 191.

Como se há de recordar, todavia, não se chegou a um consenso senão apenas para acrescer ao texto original da Orientação Jurisprudencial nº 191 a expressão "contrato de empreitada de construção civil ".

Ao final de intensos debates, por conseguinte , em 2011, o TST definiu, de um lado, que o contrato de empreitada a que alude a Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1, histórica e tradicionalmente, é o destinado à construção civil , não abrangendo outros contratos de distinta natureza, para o atendimento de necessidade normal e permanente do empreendimento econômico, a exemplo de contrato de montagem industrial.

De outro lado, manteve-se o entendimento de que, para efeito de afastar a responsabilidade solidária ou subsidiária do dono da obra por obrigações trabalhistas contraídas pelo empreiteiro, irrelevante que o dono da obra seja pessoa física, empresa de pequeno, médio ou grande porte ou ente público, contanto que não seja uma empresa construtora ou incorporadora .

Nesses termos, consoante a atual redação da Orientação Jurisprudencial nº 191, divulgada no DEJT de 31/5/2011, o Tribunal Superior do Trabalho adota, como regra geral, a ausência de responsabilidade trabalhista do dono da obra que celebra contrato de empreitada de construção civil . Apenas excepcionalmente atribui-se responsabilidade ao dono da obra, se construtor ou incorporador .

Compreensível esta última ressalva contida na parte final da Orientação Jurisprudencial nº 191. Ao compartilhar da mesma atividade econômica do empreiteiro, o dito "dono da obra" a ela se equipara e, nessa condição, atrai a aplicação, por analogia, da norma insculpida no artigo 455 da CLT.

Nesse sentido palmilham os julgados que serviram de suporte à revisão da Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1, quer no tocante à amplitude do conceito de "dono da obra" —— não adstrito à pessoa física ——, quer em relação à natureza do contrato civil de empreitada, concernente à construção civil.

Dentre esses, destaco, a título exemplificativo, alguns acórdãos proferidos antes da revisão da Orientação Jurisprudencial nº 191, e que respaldaram a atual redação:

1º) Reporto-me, em primeiro lugar, ao Processo nº ERR-53700-80.2005.5.03.0041 (SbDI-1, Relator Ministro Horácio Raymundo de Senna Pires, DEJT 9/4/2010) , cuja ementa do acórdão ostenta a seguinte redação:

"RECURSO DE EMBARGOS. DECISÃO EMBARGADA PUBLICADA ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI 11.496/2007. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. OBRIGAÇÃO DECORRENTE DE TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA. REPARAÇÃO DE DANOS À COLETIVIDADE CAUSADOS EM RAZÃO DO EXERCÍCIO NORMAL DAS ATIVIDADES DA RECLAMADA. OBRAS ENTREGUES À COMUNIDADE MUNICIPAL. O entendimento cristalizado na OJ-SBDI-1-TST-191 é no sentido da exclusão da responsabilidade do dono da obra, por falta de previsão legal, excepcionando apenas uma única hipótese, qual seja, que o dono da obra seja empresa construtora ou incorporadora . Não há, no texto dessa diretriz jurisprudencial, nenhuma atribuição de responsabilidade pelo aspecto da destinação da obra ou do fato que originou o contrato. No caso dos autos, não se nega a condição de dona da obra da FCA, ainda que as obras mencionadas sejam para o Município de Uberaba e que as construções decorreram de obrigação de fazer . E o item IV da Súmula 331/TST, aplicável aos casos de terceirização, que prevê uma forma excepcional de responsabilização do tomador de serviços pelos débitos do prestador para com seus empregados, não respalda a condenação, por disciplinar hipótese diversa, sendo que nos precedentes que deram origem à OJ-SBDI-1-TST-191 aquele Verbete é expressamente afastado. Nesse particular, como bem lembrou, em Sessão, o Eminente Ministro João Oreste Dalazen, ao editar a OJ-191, o TST, em composição plenária, rejeitou a tese de responsabilidade solidária ou supletiva do dono da obra, com as exceções ali postas de forma restritiva: o dono da obra só é responsável se se tratar de empresa construtora ou incorporadora, natureza que não ostenta a ora embargante. Por fim, não vejo como enxergar, in casu , a típica terceirização disciplinada pela Súmula-TST-331. Como se dizer que a embargante, indenizando o Município com a construção de um imóvel, estaria no exercício de atividade-fim? Trata-se de uma empresa ferroviária. Não estava sequer construindo estações ou a própria via férrea. Substituía a indenização em dinheiro por uma edificação. Como não é construtora, teria, como fez, de contratar por empreitada, a obra que prometera. Inegável que o recurso de revista da FCA merecia ser conhecido por contrariedade à OJ-SBDI-1-TST-191, pelo que resta caracterizada a denunciada ofensa ao artigo 896 da CLT. Recurso de embargos conhecido por contrariedade à OJ 191/SBDI-1 e provido." (grifamos)

No processo de que emana o acórdão sob exame, ao celebrar Termo de Ajustamento de Conduta perante o Ministério Público do Trabalho, a título de reparação por dano ambiental, a Ferrovia Centro Atlântica S.A. comprometeu-se a custear, mediante a contratação de empreiteira, a construção de hospitais, escolas, creches etc., em benefício da população do Município de Uberaba-MG.

Discutia-se, no caso, a responsabilidade da Reclamada Ferrovia Centro Atlântica S.A., dona da obra, em face das obrigações trabalhistas da empreiteira contratada para a execução do serviço.

Consoante se depreende da ementa, a Eg. SbDI-1 do TST conheceu dos embargos da Reclamada Ferrovia Centro Atlântica S.A., por contrariedade à Orientação Jurisprudencial nº 191, e, no mérito, deu-lhes provimento para " absolver a Ferrovia da responsabilidade subsidiária ".

