A C Ó R D Ã O
7ª TURMA
VMF/lm/hcf/mmc
RECURSO DE REVISTA DA RECLAMADA - EMPREGADO DE COOPERATIVA DE CRÉDITO - EQUIPARAÇÃO A BANCÁRIO - DESCABIMENTO. Para efeito de aplicação do art. 224 da CLT e de fixação da jornada de trabalho, os empregados de cooperativas de crédito não se equiparam aos empregados bancários, em razão da inexistência de expressa previsão legal e considerando as diferenças estruturais e operacionais entre as instituições financeiras e as cooperativas de crédito. Incide a Orientação Jurisprudencial nº 379 da SBDI-1 do TST.
Recurso de revista conhecido e provido .
RECURSO DE REVISTA DO RECLAMANTE - INTERVALO INTRAJORNADA – CONCESSÃO PARCIAL - PAGAMENTO INTEGRAL. Esta Corte firmou entendimento no sentido de ser defesa a supressão ou redução do intervalo intrajornada, sendo que a concessão apenas parcial do intervalo intrajornada acarreta o pagamento total do referido período, com acréscimo de, no mínimo, 50% sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho e reflexos, decorrente da natureza salarial da condenação. Inteligência da Súmula nº 437, I, do TST.
Recurso de revista conhecido e provido
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR-500600-72.2009.5.09.0195 , em que são Recorrentes COOPERATIVA DE CRÉDITO DOS EMPRESÁRIOS DE CASCAVEL - SICOOB CASCAVEL e ELISEO CARMO PERETO e são Recorridos OS MESMOS .
O 9º Tribunal Regional, mediante acórdão a fls. 153-169, deu provimento parcial aos recursos ordinários das partes, decidindo pela equiparação dos empregados de cooperativa de crédito com a jornada dos bancários, condenando a reclamada ao pagamento das horas extraordinárias excedentes à 6ª diária, adotando o divisor 180 e manteve a condenação ao pagamento do intervalo intrajornada referente ao período faltante para o tempo previsto em lei.
Inconformadas, ambas as partes interpõem recurso de revista. A reclamada (fls. 210-221) pugna pelo afastamento da condenação referente à equiparação salarial com o paradigma indicado, bem como pela impossibilidade de adoção da jornada de trabalho dos bancários aos empregados de cooperativa de crédito.
O reclamante (fls. 184-195) pleiteia a adoção do divisor 150, bem como a condenação em uma hora extraordinária pelo intervalo intrajornada concedido parcialmente.
Os recursos de revista foram admitidos, mediante as decisões de fls. 202-204 e 225-228, do reclamante e da reclamada, respectivamente.
A reclamada apresentou contrarrazões a fls. 206-209 e o reclamante a fls. 230-238.
Processo não submetido a parecer do Ministério Público do Trabalho, nos termos do art. 83, § 2º, do RITST.
É o relatório.
V O T O
I – RECURSO DE REVISTA DA RECLAMADA
1 – CONHECIMENTO
Presentes os pressupostos extrínsecos referentes à tempestividade (fls. 205 e 210), à representação processual (fls. 201) e ao preparo (fls. 222 e 223), passo ao exame dos pressupostos intrínsecos de admissibilidade.
1.1 – EQUIPARAÇÃO SALARIAL
O Tribunal de origem negou provimento ao recurso ordinário da reclamada e manteve a sentença que deferira o pagamento de diferenças salariais decorrentes da equiparação do reclamante com o empregado Sr. Erivelto Gancedo, nos seguintes termos, a fls. 153-169:
DIFERENÇAS SALARIAIS - EQUIPARAÇÃO SALARIAL/HORAS EXTRAS
Insurge-se a Reclamada contra a decisão a quo acerca das diferenças salariais/equiparação salarial. Extrai-se da sentença:
O reclamante pretende o pagamento de diferenças salariais advindas da equiparação ao paradigma Erivelto Gancedo (fl. 284).
