A C Ó R D Ã O
3ª Turma
GMJRP/lbm/JRP/pr/mm
AGRAVO. RECURSO DE REVISTA.
QUANTUM INDENIZATÓRIO (R$ 66.843,00). PROPORCIONALIDADE. REDUÇÃO INDEVIDA. ACIDENTE DE TRABALHO. DANOS MORAL E ESTÉTICO. EMPREGADO AUXILIAR DE LABORATÓRIO QUE SOFREU QUEIMADURAS NO BRAÇO, ANTEBRAÇO E DEDOS DA MÃO DIREITA QUE RESULTOU EM AFASTAMENTO DO EMPREGO POR SEIS MESES E CICATRIZES.
Não merece provimento o agravo que não desconstitui os fundamentos da decisão monocrática pela qual se negou provimento ao recurso de revista, entendendo ser razoável e proporcional o quantum arbitrado a título de indenização por danos morais, à luz dos artigos 5º, inciso V, da CF e 944 da CLT . Agravo desprovido .
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo em Recurso de Revista n° TST-Ag-RR-10686-52.2020.5.15.0149 , em que é Agravante LUTEPEL INDUSTRIA E COMERCIO DE PAPEL LTDA e é Agravado JUCELINO RIBEIRO .
A agravante interpõe agravo, seq. 8, págs. 1/10, contra a decisão deste Relator, de seq. 6, págs. 1/9, por meio da qual o seu recurso de revista foi desprovido.
Aduz, em síntese, que a decisão monocrática merece ser reformada, porquanto preenchidos se encontram os requisitos legais para o regular processamento do recurso de revista .
Contraminuta apresentada em seq. 11, págs. 1/3.
É o relatório.
V O T O
Mediante decisão monocrática o recurso de revista foi desprovido.
A decisão agravada foi amparada nos seguintes fundamentos:
PROCESSO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 13.015/2014 E DA LEI Nº 13.467/2017
ACIDENTE DE TRABALHO. DANOS MORAL E ESTÉTICO. EMPREGADO AUXILIAR DE LABORATÓRIO QUE SOFREU QUEIMADURAS NO BRAÇO, ANTEBRAÇO E DEDOS DA MÃO DIREITA QUE RESULTOU EM AFASTAMENTO DO EMPREGO POR SEIS MESES E CICATRIZES. QUANTUM INDENIZATÓRIO. PROPORCIONALIDADE.
O Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, por meio do acórdão de págs. 403-411 deu provimento ao recurso ordinário do reclamante quanto ao tema "ACIDENTE DE TRABALHO. DANO MORAL E ESTÉTICO. QUANTUM INDENIZATÓRIO. PROPORCIONALIDADE".
Recurso de revista interposto pela reclamada às págs. 439-448.
O recurso de revista foi admitido às págs. 453-454.
Apresentadas as contrarrazões às págs. 457-461.
Desnecessária a manifestação do Ministério Público do Trabalho, nos termos do artigo 95 do Regimento Interno do Tribunal Superior do Trabalho.
É o relatório.
ACIDENTE DE TRABALHO. DANO MORAL. QUANTUM INDENIZATÓRIO. PROPORCIONALIDADE.
Eis o teor da decisão regional:
"Mérito
I – Acidente de Trabalho. Culpa Exclusiva do Empregado
Busca a reclamada a reforma da r. sentença, insistindo que o reclamante foi o único responsável pelo acidente que sofreu.
Alega a reclamada, em síntese, que o reclamante era experiente na função, com cerca de 12 anos de serviço no equipamento e 23 anos na produção; que ao contrário do afirmado pela sentença, o maquinário em que ocorreu o acidente possui guarda-corpo, impedindo que o trabalhador se debruce sobre o equipamento; que o reclamante não seguiu as instruções passadas nos treinamentos.
Contudo, a reclamada não possui razão.
Pois bem.
