A C Ó R D Ã O

(1ª Turma)

GMWOC/vmn/af

RECURSO DE REVISTA. SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL CONCURSADO ADMITIDO SOB O REGIME DA CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO - CLT. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO.

Nos termos do art. 114, I, da Constituição da República, compete à Justiça do Trabalho processar e julgar ações oriundas das relações de trabalho (sentido amplo), abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Na hipótese, resultando inconteste a existência de vínculo jurídico trabalhista entre as partes, inequívoca é a competência da Justiça do Trabalho para julgar a reclamação trabalhista. Precedentes.

Recurso de revista conhecido e provido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR-904-23.2011.5.03.0132 , em que é Recorrente SANDRA DA SILVA HENRIQUES e Recorrido MUNICÍPIO DE SANTOS DUMONT .

O Tribunal Regional da 3ª Região, mediante o acórdão às fls. 148-151, acolheu a preliminar de incompetência ratione materiae da Justiça do Trabalho , determinando a remessa dos autos à Justiça Comum do Estado de Minas Gerais .

Inconformada, a reclamante interpõe recurso de revista às fls. 154-161, com amparo no art. 896, a e c , da CLT.

Admitido o recurso, mediante decisão às fls. 165-166, não foram apresentadas as contrarrazões ao recurso de revista.

O Ministério Público do Trabalho opinou no sentido do provimento do recurso.

É o relatório.

V O T O

1. CONHECIMENTO

Satisfeitos os pressupostos genéricos de admissibilidade recursal pertinentes à tempestividade (fls. 152 e 154) e à regularidade de representação processual (fl. 22), sendo dispensado o preparo, passa-se ao exame dos específicos do recurso de revista

SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL CONCURSADO ADMITIDO SOB O REGIME DA CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO - CLT. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO

O Tribunal Regional da 3ª Região, às fls. 148-151, acolheu a preliminar de incompetência ratione materiae da Justiça do Trabalho , arguida pelo reclamado, determinando a remessa dos autos à Justiça Comum do Estado de Minas Gerais adotou a seguinte fundamentação, verbis :

DA REJEIÇÃO DA PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA DESTA JUSTIÇA DO TRABALHO

O Município reclamado não se conforma com a rejeição da preliminar de incompetência absoluta desta Justiça Especializada, ao argumento de que o Excelso Supremo Tribunal Federal vem decidindo que esta Justiça é incompetente para julgar as ações que envolvam servidores e a administração pública direta, seja a relação mantida pelas partes regida pela CLT ou por estatuto próprio.

Para este Relator, a competência para exame e julgamento desta demanda, por se tratar de contratação de servidora municipal pelo regime da CLT , seria mesmo dessa Justiça do Trabalho, tal como decidido em primeiro grau.

Todavia, em casos como o dos autos, em que se julga ação entre servidor e a administração pública direta, esta E. Turma Recursal tem-se posicionado, por sua Douta Maioria, no sentido da incompetência desta Especializada, seja a relação celetista ou estatutária.

Com efeito, para a Maioria dos Julgadores desta Eg. Turma, qualquer espécie de controvérsia envolvendo o pessoal contratado por Ente Público, pouco importando a natureza do vínculo, se administrativo ou celetista, deve ser dirimida pela Justiça Comum e não pela Justiça do Trabalho.

De acordo com tal entendimento, ainda que o regime adotado pelo Município seja o celetista, a análise e o julgamento da presente demanda refoge à competência desta Justiça Especializada, devendo ser dirimida pela Justiça Comum, na medida em que a competência, no caso vertente, se estabelece em razão das partes envolvidas e não da matéria discutida no feito.

Segundo o entendimento majoritário desta Eg. Turma Julgadora, o Excelso Supremo Tribunal Federal, ao conceder liminar na ADIN 3.395-6, suspendeu toda e qualquer interpretação dada ao artigo 114, I, da Carta Maior que inclua, mesmo em face da Emenda Constitucional n. 45/2004, na competência desta Especializada, a apreciação de causas entre servidores e o Poder Público, de ordem estatuária, celetista ou jurídico-administrativa.

Não obstante, a mesma Corte julgou procedente a Reclamação Constitucional n. 6366, que buscava o reconhecimento da competência da Justiça Comum para processar e julgar ações relativas a contrato de natureza administrativa, firmado entre entes da administração pública e servidor público. Ao proferir tal decisão, a Ministra Relatora Cármem Lúcia referendou a cautelar deferida pelo Ministro Nelson Jobim na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 3395/DF, já mencionada.

