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PROCESSO Nº TST-RRAg - 0000769-40.2022.5.17.0001
A C Ó R D Ã O
Tribunal Pleno
GPACV/mmcs/rdc
REPRESENTATIVO PARA REAFIRMAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. INCIDENTE DE REAFIRMAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. CONAB. SUPRESSÃO. INCORPORAÇÃO DE GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO AO SALÁRIO DO TRABALHADOR. REVOGAÇÃO DA NORMA REGULAMENTAR QUE INSTITUIU O BENEFÍCIO. RESOLUÇÕES DA CONAB REVOGADAS EM CUMPRIMENTO A DECISÃO DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. TEMA OBJETO DO IRDR Nº 21 DO TRT DA 18ª REGIÃO. Cinge-se a controvérsia em determinar se é possível a incorporação de gratificação de função fixada em resoluções administrativas editadas no âmbito da CONAB – Companhia Nacional de Abastecimento, quando os atos normativos internos tenham sido revogadas por força de decisão do TCU – Tribunal de Contas da União. O Tribunal Regional concluiu pela possibilidade, uma vez que a supressão iria de encontro ao que prevê a Súmula nº 51, I, do TST. Diante da manifestação de todas as Turmas do Tribunal Superior do Trabalho indica-se a matéria a ter a jurisprudência reafirmada, em face da seguinte questão jurídica: É válida a supressão da incorporação de gratificação de função ao salário do trabalhador da CONAB, nos casos de revogação da norma regulamentar que instituiu o benefício, em cumprimento de decisão do Tribunal de Contas da União? Para o fim de consolidar a jurisprudência pacificada no Tribunal Superior do Trabalho, deve ser acolhido o Incidente de Recurso de Revista para o fim de fixar a seguinte tese vinculante: A alteração nos regulamentos internos da CONAB, que garantiam aos seus empregados a incorporação de gratificação de função ao salário, não afeta os empregados que já tinham esse direito adquirido, independentemente de decisão do Tribunal de Contas da União pela supressão das referidas rubricas. Recurso de revista representativo da controvérsia não conhecido, em razão do óbice definido no art. 896, §7º, da CLT e na Súmula nº 333 do TST.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista com Agravo nº TST-RRAg - 0000769-40.2022.5.17.0001, em que são AGRAVANTES COMPANHIA NACIONAL DE ABASTECIMENTO CONAB e BRICIO ALVES DOS SANTOS JUNIOR e são AGRAVADOS COMPANHIA NACIONAL DE ABASTECIMENTO CONAB e BRICIO ALVES DOS SANTOS JUNIOR, é RECORRENTE COMPANHIA NACIONAL DE ABASTECIMENTO CONAB e é RECORRIDO BRICIO ALVES DOS SANTOS JUNIOR.
O presente recurso é representativo de controvérsia que, a despeito de estar pacificada nas oito Turmas, ainda enseja elevada recorribilidade, em razão de resistente divergência entre os Tribunais Regionais, colocando em risco a segurança jurídica e a missão constitucional deste Tribunal Superior, enquanto Corte de Precedentes responsável pela unidade nacional do direito, nas matérias de sua competência.
A utilização da sistemática de demandas repetitivas tem por finalidade aumentar a segurança jurídica proporcionada ao jurisdicionado, pois consolida a jurisprudência e reduz, consequentemente, a litigiosidade nas Cortes superiores.
Apresentada, portanto, a presente proposta de afetação do processo TST-RRAg - 0000769-40.2022.5.17.0001 como Incidente de Recurso Repetitivo junto a este Tribunal Pleno, a fim de examinar a possibilidade de reafirmação de jurisprudência da Corte, nos termos do art. 132-A e parágrafos, do RITST, com o fim de dirimir a seguinte questão jurídica:
É válida a supressão da incorporação de gratificação de função ao salário do trabalhador da CONAB, nos casos de revogação da norma regulamentar que instituiu o benefício, em cumprimento de decisão do Tribunal de Contas da União?
No caso em exame, se trata de tema a ser reafirmado no recurso de revista da parte Reclamada Companhia Nacional de Abastecimento - CONAB, em que consta a matéria acima delimitada: gratificação de função. Consta, também, agravo de instrumento interposto pela Reclamada quanto à negativa de prestação jurisdicional e agravo de instrumento do Autor, quanto à data limite da incorporação da função.
É o relatório.
V O T O
ADMISSIBILIDADE DE INCIDENTE DE RECURSO DE REVISTA REPETITIVO PARA REAFIRMAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO TST
A formação de precedentes obrigatórios constitui um dos principais mecanismos de gestão processual introduzidos pelo legislador nas últimas décadas. A despeito de reiterados recordes de produtividade, é essencial que seja enfrentado de forma célere, coerente e isonômica o exponencial crescimento da demanda, conforme demonstram as estatísticas do Tribunal Superior do Trabalho, que vem recebendo um volume maior de novos processos em comparação com os últimos anos. São números incompatíveis com a estruturação do Poder Judiciário, cujas cortes de vértice são funcionalmente destinadas a dirimir as novas controvérsias nacionais, sem repetição do mesmo labor já realizado nas instâncias ordinárias, sob pena de comprometimento da isonomia, segurança jurídica e razoável duração do processo (CF, art. 5º, caput e LXXVIII).
Assim é que esta Corte Superior, com inspiração na prática já tradicional no Supremo Tribunal Federal, para fins de maior celeridade na formação de precedentes obrigatórios em matérias já conhecidas e sedimentadas, adotou fluxo procedimental (cf. Emenda Regimental n. 7, de 25/11/2024), segundo o qual:
“Art. 132-A. A proposta de afetação do incidente de recurso repetitivo (...) será necessariamente incluída em pauta de sessão virtual e deverá conter o tema a ser afetado.
§ 2º As disposições dos arts. 133 e 134 do Regimento Interno são aplicáveis, no que couber, ao procedimento de afetação do incidente de recurso repetitivo, vedada em qualquer caso a remessa do processo inserido em sessão virtual à sessão presencial, para os fins previstos no caput deste artigo. (...)
§ 5º O julgamento de mérito do incidente de recurso repetitivo, no caso de mera reafirmação de jurisprudência dominante da Corte, também será realizado por meio do Plenário Eletrônico, na mesma sessão virtual que decide sobre a proposta de afetação.