Incontroverso nos autos a ocorrência de acidente de trabalho típico em 22/01/2019, por volta das 5h, no qual o reclamante sofreu queimaduras de 2º grau em membro superior direito, à vista dos documentos acostados aos autos pela defesa (CAT de fl. 221 e RAAT de fl. 222).
Conforme relato do reclamante ao perito médico: 'exercia normalmente sua atividade passando a ponta do papel entre o cilindro secador e o cilindro acabador, teve seu braço direito sugado pelo cilindro acabador o qual tem uma temperatura média de 115 graus ocasionando queimaduras de 2º grau no referido braço. salientou que não houve a devida proteção de segurança para evitar o acidente' (fl. 295).
O argumento de que o acidente ocorreu 'por culpa exclusiva da vítima' constitui, em si, uma ofensa moral ao reclamante, pois sugere que seu comportamento deve ser avaliado como o de uma máquina e não como o de um ser humano. Ademais, se o erro humano do reclamante ocorreu, como sustenta a reclamada, não se pode conceber que o ambiente de trabalho seja apto a 'produzir' mutilações como forma de 'punição' para os seres humanos que agirem como tais, já que, como se sabe, 'errar é humano'.
Ademais, se o erro humano do reclamante ocorreu, como sustenta o reclamado, isso não exclui a responsabilidade da reclamada, pois não se pode conceber que o ambiente de trabalho seja propenso a 'produzir' mutilações e outras lesões como forma de 'punição' para os seres humanos que agirem como tais, já que, como se sabe, 'errar é humano'.
O meio ambiente do trabalho deve ser isento de riscos e dizer que o acidente ocorreu porque o reclamante agiu de forma indevida é assumir que havia o risco, pois se este não existisse a eventual falha do empregado não geraria o evento danoso.
Se decorrente de conduta incorreta, ou não, o fato é que o trabalho do reclamante oferecia notório risco, tanto é que ele sofreu lesão grave em razão do acidente, com afastamento previdenciário de 07/02/2019 s 31/07/2019 (fl. 230).
Cumpria, de fato, à reclamada zelar pelo correto procedimento no cumprimento das funções atribuídas, na medida em que o risco de acidentes de trabalho era inerente à modalidade dos serviços prestados, conforme expressamente consta dos ASOs de fls. 92/96, em que se atesta, entre outros, o risco de acidentes por 'contato com superfícies quentes ou com fogo'. Ou seja, trata-se da observância de um princípio geral de direito, qual seja, o do respeito à pessoa humana, consubstanciado no artigo 1º, inciso III, da CF/88.
Mesmo que fosse outro o raciocínio aplicado, o ônus de comprovar que o acidente ocorreu por culpa exclusiva do reclamante era da reclamada, e desse encargo ela não se desincumbiu.
Com efeito, a testemunha do reclamante, embora não tenha presenciado o acidente, declarou 'que a empresa profissional cursos sobre segurança com base nas normas regulamentadas, mas não treinamento da operação dos equipamentos, que soube que o acidente aconteceu porque o reclamante estava operando o equipamento sozinho sem o ajudante; que uma operação exige a presença de um ajudante; que soube disso por comentários já que não presenciou as informações relativas ao acidente; que conhece o equipamento operado pelo reclamante no dia do acidente; que já opera tal equipamento; que o equipamento não tem proteção; que operou a máquina em treinamento no ano de 2018 por um mês e não sabe se o equipamento estava no mesmo estado de quando nela treinou em 2018' (fls. 332/333) A 1ª testemunha da reclamada declarou: 'que o equipamento exige uma abertura para a passagem do papel, contudo tal abertura não impede que além do papel também possa ser inserido a mão; que o Sr. Paulo Cruz também teve a mão presa no mesmo equipamento e no mesmo lugar que não se recorda se o acidente com o Sr. Paulo Cruz foi anterior ao reclamante; que depois do acidente a empresa colocou um equipamento para impedir que acidentes iguais ao do reclamante não ocorressem; que depois de tal providência nenhum outro acidente ocorrido' (fl. 333).