Exsurge do próprio depoimento do preposto a identidade de função, vez atestou: " ... que como gerentes de negócios, autor e modelo desenvolviam as mesmas atividades; que a ré mantém comitê de crédito; que autor e modelo participavam de tal comitê ..." (grifei).
Acrescente-se, nos termos da Súmula 6 do TST, inciso III, para fins de equiparação salarial importa se o empregado e o paradigma exercem a mesma função e desempenham a mesma tarefa, não importando se os cargos que têm, ou não, a mesma denominação.
Assim, impõe-se o deferimento do pedido de pagamento das diferenças salariais resultantes da equiparação salarial com o paradigma Erivelto Gancedo. O cálculo das diferenças por equiparação deverão considerar além do salário-base, as comissões de cargo. Parcelas de natureza pessoal não devem fazer parte da base de cálculo da equiparação salarial. Haverá reflexos em horas extras, adicional por tempo de serviço, aviso prévio indenizado, férias (mais 1/3), gratificação natalina e FGTS - percentual de 11,2% (indevida incidência reflexa em repouso remunerado, visto que tanto o autor como o paradigma eram mensalistas, de modo que nas diferenças deferidas já se encontra embutida remuneração dos dias relativos ao repouso).
Quando da liquidação, a ré deverá juntar aos autos os recibos de pagamento do paradigma Erivelto Gancedo, sob pena de adoção do percentual noticiado pela inicial, qual seja, 70%.
Aduz que a testemunha Waldemar Antonio Paetzold e o Sr. Erivelto Gancedo exercem funções de confiança. Assim, " se a sentença persiste em declarar que o Reclamante tem como paradigma o Sr. Erivelto Gancedo, a mesma sentença não pode deixar de reconhecer (...) que o mesmo encontra-se albergado pela exceção prevista no art. 224 da CLT " (fl. 300). Pugna pela reforma para que o Reclamante " deixe de fazer jus às exordialmente requeridas como horas extras a partir da 6ª. diária e 36ª. semanal pois, definitivamente, exerce cargo de confiança " (fl. 300).
Sem razão.
A prova oral colhida tem o seguinte conteúdo:
Depoimento do(a) reclamado(a): 1) que o autor desenvolvia a função gerente de negócios, sendo o modelo superintendente de plataforma; 2) que o autor trabalhava das 8h às 17h, com 1h de intervalo intrajornada, sem anotação da jornada laborada em documento; reperguntas do(a) reclamante: 3) o depoente confirma as funções noticiadas através da peça de fl. 216 relativamente ao modelo; 4) que como gerentes de negócios, autor e modelo desenvolviam as mesmas atividades ; 5) que a ré mantém comitê de crédito; 6) que autor e modelo participavam de tal comitê; 7) que o autor, como exercente de cargo de confiança, possuía a senha que todos esses empregados tinham; 8) que abertura e fechamento da agência era feito pelo gerente administrativo, não se recordando o nome de tal pessoa. Nada mais.
Depoimento da testemunha do(a) reclamante: ROSILDA DA COSTA REIS, brasileiro(a), casada, do lar, portador(a) da cédula de identidade RG 5.021.759-0-SSP/PR, 38 anos, residente e domiciliado(a) na Rua Presidente Kennedy, 1334, centro, Cascavel/PR. Advertida e compromissada, declarou que: 1) a depoente trabalhou para o réu de abril/2007 a julho/2008, como gerente de negócios; 2) que autor e depoente trabalhavam das 7h30m às 18h30m/19h15m, com 30 minutos de intervalo intrajornada, não anotando a jornada de trabalho em documento; 3) que depoente e autor não possuíam subordinados; reperguntas do(a) reclamante: 4) que no final de 2007 ou início de 2008 a ré implantou crachá com chip, onde depoente e autor batiam a jornada de trabalho; 5) que a depoente sempre trabalhou no mesmo ambiente do autor, na agência centro; reperguntas do(a) reclamado(a): 6) que o gerente de negócios não orientava trabalho de qualquer outro empregado do réu. Nada mais".
