A C Ó R D Ã O
Tribunal Pleno
GPACV/rsb/rdc
PROPOSTA DE AFETAÇÃO EM INCIDENTE DE RECURSOS REPETITIVOS. TRABALHO EM MINAS DE SUBSOLO. INTERVALO INTRAJORNADA. COMPATIBILIDADE DO ART. 71 COM A PAUSA DO ART. 298 DA CLT. Diante da multiplicidade de recursos de revista fundados em idêntica questão de direito, a relevância da matéria e ausência de jurisprudência uniforme entre as Turmas do TST, torna-se necessária a afetação do incidente de recursos de revista repetitivos, a fim de dirimir a seguinte questão jurídica: No caso de labor em minas no subsolo em que a duração de trabalho efetivo exceda seis horas diárias ou trinta e seis semanais, o intervalo especial previsto no art. 298 da CLT impede a incidência da regra geral do art. 71 da CLT? Incidente de recursos repetitivos admitido.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista nº TST- RR - 0000280-28.2023.5.05.0251 , em que é RECORRENTE FAZENDA BRASILEIRO DESENVOLVIMENTO MINERAL LTDA e é RECORRIDO PEDRO SILVA DA CRUZ .
Trata-se de proposta de afetação de recurso, apresentada pela Presidência do Tribunal Superior do Trabalho, em face de tema ainda não pacificado, nos termos do art. 896-C da CLT.
É o relatório.
V O T O
AFETAÇÃO DO RECURSO DE REVISTA AO REGIME DE RECURSOS REPETITIVOS – CASO EM EXAME
A matéria discutida no recurso de revista diz respeito a definir se, para o labor em minas no subsolo em que a duração de trabalho efetivo exceda seis horas diárias ou trinta e seis semanais, o intervalo especial previsto no art. 298 da CLT impediria a incidência da regra geral do art. 71 da CLT.
Estabelece a Consolidação das Leis do Trabalho, em seus artigos 293 a 301, disposições específicas sobre duração e condições de trabalho em minas de subsolo:
Art. 293 - A duração normal do trabalho efetivo para os empregados em minas no subsolo não excederá de 6 (seis) horas diárias ou de 36 (trinta e seis) semanais.
Art. 294 - O tempo despendido pelo empregado da boca da mina ao local do trabalho e vice-versa será computado para o efeito de pagamento do salário.
Art. 295 - A duração normal do trabalho efetivo no subsolo poderá ser elevada até 8 (oito) horas diárias ou 48 (quarenta e oito) semanais, mediante acordo escrito entre empregado e empregador ou contrato coletivo de trabalho, sujeita essa prorrogação à prévia licença da autoridade competente em matéria de higiene do trabalho.
Parágrafo único - A duração normal do trabalho efetivo no subsolo poderá ser inferior a 6 (seis) horas diárias, por determinação da autoridade de que trata este artigo, tendo em vista condições locais de insalubridade e os métodos e processos do trabalho adotado.
Art. 296 - A remuneração da hora prorrogada será no mínimo de 25% (vinte e cinco por cento) superior à da hora normal e deverá constar do acordo ou contrato coletivo de trabalho.
Art. 297 - Ao empregado no subsolo será fornecida, pelas empresas exploradoras de minas, alimentação adequada à natureza do trabalho, de acordo com as instruções estabelecidas pelo Serviço de Alimentação da Previdência Social e aprovadas pelo Ministério do Trabalho, Industria e Comercio.
Art. 298 - Em cada período de 3 (três) horas consecutivas de trabalho, será obrigatória uma pausa de 15 (quinze) minutos para repouso, a qual será computada na duração normal de trabalho efetivo.
Art. 299 - Quando nos trabalhos de subsolo ocorrer acontecimentos que possam comprometer a vida ou saúde do empregado, deverá a empresa comunicar o fato imediatamente à autoridade regional do trabalho, do Ministério do Trabalho, Industria e Comercio.