Já a 2ª testemunha da reclamada, na qualidade de técnico de segurança, era justamente o profissional que deveria zelar pela segurança das atividades da empresa e também foi responsável pela investigação do acidente, é razoável que ele defenda a tese do seu empregador, de culpa do acidentado. Mas mesmo ele reconheceu que 'no dia do acidente o equipamento não tinha o dispositivo que impedisse o trabalhador de colocar a mão entre os rolos; que posteriormente foi feito uma adequação do equipamento com uma colocação de tal dispositivo' (fl.334).
Logo, ainda que o equipamento fosse dotado de guarda-corpo, este não era suficiente para evitar acidentes, como se viu e, tanto é verdade, que após os acidentes com o reclamante e com outro empregado, a própria reclamada cuidou de tomar medidas mais eficazes para redução do risco de novos acidentes.
Importante salientar ainda, que o perito médico, em resposta aos quesitos do juízo que: 'A reclamada não cumpria com as normas de segurança para evitar o infortúnio' (fl. 298).
E como bem fundamentado na sentença de origem:
'Ora, as provas produzidas são uníssonas, no sentido de que antes do acidente, o equipamento não continha proteção adequada, que impedisse o contato acidental com a parte superaquecida, providência esta que foi adotada pelo empregador tão somente após o acidente e que teria bastado para evitar o infortúnio.
Diante disso, não há cabimento o empregador alegar o ato inseguro do empregado, se não adotou medidas de segurança básicas, deixando o equipamento desprotegido e passível de ocasionar acidentes, tal como o que vitimou o trabalhador.
Nesse sentido, escreve Soares, Eva Bessa e Filho, Wagner Ragi Curi que 'estudar acidentes de trabalho considerando apenas que alguém errou e, normalmente, apontando o acidentado como culpado não faz sentido e impossibilita a tomada de medidas eficazes para prevenir novas ocorrências de acidentes. É imprescindível que consiga identificar quais as situações que estão favorecendo as condutas inseguras' (in 'Olhares sobre a prevenção dos acidentes de trabalho', disponível em:https://seer.ufrgs.br/ProdutoProducao/article/view/35821/40482. Data de acesso: 30/10/2019).
Nesta esteira, não se pode imputar ao reclamante a culpa pelo evento.
Dessarte, reputo sobejamente evidenciado, nos autos, a ausência de adoção, pelo empregador - ao menos até a data da ocorrência do acidente - de política de prevenção efetiva contra os possíveis acidentes de trabalho ou de preservação da segurança, higiene e saúde de seus empregados, cumprindo as obrigações previstas no artigo 157 da CLT, não se desincumbindo, pois, de seu encargo processual, o que caracteriza a culpa patronal pelo acidente' (fls. 353/354).
Ora, a responsabilidade, na perspectiva do direito social, é completamente diversa da responsabilidade na esfera civil. A sua incidência, ademais, não decorre do dano, mas do simples fato de se expor alguém ao risco. A responsabilidade, na ótica do direito social, impõe obrigações que determinam o modo de agir perante o outro, para promover valores humanísticos e, no caso das condições de trabalho, no contexto da produção hierarquizada, sobretudo para evitar a ocorrência de dano à personalidade do trabalhador. Esta responsabilidade, portanto, nada tem a ver com a visão liberal baseada na culpa, pois, afinal, ninguém pode ser considerado culpado daquilo que sequer ocorreu.
Assim, considerando as circunstâncias em que se deu o acidente, é inafastável a responsabilização da reclamada pelos evidentes danos extrapatrimoniais e materiais sofridos pelo reclamante, devendo ser mantida a r. sentença de primeiro grau.
Análise Conjunta
II - Indenização por Danos Morais e Estéticos
A r. sentença arbitrou a indenização por danos morais em oito vezes e os estéticos em quatro vezes, ambos calculados sobre o atual salário do reclamante, conforme art. 223-G, § 1º, III e II, da CLT).