§ 6º Quando designada sessão virtual para afetação de incidente de recursos repetitivos, com proposta de reafirmação de jurisprudência, eventuais sustentações orais quanto ao mérito deverão ser necessariamente juntadas por meio eletrônico, após a publicação da pauta e até 48 horas antes de iniciado o julgamento em ambiente virtual.”
Compete ao Presidente do Tribunal “indicar recurso representativo da controvérsia, dentre aqueles ainda não distribuídos, submetendo-o ao Tribunal Pleno para fins de afetação de IRR (...), inclusive mediante reafirmação de jurisprudência” (RITST, art. 41, XLVII), quando houver “multiplicidade de recursos de revista (...) fundados em idêntica questão de direito, (...) considerando a relevância da matéria ou a existência de entendimentos divergentes entre os Ministros da Subseção ou das Turmas do Tribunal”.
Quanto à multiplicidade de recursos sobre o debate da questão jurídica no Tribunal Superior do Trabalho, a despeito de já estar aqui sedimentado, veja-se que simples consulta ao acervo jurisprudencial do TST, a partir da temática ora em exame, revelou 105 acórdãos e 117 decisões monocráticas, nos últimos 12 meses (pesquisa realizada em 27/03/2025 no sítio www.tst.jus.br).
A relevância da formação de precedente obrigatório sobre o tema se configura justamente pelo fato de que a jurisprudência persuasiva desta Corte não se mostrou, até o presente, suficiente para garantir a unidade do Direito nacional em relação a tal matéria, havendo entendimentos dissonantes nos Tribunais Regionais, os quais ainda fomentam elevada recorribilidade.
RECURSO DE REVISTA REPRESENTATIVO AFETADO COMO INCIDENTE DE RECURSOS REPETITIVOS PARA REAFIRMAÇÃO JURISPRUDÊNCIA. DELINEAMENTO DO CASO CONCRETO SUBMETIDO A JULGAMENTO.
O recurso de revista com agravo ora afetado como incidente de recursos repetitivos foi interposto pela reclamante em face do acórdão proferido pelo Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região, quanto à matéria ora afetada, nos seguintes termos:
2.3.2. INCORPORAÇÃO PROPORCIONAL DAS VERBAS DE GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO E DE REMUNERAÇÃO DE FUNÇÃO DE CONFIANÇA. ANÁLISE EM CONJUNTO COM O RECURSO DO AUTOR
O reclamante alegou na inicial que em 01/03/2009 foi designado para exercer a Função de Confiança de Superintendente Regional, sendo-lhe atribuída a respectiva Gratificação de Função de Confiança - GF XI, bem como a Remuneração de Função de Confiança - RFC, função da qual foi dispensado em 30/04/2020, sendo suprimidas as referidas verbas salariais: gratificação de função - GF XI e remuneração de função de confiança - RFC. Em 04/05/2020 foi designado para exercer a função de confiança de Assistente de Superintendência Regional, sendo-lhe atribuída a gratificação de função de confiança - GF VIII.
Destacou que a dispensa da função de Superintendente Regional ocorreu após o exercício da função gratificada por mais de 10 anos e que tal ato patronal de dispensa lhe impôs severa redução salarial, pois deixou de receber as verbas salariais remuneratórias do exercício desta função de confiança, quais sejam, Gratificação de Função GF XI e Remuneração de Função de Confiança - RFC. Pelo exposto, pediu a incorporação salarial das referidas verbas.
A reclamada defendeu em contestação que apesar de ao longo dos anos regulamentar pela via administrativa a incorporação da gratificação de função, a fim de assegurar o princípio da estabilidade econômica do empregado, por dever legal, em observância às determinações do Ministério da Agricultura, órgão ao qual está vinculada, foi compelida a revogar esta regulamentação, o que ocorreu em 24/02/2015, através da edição da Resolução 06 de 2015. Assim, a partir desta data, não havia mais possibilidade de incorporação proporcional de gratificação pelo exercício de função de confiança.
Destacou ainda que o TCU, em acórdão datado de 21/10/2020, considerou os atos de incorporação de gratificação de função da CONAB, previstos nas reosoluções administrativas, eivados de vício de ilegalidade e incosntitucionalidade desde sua origem.
A sentença reconheceu o direito do reclamante à incorporação porporcional, nos termos da Resolução nº 006/2013, da gratificação de função ao salário, bem como à incorporação proporcional, nos termos da Resolução nº 008/2014, da Remuneração de Função de Confiança - RFC.
Esclareceu ainda em decisão de embargos declaratórios:
Esclareço ser incontroverso que o Reclamante foi designado para o exercício da função de confiança de Superintendente Regional, a partir de 01/03 /2009 (documento ID - a245aba), permanecendo até a 30/04/2020 (documento ID edb7669), recebendo a Gratificação de Função - GF XI e a Remuneração de Função de Confiança - RFC, sendo esta exclusiva para Superintendentes e Gerentes de Área.
Esclareço, ainda, que a Resolução nº 006, de 26/06/2013, editada pela Diretoria Colegiada da CONAB, estabelecia condições para incorporação de Gratificação de Função, prevendo que o empregado do quadro permanente, exonerado por conveniência administrativa da Função de Confiança (gratificada), que a tivesse exercido por períodos contínuos ou não, a contar de 1º/01/1991, teria o direito à incorporação da Gratificação de Função, obedecidos os critérios e a tabela de proporcionalidade; como exemplo, se o tempo de permanência no exercício da função fosse de cinco anos, incorporaria 50%, sete anos, 70%, dez anos ou mais, 100% (ID 2239832). No mesmo documento (ID 2239832) está reproduzida outra Resolução de 24 /02/2015, que revogou a anterior.
Ainda outra Resolução, editada em 22/07/2014 (ID 5eaed6e), e reeditada em 15/08/2014 (ID 5eaed6e), Resolução nº 008/2014, regulamentava a incorporação da Remuneração de Função de Confiança - RFC, indicando proporcionalidades, como exemplo: a percepção por um ano dava direito à incorporação de 10%, dois anos, 20%, três anos, 30% e assim, sucessivamente, até dez anos, 100%. No entanto, pela Resolução 009, de 25/05/2015, foi revogada (ID 5eaed6e).
Desse modo, esclareço, ainda, o julgado para constar o entendimento de fazer jus o Autor à incorporação proporcional, nos termos da Resolução nº 006/2013 (ID 2239832), da Gratificação de Função pelo exercício da função de confiança, assim computada até a data da sua revogação, em 24-02-2015.