Art. 300 - Sempre que, por motivo de saúde, for necessária a transferência do empregado, a juízo da autoridade competente em matéria da segurança e da medicina do trabalho, dos serviços no subsolo para os de superfície, é a empresa obrigada a realizar essa transferência, assegurando ao transferido a remuneração atribuída ao trabalhador de superfície em serviço equivalente, respeitada a capacidade profissional do interessado.
Parágrafo único - No caso de recusa do empregado em atender a essa transferência, será ouvida a autoridade competente em matéria de higiene e segurança do trabalho, que decidirá a respeito.
Art. 301 - O trabalho no subsolo somente será permitido a homens, com idade compreendida entre 21 (vinte e um) e 50 (cinqüenta) anos, assegurada a transferência para a superfície nos termos previstos no artigo anterior.
A partir do disposto nos dispositivos acima transcritos, surgiram duas principais correntes acerca da aplicabilidade do intervalo do artigo 71 da CLT: a primeira, no sentido de as regras especiais da CLT para o trabalho em minas de subsolo afastariam a aplicação da regra geral do art. 71; a segunda, no sentido de que a regra especial não afastou a regra geral do art. 71 da CLT, fazendo jus o empregado a ambos os intervalos caso a jornada exceda seis horas de duração.
No caso em exame, o Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região registrou a premissa fática de que o reclamante foi admitido em 06/06/2006 e dispensado sem justa causa no dia 01/12/2021; que o reclamante laborava em minas de subsolo em regime de turno ininterrupto de revezamento, com uma jornada média de 8 horas; que havia autorização de norma coletiva para turnos de revezamento de oito horas; que “pelo depoimento das testemunhas, não há como concluir que o labor do reclamante se limitava a 06 (seis) horas dentro da mina”; e que os cartões de ponto acostados pela reclamada “registram intervalo de 15 minutos”. Ao final, entendeu o Regional pela aplicabilidade do art. 71 da CLT ao caso e determinou o pagamento do “valor correspondente à supressão parcial de cada intervalo intrajornada (45 minutos), com acréscimo de 50%, não integrativo do salário”, observada a prescrição pronunciada na sentença.
No recurso de revista, a reclamada sustenta que o Regional não levou em consideração o tempo destinado a deslocamento da boca da mina ao local do trabalho e vice-versa, não devendo esse lapso temporal ser considerado para fins de jornada efetiva, mas apenas para salário; que o trabalhador de minas de subsolo se submete a tratamento legal especial, o que afastaria a aplicação da regra geral do art. 71 da CLT; e que as disposições específicas para o trabalhador de minas de subsolo são mais benéficas. Fundamenta o recurso de revista na alegação de ofensa ao art. 5º, II, da CF/1988, aos arts. 57, 71, 293, 294 e 298 da CLT e ao art. 114 do CC e em divergência jurisprudencial.
Assim delineada a controvérsia, passo à análise dos requisitos para afetação do presente caso ao regime de incidente de recursos de revista repetitivos, o que faço com fundamento no art. 41, XXXVIII, do RITST.
MULTIPLICIDADE DE RECURSOS DE REVISTA FUNDADOS EM IDÊNTICA QUESTÃO DE DIREITO
Os requisitos legais para a instauração do incidente de recursos repetitivos estão previstos no art. 896-C, caput , da CLT, segundo o qual “ Quando houver multiplicidade de recursos de revista fundados em idêntica questão de direito , a questão poderá ser afetada à Seção Especializada em Dissídios Individuais ou ao Tribunal Pleno, por decisão da maioria simples de seus membros, mediante requerimento de um dos Ministros que compõem a Seção Especializada, considerando a relevância da matéria ou a existência de entendimentos divergentes entre os Ministros dessa Seção ou das Turmas do Tribunal . ” (destaquei).
