A C Ó R D Ã O
4ª Turma
JP/FB/JM/ncp
EXECUÇÃO – PRESCRIÇÃO – ART. 7º, XXIX, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL . No ordenamento jurídico brasileiro, é inafastável a aplicação do instituto da prescrição, sob pena de se admitir a perpetuação da lide, comprometendo a segurança jurídica. Se assim não fosse, poder-se-ia chegar à hipótese de se admitir que, transitada em julgado a decisão condenatória de natureza trabalhista, ao reclamante seria facultado promover a execução dez ou até mesmo vinte anos após, o que geraria instabilidade no âmbito das relações econômicas e sociais. A incidência da prescrição não apenas decorre de lei (art. 884, § 1º, da CLT), como também é sustentada pela doutrina e reafirmada na Súmula nº 150 do Supremo Tribunal Federal, segundo a qual: " Prescreve a execução no mesmo prazo de prescrição da ação ". Nesse contexto, é de dois anos o prazo prescricional da pretensão executória, se já extinto o contrato de trabalho, nos termos do artigo 7º, XXIX, da Constituição Federal, que disciplina a prescrição na Justiça do Trabalho. Agravo de instrumento não provido.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento em Recurso de Revista nº TST-AIRR-1666/1991-001-05-00.0 , em que são agravantes LAURIANO MELO E OUTROS e agravados ENGEPAR – ENGENHARIA E PARTICIPAÇÕES LTDA e OUTROS.
Agravo de instrumento interposto pelos exeqüentes (fls. 440/443) contra o r. despacho de fl. 437, em que o i. vice-presidente do TRT da 5ª Região denegou seguimento ao seu recurso de revista.
Sustentam, em síntese, que o art. 7º, XXIX, da Constituição Federal refere-se à prescrição no processo de conhecimento, não alcançando a fase de execução. Dizem que, no Processo do Trabalho, a execução é continuação do processo de conhecimento e que não incide a prescrição superveniente intercorrente. Insistem na contrariedade ao Enunciado nº 114 do TST, na violação da Lei nº 5.584/70 e na especificidade dos paradigmas colacionados.
Foi apresentado contraminuta (fls. 446/451).
Os autos não foram remetidos ao Ministério Público do Trabalho.
Relatados .
V O T O
O agravo é tempestivo (fls. 438 e 440) e está subscrito por advogado habilitado (fls. 8, 10, 13, 15, 17, 20, 22, 25, 27, 29, 31, 33, 35, 37 e 39).
CONHEÇO.
O e. TRT da 5ª Região, pelo v. acórdão de fls. 428/429, negou provimento ao agravo de petição dos exeqüentes, sob o fundamento de que a ação de execução prescreve no prazo fixado no artigo 7º, XXIX, da Constituição Federal, que tem início com o trânsito em julgado da sentença exeqüenda.
Consigna o Regional que:
"...A decisão exeqüenda transitou em julgado em 22/03/1994 e os agravantes tiveram ciência da baixa dos autos em 10/04/1994, deixando o feito paralisado até 29/04/1997, portanto mais de dois anos após o trânsito em julgado.
É o caso de aplicação da regra contida no art. 7º, XXIX, da Constituição Federal, estando, pois, irremediavelmente prescrito o direito de ação da parte em promover a execução. O caso não se trata de prescrição intercorrente, que é aquela que acontece no curso da ação e decorre da inércia da parte. Isto porque, em verdade, o processo executório não havia começado. Assim, a argüição efetivada pelo demandado diz respeito ao próprio direito de ação não se aplicando, por isso, o Enunciado 114 do TST. O direito do autor à execução, portanto, é prescritível e está previsto no art. 884, parágrafo 1º, da CLT.
(...)
Assim considerando que o dies a quo prescricional tem início com o trânsito em julgado da sentença exeqüenda e que a presente ação de execução foi ajuizada após o biênio legal, correta a decisão a quo que acolheu a argüição dos agravados e determinou a extinção do processo executório" (fls. 428/429).
Inconformados, os exeqüentes interpuseram o recurso de revista de fls. 432/435. Sustentaram que o art. 7º, XXIX, da Constituição Federal refere-se à prescrição no processo de conhecimento, não alcançando a fase de execução. Disseram que, no Processo do Trabalho, a execução é continuação do processo de conhecimento e que não incide a prescrição superveniente intercorrente. Indicaram contrariedade ao Enunciado nº 114 do TST e violação da Lei nº 5.584/70. Transcreveram arestos.
