A C Ó R D Ã O
(5ª Turma)
GMBM/AOM/PHB/ld
AGRAVO. RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. PASTOR EVANGÉLICO. VÍNCULO DE EMPREGO. NÃO CARACTERIZAÇÃO. ÓBICE CONTIDO NA SÚMULA N° 126 DO TST. AUSÊNCIA DE TRANSCENDÊNCIA. O Regional manteve o indeferimento do reconhecimento do vínculo de emprego entre as partes por concluir que não estavam presentes os requisitos do artigo 3º da CLT. Registrou que " o reconhecimento do vínculo de emprego do pastor com a igreja somente é possível se comprovado pelo Reclamante, de forma satisfatória, o desvio de finalidade da entidade eclesiástica a que ele se encontra atrelado ". Nesse contexto, uma conclusão diversa desta Corte, contrariando aquela contida no v. acórdão regional, como pretende a parte agravante, demandaria o reexame do conjunto probatório, atraindo o óbice contido na Súmula n° 126 do TST, segundo a qual é " Incabível o recurso de revista ou de embargos (arts. 896 e 894, ‘b’, da CLT) para reexame de fatos e provas ", o que inviabiliza o exame da própria matéria de fundo veiculada no recurso de revista. A existência de obstáculo processual apto a inviabilizar o exame da matéria de fundo veiculada, como no caso , acaba por evidenciar, em última análise, a própria ausência de transcendência do recurso de revista, em qualquer das suas modalidades. Precedentes. Agravo não provido, com aplicação de multa.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo em Recurso de Revista com Agravo n° TST-Ag-RRAg-699-37.2020.5.09.0673 , em que é Agravante CARLOS AUGUSTO FERNANDES e é Agravada IGREJA PRESBITERIANA AGAPE.
Trata-se de agravo interposto contra decisão monocrática que negou seguimento ao recurso de revista .
Na minuta de agravo, a parte defende a incorreção da r. decisão agravada.
É o relatório.
V O T O
1 - CONHECIMENTO
Preenchidos os pressupostos de admissibilidade, conheço do agravo.
2 – MÉRITO
PASTOR EVANGÉLICO. VÍNCULO DE EMPREGO. NÃO CARACTERIZAÇÃO. ÓBICE CONTIDO NA SÚMULA N° 126 DO TST. AUSÊNCIA DE TRANSCENDÊNCIA .
A decisão agravada negou seguimento ao recurso, por entender não caracterizada a transcendência da matéria nele veiculada, sob os seguintes fundamentos:
Trata-se de recursos de revista interpostos contra o acórdão proferido pelo Tribunal Regional do Trabalho, nos quais procuram demonstrar a satisfação dos pressupostos do artigo 896 da CLT.
O recurso de revista do reclamante foi admitido quanto ao tema " pastor evangélico – vínculo de emprego ".
O recurso de revista da reclamada foi inadmitido, decisão contra a qual houve interposição de agravo de instrumento.
Contrarrazões apresentadas.
Sem remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho.
Com esse breve relatório, decido.
O recurso de revista foi interposto em face de acórdão publicado na vigência da Lei nº 13.467/2017, que alterou o art. 896-A da CLT, havendo a necessidade de se evidenciar a transcendência das matérias nele veiculadas, na forma do referido dispositivo e dos arts. 246 e seguintes do RITST.
EXAME PRÉVIO DA TRANSCENDÊNCIA
AGRAVO DE INSTRUMENTO DA RECLAMADA
(...)
RECURSO DE REVISTA DO RECLAMANTE.
PASTOR EVANGÉLICO. VÍNCULO DE EMPREGO. NÃO CARACTERIZAÇÃO. DECISÃO EM CONFORMIDADE COM A ITERATIVA JURISPRUDÊNCIA DO TST. AUSÊNCIA DE TRANSCENDÊNCIA.
Nas razões de revista, nas quais cuidou de indicar o trecho da decisão recorrida que consubstancia o prequestionamento da controvérsia objeto da insurgência, atendendo ao disposto no art. 896, § 1º-A, I, da CLT, a parte recorrente indica ofensa ao art. 3º, da CLT. Transcreve arestos.
