A C Ó R D Ã O

(8ª Turma)

GJCSGO/msm/wt/vbv

RECURSO DE REVISTA - DOENÇA PROFISSIONAL – SÚMULA Nº 126 DO TST

O Tribunal de origem registrou que não ficou comprovado o nexo de causalidade ou concausalidade entre a doença desenvolvida pela Reclamante e o trabalho. A alteração do julgado, no ponto, demandaria o revolvimento de fatos e provas, procedimento vedado nesta Corte, a teor da Súmula nº 126 do TST. Recurso de Revista não conhecido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR-43700-06.2008.5.12.0028 , em que é Recorrente LUCENI DE FÁTIMA RIBEIRO FERREIRA e são Recorridos ORBENK ADMINISTRAÇÃO E SERVIÇOS LTDA. e SEW-EURODRIVE BRASIL LTDA.

O Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região, pelo acórdão a fls. 1.202/1.215 , negou provimento ao Recurso Ordinário da Reclamante.

A Reclamante interpõe Recurso de Revista a fls. 1.218/1.226, com fundamento no artigo 896 da CLT.

Despacho de admissibilidade a fls. 1.228/1.229, com contrarrazões apresentadas a fls. 1.236/1.245.

Desnecessária a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho, nos termos do art. 83, do RI/TST.

É o relatório.

V O T O

REQUISITOS EXTRÍNSECOS DE ADMISSIBILIDADE

Satisfeitos os pressupostos extrínsecos de admissibilidade, examino os específicos do Recurso de Revista.

DOENÇA PROFISSIONAL – SÚMULA Nº 126 DO TST

Conhecimento

Assim se pronunciou o Tribunal de origem:

"A Lei n. 8.213/91, em seu art. 20, inc. I, define doença profissional como aquela produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade e constante da respectiva relação elaborada pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social. (grifei)

(...)

Também há de se ressaltar que a permanência da capacitação para o trabalho não exclui a responsabilidade do causador do dano. Contudo, para a configuração da responsabilidade civil do empregador, que é subjetiva, faz-se necessária, além do dano sofrido, a comprovação do nexo de causalidade entre a conduta da empresa, dolosa ou culposa.

A Constituição Federal consagra a necessidade de comprovação do dolo ou culpa do empregador para fim de pagamento da indenização por acidente do trabalho, ou doença ocupacional a ele equiparada, quando prevê o direito dos trabalhadores ao seguro contra acidentes do trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado quando incorrer em dolo ou culpa (art. 7º, inc. XXVIII).

A indenização por danos morais e materiais, embora assegurada pela Constituição da República, somente deve ser deferida nas hipóteses em que ficar comprovada a ação ou omissão ilícita, e o nexo de causalidade ocorrido entre essa ação ou omissão e a lesão moral supostamente sofrida, ônus que compete ao autor, nos termos dos arts. 818 da CLT e 333, I, do CPC.

Mas a prova produzida não corrobora sua tese.

A autora laborou como servente para a primeira ré em duas oportunidades: de 04.02.2002 a 07.05.2003 e de 19.01.2004 e 04.06.2006, prestando serviços à segunda neste período.

Foram realizadas duas perícias médicas, uma relativa à doença indicada na inicial e eventual nexo de causalidade com o trabalho desenvolvido (fls. 300-307), outra ergonômica no local de trabalho (fls. 355-366).

A primeira apresentou-se não esclarecedora, limitando-se a responder os quesitos das partes, nem sequer apresentando uma conclusão própria. Assim, indicou diagnósticos diversos em diferentes partes do laudo, apontando o CID M75.1 no quesito "a" da autora (fl. 302), equivalente à síndrome do manguito rotador, embora citasse artrose inespecífica M199 em resposta ao mesmo questionamento pelo Juízo (quesito 2, fl. 300):

Atualmente apresenta ultra sonografia datada de 11/02/2008 do ombro esquerdo demonstrando tendão do subescapular (manguito rotador) "normal" e alterações degenerativas em articulação acromioclavicular (alteração degenerativa comumente encontrada após os 30 anos de idade e normalmente não sintomática nesta idade), não demonstrando sinovite articular (processo inflamatório agudo).

Apresenta ultra sonografia também do ombro direito que demonstra tendinopatia do supraespinal e artrose acromioclavicular sem sinovite ou edema ósseo. CID para artrose inespecífica M199. (grifei)

E em que pese tenha afirmado que o ombro esquerdo apresente tendão "normal" e alterações degenerativas, indicou como patologia a tendinopatia do subescapular manguito rotador do ombro esquerdo no quesito 11 da ré (fl. 305).

