A C Ó R D Ã O

2ª Turma

GMJRP/yos/pr/ac

RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DO CPC/2015 E DA IN Nº 40/2016 DO TST.

MOTORISTA DE CARGAS. EMPRESA QUE REPASSA INFORMAÇÕES ORIUNDAS DE BANCO DE DADOS DE DOMÍNIO PÚBLICO. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. ATO ILÍCITO CONFIGURADO.

Trata-se de ação de indenização por danos morais decorrentes do impedimento do demandante de realizar o trabalho de carregamento de mercadorias, em razão de informações prestadas e compartilhadas pelas rés advindas de cadastros informativos sobre a idoneidade de motoristas a serem contratados para transporte de cargas. O Regional consignou que o fato de as ora agravadas prestarem e compartilharem informações de domínio público às empresas que contratavam motoristas não seria suficiente para a condenação em danos morais, notadamente pela ausência da prática de ato ilícito. Ao contrário do decidido pela Corte de origem, observa-se que a conduta das reclamadas está consubstanciada na forma discriminatória com que procederam, pois visa à inibição da prestação de serviços dos motoristas que figurem em suas listas cadastrais. A prática da conduta discriminatória em apreço importa em ofensa a princípios de ordem constitucional, tais como o da dignidade da pessoa humana, do valor social do trabalho, da isonomia e da não discriminação. Esclarece-se que o dano moral de ordem íntima prescinde de prova da sua ocorrência em virtude de ele consistir em ofensa a valores humanos, bastando a demonstração do ato ilícito ou antijurídico, em função do qual a parte afirma tê-lo sofrido, por ser in re ipsa , ou seja, decorre do próprio evento danoso, não havendo falar em demonstração do dano, pois, nesse caso, ele se situa no psicológico do lesado, em que é impossível se extrair uma prova material (precedentes) .

Recurso de revista conhecido e provido .

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR-83-60.2015.5.17.0141 , em que é Recorrente FABIANO PEREIRA e Recorrido BRASIL RISK GERENCIAMENTO DE RISCOS S/S LTDA. - EPP , GPS LOGÍSTICA E GERENCIAMENTO DE RISCOS S.A. , BUONNY PROJETOS E SERVIÇOS DE RISCOS SECURITÁRIOS LTDA. , GV GESTÃO DE RISCO LTDA. e KOMANDO GERENCIAMENTO DE RISCOS LTDA.

O agravo de instrumento interposto pelo reclamante foi provido em sessão realizada em 21/10/2020 para determinar o processamento do recurso de revista.

É o relatório.

V O T O

AGRAVO DE INSTRUMENTO

Nas razões de agravo de instrumento, o reclamante insiste na admissibilidade do seu recurso de revista, ao argumento de que foi demonstrado o preenchimento dos requisitos do artigo 896 da CLT.

A decisão agravada foi assim fundamentada :

"CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES

1. O presente recurso foi apresentado na vigência da Lei 13.467/2017. Vale registrar que, nos termos do art. 896-A, 81º e incisos da CLT, incumbe ao Tribunal Superior do Trabalho o exame da transcendência do recurso de revista.

2. No Id 5Sadf37e, a C. 2º Turma do TST deu provimento a recurso de revista interposto pelo reclamante (Id c472795), afastando a declaração de incompetência da Justiça do Trabalho e determinando o retorno dos autos a este Regional para proceder ao julgamento dos recursos ordinários interpostos pelas rés, como entendesse de direito.

Em atendimento à referida decisão, a C. 2º Turma deste Tribunal Regional proferiu o acórdão de Id 7073c3c.

Inconformado, o reclamante interpôs o recurso de revista de Id 78cel5d, que ora se aprecia.

PRESSUPOSTOS EXTRÍNSECOS

Tempestivo o recurso (ciência da decisão em 13/02/2020 - fl(s)./Id ; petição recursal apresentada em 28/02/2020 - fl(s).d 78cel5d), tendo em vista o teor do ATO PRESI SECOR nº 47/2019 e do ATO PRESI SECOR nº 48/2019.

Regular a representação processual - fl(s.)/Id a209712.

A parte recorrente está isenta de preparo, tendo em vista a concessão da assistência judiciária (1040097).

PRESSUPOSTOS INTRÍNSECOS

Responsabilidade Civil do Empregador / Indenização por Dano Moral .

Alegação(ões):

- violação aos artigos 1º, III, IV, 3º, IV, 5º, X, da CF.

- violação ao artigo 1º da Lei 9.029/95; 1º da Convenção 111 da OTT.

- divergência jurisprudencial.

Insurge-se o reclamante contra o acórdão, no tocante à indenização por danos morais decorrentes da recusa de emprego em razão de informações negativas prestadas pelas recorridas.

A alegação de divergência jurisprudencial não viabiliza o recurso. De acordo com o artigo 896, § 8º, da CLT, incluído pela Lei 13.015/2014, a parte que recorre deve mencionar "... as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os casos confrontados". Não tendo a parte recorrente observado o que determina o dispositivo legal, é inviável o processamento do recurso de revista.

CONCLUSÃO

DENEGO seguimento ao recurso de revista." ( págs. 1.168 e 1.169, destacou-se)

Na minuta de agravo de instrumento, o reclamante insurge-se contra o despacho denegatório do seguimento do seu recurso de revista.

Destaca-se que as condições incluídas pela Lei nº 13.015/2014 foram observadas pelo reclamante, motivo pelo qual se passa à análise do mérito do recurso de revista denegado, nos termos da Orientação Jurisprudencial nº 282 da SbDI-1 deste Tribunal .

Requer a condenação das agravadas ao pagamento de indenização por danos morais decorrentes do impedimento da realização de trabalho de transportes de mercadorias.

Alega que " a conduta de realizar pesquisa para repassar informações referentes aos motoristas consultados, a fim de instruir propostas de seguro por ele intermediadas entre as seguradoras e as transportadoras é considerada irregular, visto que viola o direito à privacidade e ao livre exercício da atividade profissional " (pág. 1.185), sendo que " os motoristas possuíam restrições no seu cadastro junto a empresa Agravada - GPS LOGÍSTICA E GERENCIAMENTO DE RISCOS S.A. e foram impedidos de trabalhar " (pág. 1.188).

Indica violação dos artigos 1º, inciso III, e 5º, inciso X, da Constituição Federal e colaciona arestos para o cotejo de teses.

Com aparente razão.