Sustenta, em síntese, que "o v. acórdão deve ser reformado, pois os próprios fundamentos utilizados pelos Magistrados de que a prestação de serviços na função de pastor possui natureza estritamente vocacional e religiosa, não havendo desvirtuamento de função não são capazes de afastar a aplicabilidade do vínculo empregatício".
Aduz que "O texto de lei e os entendimentos jurisprudenciais atestam que estando presente a alteridade, subordinação, pessoalidade, onerosidade e não eventualidade, resta caracterizada a relação de emprego".
Afirma, ainda, que "O Recorrente se dedicava pessoal, exclusiva e diariamente a função de Pastor, estando subordinado ao Conselho e ao Presbitério, mediante a contraprestação de natureza salarial".
Por fim, assevera, que "O trabalho prestado pelo Recorrente nunca foi meramente voluntário ou simplesmente altruístico, até mesmo porque ao ser contratado recebia 04 salários-mínimos como pagamento pela atividade desempenhada como pastor".
Examina-se a transcendência da matéria.
O e. TRT consignou, quanto ao tema:
(...)
O Regional manteve o indeferimento do reconhecimento do vínculo de emprego entre as partes por concluir que não estavam presentes os requisitos do artigo 3º da CLT.
Registrou que "O reconhecimento do vínculo de emprego do pastor com a igreja somente é possível se comprovado pelo Reclamante, de forma satisfatória, o desvio de finalidade da entidade eclesiástica a que ele se encontra atrelado".
Nesse contexto, para se chegar à conclusão em sentido oposto pretendida pelo reclamante, necessário seria o reexame do conjunto fático-probatório, o que impossibilita o processamento da revista, ante o óbice da Súmula 126 desta Corte Superior, a pretexto da alegada violação do dispositivo legal apontado, bem como da divergência jurisprudencial transcrita.
Pois bem.
O critério de transcendência é verificado considerando a questão jurídica posta no recurso de revista, de maneira que tal análise somente se dá por esta Corte superior se caracterizada uma das hipóteses previstas no art. 896-A da CLT.
Assim, a existência de obstáculo processual apto a inviabilizar o exame da matéria de fundo veiculada, como no caso, acaba por evidenciar, em última análise, a própria ausência de transcendência do recurso de revista, em qualquer das suas modalidades.
Isso porque não se justificaria a intervenção desta Corte superior a fim de examinar feito no qual não se estaria: a) prevenindo desrespeito à sua jurisprudência consolidada (transcendência política); b) fixando tese sobre questão nova em torno da interpretação da legislação trabalhista (transcendência jurídica); c) revendo valor excessivo de condenação, apto a ensejar o comprometimento da higidez financeira da empresa demandada ou de determinada categoria profissional (transcendência econômica); d) acolhendo pretensão recursal obreira que diga respeito a direito social assegurado na Constituição Federal, com plausibilidade na alegada ofensa a dispositivo nela contido (transcendência social) .
Nesse sentido: Ag-RR - 1003-77.2015.5.05.0461, Relator Ministro: Breno Medeiros, Data de Julgamento: 07/11/2018, 5ª Turma, Data de Publicação: DEJT 09/11/2018; AIRR - 1270-20.2015.5.09.0661, Relatora Desembargadora Convocada: Cilene Ferreira Amaro Santos, Data de Julgamento: 07/11/2018, 6ª Turma, Data de Publicação: DEJT 09/11/2018; ARR - 36-94.2017.5.08.0132, Relator Ministro: Ives Gandra Martins Filho, Data de Julgamento: 24/10/2018, 4ª Turma, Data de Publicação: DEJT 26/10/2018; RR - 11200-04.2016.5.18.0103, Relator Desembargador Convocado: Roberto Nobrega de Almeida Filho, Data de Julgamento: 12/12/2018, 1ª Turma, Data de Publicação: DEJT 14/12/2018.
Logo, diante do óbice processual já mencionado, não reputo verificada nenhuma das hipóteses previstas no art. 896-A da CLT.
Assim, não verificada qualquer das hipóteses previstas no art. 896-A da CLT, com fulcro no seu § 2º c/c art. 247, § 2º, do Regimento Interno desta Corte, nego seguimento ao recurso de revista do reclamante.
Ante todo o exposto, com fulcro no art. 896-A, § 2º, da CLT c/c arts. 247, § 2º, do Regimento Interno desta Corte, nego seguimento ao agravo de instrumento da reclamada e ao recurso de revista do reclamante.