Esclareço, ainda, que o Autor, também, faz jus à incorporação proporcional, nos termos da Resolução nº 008/2014 (ID 5eaed6e), da Remuneração de Função de Confiança - RFC, assim computada até a data da sua revogação, em 20-05-2015, data em que entrou em vigor a Resolução nº 009, de 25/05/2015.
[...]
Leia-se para que na sentença (ID 7f340dc) conste os seguintes termos:
"II-2-2-DA INCORPORAÇÃO DA GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO
(...).
Defiro, assim, em parte, os seguintes pedidos:
1. Determinar à EMPRESA RECLAMADA que proceda à incorporação salarial da verba pela via da impostação em folha de pagamento do Obreiro da rubrica GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO INCORPORADA - GI, nos termos da resolução 006/2013, de forma proporcional, inclusive com a compensação da verba salarial GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO VIII - GF VIII, com os reflexos nas demais verbas salariais e direitos e obrigações trabalhistas, fundiárias, previdenciárias e tributária;
2.Determinar à EMPRESA RECLAMADA que proceda à incorporação salarial da verba pela via da impostação em folha de pagamento do Obreiro da rubrica REMUNERAÇÃO DE FUNÇÃO DE CONFIANÇA INCORPORADA - RFC, nos termos da resolução 008/2014, de forma proporcional, com os reflexos nas demais verbas salariais e direitos e obrigações trabalhistas, fundiárias, previdenciárias e tributária;
3.Determinar à EMPRESA RECLAMADA que proceda ao pagamento dos reflexos salariais da incorporação nas demais verbas salariais e direitos trabalhistas, tais como Férias, Adicional de Férias, 13º Salário, Licença Remunerada, bem como Contribuição à Previdência Privada (Cibrius/ConabPrev), Depósitos Fundiários (FGTS), Imposto de Renda, tudo como listado na Ficha Financeira ora anexada (doc. 14), trazendo-as à base de cálculo de remuneração do RECLAMANTE, ao modo e nos termos e efeitos de folha de pagamento.
A reclamada recorre pedindo a reforma da sentença para excluir sua condenação ao pagamento das parcelas decorrentes da incorporação da gratificação de função e da remuneração da função de confiança, reiterando os termos de sua defesa.
O autor, por sua vez, requer a incorporação total das verbas, ou seja, 100% da verba GF-XI e 100% da verba RFC, pois recebidas por mais de 10 anos, conforme previsto em regulamento de pessoal da Empresa (Resoluções nºs. 006/2013 e 008/2014, docs. 12 e 13).
Analiso.
É incontroverso nos autos que a Resolução nº 006/2013 estabelecia condições para incorporação de gratificação de função, prevendo que o empregado do quadro permanente, exonerado por conveniência administrativa da função de confiança, desde que a tenha exercido por períodos contínuos ou não, a contar de 01/01/1991, teria o direito à incorporação da gratificação de função condicionado ao cumprimento dos respectivos pressupostos, observada a proporcionalidade, que poderia chegar a 100%, de acordo com o tempo de exercício da função. A Resolução nº 008/2014, por sua vez, regulamentava a incorporação da remuneração de função de confiança - RFC.
Também é incontroverso que o autor, empregado público da CONAB, no momento da revogação das mencionadas resoluções pelas Resoluções nº 006/2015 e 009/2012 contava com mais de 05 anos ininterruptos no exercício da função de confiança, com recebimento de gratificação e remuneração da função, fazendo jus a incorporação das referidas verbas de forma proporcional, conforme regulamento empresarial da reclamada.
No entanto, em outubro de 2020, decisão do TCU declarou a ilegalidade dos normativos internos da CONAB que estabeleciam o pagamento de gratificação de função e a respectiva incorporação desde sua origem.
Contextualizada a questão, destaco que o art. 7º, inciso VI, da CF prevê a irredutibilidade do salário, salvo o disposto em negociação coletiva. O referido dispositivo constitucional consagra o princípio da irredutibilidade salarial, que busca assegurar ao trabalhador que o seu salário não será reduzido pelo empregador. É uma garantia para o empregado de que as condições de vida a que ele e sua família estão acostumados não serão subitamente alteradas pela redução remuneratória decorrente da supressão de uma parcela habitualmente percebida.
O art. 468, caput, da CLT prevê que a alteração contratual só é lícita se houver consentimento do empregado e não trouxer prejuízos para o trabalhador. Este dispositivo da CLT acolhe o princípio da inalterabilidade contratual lesiva, que veda as alterações contratuais lesivas para o empregado.
Assim, a revogação das resoluções em comento somente poderia alcançar trabalhadores admitidos após a sua supressão, conforme posicionamento pacificado no âmbito do TST, consubstanciado no item I, da Súmula n. 51, que dispõe:
SÚMULA Nº 51 - NORMA REGULAMENTAR. VANTAGENS E OPÇÃO PELO NOVO REGULAMENTO. ART. 468 DA CLT
I - As cláusulas regulamentares, que revoguem ou alterem vantagens deferidas anteriormente, só atingirão os trabalhadores admitidos após a revogação ou alteração do regulamento.
II - Havendo a coexistência de dois regulamentos da empresa, a opção do empregado por um deles tem efeito jurídico de renúncia às regras do sistema do outro
Em situações similares, o Tribunal Superior do Trabalho tem privilegiado a preservação da estabilidade financeira mesmo diante de determinação do Tribunal de Contas pela supressão de rubricas incorporadas ao patrimônio jurídico dos empregados em razão do contrato de trabalho:
(...) RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. CONAB. GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO. INCORPORAÇÃO. SUPRESSÃO POR DETERMINAÇÃO DO TCU. INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 372 DO TST . TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA. Discute-se a supressão de gratificação de função, percebida por mais de dez anos e incorporada ao contrato de trabalho, após determinação do Tribunal de Consta da União, que constatou a existência de irregularidades orçamentárias, na reclamada, ao conceder a rubrica. A causa ostenta transcendência jurídica por não ter sido apreciada por este Tribunal sob o viés proposto nos autos. A respeito da matéria, a Súmula nº 372 desta Corte, dispõe que: "Percebida a gratificação de função por dez ou mais anos pelo empregado, se o empregador, sem justo motivo, revertê-lo a seu cargo efetivo, não poderá retirar-lhe a gratificação tendo em vista o princípio da estabilidade financeira". Em situações similares, Esta Corte tem privilegiado a preservação da estabilidade financeira mesmo diante de determinação do Tribunal de Contas pela supressão de rubricas incorporadas ao patrimônio jurídico dos empregados em razão do contrato de trabalho. Precedentes. Neste contexto, aplica-se a Súmula nº 372, I, desta Corte. Recurso de revista conhecido e provido. ( RR - 11768-42.2020.5.18.0018 , Relator Ministro: Breno Medeiros, Data de Julgamento: 08/06/2022, 5ª Turma , Data de Publicação: DEJT 10/06/2022. Negrito meu.)
"AGRAVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. REGIDO PELA LEI 13.467/2017. PROCEDIMENTO SUMARÍSSIMO. INCORPORAÇÃO DE GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO RECEBIDA POR MAIS DE 6 ANOS. CONTRATO DE TRABALHO FIRMADO ANTES DA LEI 13.767/17. AQUISIÇÃO DO DIREITO EM DECORRÊNCIA DE PREVISÃO EM NORMA REGULAMENTAR. REVOGAÇÃO. ART. 468 DA CLT. SÚMULA 51, I, DO TST. TRANSCENDÊNCIA NÃO RECONHECIDA NA DECISÃO AGRAVADA . 1. Cinge-se a controvérsia em saber se o empregado público teria o direito à incorporação da gratificação de função exercida por mais de seis anos, tendo em vista a revogação da Resolução 010/2010 da CONAB, que estabelecia o referido direito. 2. A CLT, em seu artigo 468, veda a alteração dos contratos individuais de trabalho que resultem em prejuízo ao empregado. Nesse mesmo sentido foi editada a Súmula 51/TST. 3. No caso dos autos, o Tribunal Regional, soberano na análise do conjunto fático-probatório, registrou expressamente que" resulta incontroversa a incorporação administrativa em 60%, datada de 2012, da média ponderada das funções gratificadas exercidas ao longo dos 6 (seis) anos anteriores; igualmente incontroversa a supressão em outubro de 2020, por motivo de revogação das normas regulamentares. "Consignou que," O sistema de incorporação parcial e proporcional de função gratificada, criado por norma interna, em que pese estar sujeito a revogação posterior, consiste em condição benéfica incorporada ao contrato de trabalho. Se o empregado logrou obter administrativamente o direito ao recebimento de gratificação de função incorporada, desde 2012, impõe-se declarar ineficaz a supressão administrativa havida em 2020. Nesse cenário, malgrado a Administração possa rever seus próprios atos, forte na Súmula de nº 473/STF, deve-se respeitar o direito adquirido e o ato jurídico perfeito ( CF, art. 7º, VI; CLT, art. 468; Súmula nº 51/TST; Lei nº 9784/99, art. 54). "Nesse cenário, a revogação não poderia alcançar os trabalhadores anteriormente admitidos, que já haviam preenchido os requisitos para obtenção da vantagem, ante os termos do art. 468 da CLT e da Súmula 51, I, do TST, sob pena de se configurar alteração contratual lesiva . Assim, estando o acórdão regional em conformidade com a Súmula 51, I, do TST, inviável o processamento do recurso de revista. Julgados. Nesse contexto, não afastados os fundamentos da decisão agravada, nenhum reparo enseja a decisão. Agravo não provido, com acréscimo de fundamentação" ( Ag-AIRR-1062-22.2020.5.10.0018, 5ª Turma , Relator Ministro Douglas Alencar Rodrigues, DEJT 28/10/2022. Negrito meu.).
Portanto, entendo que restou configurado o direito do reclamante à incorporação das verbas gratificação de função de confiança e remuneração de função de confiança. No entanto, a incorporação integral pleiteada pelo empregado não apresenta respaldo legal para ser acolhida, uma vez que as Resoluções 06/2013 e 08/2014, que previam as regras de incorporação, foram revogadas em 2015 e, no momento da revogação, o autor não contava com 10 anos de exercício da função. Eventual exercício de função em período posterior à revogação da norma não lhe dá direito à incorporação, pois embora o fenômeno jurídico não alcance o direito adquirido, impede a produção de efeitos futuros.
Nego provimento.
Conforme se verifica da transcrição acima, o acórdão regional registrou a premissa fática de que o autor foi empregado público da CONAB sob a vigência das Resoluções nº 006/2013 e 008/2014, as quais previam a possibilidade de incorporação de verbas correspondentes à gratificação de função – GF e RFC. A revogação desses atos normativos internos foi operada através das Resoluções nº 006/ 2015 e 009/2012, sendo que, na ocasião, o obreiro já percebia a parcela por 5 anos ininterruptos.
Posteriormente, em 21/10/2020, sobreveio acórdão do TCU, o qual considerou que a incorporação era eivada de vícios de inconstitucionalidade e ilegalidade. O Tribunal Regional manteve a sentença impugnada, aduzindo que o direito postulado já havia se incorporado ao patrimônio jurídico do empregado, que faz jus à percepção proporcional da parcela, por aplicação da inteligência do art. 468 da CLT e da Súmula nº 51, I, do TST.
Em sua peça recursal, a Reclamada alega que a declaração de nulidade firmada pelo TCU é dotada de efeitos ex tunc, não se tratando de alteração contratual unilateral e ilícita, de modo que restaria afastada a incidência do art. 468 da CLT e da Súmula 51, I, do TST. Fundamenta o recurso de revista na alegação de ofensa aos artigos 2º, 5º, caput, inciso II, e art. 37, caput, 71 e 169 da Constituição Federal, artigos 468, caput e §2º, da CLT, artigos 114 e 169 do Código Civil, artigo 53 da Lei nº 9.784/99, contrariedade às Súmulas 372 e 51, I, do TST e dissenso jurisprudencial com acórdão do Tribunal Regional da 21ª Região.
Assim delineados os contornos fáticos e jurídicos do caso concreto em julgamento, passo à análise da jurisprudência pacífica desta Corte Superior ora submetida à reafirmação e suas repercussões no julgamento do caso.
REAFIRMAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA PACÍFICA DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO SOBRE A MATÉRIA SUBMETIDA À AFETAÇÃO.