Quanto à indenização por dano moral, assim se manifestou o Regional:

"2.2.1 DANO MORAL. RESTRIÇÃO AO TRABALHO (análise em conjunto com os apelos das lª e 4ª reclamadas)

Adoto o relatório do Desembargador Relator, verbis:

O reclamante relatou na exordial que foi admitido pela empresa Megalog Logística e Transporte LTDA aos 13/11/2009 para exercer a função de motorista, sendo demitido sem justa causa aos 22/05/2012. Relatou que, durante o vínculo empregatício, sofreu assalto no Estado do Rio de Janeiro e chegou a ser preso como suspeito, tendo o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro requerido a expedição de Alvará de Soltura porque os elementos investigativos contidos nos autos do inquérito não seriam suficientes a embasar a necessária justa causa para deflagração da ação penal.

Ato contínuo, disse que, após sua demissão da empresa, não conseguiu novo emprego devido às restrições feitas pelas seguradoras aos potenciais empregadores. Esclareceu que após diversas recusas chegou a entrar em contato com a quarta reclamada, Buonny, oportunidade na qual lhe foi dito que continha no banco de dados das empresas informação de que o demandante estaria respondendo a um processo criminal por roubo de carga.

Exposta assim a causa de pedir, após relatar diversas tentativas de admissão em empregos e recusas injustificadas de última hora por parte dos empregadores, pleiteou a condenação das rés ao pagamento de indenização por dano moral diante da inviabilidade do exercício do seu direito ao trabalho.

A primeira reclamada, após suscitar preliminar de incompetência absoluta, esclareceu que é empresa de gerenciamento de risco, cujo serviço seria manter um banco de dados acerca dos motoristas cadastros para fornecer informações às empresas interessadas na contratação. Alega que o serviço prestado se revela de grande utilidade, pois visa cumprir condições do seguro de responsabilidade civil contratado pelas empresas de transportes, não se confundindo sua condição de gerenciadora de riscos com a de seguradora.

Em contestação, a segunda reclamada (BRASIL RISK) se defendeu ao argumento de que é empresa gerenciadora de risco, não possuindo o poder de autorização para a contratação de seguros. Nesse sentido, afirmou que as seleções e contratações dos motoristas não são realizadas pela empresa, e sim por terceiros, sequer havendo que se cogitar de relação contratual entre o demandante e a ré. Por fim, aduziu que nunca restringiu o reclamante de exercer sua atividade laborativa.

No mesmo sentido a defesa da terceira reclamada (BUONNY), acrescentando ainda que somente fornece serviço aos seus clientes, disponibilizando rede de dados para que eles decidam acerca da contratação ou não de determinado profissional, não exercendo qualquer influência ou ingerência na atividade dos empregadores. Esclareceu, por fim, que todas as pesquisas realizadas são obtidas de forma lícita e por meio de órgãos que possibilitam o acesso livre a qualquer cidadão, prestando-se unicamente a reunir as informações e disponibiliza-las aos seus clientes.

O douto juízo de primeiro grau decidiu a matéria nos seguintes termos, in verbis:

Na hipótese, o reclamante argumenta ter sido preso em flagrante em razão de equívoco relacionado ao roubo de carga por ele transportada, em situação na qual figurou como vítima do delito, tanto que o próprio Ministério Público Estadual pediu sua liberdade por ausência de elementos de convicção a respeito da culpa (ID 2db978f).

Alega que após tal fato não conseguiu mais se empregar, uma vez que as rés, classificadoras de risco/seguradoras, emitiram informações desabonadoras para as empresas transportadoras, as quais, sob a possibilidade de ausência de cobertura securitária da carga, optaram por não contratar ou até mesmo dispensar o trabalhador.

Pois bem.

As defesas patronais são confusas e conspiram contra seus próprios objetos sociais, considerando que as empresas existem exatamente para a classificação de risco.

Nessa toada, a testemunha Glaucimar Marcelino (ID 35d004a), confirmou que o reclamante sofreu restrição ao transporte de cargas em razão de informações desabonadoras prestadas pela primeira, segunda e quarta rés, impedindo o gozo do direito social ao trabalho, restando configurado, a meu ver, o abalo moral (CF, art. 5º, X).

Logo, observados, pois, os critérios de satisfação compensatória, da gravidade do evento, do caráter pedagógico e a capacidade econômica das rés, fixo o valor da indenização por danos morais no montante de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais), a ser arcado em partes iguais (R$10.000,00) pela primeira, segunda, quarta e quinta rés , esta última em razão da incidência dos efeitos da revelia, estando a terceira demandada isenta de qualquer responsabilidade face a ausência de provas contra ela. Cada reclamada é responsável exclusivamente por seu quinhão.

Defiro, ainda, tutela inibitória direcionada à quarta ré, considerando os termos da audiência de ID (35d004a), a fim de determinar que a mesma se abstenha de prestar informações desabonadoras a respeito do autor para quaisquer pessoas, físicas ou jurídicas, sob pena de incidência de astreintes, por evento confirmado, no importe de R$1.000,00, reversível ao autor. Tal provimento é concedido a título de antecipação de tutela, cujo cumprimento deve ser imediato.

Inconformadas, recorrem as reclamadas renovando os argumentos lançados em suas defesas. Em suma, alegam que prestam informações somente quando instadas, sendo que compete exclusivamente ao contratante e potencial empregador contratar, ou não, o motorista consultado, sem qualquer ingerência das rés. Esclarecem que prestam serviços de comercialização e assessoramento aos seus clientes quando da contratação de seguros, principalmente no ramo de transportes, tratando-se de prática que visa evitar a ocorrência de sinistros.

Por fim, pretendem a redução do montante indenizatório, aduzindo que no arbitramento do dano moral deve ser levada em consideração a situação social e econômica dos envolvidos, as condições em que ocorreu a ofensa, a intensidade do sofrimento, o grau de culpa, o esforço para minimizar a ofensa, a razoabilidade e as regras ordinárias de experiência.

Ao exame.

O dano moral configura-se quando há ofensa direta aos direitos da personalidade, seja no tocante à integridade física, moral ou intelectual; é aquele dano que afeta alguém em seus sentimentos, sua honra, decoro, sua consideração social ou laborativa, em sua reputação e dignidade. Trata-se de lesão imaterial que fere a personalidade, o bom nome do ofendido ou o sentimento de estima da pessoa provocado por fato de outrem. A exposição do ofendido a vexame ou constrangimentos juridicamente relevantes é que dá nota ao dano em tela.