No recurso de revista, a parte indicou ofensa ao art. 3º, da CLT.
No referido recurso, sustentou, em síntese, que " o v. acórdão deve ser reformado, pois os próprios fundamentos utilizados pelos Magistrados de que a prestação de serviços na função de pastor possui natureza estritamente vocacional e religiosa, não havendo desvirtuamento de função não são capazes de afastar a aplicabilidade do vínculo empregatício ".
Acrescentou que "o texto de lei e os entendimentos jurisprudenciais atestam que estando presente a alteridade, subordinação, pessoalidade, onerosidade e não eventualidade, resta caracterizada a relação de emprego ".
Afirmou, por fim, que "o Recorrente se dedicava pessoal, exclusiva e diariamente a função de Pastor, estando subordinado ao Conselho e ao Presbitério, mediante a contraprestação de natureza salarial ".
Na minuta de agravo interno, assevera que o seu recurso ostenta condições de prosseguimento.
Não merece reforma a decisão agravada.
O e. TRT consignou, quanto ao tema:
"RECURSO DA PARTE AUTORA
VÍNCULO DE EMPREGO
O Autor sustenta que "independentemente de o reclamante ter sentido o chamado espiritual, tal circunstância não é apta a afastar a configuração do vínculo empregatício". Argumenta que "O trabalho prestado pelo recorrente não foi meramente voluntário ou simplesmente altruístico. Até mesmo porque as provas dos autos atestam que recorrente foi contratado por 04 (quatro) salários-mínimos mensais, pela contraprestação dos seus serviços. Ou seja, sempre houve onerosidade.". Requer a reforma para que seja reconhecido o vínculo de emprego.
Analisa-se.
Segundo a r. sentença:
"(...) Em seu depoimento pessoal o autor declarou, com riqueza de detalhes, ter atuado como pastor evangélico porque recebeu "chamado espiritual". Também relatou ter deixado o mister religioso para se dedicar tratamento de enfermidade (aos 30'23" do registro audiovisual). Disse não ter recebido qualquer remuneração no ano de 2018, em razão do período de dificuldade financeira da igreja.
O preposto, por sua vez, afirmou que o autor, como pastor titular, era responsável por autorizar, juntamente com o conselho, os pagamentos. Negou que a igreja pagasse água e luz dos pastores.
A testemunha Eduardo Bueno afirmou que o autor recebia, em média, de R$ 3.600,00 a R$ 3.800,00 mensais. Explicou que os valores arrecadados pela igreja eram apresentados ao conselho que deliberava sobre a remuneração do pastor ou eventual reajuste.
Declarou que não houve repasse de valores ao autor durante o ano de 2018 porque a igreja estava em dificuldade financeira. Disse que esses valores seriam pagos posteriormente quando a igreja recuperasse a receita. Relatou ter conhecimento da reunião sobre a promessa de pagamento de indenização ao autor. Contou que o próprio autor, como pastor titular, apresentou essa proposta ao conselho da igreja. Disse que a igreja não fez qualquer pagamento ao autor após a sua saída. A testemunha Mércia Pinange disse que o autor ficava a disposição dos fiéis da igreja.
Como se vê, o autor exerceu as funções de pastor evangélico, com propósitos de ordem estritamente espiritual e a finalidade exclusiva de propagar a fé e a doutrina de sua igreja.
Com efeito, não foi comprovada a prestação de serviços sob o regime jurídico do vínculo de emprego. O autor era pastor evangélico e exercia atribuições religiosas. Também não havia onerosidade. Seu sustento era retirado as contribuições arrecadadas dos fiéis, conforme esclareceu a testemunha Eduardo Bueno (tesoureiro à época dos fatos). Parece plausível a versão da ré de que os valores recebidos pelo autor, discriminados nos documentos carreados às fls. 51-73 e extratos bancários de fls. 165-289, representaram ajuda financeira da igreja para o desempenho das atividades religiosas. Esse auxílio sequer era obrigatório. Aliás, restou demonstrado que no ano de 2018, período de dificuldade financeira da igreja, o autor deixou de receber tal verba.
O contexto da relação jurídica do caso mais se assemelha, de fato, a uma relação de natureza religiosa, vocacional. As atividades relatadas na inicial eram atribuições de caráter religioso.