2º) Destaco, também, o acórdão proferido no julgamento do Processo nº RR-620762-58.2000.5.01.5555 (2ª Turma, Relator Ministro Vantuil Abdala, DJ 28/4/2000), também precedente da Orientação Jurisprudencial nº 191 . Eis o teor da respectiva ementa:

"NATUREZA CIVIL DA RELAÇÃO JURÍDICA ENTRE DONO DE OBRA E EMPREITEIRO - CONSTRUÇÃO PARA USO PRÓPRIO OU DA EMPRESA E NÃO PARA REVENDA - INAPLICABILIDADE DA RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA OU SUBSIDIÁRIA

Não se referindo a situação dos autos à relação entre empreiteiro e subempreiteiro, mas entre empreiteiro e dono de obra, relação essa, de natureza eminentemente civil, não há que se falar em violação do art. 455 da CLT. Quando se trata de construção para uso próprio ou da empresa, não está o proprietário assumindo uma atividade econômica no empreendimento em si mesmo, pelo que inexiste qualquer responsabilidade, seja solidária ou subsidiária.

Recurso não conhecido."

No caso examinado, a Reclamada TEXACO BRASIL S.A. — Produtos de Petróleo contratou a empreiteira TECNOBAN Arquitetura e Construções Ltda. para a construção de um posto de gasolina.

A Eg. Segunda Turma do TST, mediante acórdão lavrado em 22/3/2000, anteriormente, portanto, à edição da Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1, em sua redação original, não conheceu do recurso de revista interposto pelo Reclamante. Afastou a incidência da Súmula nº 331, IV, do TST, ao fundamento de que " há que ser ressaltada a distinção entre empreiteiro e proprietário da obra, que estabelecem entre si relação jurídica de natureza civil, diversa da que ocorre entre o realizador da obra e seus empregados ".

Ainda consoante a Eg. Segunda Turma, " o dono da obra não mantém relação empregatícia com os operários que laboram para o empreiteiro, não sendo, portanto, titular de qualquer obrigação de cunho trabalhista " .

3º) Invoco, ainda, o acórdão proferido no Processo nº EEDRR-34900-33.2002.5.17.0004 (SbDI-1, Relatora Ministra Rosa Maria Weber, DEJT 30/4/2009) , também precedente da Orientação Jurisprudencial nº 191 :

"EMBARGOS EM RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO EMBARGADO PUBLICADO SOB A ÉGIDE DA LEI 11.496/2007. DONA DA OBRA. AUSÊNCIA DE RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. Indiscernível a alegada contrariedade à Súmula 331, IV, do TST, pois, na esteira do registrado pela Eg. Turma, no caso, a CST, cuja atividade não está ligada à área de construção ou incorporação, era dona da obra. Assim, não há dúvida de que a decisão turmária que excluiu a responsabilidade subsidiária da ré foi prolatada em sintonia com a OJ 191 desta SDI-I/TST."

O pano de fundo do aludido julgado revela que a Reclamada Companhia Siderúrgica de Tubarão — CST celebrou contrato de empreitada com a empresa SMS DEMAG Ltda. para o fornecimento de equipamento denominado "laminador de tiras a quente". A empreiteira, por sua vez, subcontratou com terceiro a " realização das obras de construção civil necessárias à instalação do aludido equipamento ".

Ao apreciar a controvérsia, a SbDI-1 do TST não conheceu dos embargos interpostos pelo Reclamante, assentando a conformidade do acórdão turmário, então impugnado, com a diretriz da Orientação Jurisprudencial nº 191. Registrou que, " no caso, a Companhia Siderúrgica de Tubarão — CST, cuja atividade não está ligada à área de construção ou incorporação, era dona da obra " .

Como se percebe, extrai-se do exame dos três julgados destacados a preocupação da SbDI-1 do TST em afastar a incidência da Súmula nº 331 do TST, mediante a distinção entre as figuras do "dono da obra" e do "tomador dos serviços" em típica terceirização de mão de obra, de que não se cuidava em nenhum dos casos examinados.

Os julgados mencionados denotam, ainda, a consolidação, no âmbito da SbDI-1 do TST, de entendimento segundo o qual, ao celebrar contrato de empreitada de construção civil , o dono da obra , cuja atividade econômica não se identifica com a construção ou a incorporação , não é responsável, solidária ou subsidiariamente, em face dos contratos de trabalho firmados com a empreiteira.

É certo que, dentre os precedentes da Orientação Jurisprudencial nº 191, há um julgado em que a SbDI-1 invocou a referida Orientação Jurisprudencial em caso envolvendo contrato civil de prestação de serviços de "montagem mecânica e caldeiraria", e não propriamente contrato de empreitada de construção civil . Refiro-me ao Processo nº ERR-112100-98.2006.5.17.0191 (SbDI-1, Relator Ministro Lelio Bentes Corrêa, DEJT 5/2/2010) , em que a Petrobras figurava no polo passivo da relação processual, na condição de "dona da obra".

Não obstante a decisão tomada no aludido acórdão, posteriormente à sua prolação, por ocasião da revisão da Orientação Jurisprudencial nº 191, em 2011, o Tribunal Superior do Trabalho, como visto, conscientemente limitou o espectro de incidência da Orientação Jurisprudencial aos contratos de empreitada de construção civil .

Daí por que o aludido acórdão proferido no Processo nº ERR-112100-98.2006.5.17.0191, a meu sentir, conquanto integre o rol de precedentes que informam a atual redação da Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1, não tem o condão de alterar o entendimento textualmente nela sufragado.

Do quanto já exposto, forçoso reconhecer que o Tribunal Superior do Trabalho, de forma ostensivamente deliberada , em 2011, ao aprovar a atual redação da Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1, não eximiu de responsabilidade exclusivamente o dono da obra pessoa física, ou micro, ou pequenas empresas, mas também empresas de médio e grande porte, bem assim os entes públicos.