O i. vice-presidente do Regional denegou o processamento do recurso de revista pelo r. despacho de fl. 437.
Irresignados, os exeqüentes interpõem o agravo de instrumento de fls. 440/443. Insistem nas alegações de ofensa ao artigo 7º, XXIX, da Constituição Federal, de contrariedade ao Enunciado nº 114 do TST e de existência de dissenso pretoriano.
Não lhes assiste razão.
Por divergência jurisprudencial, contrariedade ao Enunciado nº 114 do TST e violação da Lei nº 5.584/70, o recurso de revista realmente não merece processamento, uma vez que incide o óbice do artigo 896, § 2º, da CLT. Ademais, quanto à indicada ofensa à lei, os exeqüentes nem sequer apontaram o dispositivo tido por vulnerado.
Resta, portanto, a apreciação do cabimento da revista sob a ótica da violação do artigo 7º, XXIX, da Constituição Federal.
O Regional invocou o referido preceito constitucional como fundamento para declarar a prescrição, em virtude de os reclamantes não terem promovido a execução nos dois anos subseqüentes ao trânsito em julgado da decisão condenatória.
Inconformados, os exeqüentes sustentam, nas razões de revista, que a prescrição bienal prevista no artigo 7º, XXIX, da Constituição da República refere-se ao processo de conhecimento, não abrangendo a prescrição intercorrente na fase de execução (fl. 434).
Sem razão.
Discute-se se, no Processo do Trabalho, após o trânsito em julgado da decisão exeqüenda, é cabível a fixação de prazo prescricional para que se inicie a fase de execução.
No ordenamento jurídico brasileiro, é inafastável a aplicação do instituto da prescrição, sob pena de se admitir a perpetuação da lide, comprometendo a segurança jurídica.
Se assim não fosse, poder-se-ia chegar à hipótese de se admitir que, transitada em julgado a decisão condenatória, ao reclamante seria facultado promover a execução dez ou até mesmo vinte anos após, o que geraria instabilidade nas relações econômicas e sociais.
A incidência do prazo prescricional para que se inicie a execução não apenas decorre de lei (art. 884, § 1º, da CLT) como também é sustentada pela doutrina, conforme se extrai do artigo "Da Prescrição Intercorrente na Justiça do Trabalho", de Maria Cristina Alves Delgado de Ávila, in LTr 67-01/71, in verbis :
"(...)
Ao comentar o assunto, Francisco Antônio de Oliveira, cita que poderá acontecer que, ilíquida a sentença, o exeqüente não providencie a liquidação, deixando que escoe o prazo de dois anos. Neste caso, a execução estará prescrita; não poderá o juízo declará-la de ofício, mas dependerá sempre de provocação da parte ".
Entender o contrário, seria pactuar com a perpetuação da lide, pois o Devedor ficaria ad eterno ao arbítrio da vontade do Credor, quando o mesmo resolvesse proceder à liquidação do processo, o que seria totalmente incoerente diante dos princípios basilares do direito.
Esta inclusive é a colocação de Mozart Victor Russomano , ao afirmar que:
‘Aceitando-se o entendimento contrário vamos concluir que, ajuizada a ação trabalhista, ela se poderá prolongar indefinidamente – um, cinco, dez anos – sem qualquer movimento processual e sem qualquer ato interruptivo da prescrição. Uma ação com tais requisitos traça, em todas as linhas, a idéia de lide perpétua . Como ficou, anteriormente, bem acentuado, a perpetuação da demanda, desde a publicação do Código Civil, é figura inaceitável e cediça. Atualmente, em todo o direito brasileiro, não existe em qualquer hipótese a lide perpétua’.
Vale ainda transcrever a opinião de Mozart Victor Russomano, que é citada por Isis de Almeida a respeito do tema, quando coloca que:
‘Mesmo admitindo-se, para argumentar, que o autor não tenha nenhuma culpa na paralisação do processo, essa falta de culpa não o exime da prescrição, porque esta não é nenhuma punição feita a um culpado, e sim, uma norma de paz, um instrumento de ordem coletiva’.