Em toda a dilação probatória não se demonstrou que havia desvirtuamento dos objetivos da instituição religiosa ou das atividades eclesiásticas.
Não há que se falar em vínculo empregatício e a pretensão deduzida na inicial, com efeito, é inteiramente improcedente, no que se refere às parcelas e direitos decorrentes do suposto contrato de emprego, inclusive no que tange aos danos morais ." (fls. 346/348).
Este Colegiado, no julgamento do RO 11869-2012-007-09-00-7, em 22 de agosto de 2013, de relatoria do Exmo. Desembargador Ney Fernando Olivé Malhadas, firmou entendimento segundo o qual o " (...) pastor evangélico, não se equipara à figura do empregado típico, que se sujeita às ordens diretas de seu empregador, por meio da figura da subordinação jurídica. A ligação existente entre o pastor e a instituição eclesiástica é de índole religiosa, consistente na divulgação da fé e propagação do evangelho. Assim sendo, resta inviável reconhecer o liame empregatício entre as partes."
Nesse sentido, já decidiu esta E. Turma, conforme acórdão proferido nos autos do processo 02497-2011-325-09-00-3 (RO 14733/2012), publicado em 14/09/2012, de lavra da Exma Desembargadora Nair Maria Ramos, à época em que compunha este Colegiado, a quem peço vênia para transcrever e também adotar como razões de decidir:
"Sustenta o autor que o fato da Igreja ter o vocacionado para a função de Pastor Evangélico, não é suficiente para afastar o vínculo empregatício, pois as funções não se limitavam a pregar o evangelho e que os serviços realizados não eram voluntários ou simplesmente altruístico, porque desenvolvia a atividade de Pastor também como profissão.
Afirma que a prova oral demonstra a subordinação ao Pastor Ailton e que não tem outro emprego, vivendo somente dos salários recebidos. Argumenta que estão presentes todos os requisitos do art. 3º da CLT. Requer seja declarado o vínculo de emprego do autor com a ré e que seja determinado o retorno dos autos à origem para julgamento dos pedidos.
Sem razão, contudo.
Na petição inicial o autor afirmou que foi admitido aos serviços da reclamada em 01 de julho de 2009 e para exercer a função de "Pastor" e que em 30 de dezembro de 2010 foi despedida sem justa causa, sendo que nunca teve sua CTPS anotada.
Na contestação a ré alegou que em não sendo o serviço prestado pela Igreja aquilatável pecuniariamente, por certo não há de se falar em comércio e, de conseqüência, não há interesse econômico a ser tutelado ou cobrado. Aduziu que não há de se falar em vínculo empregatício, ante a falta de interesse econômico a ser tutelado.
A r.sentença indeferiu o pedido de reconhecimento de vínculo de emprego com a Igreja considerando que houve um vínculo de natureza diversa da empregatícia ligada à fé, in verbis: "A função de pastor, a priori, subsume-se ao disposto na Lei 9.608/98, que disciplina o trabalho voluntário, afinal, as atividades desenvolvidas, em razão da própria natureza, são essencialmente religiosas/filantrópicas e decorrentes de convicções pessoais, estas diretamente relacionadas à fé que o vocacionado professa.
Ressalto ainda que, em se tratando de pastor evangélico, para que se configure o trabalho subordinado aos moldes celetistas, necessário se faz, no mínimo, a prov a da existência de um falso sacerdócio, que descaracterize por completo a vocação religiosa, o que não restou comprovado no caso em análise, eis que o reclamante não produziu nenhuma prova neste aspecto.
Adianto que, em meu sentir, em se tratando de pastor evangélico ou qualquer outro ministro de confissão religiosa, o ordinário, isto é, aquilo que normalmente ocorre, é a ausência total de subordinação jurídica nos moldes celetistas, sendo este vínculo de natureza estritamente vocacional, religiosa, espiritual, de modo que a questão alusiva ao ônus da prova ganha novos contornos, passando a ser da parte autora a incumbência de provar a existência de fatos que desnaturem esse vínculo.
Incumbia ao reclamante comprovar, de modo cabal e irrefutável, que se tratava de um falso sacerdócio, e que o trabalho por ele desenvolvido se voltava ao atingimento de metas financeiras ou outros objetivos puramente materiais. No entanto, de seu interrogatório e depoimento, bem como da prova testemunhal produzida, se extrai exatamente o contrário.