O posicionamento do Tribunal Superior do Trabalho pode ser sintetizado no sentido de que a mudança nos regulamentos internos da CONAB, que garantiam aos seus empregados a incorporação de gratificação de função ao salário, não afeta aqueles que já tinham esse direito garantido, independentemente de decisão do Tribunal de Contas da União pela supressão das referidas rubricas.
Nesse sentido, a jurisprudência de todas as Turmas desta Corte Superior:
AGRAVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. CONAB. GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO. REVOGAÇÃO DA NORMA QUE AUTORIZAVA A INCORPORAÇÃO ADMINISTRATIVA. IRRELEVÂNCIA. INCORPORAÇÃO DEFERIDA EM DECORRÊNCIA DO EXERCÍCIO DA FUNÇÃO POR MAIS DE DEZ ANOS EM PERÍODO ANTERIOR À LEI Nº 13.467/2017. APLICAÇÃO DA SÚMULA Nº 372, I, DO TST. PRECEDENTES DA SBDI-1 DESTA CORTE SUPERIOR. INCIDÊNCIA DO ART. 896, § 7º, DA CLT. TRANSCENDÊNCIA NÃO DEMONSTRADA. 1. Agravo interno interposto em face de decisão monocrática que negou seguimento ao agravo de instrumento interposto pela parte ré. 2. A questão em discussão cinge-se acerca da incorporação da gratificação de função, por exercício de função de confiança por mais de dez anos, antes da vigência da Lei nº 13.467/2017. 3. O Tribunal Regional, soberano na análise e valoração das provas, registrou " o autor foi designado para função de confiança em 1992 e dispensado em 1998 (id d421a55 a d421a55); em 2003 foi novamente designado (id d421a55)”, julgou procedente o pedido de incorporação da gratificação de função percebida pelo autor por mais de dez anos. 4. Prevalece nesta Corte Superior o entendimento segundo o qual, nas hipóteses em que o empregado houver implementado o requisito alusivo à percepção da gratificação de função por dez anos ou mais antes da entrada em vigor da Lei nº 13.467/2017, subsiste aplicável o entendimento fixado na Súmula nº 372, I, do TST, considerando que a lei nova não pode alcançar situações que se consolidaram à luz da legislação anterior onde inexistia o preceito que afasta a possibilidade de incorporação da gratificação. Precedentes da SBDI-1 do TST. 5. Importa esclarecer que a revogação das normas autorizadoras da incorporação administrativa da gratificação ou, até mesmo, a declaração, pelo TCU, de ilegalidade das resoluções, são irrelevantes para o caso em apreço, haja vista que o direito adquirido à incorporação encontra respaldo no entendimento constante da Súmula nº 372 do TST e na estrita observância à garantia constitucional do direito adquirido (art. 5º, XXXVI). 6. Logo, encontrando-se a pretensão recursal ultrapassada pela iterativa, notória e atual jurisprudência deste Tribunal, incide o óbice do art. 896, § 7º, da CLT e da Súmula nº 333 do TST. 7. Assim, confirma-se a decisão agravada que negou seguimento ao agravo de instrumento, porquanto não demonstrada a transcendência do recurso de revista em nenhum dos seus aspectos. Agravo a que se nega provimento (AIRR-0000420-76.2023.5.06.0011, 1ª Turma, Relator Ministro Amaury Rodrigues Pinto Junior, DEJT 19/02/2025).
AGRAVO INTERNO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA – CONAB – GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO – INCORPORAÇÃO – PREVISÃO EM NORMA INTERNA – SUPRESSÃO POSTERIOR – ALTERAÇÃO INDEVIDA. 1. É inviável a supressão de parcela (gratificação de função incorporada) que passou a integrar o contrato de trabalho do reclamante por força de norma regulamentar. 2. A alteração prejudicial do pacto laboral daqueles empregados que já tinham adquirido o direito ao recebimento da gratificação incorporada é vedada expressamente pelo art. 468 da CLT e pela Súmula nº 51, I, do TST. 3. Ressalte-se que a posterior decisão administrativa do Tribunal de Contas da União não alcança o reclamante que recebeu de boa-fé a verba por longo período. O direito à parcela (gratificação de função incorporada) já havia sido agregado ao patrimônio jurídico do autor, devendo ser preservado o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a estabilidade econômica do empregado. Agravo interno desprovido. (Ag-AIRR-1305-49.2022.5.07.0027, 2ª Turma, Relator Ministro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, DEJT 25/10/2024).
AGRAVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. CONAB. INCORPORAÇÃO DA GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO. SUSPENSÃO DO PAGAMENTO POR DECISÃO DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. ALTERAÇÃO CONTRATUAL LESIVA. SÚMULA Nº 51, ITEM I, DO TST. Esta Corte firmou o entendimento de que a percepção de gratificação de função incorporada há mais de dez anos pelos empregados da CONAB, antes do advento do artigo 468, §§ 1º e 2º, da Lei nº 13.467/17, não pode ser suprimida pela empregadora, a despeito da orientação administrativa dada pelo Tribunal de Contas da União (TCU), uma vez que, nessa hipótese, aplica-se o disposto na Súmula nº 372, I, do TST que consagra o princípio da estabilidade financeira, na medida em que a lei nova não pode alcançar situações que se consolidaram sob a égide da legislação anterior. Dessa forma, tal como decidido pelo Regional, as alterações promovidas pela CONAB não têm o condão de alterar situações consolidadas e aderidas ao patrimônio jurídico dos empregados admitidos antes da revogação da norma regulamentar, conforme o disposto no art. 468 da CLT e na Súmula nº 51, item I, do TST. Precedentes da SBDI-1 e de Turmas do TST. Agravo desprovido. (AIRR-0000744-27.2022.5.06.0003, 3ª Turma, Relator Ministro Jose Roberto Freire Pimenta, DEJT 23/08/2024).