Pressupõe um ato ilícito que afete a esfera psíquica do trabalhador, exigindo que a agressão ultrapasse as barreiras da normalidade e dos fatos corriqueiros possíveis de acontecimentos no cotidiano.

No presente caso, ficou demonstrado que as reclamadas mantêm um banco de dados que auxilia na avaliação da cobertura pelas seguradoras, por meio da análise de risco dos motoristas que prestam serviços para transportadoras diversas.

Ocorre que as informações constantes do referido banco de dados são públicas e poderiam ser obtidas pelas contratantes por meio dos órgãos oficiais. E, neste contexto, a meu ver, só haveria dano moral se as informações fossem falsas, o que sequer foi alegado pelo autor.

Sendo assim, não vislumbro a prática de conduta abusiva pelas reclamadas, capaz de autorizar o reconhecimento de ofensa moral ao reclamante, sendo certo que não há nos autos comprovação de que as recusas de emprego ao reclamante tenham sido resultantes de quaisquer dados fornecidos pelas reclamadas às seguradoras.

Neste contexto. cabia ao autor demonstrar que a conduta da ré, efetivamente, atingiu seu patrimônio de ordem moral - ônus do qual não se desincumbiu.

Pelo exposto, dou provimento aos apelos das reclamadas para excluir a condenação ao pagamento de indenização por danos morais." (págs. 1.106-1.108,destacou-se)

Trata-se de ação de indenização por danos morais decorrentes do impedimento do demandante de realizar o trabalho de carregamento de mercadorias, em razão de informações prestadas e compartilhadas pelas rés advindas de cadastros informativos sobre a idoneidade de motoristas a serem contratados para transporte de cargas.

O Regional consignou que o fato de as agravadas prestarem e compartilharem informações de domínio público às empresas que contratam motoristas não é suficiente para a condenação em danos morais, notadamente pela ausência da prática de ato ilícito.

Ao contrário do decidido pela Corte de origem, observa-se que a conduta das reclamadas está consubstanciada na forma discriminatória com que procederam, pois visa à inibição da prestação de serviços dos motoristas que figurem em suas listas cadastrais. A prática da conduta discriminatória em apreço importa ofensa a princípios de ordem constitucional, tais como o da dignidade da pessoa humana, do valor social do trabalho, da isonomia e da não discriminação.

Esclarece-se que o dano moral de ordem íntima prescinde de prova da sua ocorrência em virtude de ele consistir em ofensa a valores humanos, bastando a demonstração do ato ilícito ou antijurídico, em função do qual a parte afirma tê-lo sofrido, por ser in re ipsa , ou seja, decorre do próprio evento danoso, não havendo falar em demonstração do dano, pois, nesse caso, ele se situa no psicológico do lesado, em que é impossível se extrair uma prova material.

Convém destacar, mais uma vez, o ensinamento de Sérgio Cavalieri Filho, segundo o qual " a doutrina francesa, aplicada com freqüência pelos nossos Tribunais, fala na (perda de uma chance perte d’une chance) nos casos em que o ato ilícito tira da vítima a oportunidade de obter uma situação futura melhor, como progredir na carreira artística ou no trabalho, arrumar um novo emprego , deixar de ganhar uma causa pela falha do advogado etc " (grifou-se - in Programa de Responsabilidade Civil. 3ª edição. São Paulo: Editora Malheiros, 2002, pp. 81 e 82).

Neste sentido, citam-se precedentes desta Corte:

"RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. MOTORISTA DE CARGAS. EMPRESA QUE REPASSA INFORMAÇÕES ORIUNDAS DE BANCO DE DADOS DE DOMÍNIO PÚBLICO. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL E MATERIAL. ATO ILÍCITO CONFIGURADO . Trata-se de ação de indenização por danos morais decorrentes do impedimento do demandante de realizar o carregamento de mercadorias, em razão de informações prestadas pela ré advindas de cadastros informativos sobre a idoneidade de motoristas a serem contratados para transporte de cargas. O Regional consignou que o fato de a agravada prestar informações de domínio público às empresas que contratam motoristas não é suficiente para a condenação em danos morais e materiais, notadamente pela ausência da prática de ato ilícito. Ao contrário do decidido pela Corte de origem, observa-se que a conduta da reclamada está consubstanciada na forma discriminatória com que procedeu, pois visa à inibição da prestação de serviços dos motoristas que figurem em suas listas cadastrais. A prática da conduta discriminatória em apreço importa ofensa a princípios de ordem constitucional, tais como o da dignidade da pessoa humana, do valor social do trabalho, da isonomia e da não discriminação. Esclarece-se que o dano moral de ordem íntima prescinde de prova da sua ocorrência por consistir em ofensa a valores humanos, bastando a demonstração do ato ilícito ou antijurídico, em função do qual a parte afirma tê-lo sofrido, por ser in re ipsa, ou seja, decorre do próprio evento danoso, não havendo falar em demonstração do dano, pois, nesse caso, ele se situa no psicológico do lesado, de que é impossível se extrair uma prova material (precedentes). Recurso de revista conhecido e provido". (RR - 10-57.2015.5.09.0094, Relator Ministro: José Roberto Freire Pimenta, Data de Julgamento: 22/11/2017, 2ª Turma , Data de Publicação: DEJT 24/11/2017, destacou-se e grifou-se)