E a seguir, exemplifica com uma reclamatória trabalhista, que fica paralisada em Juízo, mesmo sem culpa do Reclamante (Autor) – por mais de dois anos, afirmando que o transcurso desse prazo ‘ lhe tolhe quaisquer direitos, em nome da paz coletiva, sempre em risco com os conflitos, mesmo pequenos e de pouco valor monetário, que se travam entre obreiros e patrões’ .
Deve-se ainda ressaltar com a colocação de Eduardo Gabriel Saad , ao afirmar que: Assim, fica evitada a perpetuidade da ação, o que se harmoniza com o princípio geral de que não há obrigações patrimoniais imprescritíveis.
Ulderico Pires dos Santos , ao comentar sobre prescrição, afirma que: ‘ É certo que a lei estabelece prazos para o exercício dos direitos e o faz também em benefício da estabilidade social, evitando que perdure por longo tempo a incerteza ’.
Segundo Maria Helena Diniz o instituto da prescrição foi criado como medida de ordem pública para proporcionar segurança às relações jurídicas, que seriam comprometidas diante da instabilidade oriunda do fato de se possibilitar o exercício da ação por prazo indeterminado ."
Definido, portanto, que incide a prescrição da execução, o prazo prescricional somente pode ser aquele de dois anos estipulado no artigo 7º, XXIX, da Constituição Federal.
Com efeito, esse é o dispositivo que trata da prescrição na Justiça do Trabalho. Ademais, sendo de dois anos o prazo prescricional para o ajuizamento da reclamação trabalhista, após a extinção do contrato de trabalho, não se poderia pretender elastecer esse prazo para fim de execução, ante a necessidade de preservação da estabilidade social, como já exposto.
Essa é, inclusive, a orientação emanada da Súmula nº 150 do Supremo Tribunal Federal, segundo a qual: " Prescreve a execução no mesmo prazo de prescrição da ação ".
Nesse contexto, a revista efetivamente não merece processamento, estando correto o acórdão do Regional, ao declarar a prescrição, com fulcro no artigo 7º, XXIX, da Constituição Federal, quando constatado que os reclamantes promoveram a execução mais de dois anos após o trânsito em julgado da decisão exeqüenda.
Registre-se que o fato de o artigo 878 da CLT conferir legitimidade concorrente ao juiz para, de ofício, promover a execução, não afasta a incidência do prazo prescricional para que os exeqüentes o façam. Essa é a lição de José Augusto Rodrigues Pinto, no artigo "Os graves embaraços processuais da Emenda Constitucional nº 20/98", in LTr 63-05/599:
"(...)
Discordamos desse modo de pensar, data venia , porque
‘...tal conclusão só seria correta se o impulso ex officio , no caso, correspondesse a um dever do juiz porque, então, dependeria sempre de sua atividade a movimentação inicial da execução. Mas esse dever não existe na lei. E, além disso, com a faculdade do órgão jurisdicional concorre a legitimação, também atribuída às partes para dar esse impulso, de modo que não se acham, por nenhuma forma, sujeitas à atividade oficial’.
E agora que, em relação à execução da sentença, na parte concernente às contribuições previdenciárias, a EC n. 20/98 impõe ao juiz trabalhista o dever de agir ex officio ?
Continuamos respondendo com a firme convicção de que a prescrição corre contra o credor, dado o interesse social maior de proteger o equilíbrio das relações jurídicas contra a inércia do titular do direito individual de ação .
Hoje, abraçamos a opinião de que o único fato em condições de impedir o efeito prescricional será o que resulte da aliança do dever de impulso oficial com o monopólio judicial da legitimação para instaurar a ação . E como tal aliança está ausente do caso sob estudo, pois a legitimação conferida ao juiz é concorrente com a legitimação natural das partes , estas não se acham dispensadas do dever de exercer seu direito de ação se o órgão jurisdicional se omitir no cumprimento de dever de instauração da instância ex officio , sujeitando-se, portanto, aos efeitos da prescrição consumada por sua inércia".
Com estes fundamentos, NEGO PROVIMENTO ao agravo de instrumento.
ISTO POSTO
ACORDAM os Ministros da 4ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, negar provimento ao agravo de instrumento.
Brasília, 20 de abril de 2005.
_____________________________________
JUIZ CONVOCADO JOSÉ ANTONIO PANCOTTI
Relator