AGRAVO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA DA RECLAMADA COMPANHIA NACIONAL DE ABASTECIMENTO CONAB. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. 1. DIREITO À INCORPORAÇÃO DE GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO PROPORCIONAL AO TEMPO DE SERVIÇO NOS TERMOS DA RESOLUÇÃO Nº 006/2013. GRATIFICAÇÃO RECEBIDA POR MAIS DE DEZ ANOS. ÓBICE SÚMULAS Nº 51, I, do TST. ART. 468 DA CLT. DECISÃO MONOCRÁTICA DO RELATOR QUE DENEGA SEGUIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO. NÃO DEMONSTRAÇÃO DO PREENCHIMENTO DOS PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE DO RECURSO DE REVISTA. AUSÊNCIA DE TRANSCENDÊNCIA. CONHECIMENTO E NÃO PROVIMENTO. I. Fundamentos da decisão agravada não desconstituídos. II. Incontroverso nos autos que havia previsão da incorporação da gratificação, na Resolução CONAB nº 0006/2013, a qual foi revogada pela Resolução nº 006/2015, extinguindo o direito à incorporação de gratificações, tendo o Tribunal Regional concluído que, se o direito à incorporação das gratificações exercidas pelos empregados da CONAB foi estabelecido por intermédio de normatização interna, tal direito passou a integrar o contrato de trabalho da Reclamante como cláusula contratual, insuscetível de alteração, de modo que a supressão desse direito conflita com o disposto no art. 468 da CLT. Dessa forma, a decisão regional está em harmonia com a Súmula nº 51, I, desta Corte Superior. III. Agravo de que se conhece e a que se nega provimento, com aplicação da multa de 1% sobre o valor da causa atualizado, em favor da parte Agravada ex adversa, com fundamento no art. 1.021, § 4º, do CPC/2015" (Ag-AIRR-705-03.2019.5.10.0010, 4ª Turma, Relator Ministro Alexandre Luiz Ramos, DEJT 14/06/2024).
(...) RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. CONAB. SUPRESSÃO DE GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO INCORPORADA AO SALÁRIO DO TRABALHADOR. REVOGAÇÃO DA NORMA REGULAMENTAR QUE INSTITUIU O BENEFÍCIO. INCIDÊNCIA DO ART. 468 DA CLT E DA SÚMULA Nº 51, I, DESTA CORTE. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA. A Corte local, mantendo a decisão de origem, indeferiu o pedido da reclamada de supressão da gratificação de função, sob os fundamentos de que “o regramento interno que reconheceu o direito à incorporação de função aderiu ao patrimônio jurídico do autor, nos termos do art. 468 da CLT e da Súmula nº. 51 do C. TST ”. A premissa fática delineada no acórdão regional é no sentido de que o reclamante percebeu gratificação de função por mais de 08 anos e que a referida rubrica, já incorporada ao seu contrato de trabalho antes de 11/11/2017, por força da Resolução Administrativa nº 006/2013, foi suprimida pela reclamada após determinação do Tribunal de Contas da União, que considerou haver irregularidades orçamentárias no pagamento da verba, posto que editada sem dotação orçamentária suficiente e sem autorização do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Nos termos do art. 7º, inciso VI, da Constituição Federal, é direito do trabalhador a irredutibilidade do salário, sendo nula a cláusula que altere o contrato de trabalho em prejuízo do empregado, ante o que estabelece o art. 468 da CLT. A jurisprudência deste TST, cristalizada na Súmula nº 51, I, disciplina, ainda, que “as cláusulas regulamentares, que revoguem ou alterem vantagens deferidas anteriormente, só atingirão os trabalhadores admitidos após a revogação ou alteração do regulamento”. Demais disso, em situações similares, esta Corte tem privilegiado a preservação da estabilidade financeira mesmo diante de determinação do Tribunal de Contas pela supressão de rubricas incorporadas ao patrimônio jurídico dos empregados em razão do contrato de trabalho. Precedentes. Nesse contexto, não há falar em ofensa aos dispositivos invocados, tampouco em contrariedade aos verbetes invocados. O único aresto transcrito, por sua vez, é proveniente de Turma desta Corte, hipótese não contemplada no art. 896, “a”, da CLT. Recurso de revista não conhecido. (RR-0000451-55.2023.5.10.0021, 5ª Turma, Relator Ministro Breno Medeiros, DEJT 18/12/2024).
(...) RECURSO DE REVISTA SOB A ÉGIDE DA LEI 13.467/2017. INCORPORAÇÃO DE GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO. SUPRESSÃO POR DETERMINAÇÃO DO TCU. O Regional, ao afastar a condenação da reclamada para manter o pagamento da gratificação de função ao reclamante, decidiu que "... escorreita é a conduta do empregador que suprimiu a gratificação de função incorporada do autor, eis que lastreada em Resolução administrativa declarada ilegal. Destarte, a ilegalidade denota ausência de direito adquirido e, por conseguinte, demonstra que não houve violação às Súmulas ns. 51, I, 372, I, do TST e aos princípios da irredutibilidade salarial e da estabilidade financeira." (fls. 755). No entanto, a conclusão do TRT não deve prevalecer, porquanto em situações similares, o TST tem entendido dever ser preservada a estabilidade financeira do empregado mesmo diante de determinação do Tribunal de Contas ou do Ministério Público do Trabalho pela supressão de rubricas incorporadas ao patrimônio jurídico dos empregados em razão do contrato de trabalho. Recurso de revista conhecido e provido (RR-811-86.2020.5.23.0003, 6ª Turma, Relator Ministro Augusto Cesar Leite de Carvalho, DEJT 19/04/2024).
AGRAVO INTERNO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO. INCORPORAÇÃO GARANTIDA POR NORMA INTERNA. RESOLUÇÕES DA CONAB REVOGADAS EM CUMPRIMENTO A DECISÃO DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. SUPRESSÃO DO ADICIONAL DE INCORPORAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DO DISPOSTO NA SÚMULA Nº 51, I, DO TST. MATÉRIA PACIFICADA. TRANSCENDÊNCIA. NÃO RECONHECIMENTO. I. Esta Corte Superior, examinando situações idênticas a dos presentes autos, envolvendo a mesma parte reclamada, firmou entendimento de que, nos moldes da Súmula nº 51, I, do TST, a revogação de norma interna que garantia a incorporação de gratificação de função, ainda que em cumprimento a decisão do TCU, não possui o condão de atingir os empregados cujo direito ao benefício já havia se integrado ao seu patrimônio jurídico. II. Portanto, não merece reparos a decisão unipessoal, em que não se reconheceu a transcendência da causa, pois o Tribunal Regional proferiu acórdão em plena conformidade com a jurisprudência dominante do TST. III. Agravo interno de que se conhece e a que se nega provimento. (Ag-AIRR-960-39.2020.5.10.0005, 7ª Turma, Relator Ministro Evandro Pereira Valadão Lopes, DEJT 19/12/2024).