No que diz respeito ao requisito da multiplicidade de recursos de revista em que se discute a mesma questão de direito do presente caso, verifica-se que, em pesquisa jurisprudencial realizada em 23/06/2025 , no sítio eletrônico deste tribunal, adotando-se como critério de busca as expressões “subsolo” e “art. 71” , foram localizados, nos últimos 24 meses, 65 acórdãos e 416 decisões monocráticas.
RELEVÂNCIA DA MATÉRIA E DIVERGÊNCIA DE ENTENDIMENTOS ENTRE AS TURMAS
O tema de fundo diz respeito à aplicabilidade do art. 71 da CLT aos empregados de minas de subsolo quando a duração normal do trabalho efetivo em minas no subsolo ultrapasse seis horas diárias cuja relevância decorre da necessidade de sanear a insegurança quanto às diferentes interpretações existentes acerca do tema.
A controvérsia é bastante conhecida e reiteradamente levada à apreciação desta Corte Superior, com expressivo número de demandas já julgadas e ainda em curso na Justiça do Trabalho.
Além disso, a ausência de jurisprudência uniforme entre as Turmas desta Corte incentiva a recorribilidade e propicia o surgimento de entendimentos dissonantes entre os Tribunais Regionais do Trabalho, o que torna relevante a pacificação do tema, como precedente qualificado, nos termos do art. 926 do CPC.
Cito, a título de exemplo, os seguintes julgados divergentes de Tribunais Regionais:
TRABALHADOR EM MINA DE SUBSOLO INTERVALO DO ART. 298/CLT. CUMULAÇÃO COM O INTERVALO DO ART. 71/CLT. POSSIBILIDADE. O intervalo do art. 298/CLT tem natureza diversa daquele preconizado no art. 71/CLT e, com ele não se confunde, não podendo ser usado para substituí-lo, tratando-se de pausas necessárias para descanso em decorrência da atividade, indubitavelmente nociva à saúde do trabalhador (minas de subsolo). A pausa do art. 298/CLT é computada na duração do trabalho, ao contrário do intervalo do art. 71/CLT (conforme consta em seu § 2º). Portanto, admitida a cumulação dos intervalos do art. 71 e 298, ambos da CLT . ( TRT 3ª Região (01ª Turma). Acórdão: 0010336-05.2019.5.03.0094. Relator(a): Adriana Goulart de Sena Orsini. Data de julgamento: 14/11/2022).
INTERVALO INTRAJORNADA. TRABALHO EM MINA DE SUBSOLO. Inexistindo norma especial que discipline o tempo de intervalo para o trabalhador em mina de subsolo que se ative em jornada em turnos ininterruptos de revezamento de 08 horas, nada impede a aplicação do art. 71 da CLT . Apelo desprovido. ( TRT 5ª Região (03ª Turma). Acórdão: 0000583-08.2024.5.05.0251. Relator(a): DALILA NASCIMENTO ANDRADE. Data de julgamento: 13/06/2025).
TRABALHO EM MINA DE SUBSOLO. INTERVALO INTRAJORNADA. ART. 71 DA CLT. A jurisprudência majoritária do C. TST adota o entendimento de que o labor em mina de subsolo é disciplinado por regras especiais, que afastam a aplicação da norma geral de duração do trabalho relativa à obrigatoriedade da concessão do intervalo de uma hora para repouso e alimentação dos empregados que cumprem jornada superior a seis horas . Precedentes da Eg. SBDI-I. Recurso da reclamada a que se dá provimento, nesse ponto. ( TRT 18ª Região (02ª Turma). Acórdão: 0010827-57.2022.5.18.0201. Relator(a): PLATON TEIXEIRA DE AZEVEDO FILHO. Data de julgamento: 03/08/2023).