Não esclareceu a época do surgimento da doença e/ou dos sintomas, limitando-se a dizer que as queixas iniciaram em 2004. É importante essa informação, já que a autora iniciou o labor em 19.01.2004, pois somente se cogitaria de eventual nexo com o trabalho se manifestada com longo período de trabalho, não poucos meses, sobretudo diante do extenso histórico laboral da autora em atividades com equivalentes riscos. Ora, o perito admitiu a possibilidade de ter iniciado antes do ingresso na ré ou originado em outros trabalhos ou atividades extralaborais (quesitos 11 e 12 da ré, fl. 305) .

E ainda que o perito judicial tenha dito ser possível afirmar que a doença era, na época do contrato, decorrente da atividade na ré, o quesito seguinte traz a informação de não haver possibilidade de se estabelecer nexo de causalidade exclusivo com o trabalho, afirmando apenas ser alta a probabilidade (quesitos 11 e 13 do Juízo, fl. 301).

O perito também indicou a etiologia multifatorial da tendinopatia do subescapular manguito rotador ( traumática ou microtraumática, degenerativa, entre outros ). Com efeito, no citado quesito 2 do Juízo (fl. 300), afirmou haver apenas alterações degenerativas no ombro esquerdo. Estas, a meu ver, não possuem relação com o trabalho, sendo decorrentes do avanço da idade do paciente, como resultado de um processo natural do corpo humano.

O laudo confirmou a influência de outros fatores no desenvolvimento ou agravamento da doença, tais como hereditários ou emocionais (quesito 14 do Juízo), e aduziu, em conclusão, paciente com provável lesão ocupacional em 2004, sendo afastada de suas atividades habituais, ocorrendo melhora da lesã o (outros esclarecimentos, quesito 17 do Juízo, grifei ). O mesmo ocorreu no quesito "g" da autora sobre serem as lesões geradas pela atividade na ré, respondendo que muito provavelmente sim (fl. 302, grifei ).

Provocado pela autora a descrever detalhadamente as atividades realizadas, com todas as funções e locais de trabalho, o perito somente disse se tratar de serviços gerais, com todo tipo de limpeza em área interna e externa, conforme história clínica e laudos apresentados (quesito "d", fl. 302). Sobre a descrição detalhada dos movimentos realizados (quesito "e" da autora, fl. 302), disse apenas serem acima e abaixo da cintura escapular, envolvendo esforço físico ou não. Ora, os próprios quesitos da autora foram respondidos de forma vaga, insuficientes, pois, à configuração do nexo causal da doença com as atividades laborais.

A perícia suficiente à configuração do direito deve ser clara e precisa, o que não se verifica no laudo em exame, por não conclusiva, como expôs a sentença, razão por que competia à ela provocar melhores esclarecimentos do expert , a fim de se desincumbir do ônus da prova, que, no particular, repito, era seu. Compartilho, pois, da opinião do Magistrado de origem, quanto ao deferimento da perícia ergonômica requerida pela segunda ré com o propósito de busca da verdade (fl. 408), mesmo porque o primeiro perito não se dirigiu ao local de trabalho.

A perícia médica-ergonômica, por sua vez, concluiu que as tendinopatias não guardam Nexo Causal com o período em que a mesma laborou na Ré (fl. 362). Ao contrário do primeiro laudo, o segundo descreveu detalhadamente as atividades realizadas pela autora, esclarecendo não estar caracterizado que a Autora efetuava "carregamento manual de peso", "postura" e "esforço físico" prejudiciais à sua pessoa em tais atividades (quesito "a" da autora, fl. 358). Destaco que ela esteve presente, prestando informações ao expert (itens II e IV), inclusive tendo relatado a ele não realizar o transporte de objetos pesados e não flexionar os membros superiores acima da linha do ombro com frequência (quesito "b" da autora, fl. 358).

Assim, não se sustenta a alegação recursal de invalidação do laudo em razão de eventual alteração das condições do local, pelo decurso de três anos desde a rescisão, pois ela poderia informar o perito das alterações ocorridas e, havendo controvérsia sobre matéria, comprová-las mediante prova oral ou equivalente. Além disso, referida questão não foi levantada em sua manifestação ao laudo (fls. 371-372), obstando ao Juízo a quo a aferição da veracidade durante a instrução do processo, tratando-se de patente inovação recursal.

A segunda perícia considerou, ainda, as atividades laborais anteriores: seis meses na operação de empilhadeira, aos dezoito anos; seis meses na operação de máquina de produção de peças de móveis; seis anos na embalagem e operação de empilhadeira em frigorífico de frutas; e um ano e três meses no auxílio à limpeza em um shopping center (quesito "d" da autora, fl. 359).

Também com relação ao agravamento, o laudo foi claro, negando haver nexo concausal com o trabalho (quesito "e" da autora, fl. 359), com base nas atribuições relatadas pela própria autora. Refutou, ainda, as alegações da inicial quanto ao prejuízo em seus movimentos, em resposta ao quesito "f" da autora (fl. 359).