Na mesma linha, todos os doze acórdãos precedentes da atual redação da Orientação Jurisprudencial nº 191 foram proferidos em processos nos quais figurou no polo passivo da relação processual, na condição de "dono da obra", ou integrante da Administração Pública indireta, ou grandes empresas privadas (Ferrovia Centro Atlântica S.A.; Petróleo Brasileiro S.A. — Petrobras; Companhia Siderúrgica de Tubarão — CST; Empresa Baiana de Águas e Saneamento S.A. — EMBASA; Celulose Nipo Brasileira S.A. — CENIBRA; Companhia Vale do Rio Doce — CVRD; Usina Itamarati S.A.; Texaco do Brasil S.A. — Produtos de Petróleo; e SHELL Brasil S.A.) .

De sorte que, em todos os precedentes da Orientação Jurisprudencial nº 191, afastou-se a responsabilidade de grandes empresas privadas e de empresas estatais, pela condição de donas da obra.

4. ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL Nº 191 DA SBDI-1 DO TST. CONFRONTO COM A SÚMULA Nº 42 DO TRT DA TERCEIRA REGIÃO

Assim exposta a questão, cumpre examinar se se sustenta, ou não, a tese jurídica objeto da Súmula nº 42 do TRT da Terceira Região, em confronto com a Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1 do TST.

Transparece cristalinamente que, embora se ocupem do mesmo tema — responsabilidade do dono da obra em face das obrigações trabalhistas contraídas pelo empreiteiro —, há patente antinomia entre as teses jurídicas encampadas na Súmula regional e na Orientação Jurisprudencial da SbDI-1 do TST. Significa dizer, portanto, que se trata de uma espécie de "releitura", em âmbito regional, de entendimento jurisprudencial pacificado no Tribunal Superior do Trabalho.

De um lado , como cediço, a Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1 do TST alude amplamente ao " contrato de empreitada de construção civil entre o dono da obra e o empreiteiro ", para efeito de afastar de qualquer responsabilidade o dono da obra em relação às obrigações trabalhistas atribuídas ao empreiteiro.

De outro lado , a despeito de explicitamente invocar a Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1 do TST, a Súmula nº 42 do TRT da Terceira Região deliberadamente restringe a definição de "dono da obra". Tal restrição, como visto, é de tal maneira que, à luz da Súmula regional, apenas se exime de responsabilidade trabalhista o "dono da obra" se se tratar de empregador pessoa física ou de micro ou pequena empresa e desde que não exerça atividade econômica vinculada ao objeto contratado.

Mais ainda, a interpretação restritiva conferida pelo Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região à conceituação de "dono da obra" estranhamente pôs em xeque o próprio alcance da Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1 do TST, a que se reporta e em que se apoia .

Data venia , a meu sentir, a Súmula regional nº 42 absolutamente não guarda conformidade com a Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1 do TST.

Penso que o Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, ao editar a Súmula nº 42, conferiu à Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1 do TST interpretação jurídica que efetivamente não condiz quer com o texto literal, quer com as razões determinantes da referida Orientação Jurisprudencial, conforme se passa a expor.

Em primeiro lugar , chama atenção a situação paradoxal gerada pelo Eg. Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região , que invoca a Orientação Jurisprudencial nº 191 do TST para interpretá-la e aplicá-la de forma a reduzir-lhe substancialmente o alcance.

Pondero, a propósito, que a norma insculpida no artigo 896, § 3º, da CLT, ao prestigiar a atuação dos Tribunais Regionais do Trabalho na construção de sua jurisprudência interna, não constitui sinal verde para conferir a súmulas ou orientações jurisprudenciais do Tribunal Superior do Trabalho interpretação que se afaste do real escopo do entendimento jurisprudencial consolidado neste Tribunal.

Mais ainda: o próprio artigo 896, § 6º, da CLT, ao tratar do incidente de uniformização de jurisprudência nos Tribunais Regionais do Trabalho, se não veda expressamente, ao menos desestimula a edição de súmula regional conflitante com súmula ou orientação jurisprudencial do Tribunal Superior do Trabalho. Como cediço, a teor do referido dispositivo legal, súmula regional ou " tese jurídica prevalecente no Tribunal Regional do Trabalho " contrárias à súmula ou à orientação jurisprudencial do TST não viabilizam o conhecimento de recurso de revista, por divergência jurisprudencial.

Pertinente, ainda, a esse respeito, a observação de LUIZ GUILHERME MARINONI :

"Embora as decisões, no sistema brasileiro, troquem livremente de sinal e não respeitem os julgados das Cortes superiores, deve-se assinalar que isso constitui uma patologia ou um equívoco que, infelizmente, arraigou-se em nossa tradição jurídica." (In "Precedentes Obrigatórios", 4ª edição, São Paulo-SP, Revista dos Tribunais, 2016, pg. 86)

Em segundo lugar , a diretriz encampada na aludida Súmula regional nº 42, a meu juízo, data venia , vulnera igualmente o princípio da isonomia que emana do artigo 5º, caput , da Constituição Federal. Por quê?

Como visto, a Súmula regional nº 42 exclui de responsabilidade todo dono da obra pessoa física, micro e pequenas empresas, desde que não exerça atividade econômica vinculada ao objeto contratado. Ora, pode dar-se de se tratar de grande empresário pessoa física, com receita superior à de uma empresa de médio ou até de grande porte.

A prevalecer a tese da Súmula regional nº 42, portanto, o grande empresário pessoa física que celebre contrato de empreitada de construção civil não responderia pelas obrigações decorrentes dos contratos de trabalho firmados com a empreiteira, ao contrário do que se daria, por exemplo, com empresa de médio porte em situação financeira menos favorecida. Cuidar-se-ia, a meu sentir, de flagrante e injustificável tratamento desigual entre um empresário pessoa física e uma pessoa jurídica .