"RECURSO DE REVISTA. DANO MORAL. PESQUISA DA SITUAÇÃO FINANCEIRA DE CANDIDATO A EMPREGO - SPC E SERASA. Na hipótese dos autos, extrai-se do acórdão recorrido que é incontroversa a prática pela Ré de pesquisa nos sistemas de proteção ao crédito quando do processo de seleção de candidato ao emprego. Ora, chega a ser absurdo imaginar que o cidadão pode não ser contratado por ter seu nome registrado no SPC ou SERASA. Tais serviços devem ser utilizados para proteger o crédito e não para inviabilizar o emprego. Se o candidato a uma vaga de emprego eventualmente tem dívidas com outras pessoas, esta não pode ser a razão para impedir que o trabalhador obtenha o emprego. E isto se justifica porque para um candidato nesta situação, a recolocação no mercado de trabalho tem justamente o objetivo de saldar as dívidas do trabalhador. Nesse esteio, qualquer restrição ao acesso de um candidato a uma vaga de emprego em razão de seu nome constar em uma das listas de empresas de proteção ao crédito, como SERASA e SPC, é ato discriminatório e deve ser coibido por esta Justiça Especializada. A conduta do empregador é inegavelmente discriminatória, pois visa a inibir a contratação de candidatos que figurem em listas cadastrais dos serviços de proteção ao crédito. A prática da conduta discriminatória em apreço importa ofensa a princípios de ordem constitucional, tais como o da dignidade da pessoa humana, do valor social do trabalho, da isonomia e da não discriminação (arts. 1º, III e IV, 3º, IV, e 5º da Constituição da República). Deve ser ressaltado ainda o teor do artigo 1º, da Lei nº 9.029/95, que prevê a proibição de práticas discriminatórias nas relações de trabalho. Precedentes. Recurso de revista conhecido por violação do artigo 1º da Lei nº 9.029/95 e provido" (Processo: RR - 209-39.2011.5.05.0027 Data de Julgamento: 30/11/2016, Relator Ministro: Alexandre de Souza Agra Belmonte, 3ª Turma, Data de Publicação: DEJT 02/12/2016.)

"RECURSO DE REVISTA. (...). PESQUISA DA SITUAÇÃO FINANCEIRA DE CANDIDATOS A EMPREGO - SPC E SERASA - OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER. Na hipótese dos autos, extrai-se do acórdão recorrido, que é incontroversa ‘a prática pela recorrente de pesquisa nos sistemas de proteção ao crédito quando do processo de seleção de candidato ao emprego’. E o Regional concluiu, com base no acervo probatório dos autos, que ‘restou devidamente comprovada a conduta ilícita por ela praticada, fato que justifica a manutenção do julgado revisando’. Chega a ser absurdo imaginar que o cidadão pode não ser contratado, por ter seu nome registrado no SPC ou SERASA, tais serviços devem ser utilizados para proteger o crédito e não para inviabilizar o emprego. A conduta do empregador é inegavelmente discriminatória, pois visa a inibir a contratação de candidatos que figurem em listas cadastrais dos serviços de proteção ao crédito. Com efeito, a prática da conduta discriminatória em apreço importa ofensa a princípios de ordem constitucional, tais como o da dignidade da pessoa humana, do valor social do trabalho, da isonomia e da não discriminação (arts. 1º, III e IV, 3º, IV, e 5º da Constituição Federal). Recurso de revista conhecido e desprovido." (TST-RR- 8128-97.2010.5.12.0034 , Relator Ministro: Alexandre de Souza Agra Belmonte, 3ª Turma , DEJT 16/10/2015)

"RECURSO DE REVISTA (...) PROCESSO SELETIVO - PESQUISA PRÉVIA DA SITUAÇÃO FINANCEIRA DOS CANDIDATOS AO EMPREGO - SPC E SERASA - OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER - DANO MORAL COLETIVO. O Tribunal Regional convalidou a sentença da Vara do Trabalho na parte em que se concedera a antecipação de tutela pretendida pelo Ministério Publico do Trabalho nos autos da ação civil pública, por considerar ilícita a conduta do réu de proceder à pesquisa, em cadastro de proteção ao crédito, dos antecedentes creditícios de candidatos a emprego, de forma a restringir-lhes o acesso a vagas de emprego, em razão de seu nome constar em uma das listas de empresas de proteção ao crédito, como Serasa e SPC, em virtude de entender tratar-se de ato discriminatório e violador da esfera íntima e privada do trabalhador. No entanto, em que pese o Colegiado de origem tenha considerado ilícita a conduta do réu, resolveu reformar a sentença para excluir da condenação o pagamento da indenização por dano moral coletivo, ao fundamento de que não ficara comprovado o dano pela falta de prova de efetivo prejuízo moral, do qual decorreria a obrigação de indenizar, nos termos da norma do artigo 186 do Código Civil. Entendeu igualmente que, se houve dano moral, este seria individual, por atingir apenas aqueles que realmente se habilitaram a uma vaga de emprego e aceitaram submeter-se ao processo seletivo, circunstância em virtude da qual considerou que eventual indenização deveria ser buscada individualmente pelos interessados, de forma a se avaliar caso a caso, revelando-se inadequada, para tanto, a ação civil pública. Ocorre que, diante da incontrovérsia dos fatos relativos à conduta ilícita do reclamado, o dano moral daí decorrente é considerado in re ipsa , já que decorre da própria natureza das coisas, prescindindo, assim, de prova da sua ocorrência concreta, em virtude de ele consistir em ofensa a valores humanos, bastando a demonstração do ato ilícito ou antijurídico em função do qual a parte afirma ter ocorrido a ofensa ao patrimônio moral. Trata-se, nas palavras de Sérgio Cavalieri Filho, de uma demonstração do dano moral à guisa de uma presunção natural, uma presunção hominis ou facti , que decorre das regras de experiência comum. Com efeito, o dano coletivo experimentado, nessa hipótese, prescinde da prova da dor, pois, dada a sua relevância social, desencadeia reparação específica. Para a configuração do dano moral coletivo, basta, como no caso dos autos, a violação intolerável a direitos coletivos e difusos, ação ou omissão reprováveis pelo sistema de justiça social do nosso ordenamento jurídico, conduta antijurídica capaz de lesar a esfera de interesses da coletividade, cuja essência é tipicamente extrapatrimonial. Erigindo o dano moral coletivo a um plano mais abrangente de alcance jurídico, Xisto Tiago de Medeiros Neto ressalta a sua configuração, independentemente do número de pessoas atingidas pela lesão, afastando, para sua eventual caracterização, o ‘critério míope’, pautado tão somente na verificação do quantitativo de pessoas atingidas de maneira imediata. Assim, o fato de a transgressão estar circunstanciada no âmbito das relações de trabalho, por si só, não lhe atribui a visão de dano individual, como equivocadamente entendeu o Regional. O que vai imprimir o caráter coletivo é a repercussão no meio social, a adoção reiterada de um padrão de conduta por parte do infrator, com inegável extensão lesiva à coletividade, de forma a violar o sistema jurídico de garantias fundamentais. É por isso que o dano moral coletivo, em face de suas características próprias de dano genérico, enseja muito mais uma condenação preventiva e inibitória do que propriamente uma tutela ressarcitória. Há nítida separação entre as esferas a serem protegidas e tuteladas pelas cominações referidas, justamente diante da distinção entre os danos morais individualmente causados concretamente a cada uma das pessoas envolvidas, in casu , os candidatos aos empregos, dos quais não cuida esta ação civil pública, e a necessidade de reprimir a conduta, claramente tida como ilícita do reclamado, de natureza coletiva ou massiva, esta sim o objeto da pretensão formulada pelo Ministério Público do Trabalho. Aqui cabe trazer a lume a lição de Xisto Tiago de Medeiros Neto sobre a preponderância da função sancionatória da indenização por dano moral coletivo, alertando que esta se afasta da função típica que prevalece no âmbito dos direitos individuais, onde se confere maior relevância à finalidade compensatória da indenização em favor das vítimas identificadas, e, apenas em segundo plano, visualiza-se a função suasória. Em outras palavras, é o que Luiz Guilherme Marinoni ensina no sentido de que a tutela inibitória é a tutela do ilícito, prescindindo, portanto, da demonstração de existência do dano concreto. Dessa forma, encontrando-se caracterizado o dano moral coletivo, nos termos do artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal, deve-se condenar o reclamado ao pagamento da respectiva indenização, levando-se em conta para o seu arbitramento essencialmente a sua função sancionatória e pedagógica, de forma a afastar a reincidência e não deixar impune a lesão, pelo que se considera razoável e proporcional arbitrar o valor do dano moral coletivo em R$ 300.000,00 (trezentos mil reais). Recurso de revista conhecido e provido". (TST-RR-3990200-19.2008.5.09.0002, 2ª Turma , Redator Ministro: José Roberto Freire Pimenta, DEJT 20/2/2015)