A propósito, transcrevo o interrogatório prestado pelo reclamante à fl. 21:
(...)
Ora, o reclamante deixou bastante clara a natureza de sua vinculação com a reclamada, a qual decorria de sua fé, tanto que, ao verificar que as atitudes do pastor presidente conflitava com sua crença e convicções teológicas, decidiu desligar-se daquela comunidade, vindo a fazê-lo em circunstâncias bem peculiares, quais sejam, em meio a um culto que se realizava em domingo, dia em que sabidamente as igrejas estão repletas de fiéis (depoimento abaixo transcrito).
Isso demonstra claramente a intenção do reclamante em dar conhecimento àquela comunidade de fiéis quanto à sua decisão de desligar-se da mesma, atitude esta que não se coaduna com uma relação empregatícia típica, em que não se verifica, via de regra, essa conduta de justificação perante a coletividade dos colegas de trabalho ou mesmo perante a clientela, já que a ruptura contratual, nestes casos, diz respeito apenas aos envolvidos diretamente (patrão e empregado).
A propósito, o depoimento pessoal prestado à fl. 80:
(...)
Já a prova testemunhal produzida corrobora a tese defensiva (ainda que sobre a reclamada não pesasse ônus probatório algum, pelas razões já explanadas anteriormente), quanto à natureza do vínculo havido entre as partes, as atividades desenvolvidas pelo reclamante, bem como o histórico anterior deste (já exercia atividades relacionadas ao ministério pastoral em outra comunidade antes de ingressar na reclamada):
(...)
Feitas estas ponderações, o que se extrai do contexto probatório é que o reclamante desenvolvia atividades essencialmente religiosas, que decorriam de sua fé, as quais não se enquadram nos moldes celetistas do trabalho subordinado.
(...)
Por todo o exposto, julgo improcedente o pedido de reconhecimento de vínculo empregatício entre as partes, e em consequência, rejeito todos os pedidos formulados em face da reclamada."
É indubitável a existência de vínculo entre as partes. Contudo, cabe perquirir a respeito da natureza da relação havida.
Por ocasião da audiência, o autor afirmou que "foi ordenado pastor pela Igreja Mundial do Poder de Deus cuja data não se recorda, acreditando ter sido final de 2006, esclarecendo que na ocasião firmou contrato de voluntariado, mas recebia uma importância mensal de R$.1.000,00, além de 13º salário; 2 - na reclamada recebia salário mensal de R$.2.400,00, que foi ajustado com o pastor Ailton Rodrigues; 3 - pediu para sair da reclamada porque não estava concordando com algumas atitudes do pastor presidente, sobretudo, porque conflitava com a crença do depoente e convicções teológicas, além de haver questões pessoais, quando o referido pastor passou a retirar responsabilidades do depoente; 4 - apesar de estar imbuído de seu dever sacerdotal, havendo inclusive identidade de pensamento com a reclamada, o depoente firmou vínculo de emprego porque exercia o sacerdócio em tempo integral, ou seja, estava à disposição do sacerdócio 24 horas por dia, embora cumprisse alguns horários no templo, os quais eram alternados com freqüência;".
O preposto, por sua vez, mencionou que "o reclamante atuava na qualidade de pastor juntamente com outros pastores; 2 - o reclamante juntamente com os outros pastores auxiliavam o depoente nos cultos e nas visitas e atendimentos pastorais na sede da igreja; 3 - não havia horário predefinido para o atendimento pois eram os próprios membros quem agendavam diretamente o horário de atendimento ou visita com o pastor escolhido;(...) 5 - o depoente não passava atendimento de membros ao reclamante; 6 - era o próprio pastor quem passava os contatos para os membros; 7 - não havia fixação de escala de atendimentos e visitas entre os pastores estando cada um livre para o atendimento e visitas; 8 - os pastores não tinham obrigação de permanecer na sede da igrejadurante a semana para o atendimento; 9 - após o término dos cultos se o pastor quisesse realizar atendimento a membros ficava a seu critério, inclusive quanto ao horário de término do atendimento; 10 - o reclamante não possuía outro emprego."