A afronta ao princípio da isonomia, que derivaria da observância da Súmula regional nº 42, ainda mais avulta quando se tem em conta particularmente o exemplo dos entes públicos, em especial os integrantes da Administração Pública direta.

Com efeito. Cediço que a construção civil não se insere, naturalmente, entre as finalidades de um Estado da Federação. Sucede, todavia, que, com relativa frequência, o Estado celebra contratos de empreitada, mediante licitação, para a construção de escolas, hospitais, presídios, fóruns, creches para a prestação de serviços públicos que se inserem em sua atividade-fim .

Ora, consoante a tese jurídica sufragada na Súmula regional nº 42, o ente público, em semelhante circunstância, suportaria responsabilidade pelos débitos trabalhistas da empreiteira, na mesma dimensão em que se reconhece tal responsabilidade no caso de dono da obra cuja finalidade principal é, de fato, a construção civil. Tal solução, a toda evidência, também implicaria emprestar tratamento igual a situações de patente desigualdade, em descompasso com a clássica formulação aristotélica e, portanto, em evidente afronta ao princípio da isonomia.

Em terceiro lugar , data venia do que sustenta o Ministério Público do Trabalho, penso que a invocação do princípio da dignidade da pessoa humana não é o bastante para embasar a tese da Súmula nº 42 do TRT da Terceira Região.

Conquanto relevantíssima a questão socioeconômica relacionada ao desamparo que não raro atinge os empregados das empreiteiras diante do inadimplemento de suas obrigações trabalhistas, não me parece que a invocação do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, por si só , deva funcionar como verdadeira panaceia para corrigir virtuais injustiças .

A uma, porque, como sabido, o princípio alberga conceito jurídico de alta plasticidade e abstração, de modo a que sua aplicação, levada a ferro e fogo, caberia em qualquer conflito de interesses.

Pertinente a lição de INGO WOLFANG SARLET a respeito das tentativas de aproximação e concretização do conceito e significado da dignidade da pessoa na perspectiva jurídico-constitucional:

"A despeito das inúmeras tentativas de conceituação da dignidade da pessoa formuladas ao longo dos tempos, (...), verifica-se que uma conceituação clara do que efetivamente seja esta dignidade, inclusive para efeitos de definição do seu âmbito de proteção como norma jurídica fundamental, se revela no mínimo difícil de ser obtida , isto sem falar na questionável (e questionada) viabilidade de se alcançar algum conceito satisfatório do que, afinal de contas, é e significa a dignidade da pessoa humana hoje. Tal dificuldade , consoante exaustiva e corretamente destacado na doutrina, decorre certamente (ao menos também) da circunstância de que se cuida de conceito de contornos vagos e imprecisos, caracterizado por sua ‘ambiguidade e porosidade’, assim como por sua natureza necessariamente polissêmica , muito embora tais atributos não possam ser exclusivamente atribuídos à dignidade da pessoa.

(...)

Além disso, verifica-se que a doutrina e a jurisprudência – notadamente no que diz com a construção de uma noção jurídica de dignidade – cuidaram, ao longo do tempo, de estabelecer alguns contornos basilares do conceito, concretizando minimamente o seu conteúdo , ainda que não se possa falar, também aqui, de uma definição genérica e abstrata consensualmente aceita, isto sem falar no ceticismo manifesto de alguns no que concerne à própria possibilidade de uma concepção jurídica da dignidade." (In "Dos Princípios Constitucionais — Considerações em torno das normas principiológicas da Constituição", coordenação de George Salomão Leite, Editora Método, 2ª edição, 2008, São Paulo, pgs. 156/158; grifamos)

Precisamente acerca da aplicação concreta do princípio da dignidade da pessoa humana, lecionam o Exmo. Ministro do STF LUÍS ROBERTO BARROSO e ANA PAULA DE BARCELLOS :

"O princípio da dignidade da pessoa humana identifica um espaço de integridade moral a ser assegurado a todas as pessoas por sua só existência no mundo. É um respeito à criação, independentemente da crença que se professe quanto à sua origem. A dignidade relaciona-se tanto com a liberdade e valores do espírito como com as condições materiais de subsistência. Não tem sido singelo, todavia, o esforço para permitir que o princípio transite de uma dimensão ética e abstrata para as motivações racionais e fundamentadas das decisões judiciais . Partindo da premissa anteriormente estabelecida de que os princípios, a despeito de sua indeterminação a partir de um certo ponto, possuem um núcleo no qual operam como regras, tem-se sustentado que no tocante ao princípio da dignidade da pessoa humana esse núcleo é representado pelo mínimo existencial. Embora haja visões mais ambiciosas do alcance elementar do princípio, há razoável consenso de que ele inclui os direitos à renda mínima, saúde básica, educação fundamental e acesso à justiça.

A percepção da centralidade do princípio chegou à jurisprudência dos tribunais superiores, em que já se assentou que ‘ a dignidade da pessoa humana , um dos fundamentos do Estado democrático de direito, ilumina a interpretação da lei ordinária ." ( artigo em op . cit., pgs. 82/84; grifamos)

Não bastassem as dificuldades inerentes à conceituação da dignidade da pessoa humana, sobreleva, ainda, a baixa densidade normativa de tal princípio, uma vez não positivado em nosso ordenamento jurídico além do enunciado no artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal.

De todo modo, o exame da presente questão jurídica sob a perspectiva do princípio da dignidade da pessoa humana leva à seguinte indagação: na era do pós-positivismo, qual é afinal a relação entre regra e princípio na aplicação do Direito à espécie?