Deve ser ressaltado ainda o teor do artigo 1º, da Lei nº 9.029/95, que prevê a proibição de práticas discriminatórias nas relações de trabalho, in verbis :

"Art. 1º É proibida a adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso à relação de trabalho, ou de sua manutenção, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar, deficiência, reabilitação profissional, idade, entre outros, ressalvadas, nesse caso, as hipóteses de proteção à criança e ao adolescente previstas no inciso XXXIII, do art. 7º, da Constituição Federal."

Assim, tendo a Corte de origem reformado a sentença para excluir da condenação a indenização por dano moral, dou provimento ao agravo de instrumento por possível violação do artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal , para determinar o processamento do recurso de revista, a reautuação dos autos e a intimação das partes e dos interessados para seu julgamento, nos termos dos arts. 935 do CPC e 122 do RITST.

RECURSO DE REVISTA

MOTORISTA DE CARGAS. EMPRESA QUE REPASSA INFORMAÇÕES ORIUNDAS DE BANCO DE DADOS DE DOMÍNIO PÚBLICO. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. ATO ILÍCITO CONFIGURADO

I – CONHECIMENTO

Quanto à indenização por dano moral, assim se manifestou o Regional:

"2.2.1 DANO MORAL. RESTRIÇÃO AO TRABALHO (análise em conjunto com os apelos das lª e 4ª reclamadas)

Adoto o relatório do Desembargador Relator, verbis:

O reclamante relatou na exordial que foi admitido pela empresa Megalog Logística e Transporte LTDA aos 13/11/2009 para exercer a função de motorista, sendo demitido sem justa causa aos 22/05/2012. Relatou que, durante o vínculo empregatício, sofreu assalto no Estado do Rio de Janeiro e chegou a ser preso como suspeito, tendo o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro requerido a expedição de Alvará de Soltura porque os elementos investigativos contidos nos autos do inquérito não seriam suficientes a embasar a necessária justa causa para deflagração da ação penal.

Ato contínuo, disse que, após sua demissão da empresa, não conseguiu novo emprego devido às restrições feitas pelas seguradoras aos potenciais empregadores. Esclareceu que após diversas recusas chegou a entrar em contato com a quarta reclamada, Buonny, oportunidade na qual lhe foi dito que continha no banco de dados das empresas informação de que o demandante estaria respondendo a um processo criminal por roubo de carga.

Exposta assim a causa de pedir, após relatar diversas tentativas de admissão em empregos e recusas injustificadas de última hora por parte dos empregadores, pleiteou a condenação das rés ao pagamento de indenização por dano moral diante da inviabilidade do exercício do seu direito ao trabalho.

A primeira reclamada, após suscitar preliminar de incompetência absoluta, esclareceu que é empresa de gerenciamento de risco, cujo serviço seria manter um banco de dados acerca dos motoristas cadastros para fornecer informações às empresas interessadas na contratação. Alega que o serviço prestado se revela de grande utilidade, pois visa cumprir condições do seguro de responsabilidade civil contratado pelas empresas de transportes, não se confundindo sua condição de gerenciadora de riscos com a de seguradora.

Em contestação, a segunda reclamada (BRASIL RISK) se defendeu ao argumento de que é empresa gerenciadora de risco, não possuindo o poder de autorização para a contratação de seguros. Nesse sentido, afirmou que as seleções e contratações dos motoristas não são realizadas pela empresa, e sim por terceiros, sequer havendo que se cogitar de relação contratual entre o demandante e a ré. Por fim, aduziu que nunca restringiu o reclamante de exercer sua atividade laborativa.

No mesmo sentido a defesa da terceira reclamada (BUONNY), acrescentando ainda que somente fornece serviço aos seus clientes, disponibilizando rede de dados para que eles decidam acerca da contratação ou não de determinado profissional, não exercendo qualquer influência ou ingerência na atividade dos empregadores. Esclareceu, por fim, que todas as pesquisas realizadas são obtidas de forma lícita e por meio de órgãos que possibilitam o acesso livre a qualquer cidadão, prestando-se unicamente a reunir as informações e disponibiliza-las aos seus clientes.

O douto juízo de primeiro grau decidiu a matéria nos seguintes termos, in verbis:

Na hipótese, o reclamante argumenta ter sido preso em flagrante em razão de equívoco relacionado ao roubo de carga por ele transportada, em situação na qual figurou como vítima do delito, tanto que o próprio Ministério Público Estadual pediu sua liberdade por ausência de elementos de convicção a respeito da culpa (ID 2db978f).

Alega que após tal fato não conseguiu mais se empregar, uma vez que as rés, classificadoras de risco/seguradoras, emitiram informações desabonadoras para as empresas transportadoras, as quais, sob a possibilidade de ausência de cobertura securitária da carga, optaram por não contratar ou até mesmo dispensar o trabalhador.

Pois bem.