Depoimento da testemunha do(a) reclamado(a): WALDEMAR ANTONIO PAETZOLD, brasileiro(a), casado, gerente de mercado, portador(a) da cédula de identidade RG 3432147-7-SSP/PR, 47 anos, residente e domiciliado(a) na Rua Barão do Cerro Azul, 902, centro, Cascavel/PR. Contraditada sob argumento de que exerce cargo de confiança. Inquirido, confirma o exercício de cargo de confiança. Todavia, afirma não tem interesse no deslinde da causa, comprometendo-se a dizer a verdade. Assim, rejeito a contradita, mormente porque o mero exercício de cargo de confiança, por si só, não se presta para tanto, bem assim a credibilidade do depoimento será sopesada pelo Juízo. Protestos do procurador do autor. Advertida e compromissada, declarou que: 1) o depoente trabalha para a ré desde abril/2004, sendo responsável pelas agências Centro e Migrante; 2) que o autor como gerente de negócios não possuía nenhum subordinado; 3) o depoente não tem conhecimento de que o réu tenha implantado crachá com chip onde consignada a jornada de trabalho, sendo que o equipamento foi testado durante uns 3 meses mas não deu certo; 4) que o autor trabalhava das 8h30m às 17h30m, com 1h de intervalo intrajornada, não sendo anotado o horário de trabalho em nenhum documento; reperguntas do(a) reclamado(a): 5) que o autor participava do comitê com direito a voto; 6) que o autor tinha liberdade para agendar horário de visitas a cliente; 7) que era a agencia que determinava o intervalo intrajornada a ser usufruído pelo autor; 8) que o autor era subordinado ao supervisor de plataforma, Erivelto; reperguntas do(a) reclamante:9) que na época da contratualidade do autor o depoente era gerente da agência, sendo o depoente quem abria e fechava esta última; 10) que tendo direito a voto o autor tinha direito a veto, assim como os demais integrantes do comitê (...).
A existência ou não do direito à jornada de seis horas é questão estranha a este tópico e será apreciada no próximo item, que trata das horas extras. Se o Reclamante exercia ou não cargo de confiança não possui implicação com o direito à equiparação, pois depende exclusivamente da existência ou não de identidade de função com o paradigma.
Em relação a este aspecto, negado em defesa, o próprio preposto confessou que " como gerentes de negócios, autor e modelo desenvolviam as mesmas atividades ".
Logo, infirmada pelo próprio preposto a única tese de defesa apresentada como oposição ao pedido de equiparação, inequívoco o direito às diferenças salariais decorrentes.
Mantenho. (Grifou-se)
Nas razões do recurso de revista, a reclamada sustenta que as regras previstas no art. 461, § 1º da CLT não foram observadas, uma vez que não considerou o labor superior a dois anos entre o paradigma e o reclamante, a mesma perfeição técnica e a mesma produtividade.
A norma contida no art. 461, caput , da CLT determina que os empregados que atuem em idêntica função, com trabalho de igual valor, para o mesmo empregador e na mesma localidade, deverão ser remunerados igualmente. Considera-se trabalho de igual valor o desenvolvido com a mesma produtividade e perfeição técnica entre pessoas cuja diferença de tempo na função não seja superior a dois anos, nos termos do art. 461, § 1º, da CLT.
Os fatos que inviabilizam o direito do trabalhador à equiparação salarial são aqueles previstos nos parágrafos do art. 461 da CLT, quais sejam, diferença de produtividade e perfeição técnica entre os trabalhos do paradigma e do equiparando, diferença de tempo de serviço na função superior a dois anos, existência de quadro de carreira na empresa, paradigma readaptado por deficiência física ou mental.
Dessa forma, o ônus de demonstrar a existência de identidade de funções é atribuído ao empregado, em virtude de tratar-se de fato constitutivo do seu direito à equiparação salarial, nos moldes do art. 333, I, do CPC e 818 da CLT. Doutra banda, é do empregador o dever de comprovar a diferença de produtividade e perfeição técnica, bem como de tempo de serviço na função superior a dois anos, por se tratarem de fatos desconstitutivos do direito à equiparação salarial, nos termos do art. 333, II, do CPC e do item VIII da Súmula nº 6 do TST.