TRABALHO EM MINA DE SUBSOLO - REGRAMENTO ESPECIAL - INTERVALO INTRAJORNADA DO ART. 298, DA CLT - NÃO INCIDÊNCIA DO ART. 71, CAPUT, DA NORMA CONSOLIDADA - MANUTENÇÃO DO DECISUM. Conforme jurisprudência do C.TST , não se aplica o regramento geral previsto no art. 71, da CLT, que trata do intervalo intrajornada, aos empregados que trabalham em minas de subsolo, pois esses trabalhadores são regidos por normas especiais de duração de trabalho . Recurso improvido. ( TRT 20ª Região (01ª Turma). Acórdão: 0000300-14.2021.5.20.0011. Relator(a): VILMA LEITE MACHADO AMORIM. Data de julgamento: 31/01/2023).
Com efeito, há entendimentos divergentes entre Turmas do Tribunal , eis que se verificam 6 Turmas decidindo no sentido de que o trabalhador em minas de subsolo, por estar sujeito à regra específica do art. 298 da CLT, não faz jus ao intervalo previsto na regra geral do art. 71, caput , da CLT, sendo vedada a percepção cumulada dos dois intervalos, mesmo quando ultrapassada a jornada de seis horas de trabalho diária. Nesse sentido:
"[...]. RECURSO DE REVISTA. INTERPOSIÇÃO NA VIGÊNCIA DA LEI N.º 13.467/2017. TRABALHO EM MINAS DE SUBSOLO. CUMULAÇÃO DO INTERVALO DO ART. 71 COM O INTERVALO DO ART. 298 DA CLT. IMPOSSIBILIDADE. TRANCENDÊNCIA POLÍTICA. Cinge-se a questão controvertida a examinar o direito do trabalhador em minas de subsolo à cumulação do intervalo do art. 298 da CLT (quinze minutos de intervalo a cada 3 horas consecutivas de trabalho, computados na jornada de trabalho) com o intervalo intrajornada previsto no art. 71, caput , da CLT. Em conformidade com o entendimento desta Corte, o trabalhador em minas de subsolo, por estar sujeito à regra específica do art. 298 da CLT, não faz jus ao intervalo previsto na regra geral do art. 71, caput , da CLT, sendo, portanto, vedada a percepção cumulada dos dois intervalos, mesmo quando ultrapassada a jornada de seis horas de trabalho diária . Recurso de Revista conhecido e provido" (RR-1141-53.2019.5.05.0251, 1ª Turma , Relator Ministro Luiz Jose Dezena da Silva, DEJT 17/06/2025).
"[...]. RECURSO DE REVISTA. APELO INTERPOSTO APÓS A VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. TRABALHO EM MINAS DE SUBSOLO. INTERVALO INTRAJORNADA. PRORROGAÇÃO HABITUAL DA JORNADA DE 6 HORAS. INAPLICABILIDADE DO ART. 71 DA CLT. A jurisprudência desta 2ª Turma havia se consolidado no sentido de que a previsão contida no art. 298 da CLT não impedia a incidência da regra geral do art. 71 da CLT, no que tange aos trabalhadores de minas de subsolo, caso ultrapassada a jornada de seis horas de trabalho (Súmula 437, IV, desta Corte). Todavia, o julgamento do E-ARR-11325-32.2017.5.18.0201, de relatoria do Ministro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho (DEJT 28/07/2023), pela Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, determinou o overruling do entendimento desta Turma para considerar que mesmo nos casos em que caracterizados horas extras habituais e desrespeito ao intervalo intrajornada, a aplicação do art. 71 da CLT não é devida. Nessa ocasião, a SDI-1 ponderou que a regra especial do art. 298 da CLT, com previsão de dois intervalos, sendo um após as três primeiras horas e o outro após as seis horas, reduz a permanência do trabalhador no subsolo e, por isso, é mais benéfico e eficaz quanto ao seu objetivo de minimizar os riscos à saúde do empregado e a sua exposição a agentes nocivos. Diante disso, entendeu válida a interpretação de que o legislador afastou a aplicação das disposições gerais do art. 71 da CLT ao conferir regramento específico aos trabalhadores em minas de subsolo (art. 298 da CLT). Recurso de revista conhecido e provido" (RR-Ag-1572-19.2016.5.20.0011, 2ª Turma , Relatora Ministra Liana Chaib, DEJT 18/06/2025).