Recorre a reclamada, buscando a 'redução justa' da indenização, com base 'no já suscitado e comprovado tratamento condigno, humanista e respeitoso disponibilizado ao Recorrido' (fl. 380), afirmando que o laudo pericial médico atestou a aptidão física e laboral integral do reclamante, com ausência de deformações prejudiciais. Sugere a fixação no patamar mínimo conforme disposto no art. 223, §1º, I, da CLT.
O reclamante também recorre, pretendendo a majoração da indenização por danos morais e estéticos para 'valor não inferior a 25 vezes o último salário' (fl. 371).
O perito médico, no exame físico, constatou que o reclamante, a partir do acidente-tipo, sofreu queimaduras: 'BRAÇO: Face medial; ANTEBRAÇO: Face ventral; Antebraço direito: Dois terços distais da face dorsolateral; Falange distal mão Esquerda de 2º dedo; Polegar: Lado palma' (fl. 296); que tais lesões: 'afeta as camadas intermédias da pele e, por isso, além da vermelhidão e da dor, podem surgir outros sintomas como bolhas ou inchaço do local' (fl. 296); que permaneceu afastado de 21/01/20198 a 23/02/2019 e percebeu benefício previdenciário de fevereiro a julho de 2019; que em função do tratamento adequado evoluiu bem sem consequência incapacitante.
No que pertine ao dano estético, a análise do perito foi:
'É visível e evidente o dano estético que merece um destaque para majorá-lo, para tanto adotamos o método AIPE {Análise de Impressão e do Impacto do Prejuízo Estético} traduzido e adaptado do original em espanhol para uso no Brasil (COBO PLANA 2010) para valorizá-lo.
Veja:
1- A lesão se vê claramente
2- Há a tendência de fixarmos o olhar na lesão
3- Não se costuma de lembrar do dano estético.
Aplicando estes dados na tabela AIPE, o prejuízo estético seria 3 da escala 7 {3/7}; Mas não deve considerar esse tanto haja vista a lesão é passível de ocultá-la por camisa de manga comprida levando o prejuízo para a escala {2/7} (fl. 297)'.
Os direitos de personalidade, cumpre lembrar, são uma conquista da humanidade, estando ligados, portanto, aos seres humanos enquanto entidade. Em outras palavras, quando lidamos com os direitos de personalidade é da própria condição humana que estamos tratando. Isto significa dizer que não se pode falar dos direitos de personalidade de uma pessoa especificamente. Assim, quando se vai verificar se um ato determinado constituiu, ou não, uma agressão aos direitos de personalidade, deve-se ter em mente o ser humano como uma entidade global, idealmente considerado.
A nossa capacidade de equacionar, em concreto, as pertinências temáticas das agressões aos direitos de personalidade vai determinar o nível da consciência em torno da nossa própria condição de seres humanos e, ao mesmo tempo, de sermos humanos. Não é propriamente do outro que estaremos cuidando, mas de nós mesmos e, por consequência, das relações humanas e da sociedade, enfim. Devemos, assim, projetar no outro a nossa própria existência. O ensinamento bíblico de que se deve 'amar ao próximo como a si mesmo' ganha sentido preciso em se tratando da efetivação dos direitos de personalidade, que assim pode ser enunciado: 'preserve a dignidade alheia como preservarias a tua'.
Essa temática é tanto mais importante quanto se avolumam os elementos externos ameaçadores da dignidade humana: a busca do lucro; a concorrência; a dependência econômica; a fragilização de valores morais, que tendem a ser enunciados como valores inevitáveis e até necessários na sociedade capitalista.
E aí o problema está em que o próprio sentido de dignidade humana vai se perdendo e as pessoas tendem a ceder no que se refere a si mesmos quanto à defesa de alguns valores da condição humana e buscam impor ao outro a mesma concessão.