As defesas patronais são confusas e conspiram contra seus próprios objetos sociais, considerando que as empresas existem exatamente para a classificação de risco.

Nessa toada, a testemunha Glaucimar Marcelino (ID 35d004a), confirmou que o reclamante sofreu restrição ao transporte de cargas em razão de informações desabonadoras prestadas pela primeira, segunda e quarta rés, impedindo o gozo do direito social ao trabalho, restando configurado, a meu ver, o abalo moral (CF, art. 5º, X).

Logo, observados, pois, os critérios de satisfação compensatória, da gravidade do evento, do caráter pedagógico e a capacidade econômica das rés, fixo o valor da indenização por danos morais no montante de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais), a ser arcado em partes iguais (R$10.000,00) pela primeira, segunda, quarta e quinta rés , esta última em razão da incidência dos efeitos da revelia, estando a terceira demandada isenta de qualquer responsabilidade face a ausência de provas contra ela. Cada reclamada é responsável exclusivamente por seu quinhão.

Defiro, ainda, tutela inibitória direcionada à quarta ré, considerando os termos da audiência de ID (35d004a), a fim de determinar que a mesma se abstenha de prestar informações desabonadoras a respeito do autor para quaisquer pessoas, físicas ou jurídicas, sob pena de incidência de astreintes, por evento confirmado, no importe de R$1.000,00, reversível ao autor. Tal provimento é concedido a título de antecipação de tutela, cujo cumprimento deve ser imediato.

Inconformadas, recorrem as reclamadas renovando os argumentos lançados em suas defesas. Em suma, alegam que prestam informações somente quando instadas, sendo que compete exclusivamente ao contratante e potencial empregador contratar, ou não, o motorista consultado, sem qualquer ingerência das rés. Esclarecem que prestam serviços de comercialização e assessoramento aos seus clientes quando da contratação de seguros, principalmente no ramo de transportes, tratando-se de prática que visa evitar a ocorrência de sinistros.

Por fim, pretendem a redução do montante indenizatório, aduzindo que no arbitramento do dano moral deve ser levada em consideração a situação social e econômica dos envolvidos, as condições em que ocorreu a ofensa, a intensidade do sofrimento, o grau de culpa, o esforço para minimizar a ofensa, a razoabilidade e as regras ordinárias de experiência.

Ao exame.

O dano moral configura-se quando há ofensa direta aos direitos da personalidade, seja no tocante à integridade física, moral ou intelectual; é aquele dano que afeta alguém em seus sentimentos, sua honra, decoro, sua consideração social ou laborativa, em sua reputação e dignidade. Trata-se de lesão imaterial que fere a personalidade, o bom nome do ofendido ou o sentimento de estima da pessoa provocado por fato de outrem. A exposição do ofendido a vexame ou constrangimentos juridicamente relevantes é que dá nota ao dano em tela.

Pressupõe um ato ilícito que afete a esfera psíquica do trabalhador, exigindo que a agressão ultrapasse as barreiras da normalidade e dos fatos corriqueiros possíveis de acontecimentos no cotidiano.

No presente caso, ficou demonstrado que as reclamadas mantêm um banco de dados que auxilia na avaliação da cobertura pelas seguradoras, por meio da análise de risco dos motoristas que prestam serviços para transportadoras diversas.

Ocorre que as informações constantes do referido banco de dados são públicas e poderiam ser obtidas pelas contratantes por meio dos órgãos oficiais. E, neste contexto, a meu ver, só haveria dano moral se as informações fossem falsas, o que sequer foi alegado pelo autor.

Sendo assim, não vislumbro a prática de conduta abusiva pelas reclamadas, capaz de autorizar o reconhecimento de ofensa moral ao reclamante, sendo certo que não há nos autos comprovação de que as recusas de emprego ao reclamante tenham sido resultantes de quaisquer dados fornecidos pelas reclamadas às seguradoras.

Neste contexto. cabia ao autor demonstrar que a conduta da ré, efetivamente, atingiu seu patrimônio de ordem moral - ônus do qual não se desincumbiu.

Pelo exposto, dou provimento aos apelos das reclamadas para excluir a condenação ao pagamento de indenização por danos morais." (págs. 1.106-1.108,destacou-se)

O reclamante requer a condenação das recorridas ao pagamento de indenização por danos morais decorrentes do impedimento da realização de trabalho de transportes de mercadorias.

Alega que " a conduta de realizar pesquisa para repassar informações referentes aos motoristas consultados, a fim de instruir propostas de seguro por ele intermediadas entre as seguradoras e as transportadoras é considerada irregular, visto que viola o direito à privacidade e ao livre exercício da atividade profissional " (pág. 1.185), sendo que " os motoristas possuíam restrições no seu cadastro junto a empresa Agravada - GPS LOGÍSTICA E GERENCIAMENTO DE RISCOS S.A. e foram impedidos de trabalhar " (pág. 1.188).

Indica violação dos artigos 1º, inciso III, e 5º, inciso X, da Constituição Federal e colaciona arestos para o cotejo de teses.

Com razão.

Trata-se de ação de indenização por danos morais decorrentes do impedimento do demandante de realizar o trabalho de carregamento de mercadorias, em razão de informações prestadas e compartilhadas pelas rés advindas de cadastros informativos sobre a idoneidade de motoristas a serem contratados para transporte de cargas.

O Regional consignou que o fato de as reclamadas prestarem e compartilharem informações de domínio público às empresas que contratam motoristas não é suficiente para a condenação em danos morais, notadamente pela ausência da prática de ato ilícito.

Ao contrário do decidido pela Corte de origem, observa-se que a conduta das reclamadas está consubstanciada na forma discriminatória com que procederam, pois visa à inibição da prestação de serviços dos motoristas que figurem em suas listas cadastrais. A prática da conduta discriminatória em apreço importa ofensa a princípios de ordem constitucional, tais como o da dignidade da pessoa humana, do valor social do trabalho, da isonomia e da não discriminação.

Esclarece-se que o dano moral de ordem íntima prescinde de prova da sua ocorrência em virtude de ele consistir em ofensa a valores humanos, bastando a demonstração do ato ilícito ou antijurídico, em função do qual a parte afirma tê-lo sofrido, por ser in re ipsa , ou seja, decorre do próprio evento danoso, não havendo falar em demonstração do dano, pois, nesse caso, ele se situa no psicológico do lesado, em que é impossível se extrair uma prova material.