No caso dos autos, a Corte regional, após empreender acurada análise das provas dos autos, notadamente das declarações do preposto, concluiu categoricamente que foi infirmada a única tese de defesa apresentada como oposição ao pedido de equiparação, no momento em que foi declarado que " como gerentes de negócios, autor e modelo desenvolviam as mesmas atividades" (fls. 157).
Diante do contexto fático-probatório delineado no acórdão regional, afere-se que o Tribunal Regional concluiu, in casu, pelo preenchimento dos requisitos previstos no art. 461 da CLT.
Nessa quadra, para acolher a tese recursal - no sentido de que o reclamante não teria direito à equiparação salarial, pois a Corte regional não considerou os requisitos quanto ao labor superior a dois anos, a mesma perfeição técnica e a mesma produtividade – demandaria o revolvimento dos fatos e provas dos autos, procedimento vedado em sede recursal extraordinária, nos termos da Súmula nº 126 do TST.
Logo, inviável a aferição das alegações de violação de dispositivos legais.
Não conheço.
1.2 - EMPREGADO DE COOPERATIVA DE CRÉDITO - EQUIPARAÇÃO A BANCÁRIO – DESCABIMENTO
O Tribunal Regional decidiu que o autor está submetido a jornada de trabalho de seis horas diárias, porquanto as cooperativas de crédito sujeitam-se às regras do Sistema Financeiro Nacional, sendo aplicável o art. 224 da CLT ao caso, nestes termos (fls. 157-160):
HORAS EXTRAS - INDEVIDAS
Insurge-se a Reclamada contra a decisão que a condenou ao pagamento de horas extras e reflexos. Aduz que a jornada de 6 horas diárias e a carga semanal de 36 horas é inaplicável à Reclamada, eis que se trata de cooperativa de crédito e não de uma instituição bancária. Ademais, aduz que " o Autor, assim como seu suposto paradigma, exerciam cargos de confiança não estando, também, sujeitos à jornada de 6 horas diárias " (fl. 301). Pugna pela reforma.
Sem razão.
Quanto ao enquadramento das cooperativas de crédito para fins do art. 224, CLT, a matéria já se encontra pacificada no âmbito desta E. Turma, conforme voto da lavra da Desembargadora Nair Maria Ramos Gubert (TRT-PR-07898-2010-019-09-00-2 (RO 6151/2011) - publicado em 13.03.2012), cujos fundamentos invoco:
"Por consequência, pugna que eventuais horas extras sejam deferidas apenas a partir da 8h diária e 40h semanal, nos termos definidos convencionalmente. Sem razão.
Consta na sentença (fls. 233-239):
"(...); A ré é empresa voltada para a atividade financeira, sendo equiparável a estabelecimentos bancários, segundo o entendimento cristalizado na Súmula 55, do C. TST, observados seus limites:
"As empresas de crédito, financiamento ou investimento, também denominadas financeiras, equiparam-se aos estabelecimentos bancários para efeitos do artigo 224 da CLT". (grifei)
Segundo se depreende deste verbete, a equiparação a estabelecimentos bancários dá-se apenas para os efeitos do artigo 224 da CLT, que regula a duração do trabalho para bancários, estabelecendo a jornada diária de seis horas. Assim, declaro aplicável à autora a jornada de seis horas diárias de trabalho.(...)."
Prevalece nesta E. 5ª Turma o entendimento adotado na sentença. O art. 192 da Constituição Federal, dispõe que: "O sistema financeiro nacional, estruturado de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do País e a servir aos interesses da coletividade, em todas as partes que o compõem, abrangendo as cooperativas de crédito, será regulado por leis complementares que disporão, inclusive, sobre a participação do capital estrangeiro nas instituições que o integram."
Desta forma, temos que as cooperativas de crédito fazem parte do Sistema Financeiro Nacional e sua fiscalização é realizada pelo Banco Central do Brasil. Embora tenham por finalidade prestar assistência aos seus associados, e não à comunidade, não se pode perder de vista que desenvolvem atividade econômico-financeira.