AGRAVO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELA RECLAMADA CONAB NA VIGÊNCIA DA LEI 13.467/2017. INCORPORAÇÃO DA GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 372, I, DO TST. AUSÊNCIA DE TRANSCENDÊNCIA. 1. Nos termos do acórdão recorrido, o valor da função gratificada exercida pelo autor por mais de 10 anos havia sido incorporado integralmente aos seus vencimentos em 2/06/2015, por força da Resolução Administrativa nº 006/2013, a qual, contudo, foi declarada ilegal pelo Tribunal de Contas da União. Todavia, apesar da declaração de ilegalidade da referida resolução, o Tribunal Regional, considerando a demonstração da percepção da gratificação de função por mais de 10 anos, em data anterior à reforma trabalhista, concluiu devido o pagamento ao reclamante pela média das gratificações pagas nos últimos 10 anos. 2. Nesse contexto, a decisão do Tribunal Regional, nos termos em que proferida, revela consonância com o entendimento consubstanciado na Súmula 372, I, do TST de que, percebida a gratificação de função por dez ou mais anos pelo empregado, se o empregador, sem justo motivo, revertê-lo a seu cargo efetivo, não poderá retirar-lhe a gratificação tendo em vista o princípio da estabilidade financeira. 3. Desse modo, o recurso de revista não reúne condições de admissibilidade, devendo ser mantida a decisão agravada. Agravo conhecido e não provido. (AIRR-0011430-71.2020.5.18.0017, 8ª Turma, Relatora Ministra Delaide Alves Miranda Arantes, DEJT 26/09/2024).
A despeito da uniformização da jurisprudência no âmbito do Tribunal Superior do Trabalho, verificou-se que ainda remanescem recentes divergências nos Tribunais Regionais quanto ao tema, conforme se infere das seguintes ementas:
“CONAB. SUPRESSÃO DAS GRATIFICAÇÕES DE FUNÇÃO INCORPORADAS. Esta Turma julgadora entende que não é possível a manutenção do pagamento das gratificações de funções incorporadas aos salários dos empregados da CONAB tendo em vista a ilegalidade das normas internas que previram o direito à incorporação, prevalecendo, no caso, o interesse público sobre o privado. Ademais, a supressão do pagamento decorreu de cumprimento de decisão do TCU, não se tratando de liberalidade da empregadora, o que afasta a aplicação do art. 468 da CLT” (Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (06ª Turma). Acórdão: 0010048-44.2021.5.03.0108. Relator(a): Paulo Emilio Vilhena da Silva. Data de julgamento: 27/10/2021. Juntado aos autos em 10/11/2021. Disponível em:
“Incorporação de gratificação de função - Resolução CONAB nº 006/2013 - Declaração de ilegalidade pelo TCU - Pedido indevido. No processo TC 005.903/2015-7, o TCU declarou a ilegalidade dos normativos internos da CONAB que estabeleciam o pagamento de gratificação de função e a respectiva incorporação, dentre eles a Resolução CONAB nº 006/2013, a qual constituía a causa de pedir. Em vista do que, deve-se fazer respeitar a decisão do Tribunal de Contas da União, haja vista que a reclamada não pode deixar de cumpri-la e, assim, evidentemente, a revogação da sua Resolução nº 006/2013, atende ao princípio da legalidade e, por conseguinte, a obrigação patronal de incorporar a gratificação de função deixou de existir na jurídica, não podendo ser acolhido o pedido da autora. Recurso provido” (Tribunal Regional do Trabalho da 21ª Região (Primeira Turma de Julgamento). Acórdão: 0000748-40.2019.5.21.0007. Relator(a): JOSÉ BARBOSA FILHO. Data de julgamento: 17/12/2019. Juntado aos autos em 19/12/2019. Disponível em:
O TRT da 18ª Região submeteu a julgamento a questão ora debatida no IRDR 0010645-29.2021.5.18.0000, em que se fixou a seguinte tese jurídica contrária ao entendimento pacificado no âmbito do TST:
CONAB. INCORPORAÇÃO DE GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO AO SALÁRIO. (RESOLUÇÕES ADMINISTRATIVAS Nº 10/2010, 11/2010, 6/2013 e 14/2013). SUPRESSÃO. LEGALIDADE. 1. Inexiste lei que assegure aos empregados da CONAB o direito à incorporação de função gratificada exercida por 5 ou mais anos, na forma prevista nas Resoluções Administrativas nº 10/2010, 11/2010, 6/2013 e 14/2013. 2. As resoluções administrativas da CONAB que instituíram a incorporação foram declaradas ilegais pelo Tribunal de Contas da União em cumprimento estrito do seu poder-dever constitucional de controlar/fiscalizar atos dos quais resultem despesas, incluídos neste controle os entes da administração indireta que recebam recursos oriundos da união, caso da CONAB. Portanto, tais atos são incapazes de gerar direitos (súmula 473/STF). 3. O ato de supressão das incorporações levado a efeito pela CONAB por força da decisão do TCU não importa em afronta a qualquer dispositivo legal ou constitucional, ao revés, atende ao ordenamento jurídico vigente. 4. Indevida a incorporação de função gratificada pretendida pelos empregados da empresa pública federal com suporte nas Resoluções Administrativas Nº 10/2010, 11/2010, 6/2013 e 14/2013. 5. A tese ora fixada não abrange a discussão sobre eventual direito à manutenção de gratificação de função fundada nos termos da Súmula 372 do TST” (Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região. INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS. Tema nº 21. Processo: 0010645-29.2021.5.18.0000. Relator(a): DANIEL VIANA JUNIOR. Data de julgamento: 13/12/2022. Publicado em 23/01/2023. Disponível em:
Feitos tais registros, verifico que o representativo definido para alçar o tema a debate foi interposto em face de acórdão do Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região. Válido ressaltar que o referido Regional adotou entendimento deste C. Tribunal Superior do Trabalho e decidiu que a revogação das resoluções da CONAB somente alcançaria trabalhadores admitidos após a sua supressão, respeitado o direito adquirido, conforme entendimento pacificado pela Súmula 51, I, do TST (p.1142 do Pje):
RECURSO ORDINÁRIO. INCORPORAÇÃO DE GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO. Não há controvérsia quanto ao fato de que a Resolução 006/2013 estabelecia condições para incorporação de gratificação de função, prevendo que o empregado do quadro permanente, exonerado de função de confiança por conveniência administrativa, desde que a tenha exercido por períodos contínuos ou não a partir de 01/01/1991, teria o direito à incorporação da gratificação de função condicionado ao cumprimento dos respectivos pressupostos e observada a proporcionalidade, que poderia chegar a 100%, de acordo com o tempo de exercício da função. A Resolução 008/2014, por sua vez, regulamentava a incorporação da remuneração de função de confiança - RFC. Assim, respeitados os direitos adquiridos, a revogação dessas resoluções alcançaria trabalhadores admitidos após a sua supressão, conforme posicionamento pacificado pela Súmula 51, I, do TST.