A testemunha inquirida a convite do autor informou que "foi membro da igreja reclamada de final de 2008 a final de 2009 esclarecendo que aproximadamente três meses após ter sido membrado o pastor Leandro passou a atuar na igreja reclamada; 2 - o reclamante atendeu a depoente em três ocasiões, uma vez após o culto de quinta-feira, outra vez em sua própria casa durante o dia, e a terceira na sede da igreja em virtude de o pastor Ailton não ter podido atender a depoente tendo solicitado ao reclamante que o fizesse; 3 - em todas as ocasiões foi a depoente que teve a iniciativa de procurar o atendimento; (...) 4 - a depoente era informada acerca dos horários de atendimento pastoral de que cada pastor da igreja, não se lembrando se através de avisos durante os cultos ou por avisos fixados no mural;"
A testemunha da ré afirmou que "conheceu o reclamante em um dia final de culto quando procurou o depoente buscando ajuda pois havia se desligado de um ministério pois a igreja havia fechado.(...) 3 - após um período de adaptação, inclusive quanto à visão e ao pensamento da igreja, o reclamante passou a auxiliar no pastoreio realizando visitas, atendimentos e auxiliando nos cultos;(...) geralmente era o pastor Ailton quem fazia as visitas inclusive acompanhado do depoente e do reclamante sobretudo quando visitavam hospitais, mas esclarece que os membros poderiam também agendar visitas diretamente com cada pastor; 8 - em determinado culto de quinta-feira o reclamante pediu a palavra ao pastor Ailton que a concedeu e, após pegar o microfone, pediu aos irmãos que abrissem no livro de Efésios 4 e em seguida leu uma carta manifestando discordância com o ministério e comunicando o seu desligamento, tendo saído pelo corredor;(...) 9 - o reclamante comparecia em quase todos os cultos na igreja; 10 - o reclamante também dava atendimentos a membros quando solicitado pelo próprio membro, ainda que após o culto; (...) 13 - quando faziam visitas nos hospitais avisavam o pastor Ailton dando-lhe ciência."
Extrai-se da prova oral que as atividades executadas pelo autor eram de cunho eminentemente religioso e fundadas na fé. O autor na condição de Pastor da Igreja auxiliava nos cultos e fazia atendimento de pessoas e membros. Não se vislumbra que a hipótese seja a do art. 3º da CLT uma vez que a relação mantida entre o autor e a Igreja era de natureza religiosa/espiritual.
Além disso, ao contrário do que sustenta o recorrente, não ficou demonstrado que o autor executava outras atividades na Igreja que fossem o auxílio na celebração dos cultos e o atendimento de pessoas. Da mesma forma, não se verifica no presente caso a subordinação caracterizadora do vínculo de emprego no desempenho das funções do autor e nem tampouco os demais requisitos do art. 3º da CLT.
Nesse aspecto, importa consignar que o trabalho voluntário/religioso exige um mínimo de regras e organização para que se realize, não se configurando, por isso, a subordinação jurídica típica das relações empregatícias. Repisa-se ainda que a importância recebida visa apenas propiciar a maior disponibilidade do Pastor na divulgação da palavra de fé.
Ensina Alice Monteiro de Barros que "O trabalho de cunho religioso não constitui objeto de um contrato de emprego, pois, sendo destinado à assistência espiritual e à divulgação da fé, ele não é avaliável economicamente. Eventual importância recebida pelo religioso visa não só a assegurar-lhe a subsistência, mas a propiciar-lhe maior disponibilidade para se dedicar à difusão e fortalecimento da crença."(Curso de Direito do Trabalho, 5ª edição, Ed: LTr, São Paulo, 2009, p. 467) A propósito, já decidiu esta E. Turma, envolvendo a mesma reclamada, no julgamento do RO nº 325-2011-661-09-00-3, Acórdão publicado em 18-01-2012, em que foi Relatora a Exma. Desembargadora Eneida Cornel. Peço vênia para transcrever e adotar os fundamentos: "Ainda que o autor exercesse outras atividades, tais como prestar contas dos dízimos e doações recebidos pela igreja, efetuar pagamentos de contas de água e luz, cuidar do asseio do seu templo, dentre outras, não desvirtua a condição de religioso do reclamante. É sabido que nas pequenas cidades os pastores ou padres ficam com a incumbência de gerir e zelar pela igreja que representam. Presume-se que a dedicação e entrega de vida feita em decorrência da crença religiosa não se resume unicamente à atividade de celebrar missas ou cultos e pregar seus ensinamentos.