Mas, de fato, não pode haver fragilização do raciocínio, em nenhum aspecto, no que se refere à essencialidade dos direitos de personalidade, pois o que está em jogo, repita-se, não é a eficiência econômica, mas a preservação e sobreelevação da condição humana. De nada se poderá ter orgulho se como efeito do sucesso econômico destruirmos os valores essenciais da condição humana.
É neste sentido, para que as imperfeições subjetivas não impeçam a evolução objetiva da condição humana, que os direitos de personalidade se apresentam como irrenunciáveis.
Assim, deve chamar a atenção, de forma extremamente negativa, o ato de não se fazer concessões quanto a si ao mesmo tempo em que se aponta para a normalidade das agressões aos direitos de personalidade de outra pessoa.
Nas relações de trabalho esse tema ganha contornos até dramáticos, na medida em que alguns fatores externos ameaçadores dos direitos de personalidade tendem a se considerar legítimos em razão do elemento configurador da relação de emprego que é a subordinação. Aliás, é a própria doutrina trabalhista, apoiada em artigo expresso na CLT (art. 474), que professa a ideia de que a relação de emprego é uma relação de poder, atribuindo ao empregador até mesmo um poder disciplinador frente à conduta do empregado.
Como explicita Antônio Lamarca, a ideia de que existe um poder disciplinar do empregador sobre o empregado gerou o fetiche da existência de uma supremacia humana do empregador sobre o empregado.
Considerando os termos da Constituição atual, baseada na dignidade humana e nos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, não se pode conceber que em uma relação jurídica, com base contratual, uma das partes detenha poder disciplinar sobre a outra.
Só se pode admitir, juridicamente, a existência de um poder diretivo, cujos limites são dados pelo efetivo interesse produtivo e pelos direitos fundamentais do empregado, que não se anulam em razão da integração do trabalhador a uma relação de emprego.
A temática dos direitos de personalidade é pertinente aos seres humanos enquanto entidade e, neste aspecto, devem ser abstraídas as posições sociais que as pessoas ocupam na sociedade. Quando se avaliam os direitos de personalidade do empregado de fato não se avaliam os direitos de personalidade do empregado propriamente dito, mas do ser humano que, por acaso, ocupa na sociedade a posição jurídica de empregado. Em palavras mais claras, uma pessoa não perde a sua condição humana quando se torna um empregado e, portanto, a análise no caso concreto deve refletir toda a temática dos direitos humanos, que atinge a todo e qualquer cidadão.
Assim, devem valer para o empregado os mesmos pressupostos jurídicos pertinentes à efetivação dos direitos de personalidade. Esse é o pressuposto teórico necessário: o de que a abordagem acerca dos direitos de personalidade liga os seres humanos a si mesmos enquanto entidade cultural e histórica, devendo-se, portanto, avaliar os efeitos na perspectiva da preservação e elevação constante do atributo da dignidade humana.
A situação verificada nos autos se encaixa plenamente na temática supra, sendo inafastável o deferimento da indenização pleiteada pelo reclamante.
Cumpre salientar que o equívoco cometido sobre o tema 'dano moral' situa-se na própria nomenclatura utilizada.
Com efeito, fala-se em 'dano moral' para se referir às agressões aos direitos de personalidade que refletem um dano à pessoa, que tanto pode ser de natureza moral quanto física, intelectual ou mesmo social. Adotando a limitada denominação, dano moral, corre-se o risco de entender que quando o fato não atinge a integridade moral do indivíduo não se teria uma hipótese típica a ensejar uma indenização. É por este motivo que alguns juristas, como o Dr. Paulo Eduardo Vieira de Oliveira, preferem a expressão dano pessoal, para designar esse fenômeno jurídico, justamente para abranger todas as hipóteses de dano ao indivíduo, seguindo classificação feita por Limongi França: integridade física, no qual se inclui o aspecto puramente estético, integridade intelectual; e, integridade moral, as quais o autor supramencionado acrescenta a integridade social (OLIVEIRA, Paulo Eduardo Vieira de. O dano pessoal no direito do trabalho. São Paulo: LTr, 2002).