Convém destacar, mais uma vez, o ensinamento de Sérgio Cavalieri Filho, segundo o qual " a doutrina francesa, aplicada com freqüência pelos nossos Tribunais, fala na (perda de uma chance perte d’une chance) nos casos em que o ato ilícito tira da vítima a oportunidade de obter uma situação futura melhor, como progredir na carreira artística ou no trabalho, arrumar um novo emprego , deixar de ganhar uma causa pela falha do advogado etc " (grifou-se - in Programa de Responsabilidade Civil. 3ª edição. São Paulo: Editora Malheiros, 2002, pp. 81 e 82).

Neste sentido, citam-se precedentes desta Corte:

"RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. MOTORISTA DE CARGAS. EMPRESA QUE REPASSA INFORMAÇÕES ORIUNDAS DE BANCO DE DADOS DE DOMÍNIO PÚBLICO. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL E MATERIAL. ATO ILÍCITO CONFIGURADO . Trata-se de ação de indenização por danos morais decorrentes do impedimento do demandante de realizar o carregamento de mercadorias, em razão de informações prestadas pela ré advindas de cadastros informativos sobre a idoneidade de motoristas a serem contratados para transporte de cargas. O Regional consignou que o fato de a agravada prestar informações de domínio público às empresas que contratam motoristas não é suficiente para a condenação em danos morais e materiais, notadamente pela ausência da prática de ato ilícito. Ao contrário do decidido pela Corte de origem, observa-se que a conduta da reclamada está consubstanciada na forma discriminatória com que procedeu, pois visa à inibição da prestação de serviços dos motoristas que figurem em suas listas cadastrais. A prática da conduta discriminatória em apreço importa ofensa a princípios de ordem constitucional, tais como o da dignidade da pessoa humana, do valor social do trabalho, da isonomia e da não discriminação. Esclarece-se que o dano moral de ordem íntima prescinde de prova da sua ocorrência por consistir em ofensa a valores humanos, bastando a demonstração do ato ilícito ou antijurídico, em função do qual a parte afirma tê-lo sofrido, por ser in re ipsa, ou seja, decorre do próprio evento danoso, não havendo falar em demonstração do dano, pois, nesse caso, ele se situa no psicológico do lesado, de que é impossível se extrair uma prova material (precedentes). Recurso de revista conhecido e provido". (RR - 10-57.2015.5.09.0094, Relator Ministro: José Roberto Freire Pimenta, Data de Julgamento: 22/11/2017, 2ª Turma , Data de Publicação: DEJT 24/11/2017, destacou-se e grifou-se)

"RECURSO DE REVISTA. DANO MORAL. PESQUISA DA SITUAÇÃO FINANCEIRA DE CANDIDATO A EMPREGO - SPC E SERASA. Na hipótese dos autos, extrai-se do acórdão recorrido que é incontroversa a prática pela Ré de pesquisa nos sistemas de proteção ao crédito quando do processo de seleção de candidato ao emprego. Ora, chega a ser absurdo imaginar que o cidadão pode não ser contratado por ter seu nome registrado no SPC ou SERASA. Tais serviços devem ser utilizados para proteger o crédito e não para inviabilizar o emprego. Se o candidato a uma vaga de emprego eventualmente tem dívidas com outras pessoas, esta não pode ser a razão para impedir que o trabalhador obtenha o emprego. E isto se justifica porque para um candidato nesta situação, a recolocação no mercado de trabalho tem justamente o objetivo de saldar as dívidas do trabalhador. Nesse esteio, qualquer restrição ao acesso de um candidato a uma vaga de emprego em razão de seu nome constar em uma das listas de empresas de proteção ao crédito, como SERASA e SPC, é ato discriminatório e deve ser coibido por esta Justiça Especializada. A conduta do empregador é inegavelmente discriminatória, pois visa a inibir a contratação de candidatos que figurem em listas cadastrais dos serviços de proteção ao crédito. A prática da conduta discriminatória em apreço importa ofensa a princípios de ordem constitucional, tais como o da dignidade da pessoa humana, do valor social do trabalho, da isonomia e da não discriminação (arts. 1º, III e IV, 3º, IV, e 5º da Constituição da República). Deve ser ressaltado ainda o teor do artigo 1º, da Lei nº 9.029/95, que prevê a proibição de práticas discriminatórias nas relações de trabalho. Precedentes. Recurso de revista conhecido por violação do artigo 1º da Lei nº 9.029/95 e provido" (Processo: RR - 209-39.2011.5.05.0027 Data de Julgamento: 30/11/2016, Relator Ministro: Alexandre de Souza Agra Belmonte, 3ª Turma, Data de Publicação: DEJT 02/12/2016.)

"RECURSO DE REVISTA. (...). PESQUISA DA SITUAÇÃO FINANCEIRA DE CANDIDATOS A EMPREGO - SPC E SERASA - OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER. Na hipótese dos autos, extrai-se do acórdão recorrido, que é incontroversa ‘a prática pela recorrente de pesquisa nos sistemas de proteção ao crédito quando do processo de seleção de candidato ao emprego’. E o Regional concluiu, com base no acervo probatório dos autos, que ‘restou devidamente comprovada a conduta ilícita por ela praticada, fato que justifica a manutenção do julgado revisando’. Chega a ser absurdo imaginar que o cidadão pode não ser contratado, por ter seu nome registrado no SPC ou SERASA, tais serviços devem ser utilizados para proteger o crédito e não para inviabilizar o emprego. A conduta do empregador é inegavelmente discriminatória, pois visa a inibir a contratação de candidatos que figurem em listas cadastrais dos serviços de proteção ao crédito. Com efeito, a prática da conduta discriminatória em apreço importa ofensa a princípios de ordem constitucional, tais como o da dignidade da pessoa humana, do valor social do trabalho, da isonomia e da não discriminação (arts. 1º, III e IV, 3º, IV, e 5º da Constituição Federal). Recurso de revista conhecido e desprovido." (TST-RR- 8128-97.2010.5.12.0034 , Relator Ministro: Alexandre de Souza Agra Belmonte, 3ª Turma , DEJT 16/10/2015)

