A C Ó R D Ã O

(5ª Turma)

GMDAR/LSM/LMM

AGRAVO. RECURSO DE REVISTA REGIDO PELA LEI 13.467/2017. ACIDENTE DO TRABALHO. MOTORISTA DE CAMINHÃO RODOVIÁRIO. ATIVIDADE DE RISCO. CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA CONFIGURADA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA AFASTADA. TRANSCENDÊNCIA NÃO RECONHECIDA NA DECISÃO AGRAVADA. 1. Caso em que o Tribunal Regional, com amparo nas provas dos autos, registrou que, " conforme informações colhidas pela Polícia Rodoviária Federal (id. 7f73bee), no dia 18-11-2016, por volta das 14 horas, o empregado falecido, quando dirigia o caminhão de propriedade da ré (Caminhão SCANIA/T 113 H 4X2 360, placas MDM-9190), na BR 135, km 625, perdeu o controle da direção do veículo, vindo a colidir com outro caminhão que seguia no sentido contrário. Ainda, conforme relatórios de rastreamento do veículo (id. 23578b7), é possível verificar que o autor permaneceu desde 14-11-2016 na cidade de Várzea da Palma/MG, sem viajar, e que a viagem do dia do acidente iniciou a viagem somente às 11h30min, tendo o evento ocorrido por volta das 14h25min .". Consignou que o caminhão guiado pelo Autor estava em bom estado de conservação, não apresentando defeitos. Ressaltou que " os relatórios de rastreamento do veículo indicam que o autor usufruiu os descansos devidos, sendo que estava havia 4 dias sem viajar e que, no dia do infortúnio, estava dirigindo havia apenas 40 minutos desde o último intervalo. (...) os relatórios indicam, ainda, que o trabalhador ultrapassou a velocidade permitida em várias oportunidades ". Destacou que o trabalhador " invadiu a pista contrária sem motivo ". Manteve a sentença, na qual julgadas improcedentes as pretensões indenizatórias, afastando a responsabilidade objetiva da empresa e concluindo que restou " configurada a culpa exclusiva da vítima no acidente de trabalho ocorrido ". 2. A insuficiência da teoria da culpabilidade para dar solução aos inúmeros casos de vítimas de acidentes levou à criação da teoria do risco, segundo a qual o dono do negócio é o responsável por riscos ou perigos que sua atividade promova, ainda que empregue toda diligência para evitar o dano. Trata-se da denominada teoria do risco criado. Em sendo o empregador responsável pela organização da atividade produtiva, beneficiando-se do lucro do empreendimento, nada mais razoável e justo do que lhe imputar a responsabilidade pelo ressarcimento ao obreiro dos danos decorrentes de sua exposição ao foco de risco. 3. Ressalta-se que a jurisprudência trabalhista tem autorizado o reconhecimento de risco expressivo na atividade de motorista de caminhão que trafega em rodovias, capaz de acionar a cláusula objetiva da responsabilidade. 4. Nada obstante, podem existir situações em que, mesmo em se cuidando de atividade empresarial gravada com risco diferenciado, a motivação dos protagonistas ou mesmo a forma como os eventos se sucederam podem levar à ruptura do nexo entre o acidente e a atividade empresarial, elidindo o dever de reparar. São hipóteses em que o evento gerador do dano não guarda relação direta ou indireta com a atividade empresarial explorada, configurado fortuito externo. 5. Ainda, a culpa exclusiva da vítima é fator excludente da responsabilidade objetiva, não podendo ser considerada parte inerente aos riscos do negócio a conduta imprudente ou negligente do motorista, antes traduzindo evento singular, suficiente para afastar a responsabilidade do empregador pelo infortúnio causado. 6. No caso presente, a partir das premissas fáticas consignadas pelo Tribunal Regional, insuscetíveis de reexame nesta instância extraordinária, ante o óbice da Súmula 126/TST, permitem a conclusão de que o acidente não decorreu do risco da atividade exercida, mas da atuação negligente e imprudente do trabalhador, o que afasta o nexo de causalidade e, por consequência, a responsabilidade objetiva do empregador. 7. Além disso, o único aresto paradigma válido para o confronto de teses, traz a premissa de que " Diante dos riscos próprios da atividade econômica (art. 2º da CLT) e dos riscos especiais e potenciais decorrentes do exercício da atividade de motorista de caminhão desempenhada em empresa de transporte (art. 927, § único, do CC), objetiva é a responsabilidade da empresa pelo acidente que vitimou o empregado, a ensejar a manutenção do dever de indenizar os prejuízos causados reconhecida na origem ." É, portanto, inespecífico, pois apenas trata da responsabilidade objetiva da empresa por acidente causado a trabalhador nas mesmas circunstâncias do de cujos , sem consignar, contudo, a excludente da responsabilidade objetiva que, no caso, é a culpa exclusiva da vítima, motivo pelo qual incide o óbice da Súmula 296/TST. Decisão monocrática mantida com acréscimo de fundamentação. Agravo não provido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo em Recurso de Revista n° TST-Ag-RR-301-75.2017.5.12.0006 , em que é Agravante IVONETE TEREZINHA ALEXANDRE e Agravado MTM TRANSPORTES, COMÉRCIO & SERVIÇOS LTDA.

A parte interpõe agravo em face de decisão mediante a qual foi denegado seguimento ao seu agravo de instrumento.

Não houve apresentação de contraminuta.