Sob essa perspectiva, as circunstâncias verificadas nos autos constituem causa suficiente para a reparação, caracterizando-se a violação a direitos de personalidade da reclamante. Trata-se de dano especificamente moral ou pessoal, cuja repercussão toca no sentir da vítima do ato ilícito, sendo certa e necessária a reparação do dano perpetrado.
O reclamante, enquanto trabalhava em proveito da reclamada, sofreu acidente de trabalho (queimadura de 2º grau no braço, antebraço, dedo e polegar) e, embora tenha recuperado sua capacidade laborativa, submeteu-se a tratamento médico, permaneceu afastado do trabalho por seis meses e ainda possui cicatrizes decorrentes do acidente.
Assim sendo, entendo que a condenação da reclamada, pelos danos morais e estéticos ao pagamento de R$ 66.843,00, correspondentes a 25 vezes o salário do reclamante quando do ajuizamento da presente ação, conforme pretendido pelo reclamante, é mais adequada do que aquela fixada em primeiro grau (12 vezes o salário), pois leva em consideração a dimensão do dano e sua projeção no patrimônio ideal do empregado, bem como as condições socioeconômicas das partes.
Registra-se ser inaplicável a tarifação prevista no art. 223-G, § 1º da CLT, já que referida tarifação encontra óbice na Constituição Federal (art. 5º, incisos V e X), vez que afasta a reparação integral ao ofendido. Ressalto que o Supremo Tribunal Federal já declarou inconstitucional a tarifação de danos morais prevista na Lei n.º 5250/67 (Lei de Imprensa) quando do julgamento da ADPF 130.
Por todo o exposto, provejo o recurso do reclamante e nego provimento ao recurso da reclamada" (págs. 403-411, grifou-se).
A reclamada, em seu recurso de revista, argumenta que o valor da indenização por dano moral arbitrado pelo Regional, em razão de acidente de trabalho sofrido pelo reclamante, é desproporcional à extensão do dano, em afronta ao artigo 223-G, § 1º, incisos II e III, da CLT.
Ao exame.
No caso, discute-se a proporcionalidade do quantum indenizatório arbitrado pelo Regional, a título de danos moral e estético, decorrente de acidente de trabalho sofrido pelo reclamante.
Segundo o Regional, o reclamante, no exercício da função de auxiliar de laboratório, ao manusear cilindros secador e acabador de alta temperatura, teve seu braço direito sugado, que resultou em queimaduras.
Nos termos do acórdão recorrido, as queimaduras no braço, antebraço, e dedos da mão direita demandou o afastamento do autor do emprego por seis meses, e deixou algumas cicatrize. Por outro lado, também ficou consignado que o acidente não resultou em incapacidade laborativa, tendo o reclamante sido considerado apto ao trabalho após a cessão do afastamento previdenciário.
O Tribunal a quo considerou que o quantum indenizatório arbitrado pelo Juízo de origem a título de danos morais e estéticos, no valor de 8 (oito) vezes e 4 (quatro) vezes a última remuneração do reclamante, respectivamente, é desprorpocional à extensão do dano.
Nesse contexto, a Corte regional majorou o valor da indenização por danos morais e estéticos, de 12 (vezes) a última remuneração do reclamante, fixado na sentença, para 25 (vinte e cinco) vezes, totalizando R$ 70.000,00 (setenta mil reais), com fundamento no artigo 5º, incisos V e X, da Constituição da República, além de registrar a inaplicabilidade da tarifação da condenação indenizatória disciplinada no artigo 223-G, §1º, da CLT.
Ressalta-se que a condenação indenizatória por danos morais e estéticos majorada pelo Regional fundamentou-se na gravidade do dano, o grau de culpa do empregador, e a extensão do dano suportado pelo empregado, assim como a necessidade de adequação entre a necessidade de reparar o infortúnio ao seu direito da personalidade, bem como o caráter pedagógico-punitivo da reprimenda, sem que isso configure enriquecimento sem causa.