"[...]. 2. INTERVALO INTRAJORNADA. MINAS DE SUBSOLO. ÓBICE DA SÚMULA 333 DO TST. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA. CONHECIMENTO E PROVIMENTO. I. A controvérsia diz respeito ao período de deslocamento dos trabalhadores em mina de subsolo, de ida e volta, entre a boca da mina e a frente da lavra, se devia ser computado na jornada de trabalho para efeito de concessão de intervalo intrajornada previsto no art. 71, caput , da CLT. O Regional entendeu que, para os trabalhadores em minas de subsolo, o tempo de trabalho efetivo inclui o tempo de deslocamento da boca da mina até o subsolo e vice-versa, e, apesar de registrar que a jornada era de 6 horas, concluiu que o reclamante tem direito ao intervalo intrajornada, devido ao tempo gasto com atos preparatórios, antes e depois da jornada. II. A jurisprudência desta Corte é no sentido de que o trabalhador em minas de subsolo, por estar sujeito à regra específica prevista no art. 298 da CLT, não faz jus ao intervalo previsto na regra geral do art. 71, caput, da CLT, mesmo quando ultrapassada a jornada de seis horas de trabalho . III. Desse modo, a Corte Regional decidiu em dissonância com o entendimento do TST. IV. Demonstrado o desacerto da decisão recorrida, deve ser reconhecida a transcendência política da causa. V. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento" (RR-12264-46.2016.5.18.0201, 4ª Turma , Relator Ministro Alexandre Luiz Ramos, DEJT 06/06/2025).
"[...]. III. RECURSO DE REVISTA. REGIDO PELA LEI 13.467/2017. TRABALHO EM MINA DE SUBSOLO. JORNADA SUPERIOR A SEIS HORAS. INTERVALO INTRAJORNADA. ART. 71 DA CLT. INAPLICABILIDADE. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA RECONHECIDA. Caso em que o Tribunal Regional entendeu ser devido o pagamento de 1 hora diária decorrente da supressão do intervalo intrajornada, destacando que havia extrapolação da jornada diária de seis horas. Ocorre que tal entendimento é dissonante da decisão do Tribunal Pleno desta Corte proferida no julgamento do E-ED-RR-909-46.2011.5.20.0011, no qual prevaleceu a tese de que as regras especiais dos artigos 293, 294 e 298 da CLT, a respeito da duração do trabalho em minas de subsolo, afastam a aplicação do intervalo intrajornada do artigo 71 da CLT. Precedentes da SBDI-1 e julgados de Turmas desta Corte Superior. Demonstrada a contrariedade à jurisprudência consolidada desta Corte Superior, resta caracterizada a transcendência política do debate proposto, o que viabiliza o conhecimento do recurso de revista. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-0001009-25.2021.5.05.0251, 5ª Turma , Relator Ministro Douglas Alencar Rodrigues, DEJT 23/06/2025).
"[...]. 2. TRABALHO EM MINAS DE SUBSOLO. INTERVALO INTRAJORNADA. ART. 71 DA CLT. INAPLICÁVEL. NORMA ESPECIAL. ART. 298 DA CLT. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA. RECONHECIMENTO. I. Conforme decidido pela Subseção I Especializada em Dissídios Individuais por ocasião do julgamento do processo TST-E-ARR-11325-32.2017.5.18.0201, a CLT conferiu tratamento especial aos trabalhadores em minas de subsolo, sendo inaplicável o art. 71 da CLT, ante a norma especial do art. 298 da CLT, que prevê um intervalo intrajornada mais benéfico . II. No caso vertente, o Tribunal Regional entendeu pela aplicação do art. 71 da CLT ao trabalhador em minas de subsolo. III. A decisão do Tribunal Regional encontra-se em dissonância com o entendimento desta Corte Superior. IV. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento" (RRAg-747-68.2016.5.12.0053, 7ª Turma , Relator Ministro Evandro Pereira Valadao Lopes, DEJT 23/05/2025).