A meu juízo, sob pena de afronta à segurança jurídica, os princípios constitucionais devem auxiliar na interpretação das normas infraconstitucionais, de modo a extrair-lhes a máxima efetividade. Essa conclusão não importa, contudo, a aplicação atomizada de princípios, ainda que de elevada hierarquia constitucional, dissociada de normas positivadas em nosso ordenamento jurídico.

O Exmo. Ministro LUÍS ROBERTO BARROSO bem realça essa verdadeira relação de interdependência entre normas e princípios no atual estágio de interpretação do arcabouço normativo brasileiro:

"Os princípios – notadamente os princípios constitucionais – são a porta pela qual os valores passam do plano ético para o mundo jurídico. Em sua trajetória ascendente, os princípios deixaram de ser fonte secundária e subsidiária do Direito para serem alçados ao centro do sistema jurídico. De lá, irradiam-se por todo o ordenamento, influenciando a interpretação e aplicação das normas jurídicas em geral e permitindo a leitura moral do Direito .

(...)

Estabelecidas algumas distinções relevantes entre regras e princípios, assim do ponto de vista material como formal, cabe assinalar, por fim, os diferentes papéis desempenhados por cada uma dessas espécies normativas no âmbito do sistema jurídico. O principal valor subjacente às regras é a segurança jurídica . Elas expressam decisões políticas tomadas pelo constituinte ou pelo legislador, que procederam às valorações e ponderações que consideraram cabíveis, fazendo com que os juízos por eles formulados se materializassem em uma determinação objetiva de conduta. Não transferiram, portanto, competência valorativa ou ponderativa ao intérprete, cuja atuação, embora não seja mecânica – porque nunca é -, não envolverá maior criatividade ou subjetividade. Regras, portanto, tornam o Direito mais objetivo, mais previsível e, consequentemente, realizam melhor o valor segurança jurídica ." (In "Curso de Direito Constitucional Contemporâneo — Os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo", Editora Saraiva, 4ª edição, São Paulo, 2013, pgs. 226/232; grifamos)

E arremata o eminente jurista:

"Como o direito gravita em torno desses dois grandes valores – justiça e segurança -, uma ordem jurídica democrática e eficiente deve trazer em si o equilíbrio necessário entre regras e princípios . Um modelo exclusivo de regras supervalorizaria a segurança, impedindo, pela falta de abertura e flexibilidade, a comunicação do ordenamento com a realidade, frustrando, em muitas situações, a realização da justiça. Um modelo exclusivo de princípios aniquilaria a segurança jurídica, pela falta de objetividade e previsibilidade das condutas e, consequentemente, de uniformidade nas soluções interpretativas . Como intuitivo, os dois extremos seriam ruins . A advertência é importante porque, no Brasil, a trajetória que levou à superação do positivismo jurídico – para o qual apenas as regras possuiriam status normativo – foi impulsionada por alguns exageros principialistas, na doutrina e na jurisprudência." (In op. cit., pag. 232; grifamos)

Nesta perspectiva, o princípio da dignidade da pessoa humana não pode ser o único fundamento a embasar a declaração de responsabilidade do dono da obra em face das obrigações trabalhistas contraídas pelo empreiteiro.

Por essas razões, data venia , não obstante o louvável escopo de proteção ao hipossuficiente que decerto serviu de força motriz à tese jurídica encampada na Súmula regional nº 42, penso que o princípio da dignidade da pessoa humana deve ser utilizado em exercício de hermenêutica da legislação infraconstitucional, mas não, por si só , como fator determinante de criação de obrigação.

Assim, objetivamente, concluo que não se harmoniza com a diretriz sufragada na Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1 do TST jurisprudência de Tribunal Regional do Trabalho que amplia a responsabilidade trabalhista do dono da obra, excepcionando apenas " a pessoa física ou micro e pequenas empresas, na forma da lei, que não exerçam atividade econômica vinculada ao objeto contratado ".

5. ANÁLISE CRÍTICA DA ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL Nº 191 DA SbDI-1 DO TST. RESPONSABILIDADE DO DONO DA OBRA. INIDONEIDADE ECONÔMICO-FINANCEIRA DO EMPREITEIRO. APRIMORAMENTO DA JURISPRUDÊNCIA DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO. SUPRIMENTO DE LACUNA LEGISLATIVA. ARTIGO 8º DA CLT. ANALOGIA. APLICAÇÃO DO ARTIGO 455 DA CLT

O âmbito de cognição do IRRR não se exaure estritamente no objeto fixado por ocasião da afetação do Incidente ao órgão competente. A disposição em contrário do § 2º do artigo 1.037 do CPC de 2015 foi revogada pela Lei nº 13.256/2016 (art. 3º, inciso II).

De sorte que, admitido o IRRR, o órgão competente pode examinar outras questões jurídicas correlatas do tema.

É o que se dá, mutatis mutandis , após o conhecimento de recurso de revista, por divergência jurisprudencial: no exame do mérito do recurso, abre-se a ampla cognição do Tribunal para o exame do tema controvertido, mediante a aplicação do Direito à espécie, sem as amarras processuais pertinentes ao conhecimento.

Aliás, nesse sentido já decidiu a própria SbDI-1 Plena , no julgamento do IRRR instaurado no Processo nº 849-83.2013.5.03.0138, ocorrido em 21/11/2016 (publicado no DEJT de 19/12/2016).

Na oportunidade, como se recorda, após fixar tese jurídica relativa aos divisores aplicáveis para o cálculo de horas extras devidas aos empregados bancários, a Eg. SbDI-1 Plena adentrou no exame da Súmula nº 124 do TST, por se tratar de matéria ínsita ao equacionamento daquela controvérsia.

Assentada essa premissa, cabe perscrutar se a Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1 desta Corte ainda soluciona de forma juridicamente adequada a questão atinente à responsabilidade do dono da obra por obrigações trabalhistas do empreiteiro que contratar.