O recurso de revista foi interposto em face de decisão publicada na vigência da Lei 13.467/2017.

É o relatório.

V O T O

1. CONHECIMENTO

CONHEÇO do agravo porque atendidos os pressupostos de admissibilidade.

2. MÉRITO

Eis os termos da decisão:

(...)

A parte sustenta que deveria ter sido aplicada ao caso a responsabilidade objetiva, pois a atividade de motorista é atividade de risco.

Pleiteia "que o valor da indenização moral deva ser na importância de R$ 300.000,00 (trezentos mil reais), valor este muito bem suportado pela Recorrida (e considerado razoável pelo próprio TST), haja vista, ser uma empresa financeira de grande porte. Sobre o valor da indenização, deverão incidir juros desde o evento danoso, pois se trata de responsabilidade extracontratual" (fl. 259).

Aponta violação do artigo 927 do CCB e transcreve arestos.

Ao exame.

Inicialmente, ressalto que a parte Recorrente, nas razões do recurso de revista, atendeu devidamente às exigências processuais contidas no art. 896, § 1º-A, I, II e III, e § 8º, da CLT.

Afinal, a parte transcreveu o trecho da decisão regional que consubstancia o prequestionamento da controvérsia; indicou ofensa à ordem jurídica; e promoveu o devido cotejo analítico.

No caso presente, o Tribunal Regional registrou que "Conforme informações colhidas pela Polícia Rodoviária Federal (id. 7f73bee), no dia 18-11-2016, por volta das 14 horas, o empregado falecido, quando dirigia o caminhão de propriedade da ré (Caminhão SCANIA/T 113 H 4X2 360, placas MDM-9190), na BR 135, km 625, perdeu o controle da direção do veículo, vindo a colidir com outro caminhão que seguia no sentido contrário" (fl. 233).

Concluiu que o acidente ocorreu por culpa exclusiva da vítima, uma vez que o caminhão estava em bom estado e que não houve jornada extenuante.

O nexo de causalidade é evidente, sendo incontroverso que o acidente ocorreu no curso da prestação dos serviços e que o veículo conduzido pelo trabalhador era fornecido pela Reclamada para o transporte de cargas.

Resta, portanto, analisar a controvérsia do ponto de vista da responsabilidade do empregador.

A insuficiência da teoria da culpabilidade para dar solução aos inúmeros casos de vítimas de acidentes levou à criação da teoria do risco, segundo a qual o dono do negócio é o responsável por riscos ou perigos que sua atividade promova, ainda que empregue toda diligência para evitar o dano.

Trata-se da denominada teoria do risco criado.

Em sendo o empregador responsável pela organização da atividade produtiva, beneficiando-se do lucro do empreendimento, nada mais razoável e justo do que lhe imputar a responsabilidade pelo ressarcimento ao obreiro dos danos decorrentes de sua exposição ao foco de risco, independentemente de cogitação acerca da imprudência, negligência ou imperícia.

Assim anota Rui Stocco:

"Significa que a periculosidade é ínsita à própria atividade, com força para dispensar qualquer outra indagação para impor a obrigação de reparar, devendo aquele que exerce ocupação, profissão, comércio ou indústria perigosa assumir os riscos dela decorrentes, pois mesmo sabendo da potencialidade ou possibilidade de danos a terceiros, ainda assim optou por dedicar a esse mister". (Tratado de responsabilidade Civil, Editora Revista dos Tribunais, 2004, p. 167).

Aliás, é inerente à própria concepção de empregador a assunção dos riscos da atividade econômica, conforme já previa a legislação trabalhista (CLT, art. 2°).

No momento em que o empreendedor põe em funcionamento uma atividade empresarial, ele assume todos os riscos dela inseparáveis, inclusive a possibilidade de acidente do trabalho.

Por definição, risco é a ameaça de lesão, envolvendo a possibilidade de que o evento danoso venha a ocorrer.

De fato, a exposição do empregado a um ambiente de risco potencial, por força da natureza da atividade ou do seu modo de execução, o coloca em condição permanente de vulnerabilidade.

A Constituição Federal assegura ao trabalhador o direito a desenvolver suas atividades em ambiente seguro que preserve sua vida, saúde, integridade física e moral, sendo certo que as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente, dentre as quais se insere o ambiente do trabalho, sujeita o causador do dano a suportar as consequências sem se perquirir sobre a culpa (art. 225, § 3°).

A professora e Magistrada Maria Zuíla Lima Dutra argumenta, verbis :

"A teoria da responsabilidade sem culpa se impõe pela necessidade de socialização do direto, pois aos interesses individuais se sobrepõem os interesses da ordem social, significando dizer que a opção pela teoria do risco representa a defesa da justiça social e da dignidade do ser humano. É nesse sentido que o jurista brasileiro Aguiar Dias afirma que 'a teoria do risco é nitidamente democrática".(Responsabilidade Objetiva do Empregador, Revista do TRT 8ª Região, Jul/Dez/2004, P. 38).

Entendo, todavia, que a regra geral da responsabilidade subjetiva inscrita no art. 7°, XXXVIII, da Carta Magna, fundada essencialmente na teoria da culpa, continua em pleno vigor, devendo, porém, ser interpretada em harmonia com a teoria do risco, sempre que se cuidar de atividades perigosas.