De tal v. acórdão foi interposto recurso de revista, cuja decisão de admissibilidade destacou a divergência jurisprudencial no âmbito dos Tribunais Regionais do Trabalho (pp.1342/1343 do Pje):
Tendo a C. Turma decidido que a revogação das resoluções em comento somente poderia alcançar trabalhadores admitidos após a sua supressão, conforme posicionamento pacificado no âmbito do TST, consubstanciado no item I, da Súmula n. 51, mesmo diante de determinação do Tribunal de Contas pela supressão de rubricas incorporadas ao patrimônio
jurídico dos empregados em razão do contrato de trabalho, verifica-se que a parte recorrente demonstrou aparente divergência jurisprudencial apta a ensejar o conhecimento do recurso de revista, por meio da ementa proveniente do Tribunal Regional do Trabalho da 21ª Região (Processo nº ROT 0000748- 40.2019.5.21.0007), o que viabiliza o recurso, nos termos da alínea "a" do artigo 896, da CLT.
Nesse sentido, demonstrado que a jurisprudência pacífica desta Corte encontra resistência nas instâncias ordinárias – inclusive com decisão em sede de Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas em sentido diverso –, e ainda enseja elevada recorribilidade, forçoso admitir a necessidade de uniformizar a matéria, por meio do presente Incidente de Recurso de Revista, para reafirmação da jurisprudência, nos termos do § 5º do art. 132-A do Regimento Interno do TST:
“Art. 132-A. A proposta de afetação do incidente de recurso repetitivo (...) será necessariamente incluída em pauta de sessão virtual e deverá conter o tema a ser afetado.
§ 5º O julgamento de mérito do incidente de recurso repetitivo, no caso de mera reafirmação de jurisprudência dominante da Corte, também será realizado por meio do Plenário Eletrônico, na mesma sessão virtual que decide sobre a proposta de afetação.”
A atuação qualificada e célere do Tribunal Superior do Trabalho sob o rito dos recursos repetitivos converge para sua finalidade precípua como Corte de precedentes – ainda com mais razão nestes casos em que já produziu jurisprudência pacificada sobre a matéria, bastando que haja sua reafirmação sob rito destinado à conversão em precedente obrigatório, de modo a evitar a divergência de julgamentos nas instâncias ordinárias.
Como já mencionado, a posição consolidada do Tribunal Superior do Trabalho é no sentido de que a mudança nos regulamentos internos da CONAB, que garantiam aos seus empregados a incorporação de gratificação de função ao salário, não afeta aqueles que já tinham esse direito garantido, independentemente de decisão do Tribunal de Contas da União pela supressão das referidas rubricas.
A matéria discutida no recurso de revista diz respeito a definir se é válida a supressão da incorporação de gratificação de função ao salário do trabalhador da Companhia Nacional de Abastecimento - CONAB, nos casos de revogação da norma regulamentar que instituiu o benefício, em cumprimento de decisão do Tribunal de Contas da União.
A Constituição da República assegura em seu art. 7º, inciso VI, o direito dos trabalhadores urbanos e rurais, à irredutibilidade salarial (salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo). Ademais, a Consolidação das Leis do Trabalho dispõe em seu artigo 468 acerca da alteração dos contratos de trabalho e dispõe da seguinte forma:
Art. 468 - Nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda assim desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia.
Ainda no que se refere à temática, relevante ainda mencionar as Súmulas nº 51, I e nº 372, I dessa C. Corte, com esteio na garantia constitucional.
A interpretação conjunta dos preceitos citados, acrescidos ao princípio da boa-fé e da estabilidade econômica do empregado, leva ao entendimento de que a supressão da referida parcela viola o direito adquirido e o ato jurídico perfeito.
No caso em exame, o recurso de revista de que trata o tema afetado para representativo de controvérsia não merece ser conhecido, em razão do óbice definido no art. 896, §7º, da CLT e na Súmula nº 333 do TST, pois o dissenso não está demonstrado, uma vez superado o entendimento conflitante por iterativa e notória jurisprudência desta C. Corte.
Assim, do julgamento do caso concreto afetado, extrai-se a reafirmação da mesma ratio decidendi antes firmada nos julgamentos das Turmas transcritos acima, cuja tese pode ser fixada nos seguintes termos:
A alteração nos regulamentos internos da CONAB, que garantiam aos seus empregados a incorporação de gratificação de função ao salário, não afeta os empregados que já tinham esse direito adquirido, independentemente de decisão do Tribunal de Contas da União pela supressão das referidas rubricas.
Quanto aos demais temas recursais listados no relatório, determina-se a redistribuição a uma das Turmas desta Corte, na forma regimental.
ISTO POSTO
ACORDAM os Ministros do Tribunal Pleno do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade: I – Acolher a proposta de afetação do incidente de recurso de revista, para reafirmar a jurisprudência deste Tribunal, quanto à matéria, fixando a seguinte tese obrigatória para o presente Incidente de Recursos Repetitivos: A alteração nos regulamentos internos da CONAB, que garantiam aos seus empregados a incorporação de gratificação de função ao salário, não afeta os empregados que já tinham esse direito adquirido, independentemente de decisão do Tribunal de Contas da União pela supressão das referidas rubricas. II – Não conhecer do recurso de revista no tema objeto do representativo por incidência do óbice definido no art. 896, §7º, da CLT e na Súmula nº 333 do TST. III – Determinar a redistribuição a uma das Turmas desta Corte, na forma regimental, para fins do julgamento dos temas remanescentes.
Brasília, 28 de abril de 2025..
ALOYSIO SILVA CORRÊA DA VEIGA
Ministro Presidente do TST