Nesta linha de raciocínio, mesmo que o regime jurídico adotado pelo Município seja o celetista (o que ocorre no caso dos autos ), verificando se tratar de demanda envolvendo servidor público e ente da administração pública, para a d. maioria deste Colegiado Descentralizado, resta incompetente a Justiça do Trabalho para processamento e julgamento do feito .

Destarte, forte no art. 113, § 2º do CPC, impõe-se seja determinada a remessa dos autos à Justiça comum, porquanto a vexata quaestio por ela deve ser dirimida, por se tratar, na espécie, de competência em razão da pessoa e/ou das partes envolvidas na lide, e não da matéria controvertida.

Em face do exposto, ressalvado o entendimento deste Relator, dá-se provimento ao apelo, para declarar a incompetência absoluta da Justiça do Trabalho para apreciar e julgar o feito, declarando a nulidade da sentença e determinando a remessa dos autos à Justiça Comum (art. 113, §2º, do CPC), observadas as cautelas de praxe. (Grifos Apostos).

Nas razões do recurso de revista, sustenta a reclamante ser competente a Justiça do Trabalho para o julgamento da reclamação trabalhista, tendo em vista ter sido contratada mediante concurso público sob o regime da CLT. Indica ofensa aos arts. 7º, I, 102, I, a , e 114, I, da Constituição Federal, além de trazer arestos para o cotejo de teses.

Razão lhe assiste.

Com efeito, resta incontroverso que a reclamante é servidora pública concursada submetida ao regime da CLT, evidenciando, portanto, a natureza tipicamente celetista do vínculo jurídico entre a Autora e o Município. Registre-se que a hipótese dos autos não envolve a questão debatida na ADI nº 3.395-MC/DF, porquanto sequer há cogitar de contratação temporária.

Assim, não andou bem a Corte Regional ao declarar a incompetência da Justiça do Trabalho para julgar a causa - na qual não resta qualquer sombra de dúvida quanto à existência de liame trabalhista entre as partes processuais - o que poderia ensejar, em tese, conflito negativo de competência entre a Justiça do Estado de Minas Gerais e a Justiça do Trabalho.

Nos termos do art. 114, I, da Constituição da República, compete à Justiça do Trabalho processar e julgar as ações oriundas das relações de trabalho (sentido amplo), abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

Na hipótese vertente, resultando inconteste a existência de vínculo jurídico trabalhista entre as partes, inequívoca a competência da Justiça do Trabalho para julgar a reclamação trabalhista.

Nesse sentido, destacam-se os seguintes precedentes desta Corte Superior, em que figura como parte processual o município ora reclamado, verbis :

RECURSO DE REVISTA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DIRETA. SERVIDOR PÚBLICO CELETISTA. Registrado pela Corte de origem que o regime jurídico da reclamante é celetista, insere-se a demanda na competência material da Justiça do Trabalho. Recurso de revista conhecido e provido. (TST-RR-463-42.2011.5.03.0132, Relator Ministro Hugo Carlos Scheuermann, 1ª Turma, DEJT de 09/11/2012).

RECURSO DE REVISTA. SERVIDOR MUNICIPAL CELETISTA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. O Supremo Tribunal Federal, por certo, entende que, ainda que a pretensão deduzida na lide se refira ao reconhecimento de direitos trabalhista e a causa de pedir indique relação de emprego decorrente de suposta irregularidade na contratação, não se modifica a natureza jurídica de cunho estatutário ou jurídico-administrativo do vínculo estabelecido originalmente entre o trabalhador e o Poder Público, sendo incompetente a Justiça Trabalhista para decidir o feito. Ocorre que, na hipótese dos autos, a Reclamante é servidora municipal, contratada após aprovação em processo seletivo para exercer emprego público regido pela CLT. Dessa feita, não sendo a presente hipótese relação jurídica de cunho estatutário ou de caráter jurídico-administrativo similar àquelas discutidas e pacificadas pela Corte Suprema, entende-se incorreta a decisão que determina a remessa dos autos à Justiça Comum para apreciação do mérito. Recurso de Revista conhecido e provido. (TST-RR-903-38.2011.5.03.0132, Relatora Ministra Maria de Assis Calsing, 4ª Turma, DEJT de 07/12/2012).