Sobre esse aspecto, vale colher nova lição de Rui Stoco:

"Comporta admitir que, inobstante o grande entusiasmo que a teoria do risco despertou, o certo é que não chegou a substituir a culpa nos sistemas jurídicos de maior expressão e nem poderia assim ser. O que se observa, como ressuma da obra de Caio Mário, é a convivência de ambas: a teoria da culpa impera como direito comum ou regra geral básica da responsabilidade civil, e a teoria do risco ocupa os espaços excedentes, nos casos e situações que lhe são reservado". (Tratado de Responsabilidade Civil, Editora Revista dos Tribunais, 2004, p. 151).

Com efeito, só excepcionalmente, nos casos em que a atividade empresarial se desenvolve em um ambiente que implique risco para direitos de outrem, cogitar-se-á da aplicação da teoria do risco, cumprindo ressaltar que, no contexto desta Justiça Especializada, está-se diante de norma mais favorável ao trabalhador e compatível com o princípio protetivo que informa o direito do trabalho.

Nessa perspectiva, dar interpretação diversa à norma constitucional é atentar contra a dignidade da pessoa humana, fundamento do Estado Democrático de Direito.

Feitos esses registros, ressalto o fato de o trabalhador exercer sua atividade conduzindo caminhão para o transporte de cargas em rodovias.

Ora, sabe-se que os índices de acidentes em rodovias vêm aumentando significativamente nos últimos anos, o que tem autorizado o reconhecimento de risco expressivo na atividade, capaz de acionar a cláusula objetiva da responsabilidade.

Obviamente, podem existir situações em que, mesmo em se cuidando de atividade empresarial gravada com risco diferenciado, a motivação dos protagonistas ou mesmo a forma como os eventos se sucederam pode levar à ruptura do nexo entre o acidente e a atividade empresarial, elidindo o dever de reparar.

São hipóteses, insista-se, em que o evento gerador do dano não guarda relação direta ou indireta com a atividade empresarial explorada, configurado fortuito externo, como se colhe de vários julgados do Superior Tribunal de Justiça, envolvendo o contrato de transporte, no qual o dever de proteção à integridade dos passageiros é parte dele integrante.

Nesses casos não há responsabilidade do transportador por danos vivenciados por passageiros em razão do arremesso de pedras contra ônibus ou trem (AgInt nos EREsp 1.325.225/SP, 2ª Seção, DJe de 19/09/2016; AgRg nos EDcl no AREsp 156.998/RJ, 3ª Turma, DJe de 04/09/2012; REsp 247.349/MG, 4ª Turma, DJe de 26/02/2009), também não respondendo por eventual razão de assalto a mão armada durante o transporte coletivo (REsp 435.865/RJ, 2ª Seção, DJ de 12/05/2003; AgRg no REsp 620.259/MG, 4ª Turma, DJe de 26/10/2009; AgRg no REsp 960.578/SP, 4ª Turma, DJ de 08/10/2007) ou mesmo em estações metroviárias (REsp 974.138/SP, 4ª Turma, DJe de 09/12/2016).

De igual modo não se cogita de responsabilidade, por configurado fortuito externo, a morte de passageiro colhido por "bala perdida" (AgRg no REsp 1.049.090/SP, 3ª Turma, DJe de 19/08/2014; REsp 613.402/SP, 4ª Turma, DJ de 04/10/2004), bem assim não havendo dever de reparar danos resultantes de explosão de bomba no interior de vagão de trem (AgRg nos EDcl nos EREsp 1.200.369/SP, 2ª Seção, DJe de 16/12/2013).

Claro exemplo nesse mesmo sentido, envolvendo a própria atividade de motorista de carreta, diz com o propósito pessoal de cometimento de suicídio, com o uso do veículo confiado ao trabalhador. Ainda, situações em que o emprego trafega acima dos limites de velocidade ou com o uso de medicamentos ou ainda após prévio consumo de álcool. Nesses casos, ainda que a atividade empresarial seja realmente de risco, não se poderia imputar a responsabilidade ao empregador, quando o infortúnio é deliberadamente causado pela própria vítima, que, agindo com dolo eventual ou culpa consciente, aceita o risco ou, mesmo ciente de sua potencialidade, acreditando em sua não ocorrência.

A culpa da vítima, enquanto situação capaz de afastar o dever de reparar, é assim definida por Sebastião Geraldo de Oliveira:

"Fica caracterizada a culpa exclusiva da vítima quando a causa única do acidente do trabalho tiver sido a sua conduta, sem qualquer ligação com o descumprimento das normas legais, contratuais, convencionais, regulamentares, técnicas ou do dever geral de cautela por parte do empregador. Se o empregado, por exemplo, numa atitude inconsequente, desliga o sensor de segurança automática de um equipamento perigoso e posteriormente sofre acidente por essa conduta, não há como atribuir culpa em qualquer grau ao empregador, pelo que não se pode falar em indenização. O 'causador' do acidente foi o próprio acidentado, daí falar-se em rompimento do nexo causal ou do nexo de imputação do fato ao empregador." (Indenizações por acidente de trabalho ou doença ocupacional, 12ª edição, JusPodium, 2021, p. 208).

No caso dos autos, a Corte Regional fixou a premissa da culpa exclusiva da vítima para o infortúnio, inclusive transcrevendo a sentença, em que referidos os elementos de prova ligados ao acidente, dos quais resta confirmada a responsabilidade única do prestador pelo infortúnio que o vitimou.