"[...]. III - RECURSO DE REVISTA - REGÊNCIA PELA LEI Nº. 13.467/2017 - TRABALHO EM MINAS DE SUBSOLO - CUMULAÇÃO DO INTERVALO DO ART. 71 DA CLT COM O INTERVALO DO ART. 298 - IMPOSSIBILIDADE. Nos termos do entendimento desta Corte, o trabalhador em minas de subsolo, por estar sujeito à regra específica prevista no art. 298 da CLT, não faz jus ao intervalo previsto na regra geral do art. 71, caput , da CLT, sendo, portanto, vedada a percepção cumulada dos dois intervalos, mesmo quando ultrapassada a jornada de seis horas de trabalho . Precedentes. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-10861-37.2019.5.18.0201, 8ª Turma , Relator Ministro Sergio Pinto Martins, DEJT 11/02/2025).
No mesmo sentido, a SDI-I e o Pleno já decidiram:
"EMBARGOS INTERPOSTOS SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 13.467/2017 - TRABALHADOR EM MINAS DE SUBSOLO - INTERVALO INTRAJORNADA - ART. 71 DA CLT - INAPLICABILIDADE. 1. A controvérsia submetida a exame nestes embargos consiste em definir se os empregados de minas de subsolo têm direito ao intervalo intrajornada previsto no art. 71, caput , da CLT, caso extrapolada a jornada de trabalho de seis horas. 2. A CLT conferiu tratamento especial aos trabalhadores em minas de subsolo (arts. 293 e seguintes), cujas condições de trabalho são nocivas à saúde e de elevado risco, pretendendo que o tempo de permanência no interior da mina fosse o menor possível . 3. Na parte especial, exauriu a matéria relativa aos intervalos intrajornada, afastando a aplicação da parte geral (art. 71 da CLT), ao impor a concessão de pausas de quinze minutos a cada período de três horas de trabalho ininterrupto, com o cômputo desses intervalos na jornada de trabalho (art. 298) . 4. Esse entendimento foi adotado no julgamento do processo E-ED-RR-909-46.2011.5.20.0011 pelo Tribunal Pleno, que, em sessão realizada no dia 20/5/2019, concluiu, por maioria, pelo provimento do recurso de embargos da reclamada para restabelecer a decisão regional que afastou a condenação decorrente da inobservância do intervalo intrajornada de uma hora. 5. Na ocasião, foi examinada a questão da aplicabilidade do art. 71 da CLT aos trabalhadores de minas de subsolo, tendo sido registrado que esse dispositivo é inaplicável, ante a norma especial do art. 298 da CLT, que prevê um intervalo intrajornada mais benéfico, de quinze minutos a cada três horas de labor, computado na duração normal do trabalho efetivo, e cujo objetivo é minimizar os riscos à saúde do empregado e a sua exposição a agentes nocivos, reduzindo sua permanência em subsolo (informativo TST nº 196). Recurso de embargos conhecido e provido" (E-ARR-11325-32.2017.5.18.0201, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais , Relator Ministro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, DEJT 28/07/2023).