Pondero, inicialmente, que, ao ensejo da revisão da Orientação Jurisprudencial nº 191, em 2011, a despeito dos intensos debates sobre outros aspectos polêmicos, aqui já reportados, o Tribunal Superior do Trabalhou não equacionou a sensível temática do recalcitrante inadimplemento das parcelas trabalhistas devidas aos empregados do empreiteiro.

Não obstante, a experiência subministrada a todos nós, advinda da observação do que ordinariamente acontece, tem revelado a frequente contratação de empreiteiros sem idoneidade econômico-financeira para honrar as obrigações trabalhistas com os respectivos empregados. Não raro, a Justiça do Trabalho, ao julgar reclamações trabalhistas propostas por trabalhadores em face do empreiteiro/empregador ou em face deste e do dono da obra, impõe condenações à revelia de empreiteiros que se encontram em local ignorado. Ao mesmo tempo, afasta qualquer responsabilidade do dono da obra. Inviabiliza-se, assim, a efetividade da prestação jurisdicional.

Não se pode negar, também, que esse dramático cenário de flagrante denegação de justiça é em grande medida reforçado pelo atual teor da Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1 do TST no que , em regra , não reconhece responsabilidade do dono da obra por débitos trabalhistas do empreiteiro que contrata, ainda que sem o zelo e a diligência exigíveis .

Significa dizer, pois, que, apesar dos esforços engendrados pelo Tribunal Superior do Trabalho, lastimavelmente ainda há um profundo abismo entre a nossa jurisprudência consolidada e o que se possa considerar uma solução juridicamente apropriada no tocante à satisfação dos créditos trabalhistas dos empregados do empreiteiro desprovido de idoneidade econômico-financeira .

Inequivocamente, ressente-se de lacuna o ordenamento jurídico brasileiro a propósito, mais precisamente a Consolidação das Leis do Trabalho, que não contempla , explicitamente, como sabemos, a responsabilidade do dono da obra por débitos trabalhistas do empreiteiro.

À face de evidente lacuna legislativa, é o caso, portanto, de o intérprete socorrer-se da analogia como instrumento de concretização da integração jurídica.

Tal exercício hermenêutico deriva diretamente do comando expresso no artigo 8º da CLT, circundado pelos artigos 4º e 5º da Lei de Introdução ao Novo Direito Brasileiro (LINDB), sempre com vistas a conferir a máxima efetividade aos princípios constitucionais, dentre os quais sobreleva o valor social do trabalho, insculpido nos artigos 1º, inciso IV, 170, caput , e 193 da Constituição Federal, e aos princípios específicos do Direito do Trabalho, com destaque para o princípio protetivo.

Diante de tal panorama, parece-me absolutamente própria e adequada a aplicação analógica do artigo 455 da CLT, o qual, como cediço, cogita expressamente da responsabilidade do empreiteiro por obrigações trabalhistas do subempreiteiro.

Reza, a propósito, o referido dispositivo legal:

"Art. 455. Nos contratos de subempreitada responderá o subempreiteiro pelas obrigações derivadas do contrato de trabalho que celebrar, cabendo, todavia, aos empregados, o direito de reclamação contra o empreiteiro principal pelo inadimplemento daquelas obrigações por parte do primeiro.

Parágrafo único. Ao empreiteiro principal fica ressalvada, nos termos da lei civil, ação regressiva contra o subempreiteiro e a retenção de importâncias a este devidas, para a garantia das obrigações previstas neste artigo."

Nos termos da lei, portanto, ao celebrar contrato de subempreitada, o empreiteiro responde por obrigações trabalhistas do subempreiteiro, em caso de inadimplemento .

A meu juízo, as mesmas razões que levaram o legislador ordinário a salvaguardar os direitos trabalhistas dos empregados do subempreiteiro , mediante responsabilização do empreiteiro, ditam a extensão de raciocínio equivalente às situações envolvendo outra relação triangular, entre o empreiteiro, seus empregados e o dono da obra.

Não se trata de criar obrigação sem amparo na lei, mas de aplicação, por analogia, de dispositivo da CLT direcionado para regular situação muito similar .

Robustece tal convicção a circunstância de que o artigo 455 da CLT integra a Consolidação das Leis do Trabalho desde o seu texto original, de 1943. Compreensível, portanto, que o legislador ordinário, àquele tempo, inserido em outra realidade socioeconômica, não previsse todas as situações envolvendo a moderna dinâmica dos contratos de empreitada e suas repercussões de ordem trabalhista em relação ao dono da obra.

Sobreleva, ainda, afirmar que a aplicação analógica do artigo 455 da CLT , a fim de atribuir responsabilidade ao dono da obra em caso de inidoneidade econômico-financeira do empreiteiro que contratar , importa em prestigiar copiosa jurisprudência e pensamento doutrinário já relativamente assentados outrora no próprio TST e nos Tribunais Regionais do Trabalho .