A só circunstância de se cuidar de atividade empresarial de risco não impõe, objetivamente, o dever de reparação em toda e qualquer circunstância, em eventos ligados ao exercício da atividade. O exercício da atividade de motorista é objeto de regulação legal (Lei 13.103/2015) e está cercada de exigências e cautelas legais, não se mostrando razoável -- salvo hipóteses específicas em que o empregador expõe o empregado a jornadas extenuantes, reduzindo sua capacidade funcional, ou não provê veículos em boas condições de trafegabilidade -- que todo e qualquer evento lesivo causado pelo empregado possa autorizar a sua própria reparação.

Acrescento que, nem mesmo nas atividades nucleares, em que a responsabilidade é objetiva (art. 6º da Lei 6.453/77), há possibilidade de imposição do dever de reparar nos casos em que provada a culpa exclusiva da vítima. Nessa mesma direção, os arts. 12, § 3º, e 14, § 3º, do CDC afastam as responsabilidades objetivas do fabricante, construtor, produtor ou fornecedor, nas situações em que revelada a culpa exclusiva do consumidor. Essa mesma exclusão da responsabilidade está presente nos casos de danos causados por animais, quando evidenciada a culpa exclusiva da vítima (CC, art. 936).

Sob outro prisma, cabe recordar que a hipótese dos autos não se enquadra como caso fortuito, na modalidade interna, com todas as vênias, pois a imperícia ou mesmo a negligência do condutor não encerra evento imprevisível ou inevitável, essenciais para o reconhecimento do caso fortuito. Com efeito, diante do amplo arsenal normativo que disciplina o exercício dessa importante função de motorista, os casos de acidentes causados pelos próprios motoristas, sem qualquer falha mecânica ou mesmo sem o concurso de terceiros, configuram, em realidade, típica transgressão contratual. A culpa exclusiva do motorista pelo acidente, em conduta imprudente ou negligente, nesse contexto, sequer pode ser considerada parte inerente aos riscos do negócio, antes traduzindo evento singular, suficiente para afastar a responsabilidade do empregador pelo infortúnio causado.

Outrossim, o aresto colacionado às fls. 255/256 é inservível ao cotejo de teses, porquanto revela-se inespecífico, visto que não retrata tese divergente em torno de situação fática idêntica (Súmula 296/TST). Assim como os arestos transcritos às fls. 257 e 259 são oriundos de órgãos não contemplados na alínea "a" do art. 896 da CLT.

Não se tratando, portanto, de questão jurídica nova (transcendência jurídica) ou de ofensa a direito social constitucionalmente assegurado (transcendência social), ou ainda de questão em que esteja envolvido valor da causa de montante elevado (transcendência econômica), não há como processar o presente recurso de revista.

Ademais, não há, a partir das específicas circunstâncias fáticas consideradas pela Corte Regional, jurisprudência dissonante pacífica e reiterada no âmbito desta Corte, não se configurando a transcendência política do debate proposto.

Ante o exposto, e amparado no artigo 932 do CPC/2015, NÃO CONHEÇO do recurso de revista.

(...).

A parte, em seu agravo, sustenta que os arestos transcritos são específicos, pois " na decisão do julgado paradigma os Desembargadores são claros ao aduzir que a atividade de motorista é, de fato, atividade de risco " (fl. 309).

Afirma que " tratando-se de alegada morte decorrente de acidente de trabalho, a transcendência social é latente. A transcendência econômica também não está, a seu turno, fora de cogitação, considerando que o valor da causa ultrapassa os R$ 700.000,00 (setecentos mil reais) ." (fl. 310).

À análise.

Constou do acórdão regional:

(...)

M É R I T O

1. ACIDENTE DE TRABALHO. RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS (PENSÃO) E MORAIS

A autora, progenitora do ex-empregado, postula a condenação da demandada ao pagamento dos pleitos indenizatórios decorrentes do acidente de trabalho que vitimou o seu filho. Argumenta que "o trabalho em rodovias como motorista carreteiro e de ônibus caracteriza-se como atividade de risco e com isso a responsabilidade objetiva do empregador" pelo acidente fatal ocorrido.

O Juízo de origem indeferiu os pleitos indenizatórios, por considerar que o infortúnio laboral sofrido pelo trabalhador ocorreu por sua culpa exclusiva. Também consignou que, "ainda que se entenda que não se trata de culpa exclusiva do trabalhador, não restou comprovada a culpa da empregador, o que afasta sua responsabilidade civil, no caso, subjetiva".

Oportuno transcrever excertos da decisão recorrida:

A parte autora não se fez presente à audiência em que deveria prestar depoimento, razão pela qual reconheço a presunção de veracidade acerca do fatos narrados na defesa (Súmula 74 do TST).

(...)

A ré sustenta a correção das anotações da CTPS do trabalhador. Argumenta que os relatórios de rastreamento do veículo indicam que o autor usufruiu os descansos devidos, sendo que estava havia 4 dias sem viajar e que, no dia do infortúnio, estava dirigindo havia apenas 40 minutos desde o último intervalo. Segundo a defesa, os relatórios indicam, ainda, que o trabalhador ultrapassou a velocidade permitida em várias oportunidades.

Analisando os relatórios de rastreamento anexos, noto que, efetivamente, o trabalhador permaneceu na mesma cidade de Várzea da Palma/MG, sem viajar, desde o dia 14/11/2016, e que a viagem do dia 18/11/2016 começou por volta das 11h30min (id 23578b7), o que afasta a tese de que ele dormiu ao volante por estar exausto do trabalho.