"EMBARGOS - TRABALHO EM MINA DE SUBSOLO - TURNO ININTERRUPTO DE REVEZAMENTO DE 6 (SEIS) HORAS - JORNADA DE TRABALHO - DESLOCAMENTO DA BOCA DA MINA AO LOCAL DE TRABALHO - INTERVALO INTRAJORNADA - PROVIMENTO DO APELO. 1. Os arts. 293, 294 e 298 da CLT dispõem que a duração normal do trabalho efetivo para os empregados em minas no subsolo não excederá de 6 (seis) horas diárias, sendo que o tempo despendido pelo empregado da boca da mina ao local de trabalho e vice-versa será computado para efeito de pagamento do salário, com direito, em cada período de três horas consecutivas de trabalho, a uma pausa de quinze minutos para repouso, computada na duração normal de trabalho efetivo. 2. A 1ª Turma desta Corte conheceu do recurso de revista obreiro, por contrariedade à Súmula 437, IV, do TST e, no mérito, deu-lhe provimento para condenar a Reclamada ao pagamento do intervalo intrajornada não usufruído, acrescido do adicional de 50%, com reflexo nas demais parcelas, ao fundamento de que a partir do momento em que o trabalhador adentra a boca da mina ele já se encontra à disposição do empregador, devendo o tempo gasto no percurso até o local do trabalho e vice-versa, ser computado à jornada . 3. In casu , assiste razão à Empresa Embargante, ao pretender a reforma da decisão turmária desta Corte, pois: a) os trabalhadores em minas de subsolo estão regidos por normas especiais de tutela do trabalho constantes no Capítulo I, Título III, da CLT, precipuamente no tocante ao regime especial de duração do trabalho, daí porque o tempo gasto no percurso entre a boca da mina e a frente da lavra não pode ser computado na jornada de trabalho dos mineiros para efeito de concessão de intervalo intrajornada, como previsto no art. 71, caput , da CLT, pois os arts. 293 e 294 da CLT são absolutamente claros ao dispor que a jornada não ultrapassa as 6 (seis) horas diárias e que o tempo de percurso será computado apenas para efeito de pagamento de salário, com regra própria e específica quanto ao intervalo intrajornada (CLT, art. 298); b) na hipótese dos autos, a existência de norma coletiva a respeito revela vantagem compensatória aos mineiros, de modo que o acolhimento da pretensão obreira, além de implicar ofensa ao art. 7º, XXVI, da CF, ensejaria duplo pagamento pelo intervalo intrajornada concernente à mesma hipótese, em flagrante bis in idem, o que é repudiado pelas normas jurídicas . 4. Assim, merece ser provido o recurso de embargos, a fim de restabelecer o acórdão regional, que excluiu da condenação as horas extraordinárias decorrentes da não concessão do intervalo intrajornada de uma hora. Recurso de embargos conhecido e provido" (E-ED-RR-909-46.2011.5.20.0011, Tribunal Pleno , Redator Ministro Ives Gandra Martins Filho, DEJT 12/12/2019).
De outro lado, 2 Turmas adotam entendimento diverso , no sentido de que, caso ultrapassada a jornada de 6 horas diárias, não há incompatibilidade entre os intervalos previstos no arts. 298 e 71, da CLT. Nesse sentido os seguintes julgados:
"AGRAVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. LEIS NOS 13.015/2014 E 13.467/2017. INTERVALO INTRAJORNADA. TRABALHO EM MINAS DE SUBSOLO. ART. 71 DA CLT. COMPATIBILIDADE COM A PAUSA PREVISTA NO ART. 298 DA CLT. A decisão do Tribunal Regional harmoniza-se com a jurisprudência desta Corte no sentido de que não há incompatibilidade entre o intervalo para repouso e alimentação previsto no art. 71 da CLT e a pausa para repouso a cada três horas consecutivas do trabalho em minas de subsolo . Precedentes. Revela-se, portanto, inviável a admissibilidade do recurso de revista nos termos da Súmula nº 333 do TST e do art. 896, § 7º da CLT. Agravo a que se nega provimento." (Ag-RRAg-10447-39.2019.5.18.0201, 3ª Turma , Relator Ministro Alberto Bastos Balazeiro, DEJT 27/05/2025).