RECURSO DE REVISTA. CONTRATAÇÃO DE SERVIDOR PELO REGIME CELETISTA. DEMANDA ENVOLVENDO RELAÇÃO DE TRABALHO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. O artigo 114, I, da Constituição Federal atribui competência à Justiça do Trabalho para processar e julgar demanda envolvendo pessoal contratado por ente público pelo regime da CLT, em que se discute relação de trabalho. Precedentes de Turmas. Tal competência não foi afastada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da ADI nº 3.395 e da RCL nº 6652. Naquelas decisões, apenas considerou que esta Justiça especializada não era competente para julgar questões envolvendo contratação de servidores pelo regime estatutário ou contrato de caráter jurídico-administrativo para atender necessidade temporária de excepcional interesse público, prevista no artigo 37, IX, da Constituição Federal. Recurso de revista conhecido e provido. (TST-RR-869-21.2011.5.03.0049, Relator Ministro Guilherme Augusto Caputo Bastos, 5ª Turma, DEJT de 07/12/2012).

RECURSO DE REVISTA. RECLAMANTE. JUSTIÇA DO TRABALHO. COMPETÊNCIA. CONTRATAÇÃO DE SERVIDOR SOB O REGIME CELETISTA. O caso dos autos é de servidor contratado sob o regime da CLT. Conforme entendimento firmado pela Suprema Corte, no exame do mérito da ADIn-MC nº 3395-6, a Justiça do Trabalho é incompetente para apreciar as causas instauradas entre o Poder Público e servidor que lhe seja vinculado por relação de natureza jurídico-estatutária, e também a lide que trata de vínculo de natureza jurídico-administrativa, a contratação para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público. Não é esse o caso dos autos, sobre vínculo de natureza jurídica contratual, quando a Administração Pública submete os contratados às normas da CLT. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento. (TST-RR-962-26.2011.5.03.0132, Relatora Ministra Kátia Magalhães Arruda, 6ª Turma, DEJT de 17/05/2013).

RECURSO DE REVISTA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. EMPREGADO PÚBLICO CELETISTA. Incontroverso no feito que o contrato de trabalho do reclamante sempre foi regido pelas normas celetistas. Não se trata, portanto, de relação jurídico-administrativa. Caracterizada a competência da Justiça do Trabalho para o julgamento do feito, nos exatos termos do artigo 114, I, da Constituição Federal. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento. (TST-RR-961-41.2011.5.03.0132, Relator Ministro Cláudio Mascarenhas Brandão, 7ª Turma, DEJT de 06/12/2013).

RECURSO DE REVISTA - COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO - ENTE PÚBLICO - REGIME CELETISTA. A Justiça do Trabalho é competente para processar e julgar controvérsia envolvendo pessoal contratado por Ente Público, submetido a regime celetista, nos termos do art. 114, I, da Constituição da República. Precedentes. Recurso de Revista conhecido e provido. (TST-RR-439-14.2011.5.03.0132, Relatora Juíza Convocada Maria Laura Franco Lima de Faria, 8ª Turma, DEJT de 29/06/2012).

Como se observa, o Tribunal Regional de origem dissentiu dessa orientação, violando, consequentemente, o art. 114, I, da Constituição Federal, por ser inequívoca a competência da Justiça do Trabalho para julgar reclamação trabalhista proposta por servidor público municipal vinculado ao empregador por meio de contrato de trabalho regido pela Consolidação das Leis do Trabalho.

Do exposto, CONHEÇO do recurso de revista, na forma da alínea c do art. 896 da CLT.

2. MÉRITO

SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL CONCURSADO ADMITIDO SOB O REGIME DA CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO - CLT. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO

No mérito, conhecido o recurso de revista por violação do art. 114, I, da Constituição Federal, DOU-LHE PROVIMENTO para, reformando o acórdão recorrido, declarar a competência da Justiça do Trabalho para julgar a reclamação trabalhista, determinando o retorno dos autos ao Tribunal Regional do Trabalho de origem para que prossiga no exame do recurso ordinário interposto pelo reclamado, conforme entender de direito.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer do recurso de revista, por violação do art. 114, I, da Constituição da República, e, no mérito, dar-lhe provimento para, reformando o acórdão recorrido, declarar a competência da Justiça do Trabalho para julgar a reclamação trabalhista, determinando o retorno dos autos ao Tribunal Regional do Trabalho de origem para que prossiga no exame do recurso ordinário interposto pelo reclamado, conforme entender de direito.

Brasília, 14 de maio de 2014.

Firmado por assinatura digital (Lei nº 11.419/2006)

Walmir Oliveira da Costa

Ministro Relator