Por outro lado, o boletim de acidente de trânsito do id 7f73bee indica que o filho da autora invadiu a pista contrária sem motivo , o que aproxima o caso da culpa exclusiva da vítima.

Todavia, ainda que se entenda que não se trata de culpa exclusiva do trabalhador, impõe-se a conclusão de que não houve culpa da ré, o que afasta a sua responsabilidade civil, que, no caso, é subjetiva.

O significado da atividade de risco, prevista no parágrafo único do art. 927 do CC/02, deve ser preenchido em cada caso pelo aplicador do Direito, já que se trata de conceito jurídico indeterminado.

(...)

Nesse contexto, no que diz com o transporte de cargas, não há como reconhecer que a atividade do motorista, genericamente, lhe imponha um ônus maior em relação aos demais membros da coletividade, porquanto o risco de conduzir veículos nas estradas é suportado regularmente por todas as pessoas que dirigem. Não vejo, nessa linha, como comparar a atividade do motorista com a do paraquedista ou com a do trabalhador na área da saúde que manuseie amostras de vírus e bactérias de fácil contágio, exemplos estes utilizados pela doutrina como atividade enquadrada no parágrafo único do art. 927.

De início, registro meu entendimento de que o empregador só responde por eventual acidente de trabalho (ou doença a ele equiparada) no caso de haver prova incontestável do dano sofrido, da sua culpa ou dolo e do nexo de causalidade, tudo nos termos do art. 7º, XXVIII, da Constituição Federal, razão pela qual o feito deve ser analisado sob a ótica da responsabilidade civil subjetiva, exigindo a comprovação de dano, ato ilícito e nexo causal entre ambos.

Destaco, ainda, que não se cogita, no presente caso, de responsabilidade civil objetiva, uma vez que a atividade desempenhada pelo "de cujus" (motorista) não era de risco, não configurando a hipótese do art. 927 do Código Civil.

Outrossim, o caso sub judice não autoriza o deferimento de indenização por dano moral ou material fundamentado na responsabilidade subjetiva do empregador ante a ausência da integralidade de seus elementos caracterizadores, especificamente do nexo causal, pois entendo provada a culpa exclusiva da vítima.

Conforme informações colhidas pela Polícia Rodoviária Federal (id. 7f73bee), no dia 18-11-2016, por volta das 14 horas, o empregado falecido, quando dirigia o caminhão de propriedade da ré (Caminhão SCANIA/T 113 H 4X2 360, placas MDM-9190), na BR 135, km 625, perdeu o controle da direção do veículo, vindo a colidir com outro caminhão que seguia no sentido contrário. Ainda, conforme relatórios de rastreamento do veículo (id. 23578b7), é possível verificar que o autor permaneceu desde 14-11-2016 na cidade de Várzea da Palma/MG, sem viajar, e que a viagem do dia do acidente iniciou a viagem somente às 11h30min, tendo o evento ocorrido por volta das 14h25min.

A representante do espólio não compareceu à audiência de instrução, sendo declarada confessa quanto à matéria fática e, de acordo com as provas documentais trazidas aos autos, ficou evidenciado que o trágico infortúnio ocorreu por culpa exclusiva do obreiro, porquanto não restou comprovada a jornada extenuante que pudesse resultar a fadiga alegada ou a existência de defeito no caminhão, que pudessem ocasionar o acidente. Pelo contrário, restou claro que, no dia fatídico, que o empregado dirigiu menos de 4 horas antes do acidente e que o caminhão estava em bom estado de conservação .

Entrementes, não obstante a consternação que a trágica situação impõe, entendo demonstrado que o sinistro se deu por culpa exclusiva do próprio trabalhador, o qual perdeu o controle da direção, avançando a pista contrária e colidindo com outro veículo que vinha naquele sentido, sem que outros fatores contribuíssem para o infortúnio, inexistindo espaço, assim, para a responsabilização da ré aventada nas razões recursais.

Nesse contexto, configurada a culpa exclusiva da vítima no acidente de trabalho ocorrido, resulta inequívoco o descabimento das pretensões indenizatórias, em face da ausência dos elementos configuradores do dever de indenizar.

Mantenho, dessa sorte, o julgado de origem por seus próprios e jurídicos fundamentos.

(...). (destaquei, fls. 232/234).

No caso presente, o Tribunal Regional, com amparo nas provas dos autos, registrou que, " Conforme informações colhidas pela Polícia Rodoviária Federal (id. 7f73bee), no dia 18-11-2016, por volta das 14 horas, o empregado falecido, quando dirigia o caminhão de propriedade da ré (Caminhão SCANIA/T 113 H 4X2 360, placas MDM-9190), na BR 135, km 625, perdeu o controle da direção do veículo, vindo a colidir com outro caminhão que seguia no sentido contrário. Ainda, conforme relatórios de rastreamento do veículo (id. 23578b7), é possível verificar que o autor permaneceu desde 14-11-2016 na cidade de Várzea da Palma/MG, sem viajar, e que a viagem do dia do acidente iniciou a viagem somente às 11h30min, tendo o evento ocorrido por volta das 14h25min. " (fl. 233).