Com efeito. É o que demonstram, exemplificativamente, os seguintes julgados:

"EMPREITADA. RESPONSABILIDADE DO DONO DA OBRA. Falência do empreiteiro. A falência do empreiteiro é, por si só, suficiente à conclusão em torno da respectiva inidoneidade econômica e financeira, fato que atrai a responsabilidade do dono da obra, a teor do disposto no salutar art. 9º da CLT: Serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente Consolidação." (TST-Pleno-ERR-3.692/1985.7, Redator p/ o acórdão Ministro Marco Aurélio Mello, DJU 10.11.1989, pg. 16.951)

"CONTRATO DE EMPREITADA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. DONO DA OBRA. CULPA ‘IN ELIGENDO’". A falta de idoneidade do empreiteiro atrai a responsabilidade solidária do dono da obra por culpa ‘in eligendo’. Recurso de revista conhecido e provido." (TST-RR-4452/88.4, 2ª Turma, DJU 8/8/1990, pg. 7.480)

"Empresa que contrata serviços com empreiteiro não habilitado legalmente para este fim, responde diretamente por todos os eventos legais atribuídos aos obreiros que, contratados para execução de seu serviço, não foram satisfeitos pelo rotulado empreiteiro. Os mendigos da sociedade não hão que ser feitos pelos que, trabalhando, gozam da tutela do direito obreiro. Ac. TRT – 1ª Reg. – 3ª Turma (Proc. 4.065/74), Rel. Juiz Herondines Saraiva de Carvalho, proferido em 26-2-75." (In "Dicionário de Decisões Trabalhistas", Benedito Calheiros Bonfim e Silvério dos Santos, Edições Trabalhistas, 13ª edição, Rio de Janeiro, 1976, pg. 240)

"A solidariedade passiva, prevista pelo legislador no art. 455 da CLT, é extensiva ao dono da obra, quando o produto resultante do ‘contrato de empreitada’ é canalizado para fins lucrativos. Exegese que afasta, em qualquer hipótese, o dono da obra dessa responsabilidade conduz ao desvirtuamento do dispositivo de proteção aos obreiros. Ac. TRT 2ª Reg. – 2ª Turma (Proc. RO 13.364/79), Rel. Juiz Roberto Mário Rodrigues Martins, D.O. 13-11-80, pág. 47." (op. cit., 17ª edição, pg. 231)

"Contrato de empreitada – empreiteiro inidôneo. Tratando-se de empreitada de mão-de-obra e provado que o empreiteiro, simples pedreiro, não possui nenhuma idoneidade econômico-financeira, estando até mesmo em local ignorado, não há como negar a responsabilidade do dono da obra, pelos direitos dos empregados que nela trabalham, por culpa na escolha; art. 9º da CLT. Ac TRT 3ª Reg. – 2ª Turma (Proc. RO 1.300/79), Rel. (designado) Juiz Ney Proença Doyle, "Minas Gerais" (Parte II), 13-2-80, pág. 30." (Ibidem, pg. 231)

" SOLIDARIEDADE – DONO DA OBRA -  O dono da obra é responsável, solidariamente, com o empreiteiro quando demonstrado nos autos a sua inidoneidade e incapacidade financeira para a execução da obra. Contrato de empreitada assim firmado viola o disposto no  9 (...)" (TRT-03ª R. - RO 16748/92 - 3ª T. - Rel. Juiz Levi Fernandes Pinto - DJMG 06.09.1994)

"DONO DA OBRA -  DA OBRA - RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA -  -  Contratado empreiteiro que demonstrou inidoneidade, abandonando a obra e descumprindo suas obrigações trabalhistas, a responsabilidade passiva das obrigações se volta ao dono da obra, como estatui o ." (TRT-03ª R. - RO 5039/88 - 2ª T. - Rel. Juiz Israel Kuperman - DJMG 14.07.1989)

"DONO DA OBRA - INIDONEIDADE FINANCEIRA DO EMPREITEIRO - RESPONSABILIDADE - Embora, em princípio, não responda o dono da obra por créditos trabalhistas dos empregados do empreiteiro, constatada a inidoneidade financeira deste, e de se reconhecer a responsabilidade solidária daquele, porque partícipe (culpa ‘in eligendo’) e real beneficiário das violações dos direitos trabalhistas." (TRT-09ª R. - RO 3.954/91 - 2ª T. - Ac. 8.658/92 - Rel. Juiz João Antônio Gonçalves de Moura - DJPR 13.11.1992)

Dessa forma, por aplicação analógica do artigo 455 da CLT, em caso de inadimplemento das obrigações trabalhistas do empreiteiro sem idoneidade econômico-financeira que contratar, o dono da obra responde por culpa in eligendo presumida .

Descarta-se, no caso, o reconhecimento de automática imposição de responsabilidade solidária do dono da obra. Entendo, sim, que se cuida de responsabilidade por obrigações trabalhistas de outrem, na modalidade subsidiária .

A uma , tendo em vista que a imputação de responsabilidade, na espécie, decorre de aplicação analógica do artigo 455 da CLT para fazer face à patente lacuna legislativa em relação ao dono da obra.

Sucede que, segundo o artigo 265 do Código Civil de 2002, " a solidariedade não se presume; resulta da lei ou da vontade das partes ".

Entendo, assim, que, por força do comando restritivo do artigo 265 do Código Civil, o reconhecimento de obrigação, por aplicação analógica do artigo 455 da CLT, para suprir lacuna legislativa, não alberga a extensão da solidariedade, resguardada tão somente se há explícita disposição legal a ampará-la .

A duas , porquanto a imputação de responsabilidade solidária, na espécie, implicaria criar para o dono da obra injustificável condição mais gravosa do que a imposta ao tomador dos serviços, em caso de intermediação lícita de mão de obra, à luz do que sinaliza a Súmula nº 331, IV, do TST.

Resta examinar, por fim, a situação peculiar dos entes públicos da Administração direta e indireta, os quais, com certa habitualidade, segundo já esposado, figuram como donos de obras de construção civil e, nessa condição, também são demandados perante a Justiça do Trabalho por empregados ou ex-empregados de empreiteiros inadimplentes .

Conquanto a jurisprudência de há muito consolidada no Tribunal Superior do Trabalho reconheça que também os entes públicos podem incorrer em condutas culposas na eleição de empresas prestadoras de serviço lato sensu , dentre as quais as empreiteiras para a execução de obras de construção civil, não se pode fechar os olhos para o que dispõe expressamente o artigo 71, § 1º, da Lei nº 8.666/93.