"RECURSO DE REVISTA (...) PROCESSO SELETIVO - PESQUISA PRÉVIA DA SITUAÇÃO FINANCEIRA DOS CANDIDATOS AO EMPREGO - SPC E SERASA - OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER - DANO MORAL COLETIVO. O Tribunal Regional convalidou a sentença da Vara do Trabalho na parte em que se concedera a antecipação de tutela pretendida pelo Ministério Publico do Trabalho nos autos da ação civil pública, por considerar ilícita a conduta do réu de proceder à pesquisa, em cadastro de proteção ao crédito, dos antecedentes creditícios de candidatos a emprego, de forma a restringir-lhes o acesso a vagas de emprego, em razão de seu nome constar em uma das listas de empresas de proteção ao crédito, como Serasa e SPC, em virtude de entender tratar-se de ato discriminatório e violador da esfera íntima e privada do trabalhador. No entanto, em que pese o Colegiado de origem tenha considerado ilícita a conduta do réu, resolveu reformar a sentença para excluir da condenação o pagamento da indenização por dano moral coletivo, ao fundamento de que não ficara comprovado o dano pela falta de prova de efetivo prejuízo moral, do qual decorreria a obrigação de indenizar, nos termos da norma do artigo 186 do Código Civil. Entendeu igualmente que, se houve dano moral, este seria individual, por atingir apenas aqueles que realmente se habilitaram a uma vaga de emprego e aceitaram submeter-se ao processo seletivo, circunstância em virtude da qual considerou que eventual indenização deveria ser buscada individualmente pelos interessados, de forma a se avaliar caso a caso, revelando-se inadequada, para tanto, a ação civil pública. Ocorre que, diante da incontrovérsia dos fatos relativos à conduta ilícita do reclamado, o dano moral daí decorrente é considerado in re ipsa , já que decorre da própria natureza das coisas, prescindindo, assim, de prova da sua ocorrência concreta, em virtude de ele consistir em ofensa a valores humanos, bastando a demonstração do ato ilícito ou antijurídico em função do qual a parte afirma ter ocorrido a ofensa ao patrimônio moral. Trata-se, nas palavras de Sérgio Cavalieri Filho, de uma demonstração do dano moral à guisa de uma presunção natural, uma presunção hominis ou facti , que decorre das regras de experiência comum. Com efeito, o dano coletivo experimentado, nessa hipótese, prescinde da prova da dor, pois, dada a sua relevância social, desencadeia reparação específica. Para a configuração do dano moral coletivo, basta, como no caso dos autos, a violação intolerável a direitos coletivos e difusos, ação ou omissão reprováveis pelo sistema de justiça social do nosso ordenamento jurídico, conduta antijurídica capaz de lesar a esfera de interesses da coletividade, cuja essência é tipicamente extrapatrimonial. Erigindo o dano moral coletivo a um plano mais abrangente de alcance jurídico, Xisto Tiago de Medeiros Neto ressalta a sua configuração, independentemente do número de pessoas atingidas pela lesão, afastando, para sua eventual caracterização, o ‘critério míope’, pautado tão somente na verificação do quantitativo de pessoas atingidas de maneira imediata. Assim, o fato de a transgressão estar circunstanciada no âmbito das relações de trabalho, por si só, não lhe atribui a visão de dano individual, como equivocadamente entendeu o Regional. O que vai imprimir o caráter coletivo é a repercussão no meio social, a adoção reiterada de um padrão de conduta por parte do infrator, com inegável extensão lesiva à coletividade, de forma a violar o sistema jurídico de garantias fundamentais. É por isso que o dano moral coletivo, em face de suas características próprias de dano genérico, enseja muito mais uma condenação preventiva e inibitória do que propriamente uma tutela ressarcitória. Há nítida separação entre as esferas a serem protegidas e tuteladas pelas cominações referidas, justamente diante da distinção entre os danos morais individualmente causados concretamente a cada uma das pessoas envolvidas, in casu , os candidatos aos empregos, dos quais não cuida esta ação civil pública, e a necessidade de reprimir a conduta, claramente tida como ilícita do reclamado, de natureza coletiva ou massiva, esta sim o objeto da pretensão formulada pelo Ministério Público do Trabalho. Aqui cabe trazer a lume a lição de Xisto Tiago de Medeiros Neto sobre a preponderância da função sancionatória da indenização por dano moral coletivo, alertando que esta se afasta da função típica que prevalece no âmbito dos direitos individuais, onde se confere maior relevância à finalidade compensatória da indenização em favor das vítimas identificadas, e, apenas em segundo plano, visualiza-se a função suasória. Em outras palavras, é o que Luiz Guilherme Marinoni ensina no sentido de que a tutela inibitória é a tutela do ilícito, prescindindo, portanto, da demonstração de existência do dano concreto. Dessa forma, encontrando-se caracterizado o dano moral coletivo, nos termos do artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal, deve-se condenar o reclamado ao pagamento da respectiva indenização, levando-se em conta para o seu arbitramento essencialmente a sua função sancionatória e pedagógica, de forma a afastar a reincidência e não deixar impune a lesão, pelo que se considera razoável e proporcional arbitrar o valor do dano moral coletivo em R$ 300.000,00 (trezentos mil reais). Recurso de revista conhecido e provido". (TST-RR-3990200-19.2008.5.09.0002, 2ª Turma , Redator Ministro: José Roberto Freire Pimenta, DEJT 20/2/2015)

Deve ser ressaltado ainda o teor do artigo 1º, da Lei nº 9.029/95, que prevê a proibição de práticas discriminatórias nas relações de trabalho, in verbis :

"Art. 1º É proibida a adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso à relação de trabalho, ou de sua manutenção, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar, deficiência, reabilitação profissional, idade, entre outros, ressalvadas, nesse caso, as hipóteses de proteção à criança e ao adolescente previstas no inciso XXXIII, do art. 7º, da Constituição Federal."

Assim, tendo a Corte de origem reformado a sentença para excluir da condenação a indenização por dano moral, decidiu em desacordo com o disposto no artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal.

Diante do exposto, conheço do recurso de revista por violação do artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal.

II – MÉRITO

A consequência lógica do conhecimento do recurso de revista por violação do artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal é o seu provimento.

Assim, dou provimento ao recurso de revista para restabelecer a sentença na qual foi deferida indenização por danos morais.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer do recurso de revista por violação do artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal e, no mérito, dar-lhe provimento para restabelecer a sentença na qual foi deferida indenização por danos morais, observada a Súmula nº 439 do TST. Mantidos os valores das custas e da condenação.

Brasília, 11 de novembro de 2020.

Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)

JOSÉ ROBERTO FREIRE PIMENTA

Ministro Relator