Ressaltou que " os relatórios de rastreamento do veículo indicam que o autor usufruiu os descansos devidos, sendo que estava havia 4 dias sem viajar e que, no dia do infortúnio, estava dirigindo havia apenas 40 minutos desde o último intervalo. (...) os relatórios indicam, ainda, que o trabalhador ultrapassou a velocidade permitida em várias oportunidades " (fl. 232).

Destacou que o trabalhador " invadiu a pista contrária sem motivo " (fl. 232).

Consignou que o caminhão não apresentava defeitos.

Manteve a sentença, na qual julgadas improcedentes as pretensões indenizatórias, concluindo que restou " configurada a culpa exclusiva da vítima no acidente de trabalho ocorrido " (fl. 234).

A insuficiência da teoria da culpabilidade para dar solução aos inúmeros casos de vítimas de acidentes levou à criação da teoria do risco, segundo a qual o dono do negócio é o responsável por riscos ou perigos que sua atividade promova, ainda que empregue toda diligência para evitar o dano.

Trata-se da denominada teoria do risco criado.

Em sendo o empregador responsável pela organização da atividade produtiva, beneficiando-se do lucro do empreendimento, nada mais razoável e justo do que lhe imputar a responsabilidade pelo ressarcimento ao obreiro dos danos decorrentes de sua exposição ao foco de risco, independentemente de cogitação acerca da imprudência, negligência ou imperícia.

Assim anota Rui Stocco:

"Significa que a periculosidade é ínsita à própria atividade, com força para dispensar qualquer outra indagação para impor a obrigação de reparar, devendo aquele que exerce ocupação, profissão, comércio ou indústria perigosa assumir os riscos dela decorrentes, pois mesmo sabendo da potencialidade ou possibilidade de danos a terceiros, ainda assim optou por dedicar a esse mister". (Tratado de responsabilidade Civil, Editora Revista dos Tribunais, 2004, p. 167).

Aliás, é inerente à própria concepção de empregador a assunção dos riscos da atividade econômica, conforme já previa a legislação trabalhista (CLT, art. 2°).

No momento em que o empreendedor põe em funcionamento uma atividade empresarial, ele assume todos os riscos dela inseparáveis, inclusive a possibilidade de acidente do trabalho.

Por definição, risco é a ameaça de lesão, envolvendo a possibilidade de que o evento danoso venha a ocorrer.

De fato, a exposição do empregado a um ambiente de risco potencial, por força da natureza da atividade ou do seu modo de execução, o coloca em condição permanente de vulnerabilidade.

A Constituição Federal assegura ao trabalhador o direito a desenvolver suas atividades em ambiente seguro que preserve sua vida, saúde, integridade física e moral, sendo certo que as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente, dentre as quais se insere o ambiente do trabalho, sujeita o causador do dano a suportar as consequências sem se perquirir sobre a culpa (art. 225, § 3°).

A professora e Magistrada Maria Zuíla Lima Dutra argumenta, verbis :

"A teoria da responsabilidade sem culpa se impõe pela necessidade de socialização do direto, pois aos interesses individuais se sobrepõem os interesses da ordem social, significando dizer que a opção pela teoria do risco representa a defesa da justiça social e da dignidade do ser humano. É nesse sentido que o jurista brasileiro Aguiar Dias afirma que 'a teoria do risco é nitidamente democrática".(Responsabilidade Objetiva do Empregador, Revista do TRT 8ª Região, Jul/Dez/2004, P. 38).

Entendo, todavia, que a regra geral da responsabilidade subjetiva inscrita no art. 7°, XXXVIII, da Carta Magna, fundada essencialmente na teoria da culpa, continua em pleno vigor, devendo, porém, ser interpretada em harmonia com a teoria do risco, sempre que se cuidar de atividades perigosas.

Sobre esse aspecto, vale colher nova lição de Rui Stoco:

"Comporta admitir que, inobstante o grande entusiasmo que a teoria do risco despertou, o certo é que não chegou a substituir a culpa nos sistemas jurídicos de maior expressão e nem poderia assim ser. O que se observa, como ressuma da obra de Caio Mário, é a convivência de ambas: a teoria da culpa impera como direito comum ou regra geral básica da responsabilidade civil, e a teoria do risco ocupa os espaços excedentes, nos casos e situações que lhe são reservado". (Tratado de Responsabilidade Civil, Editora Revista dos Tribunais, 2004, p. 151).

Com efeito, só excepcionalmente, nos casos em que a atividade empresarial se desenvolve em um ambiente que implique risco para direitos de outrem, cogitar-se-á da aplicação da teoria do risco, cumprindo ressaltar que, no contexto desta Justiça Especializada, está-se diante de norma mais favorável ao trabalhador e compatível com o princípio protetivo que informa o direito do trabalho.

Nessa perspectiva, dar interpretação diversa à norma constitucional é atentar contra a dignidade da pessoa humana, fundamento do Estado Democrático de Direito.

Feitos esses registros, ressalto o fato de o trabalhador exercer sua atividade conduzindo caminhão para o transporte de cargas em rodovias.

Ora, sabe-se que os índices de acidentes em rodovias vêm aumentando significativamente nos últimos anos, o que tem autorizado o reconhecimento de risco expressivo na atividade, capaz de acionar a cláusula objetiva da responsabilidade.

Obviamente, podem existir situações em que, mesmo em se cuidando de atividade empresarial gravada com risco diferenciado, a motivação dos protagonistas ou mesmo a forma como os eventos se sucederam pode levar à ruptura do nexo entre o acidente e a atividade empresarial, elidindo o dever de reparar.