Aludido dispositivo legal, como se recorda, inserido no capítulo III da Lei das Licitações, que trata dos contratos administrativos, textualmente afasta a responsabilidade da Administração Pública por débitos das empresas contratadas.

Outrossim, uma vez declarado constitucional pelo Eg. Supremo Tribunal Federal na Ação Direta de Constitucionalidade nº 16 (DJe 8/9/2011), o artigo 71, § 1º, da Lei nº 8.666/93 constitui, de fato, óbice a que se reconheça a responsabilidade de qualquer ente da Administração Pública, direta e indireta, na qualidade de "dono da obra", por obrigações trabalhistas decorrentes dos contratos administrativos que celebrar .

No particular, portanto, não há vácuo legislativo, o que efetivamente desautoriza a aplicação analógica do artigo 455 da CLT, a fim de imputar qualquer responsabilidade à Administração Pública, direta e indireta, na condição de "dono da obra", em decorrência do inadimplemento dos débitos trabalhistas do empreiteiro.

Na mesma linha de raciocínio segue a recente definição, em 26/4/2017, da tese de Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 760931 pelo Tribunal Pleno do Supremo Tribunal Federal, cujo acórdão ainda pende de publicação:

"O inadimplemento dos encargos trabalhistas dos empregados do contratado não transfere ao poder público contratante automaticamente a responsabilidade pelo seu pagamento, seja em caráter solidário ou subsidiário, nos termos do artigo 71, parágrafo 1º, da Lei 8.666/1993."

Em vista desse panorama, inafastável excluir de responsabilidade o ente público por obrigações trabalhistas do empreiteiro que contratar.

Cumpre ressalvar, no entanto, que se sobrevier alteração da situação jurídica atual , com a publicação do acórdão lavrado no julgamento do RE nº 760931, naturalmente poderá haver revisão da decisão firmada no presente Incidente, no tocante aos entes públicos, mediante a utilização da técnica da superação ("overruling"), consoante expressamente assegurado nos artigos 896-C, § 17, da CLT, e 927, §§ 2º, 3º e 4º, do CPC de 2015.

6. FIXAÇÃO DE TESES JURÍDICAS NO IRRR

À vista do exposto, sopesados todos os aspectos relevantes ao equacionamento da questão controvertida, proponho, em conclusão, no julgamento do presente Incidente , a adoção das seguintes teses jurídicas :

1ª) a exclusão de responsabilidade solidária ou subsidiária por obrigação trabalhista, a que se refere a Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1 do TST, não se restringe a pessoa física ou micro e pequenas empresas. Compreende igualmente empresas de médio e grande porte e entes públicos;

2ª) a excepcional responsabilidade por obrigações trabalhistas, prevista na parte final da Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1 do TST, por aplicação analógica do artigo 455 da CLT, alcança os casos em que o dono da obra de construção civil é construtor ou incorporador e, portanto, desenvolve a mesma atividade econômica do empreiteiro;

3ª) não é compatível com a diretriz sufragada na Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1 do TST jurisprudência de Tribunal Regional do Trabalho que amplia a responsabilidade trabalhista do dono da obra, excepcionando apenas " a pessoa física ou micro e pequenas empresas, na forma da lei, que não exerçam atividade econômica vinculada ao objeto contratado ";

4ª) exceto ente público da Administração direta e indireta, se houver inadimplemento das obrigações trabalhistas contraídas por empreiteiro que contratar, sem idoneidade econômico-financeira, o dono da obra responderá subsidiariamente por tais obrigações, em face de aplicação analógica do art. 455 da CLT e de culpa in eligendo .

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho, em sua composição plena, nos termos do voto do Exmo. Ministro Relator, fixar as seguintes teses jurídicas para o Tema Repetitivo Nº 0006 – "RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA – DONA DA OBRA – APLICAÇÃO DA OJ 191 DA SbDI-1 LIMITADA À PESSOA FÍSICA OU MICRO E PEQUENAS EMPRESAS": 1ª) a exclusão de responsabilidade solidária ou subsidiária por obrigação trabalhista, a que se refere a Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1 do TST, não se restringe a pessoa física ou micro e pequenas empresas. Compreende igualmente empresas de médio e grande porte e entes públicos (decidido por unanimidade); 2ª) a excepcional responsabilidade por obrigações trabalhistas, prevista na parte final da Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1 do TST, por aplicação analógica do artigo 455 da CLT, alcança os casos em que o dono da obra de construção civil é construtor ou incorporador e, portanto, desenvolve a mesma atividade econômica do empreiteiro (decidido por unanimidade); 3ª) não é compatível com a diretriz sufragada na Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1 do TST jurisprudência de Tribunal Regional do Trabalho que amplia a responsabilidade trabalhista do dono da obra, excepcionando apenas " a pessoa física ou micro e pequenas empresas, na forma da lei, que não exerçam atividade econômica vinculada ao objeto contratado " (decidido por unanimidade); 4ª) exceto ente público da Administração direta e indireta, se houver inadimplemento das obrigações trabalhistas contraídas por empreiteiro que contratar, sem idoneidade econômico-financeira, o dono da obra responderá subsidiariamente por tais obrigações, em face de aplicação analógica do art. 455 da CLT e de culpa in eligendo (decidido por maioria, vencido o Exmo. Ministro Márcio Eurico Vitral Amaro). Por maioria, examinando questão de ordem, rejeitar a proposta de suspensão da proclamação do resultado e a remessa dos autos ao Tribunal Pleno para deliberação sobre a alteração ou não da Orientação Jurisprudencial nº 191 da SbDI-1, vencidos os Exmos. Ministros José Roberto Freire Pimenta, proponente, Augusto César Leite de Carvalho e Hugo Carlos Scheuermann .

Brasília, 11 de maio de 2017.

Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)

JOÃO ORESTE DALAZEN

Ministro Relator