No tocante ao quantum indenizatório, em que pese não existam no ordenamento jurídico critérios objetivos para a fixação da quantia devida a título de dano moral, cabe ao julgador arbitrar o montante indenizatório com base na própria moldura fática e probatória constante dos autos, o que foi observado no caso dos autos.
Constata-se, portanto, que a pretensão recursal da reclamada de redução do quantum indenizatório não tem o menor sentido técnico e jurídico, já que, o rearbitramento da condenação, correspondente a vinte e cinco vezes o valor salarial mensal percebido pelo reclamante, revela-se razoável, tendo em vista que se refere tanto à reparação, cumulativa, por dano moral, como por dano estético, em consonância com os artigos 5º, inciso V, da Constituição da República e 944, da CLT.
Ademais, não se verifica violação do artigo 223-G, § 1º, inciso III, da CLT, (cuja inconstitucionalidade, é importante ressalvar, não foi arguída pelo reclamante ao longo do presente feito), já que o valor arbitrado mostra-se rigorosamente compatível com o critério estabelecido no inciso III do parágrafo 1º do artigo 223-G da CLT, sendo, pois, razoável e proporcional.
Dessa forma, estando a decisão regional em conformidade com a jurisprudência consolidada desta Corte, nego provimento ao recurso de revista, com fundamento no artigo 932, inciso IV, alínea "a", do CPC/2015 c/c o artigo 251, inciso II, do Regimento Interno do Tribunal Superior do Trabalho (seq. 6, págs. 1/9) .
No agravo, a reclamada reitera a alegação de violação ao art. 223-G, §1º, incisos I e IV, da CLT, aduzindo que " o reajuste indenizatório no segundo grau de jurisdição resultou de uma recusa à aplicação da Lei Federal incidente na espécie, cumulada com a reavaliação sob critérios subjetivos e desconexos do texto legal aplicável" (seq. 6, pág. 9).
No caso, não merece provimento o agravo, haja vista que os argumentos apresentados não desconstituem os fundamentos da decisão monocrática pela qual se negou provimento ao recurso de revista, mantendo o quantum arbitrado a título de indenização por danos morais e estéticos (R$ 66.843,00), o que corresponde a 25 (vinte e cinco) vezes a última remuneração do reclamante.
Registrou este Relator que "a condenação indenizatória por danos morais e estéticos majorada pelo Regional fundamentou-se na gravidade do dano, o grau de culpa do empregador, e a extensão do dano suportado pelo empregado, assim como a necessidade de adequação entre a necessidade de reparar o infortúnio ao seu direito da personalidade, bem como o caráter pedagógico-punitivo da reprimenda, sem que isso configure enriquecimento sem causa " (seq. , pág. 9).
Consignou, ainda, que "a pretensão recursal da reclamada de redução do quantum indenizatório não tem o menor sentido técnico e jurídico, já que, o rearbitramento da condenação, correspondente a vinte e cinco vezes o valor salarial mensal percebido pelo reclamante, revela-se razoável, tendo em vista que se refere tanto à reparação, cumulativa, por dano moral, como por dano estético, em consonância com os artigos 5º, inciso V, da Constituição da República e 944, da CLT" (seq. , pág. 9) .
Quanto à alegada violação ao art. 223-G, §1º, inciso III, da CLT, concluiu que não houve ofensa aos seus termos, uma vez que o valor arbitrado pelo TRT mostra-se rigorosamente compatível com o critério estabelecido no referido preceito de lei, sendo, pois, razoável e proporcional.
Havendo, na decisão monocrática, as razões de decidir deste Relator, tem-se por atendida a exigência da prestação jurisdicional, ainda que o resultado do julgamento seja contrário ao interesse da parte.
Assim, nego provimento ao agravo.
ISTO POSTO
ACORDAM os Ministros da Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, negar provimento ao agravo.
Brasília, 11 de outubro de 2023.
Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)
JOSÉ ROBERTO FREIRE PIMENTA
Ministro Relator