São hipóteses, insista-se, em que o evento gerador do dano não guarda relação direta ou indireta com a atividade empresarial explorada, configurado fortuito externo, como se colhe de vários julgados do Superior Tribunal de Justiça, envolvendo o contrato de transporte, no qual o dever de proteção à integridade dos passageiros é parte dele integrante.

Nesses casos não há responsabilidade do transportador por danos vivenciados por passageiros em razão do arremesso de pedras contra ônibus ou trem (AgInt nos EREsp 1.325.225/SP, 2ª Seção, DJe de 19/09/2016; AgRg nos EDcl no AREsp 156.998/RJ, 3ª Turma, DJe de 04/09/2012; REsp 247.349/MG, 4ª Turma, DJe de 26/02/2009), também não respondendo por eventual razão de assalto a mão armada durante o transporte coletivo (REsp 435.865/RJ, 2ª Seção, DJ de 12/05/2003; AgRg no REsp 620.259/MG, 4ª Turma, DJe de 26/10/2009; AgRg no REsp 960.578/SP, 4ª Turma, DJ de 08/10/2007) ou mesmo em estações metroviárias (REsp 974.138/SP, 4ª Turma, DJe de 09/12/2016).

De igual modo não se cogita de responsabilidade, por configurado fortuito externo, a morte de passageiro colhido por "bala perdida" (AgRg no REsp 1.049.090/SP, 3ª Turma, DJe de 19/08/2014; REsp 613.402/SP, 4ª Turma, DJ de 04/10/2004), bem assim não havendo dever de reparar danos resultantes de explosão de bomba no interior de vagão de trem (AgRg nos EDcl nos EREsp 1.200.369/SP, 2ª Seção, DJe de 16/12/2013).

Claro exemplo nesse mesmo sentido, envolvendo a própria atividade de motorista de carreta, diz com o propósito pessoal de cometimento de suicídio, com o uso do veículo confiado ao trabalhador. Ainda, situações em que o empregado trafega acima dos limites de velocidade ou com o uso de medicamentos ou ainda após prévio consumo de álcool. Nesses casos, ainda que a atividade empresarial seja realmente de risco, não se poderia imputar a responsabilidade ao empregador, quando o infortúnio é deliberadamente causado pela própria vítima, que, agindo com dolo eventual ou culpa consciente, aceita o risco ou, mesmo ciente de sua potencialidade, acreditando em sua não ocorrência.

A culpa da vítima, enquanto situação capaz de afastar o dever de reparar, é assim definida por Sebastião Geraldo de Oliveira:

"Fica caracterizada a culpa exclusiva da vítima quando a causa única do acidente do trabalho tiver sido a sua conduta, sem qualquer ligação com o descumprimento das normas legais, contratuais, convencionais, regulamentares, técnicas ou do dever geral de cautela por parte do empregador. Se o empregado, por exemplo, numa atitude inconsequente, desliga o sensor de segurança automática de um equipamento perigoso e posteriormente sofre acidente por essa conduta, não há como atribuir culpa em qualquer grau ao empregador, pelo que não se pode falar em indenização. O 'causador' do acidente foi o próprio acidentado, daí falar-se em rompimento do nexo causal ou do nexo de imputação do fato ao empregador." (Indenizações por acidente de trabalho ou doença ocupacional, 12ª edição, JusPodium, 2021, p. 208).

No caso dos autos, a Corte Regional fixou premissas fáticas que permitem concluir que o acidente decorreu de fato da vítima.

Destacou que o Reclamante não foi exposto à jornada extenuante, porquanto ficou sem viajar pelo período de 4 dias que antecederam o evento, bem como que o acidente ocorreu aproximadamente três horas após o início do labor.

Ressaltou que o caminhão dirigido pelo Reclamante não apresentava qualquer defeito.

Anotou que o obreiro estava dirigindo havia apenas 40 minutos após o último intervalo, tendo ele fruído dos descansos devidos.

Acrescentou que os relatórios de rastreamento indicaram que em várias oportunidades o Autor ultrapassou a velocidade máxima permitida.

Tais premissas fáticas, insuscetíveis de reexame nesta instância extraordinária, ante o óbice da Súmula 126/TST, permitem a conclusão de que o acidente não decorreu do risco da atividade exercida, mas da atuação negligente e imprudente do trabalhador, o que afasta o nexo de causalidade e, por consequência, a responsabilidade objetiva do empregador.

Não se olvida de que a jurisprudência desta Corte tem mantido a responsabilidade objetiva e o dever de indenizar nas hipóteses em que, em sendo atividade de risco, o acidente decorre de eventual erro humano.

Nesse sentido, vale citar o seguinte precedente:

RECURSO DE EMBARGOS - ACIDENTE DE TRABALHO - INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - MOTORISTA DE CAMINHÃO CARRETEIRO - TRANSPORTE RODOVIÁRIO - RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO EMPREGADOR - EXPOSIÇÃO DO EMPREGADO A ATIVIDADE DE ALTO RISCO.

1. Na forma do art. 927, parágrafo único, do Código Civil, é possível a responsabilização objetiva - dispensada a culpa daquele a quem se imputa o evento lesivo - quando houver determinação legal nesse sentido e nos casos em que a atividade do causador do dano implicar, por sua natureza, risco para o direito de outrem.