Questionado pela ré acerca da alteração de postura no sistema de trabalho, respondeu que a autora realizava suas atividades conforme a necessidade, sempre porém dentro de seus limites (biótipo brevilineo), conforme seu próprio relato (quesito 15 da ré, fl. 361). E apontou como atribuição com emprego de maior esforço a limpeza dos vidros (quesito 20 da ré, fl. 362).

Além disso, disse a autora que realizava e realiza atividades domésticas em sua residência, igualmente contributivas para a moléstia. A ajuda recebida para isso se restringe à sua filha de onze anos (oito, à época do contrato de trabalho), com frequência escolar no período matutino (quesito 21 da ré, fl. 362). Nesse quesito, cito a informação acrescentada pelo perito:

Enfatizou por várias vezes que a colocação de seu Procurador às fls. 10 nos autos que a mesma encontra-se com "lesões que acarretam redução/depreciação total e permanente da sua capacidade para o trabalho" não é verdadeira. (destaque original)

Tampouco a culpa do empregador está demonstrada pelas disposições do PPRA, uma vez que o "carregamento manual de peso" e o "esforço físico" foram refutados pela própria declaração da autora.

Esclareço, por fim, que o INSS, órgão melhor capacitado para aferição da natureza ocupacional dos acidentes ou doenças, também não reconheceu o nexo entre a doença diagnosticada e o trabalho, pois, ao contrário do que sustenta a recorrente, lhe concedeu benefício na forma de auxílio-doença previdenciário, sendo alterada a espécie apenas por decisão judicial proferida na Justiça Comum, em sede de antecipação dos efeitos da tutela.

Porém, não se encontra este Juízo vinculado à decisão daquele Juízo, mesmo porque precária, tampouco ao laudo produzido pelo CEREST (fls. 33-38). Vige, no ordenamento jurídico pátrio, o princípio do livre convencimento motivado, consubstanciado no art. 131, do CPC, não estando, destarte, o Magistrado adstrito às conclusões daquele técnico, ou daquela ação, cujo objeto era diverso.

Ademais, ainda que se considerasse tenha o trabalho promovido o agravamento das doenças, como concausa defendida pela recorrente, não existiria nexo causal suficiente à responsabilização do empregador.

Acontece que, na esfera jurídica civil, diversamente do que ocorre na seara médica ou criminal, a concausalidade deve ser analisada sob a perspectiva da capacidade que detém determinada conduta de, isoladamente, causar dano. Cuida-se, pois, da denominada "teoria da causa adequada", assim explicitada :

(...)

Nesse sentido, entendo que a concausa não enseja, por si só, a condenação do empregador. É preciso a prova incontestável de efetiva "causa" ligada diretamente ao trabalho.

A redação do artigo 21 da Lei n. 8.213/91 é expressa quanto à previsão visar somente a disciplina dos benefícios previdenciários, na medida em que equipara os casos discriminados em seus incisos ao acidente do trabalho "para os efeitos desta Lei", ou seja, da Lei n. 8.213/91 (Planos de Benefícios da Previdência Social). Não obstante.

Não ficou demonstrado, portanto, o nexo de causalidade entre a moléstia que acometeu a autora e sua atividade profissional, tampouco restou evidenciado que as rés tenham praticado algum ato ilícito, quer por ação, quer por omissão, que tenha contribuído para o aparecimento da doença, elementos imprescindíveis para caracterizar a responsabilidade civil pela ofensa a um bem jurídico.

Nesse contexto, ausentes os pressupostos necessários à responsabilização, é incabível a condenação das rés ao pagamento de danos morais e materiais. Inexistindo condenação, também não há falar em imposição de honorários advocatícios.

Por esta razão, nego provimento ao recurso." (fls. 1.204/1.214 – sem grifos no original)

A Reclamante sustenta que ficou comprovado o nexo de causalidade pelo agravamento da doença. Aduz que, para se considerar acidente de trabalho, não é necessário que a patologia tenha sido gerada exclusivamente pelo trabalho, mas que este tenha contribuído para a sua ocorrência. Aponta violação aos arts. 21 da Lei 8.213/91 e traz arestos à divergência.

O Tribunal de origem registrou que não ficou comprovado o nexo de causalidade ou concausalidade entre a doença desenvolvida pela Reclamante e o trabalho. A alteração do julgado, no ponto, demandaria o revolvimento de fatos e provas, procedimento vedado nesta Corte, a teor da Súmula nº 126 do TST.

Não conheço.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, não conhecer do Recurso de Revista .

Brasília, 28 de Setembro de 2011.

Firmado por Assinatura Eletrônica (Lei nº 11.419/2006)

Sebastião Geraldo de Oliveira

Juiz Convocado Relator