"AGRAVO DA RECLAMADA. RECURSO DE REVISTA COM AGRAVO. TEMA DO AGRAVO DE INSTRUMENTO. INTERVALO INTRAJORNADA. TRABALHO EM MINAS DE SUBSOLO. PRORROGAÇÃO DA JORNADA DE SEIS HORAS. APLICAÇÃO DO ART. 71 DA CLT. 1 - A decisão monocrática não reconheceu a transcendência da matéria e negou provimento ao agravo de instrumento. 2 - Os argumentos da parte não conseguem desconstituir os fundamentos da decisão monocrática. 3 - No caso, o TRT manteve a sentença que deferiu o pagamento do intervalo intrajornada (1 hora extra por dia de trabalho). Registrou que o art. 298 da CLT, que prevê pausa de 15 minutos, somente se aplica quando a jornada é de 6h, mas o reclamante permanecia em minas de subsolo por período superior à 6h, pois além destas utilizava outras duas horas para "permitir que as trocas de turno sejam executadas". Consignou que a reclamada não comprovou os requisitos para validação da jornada para 8h (acordo escrito entre empregado e empregador ou contrato coletivo de trabalho e licença do órgão competente em matéria de higiene do trabalho) e sequer comprovou que o tempo efetivo de permanência no subsolo era restrito a 6h. 4 - Nesse passo, como bem assinalado na decisão monocrática, não se constata a transcendência sob nenhum dos indicadores previstos na Lei n. 13.467/2017. 5 - Anote-se que os fatos narrados nos autos são diversos daquele resolvido pelo Tribunal Pleno do TST no EEDRR- 909-46.2011.5.20.0011 ("TRABALHO EM MINA DE SUBSOLO - TURNO ININTERRUPTO DE REVEZAMENTO DE 6 (SEIS) HORAS - JORNADA DE TRABALHO - DESLOCAMENTO DA BOCA DA MINA AO LOCAL DE TRABALHO - INTERVALO INTRAJORNADA"), uma vez que o presente caso diz respeito à jornada de 8 horas em turnos ininterruptos de revezamento e a jurisprudência do TST tem firmado entendimento no mesmo sentido do acórdão recorrido de que não há impedimento legal que inviabilize a aplicação do art. 71 da CLT e, por conseguinte do entendimento da Súmula nº 437 do TST, quando a jornada do trabalhador de minas de subsolo for superior à 6 horas diárias . Julgados. 6 - Agravo a que se nega provimento" (Ag-RRAg-1332-40.2015.5.05.0251, 6ª Turma , Relatora Ministra Katia Magalhaes Arruda, DEJT 23/08/2024).
A divergência verificada, associada à grande quantidade de recursos sobre a matéria em foco, permite concluir pela necessidade de uniformização da jurisprudência desta Corte em um precedente obrigatório, como forma de promover a isonomia, a segurança jurídica e a razoável duração do processo (Constituição Federal, art. 5º, caput e LXXVIII).
Assim, preenchidos os requisitos do art. 896-C da CLT proponho a afetação do processo TST-RR-0000280-28.2023.5.05.0251 como Incidente de Recurso Repetitivo junto a este Tribunal Pleno, a fim de dirimir a seguinte questão jurídica:
No caso de labor em minas no subsolo em que a duração de trabalho efetivo exceda seis horas diárias ou trinta e seis semanais, o intervalo especial previsto no art. 298 da CLT impede a incidência da regra geral do art. 71 da CLT?
ISTO POSTO
ACORDAM os Ministros do Tribunal Pleno, por unanimidade, acolher a proposta de afetação do incidente de recursos de revista repetitivos, a fim de dirimir a seguinte questão jurídica: No caso de labor em minas no subsolo em que a duração de trabalho efetivo exceda seis horas diárias ou trinta e seis semanais, o intervalo especial previsto no art. 298 da CLT impede a incidência da regra geral do art. 71 da CLT? Determina-se o encaminhamento dos autos à distribuição, na forma regimental.
Brasília, de de
Aloysio Silva Corrêa da Veiga
Ministro Presidente do TST