2. Somente o dano decorrente do risco voluntariamente criado e assumido pelo empreendedor é passível de reparação. O empresário, na execução de suas atividades, cria um risco e expõe outrem a perigo de dano (risco criado), além de se beneficiar e tirar proveito financeiro do risco por ele próprio gerado, auferindo lucros (risco - proveito).

3. No caso, o empregado, motorista de caminhão carreteiro, sofreu acidente automobilístico e faleceu em decorrência do infortúnio.

4. Verifica-se que a reclamada submetia a vítima , motorista de caminhão rodoviário, ao desempenho de atividade de alto risco . Assumiu, assim, voluntariamente , o risco inerente ao negócio empresarial e passou a expor, diferenciadamente, a vida e a integridade física dos trabalhadores cuja força de trabalho contrata e dirige.

5 . Eventual erro humano do empregado está absolutamente inserido no risco assumido pela empresa. Ao auferir lucros, dirigir o empreendimento de risco e controlar a atividade laboral do empregado, a empresa internaliza todo o potencial ofensivo de sua atividade. Possível negligência ou imperícia do empregado na sua função de motorista não impede a responsabilização da empresa, visto que a culpa do empregado-motorista faz parte do risco da atividade de transporte rodoviário de cargas, assemelhando-se ao caso fortuito interno.

6 . Considerando o risco da atividade desenvolvida , o infortúnio com nexo de causalidade e o dano sofrido pelo empregado , imperiosa a responsabilização objetiva da reclamada e a condenação ao pagamento de danos materiais e morais.

Recurso de embargos conhecido e desprovido. (E-RR - 270-73.2012.5.15.0062; Orgão Judicante: Subseção I Especializada em Dissídios Individuais; Relator Ministro: Luiz Philippe Vieira de Mello Filho; DEJT: 23/10/2020).

Todavia, a hipótese presente apresenta contornos que o diferem do caso acima destacado.

No caso presente, além de as circunstâncias relativas ao bom estado de conservação do caminhão e dos longos períodos de descaso fruídos pelo obreiro, restou destacado que o trabalhador, em várias oportunidades, ultrapassou o limite de velocidade permitida, assumindo, por si só, risco desnecessário e estranho à atividade empresarial.

A só circunstância de se cuidar de atividade empresarial de risco não impõe, objetivamente, o dever de reparação em toda e qualquer circunstância, em eventos ligados ao exercício da atividade. O exercício da atividade de motorista é objeto de regulação legal (Lei 13.103/2015) e está cercada de exigências e cautelas legais, não se mostrando razoável -- salvo hipóteses específicas em que o empregador expõe o empregado a jornadas extenuantes, reduzindo sua capacidade funcional, ou não provê veículos em boas condições de trafegabilidade -- que todo e qualquer evento lesivo causado pelo empregado possa autorizar a sua própria reparação.

Acrescento que, nem mesmo nas atividades nucleares, em que a responsabilidade é objetiva (art. 6º da Lei 6.453/77), há possibilidade de imposição do dever de reparar nos casos em que provada a culpa exclusiva da vítima. Nessa mesma direção, os arts. 12, § 3º, e 14, § 3º, do CDC afastam as responsabilidades objetivas do fabricante, construtor, produtor ou fornecedor, nas situações em que revelada a culpa exclusiva do consumidor. Essa mesma exclusão da responsabilidade está presente nos casos de danos causados por animais, quando evidenciada a culpa exclusiva da vítima (CC, art. 936).

Sob outro prisma, cabe recordar que a hipótese dos autos não se enquadra como caso fortuito, na modalidade interna, com todas as vênias, pois a imperícia ou mesmo a negligência do condutor não encerra evento imprevisível ou inevitável, essenciais para o reconhecimento do caso fortuito. Com efeito, diante do amplo arsenal normativo que disciplina o exercício dessa importante função de motorista, os casos de acidentes causados pelos próprios motoristas, sem qualquer falha mecânica ou mesmo sem o concurso de terceiros, configuram, em realidade, típica transgressão contratual. A culpa exclusiva do motorista pelo acidente, em conduta imprudente ou negligente, nesse contexto, sequer pode ser considerada parte inerente aos riscos do negócio, antes traduzindo evento singular, suficiente para afastar a responsabilidade do empregador pelo infortúnio causado.

Além disso, o único aresto paradigma válido para o confronto de teses, traz a premissa de que " Diante dos riscos próprios da atividade econômica (art. 2º da CLT) e dos riscos especiais e potenciais decorrentes do exercício da atividade de motorista de caminhão desempenhada em empresa de transporte (art. 927, § único, do CC), objetiva é a responsabilidade da empresa pelo acidente que vitimou o empregado, a ensejar a manutenção do dever de indenizar os prejuízos causados reconhecida na origem. ".

É, portanto, inespecífico, pois apenas trata da responsabilidade objetiva da empresa por acidente causado a trabalhador nas mesmas circunstâncias do de cujos , sem consignar, contudo, a excludente da responsabilidade objetiva que, no caso, é a culpa exclusiva da vítima, motivo pelo qual incide o óbice da Súmula 296/TST

Decisão monocrática mantida com acréscimo de fundamentação.

NEGO PROVIMENTO ao agravo.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Quinta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, negar provimento ao agravo.

Brasília, 25 de maio de 2022.

Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)

DOUGLAS ALENCAR RODRIGUES

Ministro Relator