Entendo prejudicado também o elemento "subordinação" na relação religioso-Igreja. Ainda que o autor tivesse que prestar contas da igreja que representava, participar de reuniões e estar presente na hora marcada para os cultos, considero que inerentes e necessárias ao correto desempenho da função de religioso a que se propôs, pois não haveria sentido um religioso que não observasse as normas institucionais de sua Igreja e desempenhasse sua função como bem entendesse. Não há instituição que se mantenha sem regras, organização e certa hierarquia que - vale dizer - não se assemelha à hierarquia empresarial presente nas relações de emprego.
Situações análogas já foram analisadas por esta Turma Julgadora, cito o voto proferido no RO 01992-2006-069-09-00-8 pelo Redator Designado o Exmo. Des. Rubens Edgard Tiemanm, publicado em 04-04-2008 e o voto proferido no RO 02139-2009-095-09-00-2 16-04-2010 pela Exma. Juíza convocada Patrícia De Matos Lemos, publicado em 16-04-2010.
Assim sendo, mantenho a sentença que rejeitou o pedido de reconhecimento de vínculo de emprego entre as partes."
O reconhecimento do vínculo de emprego do pastor com a igreja somente é possível se comprovado pelo Reclamante, de forma satisfatória, o desvio de finalidade da entidade eclesiástica a que ele se encontra atrelado.
Porém, em depoimento pessoal, o Reclamante confessou que se tornou pastor em razão de um "chamado interior muito profundo, de uma conversão muito profunda". Relatou que foi criado em "berço" evangélico e que deixou de ser pastor por motivos de saúde (Pje mídias - 29m30s).
Assim, da análise da prova oral evidencia-se que a prestação de serviços pelo Recorrente tinha natureza estritamente vocacional e religiosa, sendo insuscetível de gerar os direitos trabalhistas típicos de uma relação de emprego.
Mantém-se." (destacou-se)
O Regional manteve o indeferimento do reconhecimento do vínculo de emprego entre as partes por concluir que não estavam presentes os requisitos do artigo 3º da CLT.
Registrou que " da análise da prova oral evidencia-se que a prestação de serviços pelo Recorrente tinha natureza estritamente vocacional e religiosa, sendo insuscetível de gerar os direitos trabalhistas típicos de uma relação de emprego ".
Nesse contexto, uma conclusão diversa desta Corte, contrariando aquela contida no v. acórdão regional, como pretende a parte agravante, demandaria o reexame do conjunto probatório, atraindo o óbice contido na Súmula n° 126 do TST, segundo a qual é " Incabível o recurso de revista ou de embargos (arts. 896 e 894, ‘b’, da CLT) para reexame de fatos e provas ", o que inviabiliza o exame da própria matéria de fundo veiculada no recurso de revista.
A existência de obstáculo processual apto a inviabilizar o exame da matéria de fundo veiculada, como no caso , acaba por evidenciar, em última análise, a própria ausência de transcendência do recurso de revista, em qualquer das suas modalidades, conforme precedentes invocados na decisão agravada.
Nesse contexto, não tendo sido apresentados argumentos suficientes à reforma da r. decisão impugnada, deve ser desprovido o agravo.
Analisando-se o agravo interno, verifica-se que a decisão impugnada, ora mantida, pautou-se em firme jurisprudência já firmada por este colegiado, o que dispensou, inclusive, a necessidade de acréscimo de fundamentos em relação àqueles já expostos, o que evidencia, no presente caso, a manifesta improcedência do recurso, razão pela qual determinado a aplicação da multa prevista no art. 1.021, § 4º, do CPC, no importe de R$ 3.584,71 – três mil quinhentos e oitenta e quatro reais e setenta e um centavos, equivalente a 1% do valor da causa (R$ 358.471,59), em favor da parte reclamada.
Ante o exposto, nego provimento ao agravo, com aplicação de multa.
ISTO POSTO
ACORDAM os Ministros da Quinta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer do agravo e, no mérito, negar-lhe provimento , com aplicação da multa prevista no art. 1.021, § 4º, do CPC, no importe de R$ 3.584,71 – três mil quinhentos e oitenta e quatro reais e setenta e um centavos, equivalente a 1% do valor da causa (R$ 358.471,59), em favor da parte reclamada.
Brasília, 31 de maio de 2023.
Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)
BRENO MEDEIROS
Ministro Relator