Denota-se se tratar de verdadeira atividade econômica, situação que justifica sua equiparação às instituições financeiras e, por analogia, aos estabelecimentos bancários apenas para os efeitos do art. 224 da CLT, nos termos da Súmula nº 55/TST.
No que tange ao alegado cargo de confiança, também não procede a insurgência.
Com efeito, a testemunha indicada pelo Reclamante afirmou: " 1) a depoente trabalhou para o réu de abril/2007 a julho/2008, como gerente de negócios; 2) que autor e depoente trabalhavam das 7h30m às 18h30m/19h15m, com 30 minutos de intervalo intrajornada, não anotando a jornada de trabalho em documento; 3) que depoente e autor não possuíam subordinados ; (...) " que o gerente de negócios não orientava trabalho de qualquer outro empregado do réu " (destaquei).
A testemunha indicada pela Reclamada, WALDEMAR ANTONIO PAETZOLD, declarou que " o autor como gerente de negócios não possuía nenhum subordinado (...) 5) que o autor participava do comitê com direito a voto; 6) que o autor tinha liberdade para agendar horário de visitas a cliente; 7) que era a agencia que determinava o intervalo intrajornada a ser usufruído pelo autor; 8) que o autor era subordinado ao supervisor de plataforma, Erivelto; (...) que tendo direito a voto o autor tinha direito a veto, assim como os demais integrantes do comitê (...) ".
Portanto, a própria testemunha indicada pela Reclamada reconheceu que o Reclamante não possuía subordinados, não revelando qualquer fidúcia especial que pudesse justificar o enquadramento da exceção do art. 224, § 2º, da CLT. Frise-se que a mera participação no comitê e o direito de voto e veto, por si só, não indica fidúcia especial suficiente para este enquadramento.
Ressalte-se que a afirmação da testemunha indicada pela Reclamada, no sentido de que o Autor seria subordinado ao Erivelto, ainda que não diga respeito às horas extras, não pode ser considerada, pois, como destacado no item anterior, a identidade de função com este restou confessada pelo preposto. Esse fato (reconhecimento da equiparação salarial) não autoriza, por si só, reconhecer que o Reclamante exercia cargo de confiança na forma do § 2º, do art. 224, da CLT, pois pela prova produzida o paradigma exercia a mesma função do Reclamante, portanto, também não detinha fidúcia especial.
Mantenho.
A reclamada, em seu recurso de revista, indica afronta aos arts. 58, 62, 224 e 226 da CLT e contrariedade à Orientação Jurisprudencial nº 379 da SBDI-1. Colaciona arestos dissonantes.
Alega que as provas dos autos demonstram que o autor era integrante do Comitê, com direito a voto e veto e que o reclamante não batia ponto e tinha liberdade para agendar visitas aos clientes, o que caracteriza a fidúcia especial, enquadrando-se no art. 62, II, da CLT.
Sustenta ainda, que as cooperativas de crédito não podem ser equiparadas às instituições financeiras, pois não visam lucros e são sociedades de pessoas, sendo descabida a aplicação do art. 224 da CLT aos seus empregados.
No que diz respeito as provas constantes dos autos, pretendendo a caracterização do exercício de cargo de confiança, ressalte-se, de plano, que, para se alcançar a conclusão pretendida pela reclamada demandaria o reexame do conjunto fático probatório dos autos, o que é vedado pelo entendimento consubstanciado na Súmula nº 126 do TST.
De outro lado, quanto à próxima questão apresentada, esta Corte firmou o entendimento de que, diversamente das instituições financeiras, as cooperativas de crédito não se equiparam às instituições bancárias, pois possuem caráter social sem o objetivo de lucro, nos termos do disposto na Orientação Jurisprudencial 379 da SBDI-1:
EMPREGADO DE COOPERATIVA DE CRÉDITO, BANCÁRIO. EQUIPARAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. (DEJT divulgado em 19, 20 e 22.04.2010)
Os empregados de cooperativas de crédito não se equiparam a bancário, para efeito de aplicação do art. 224 da CLT, em razão da inexistência de expressa previsão legal, considerando, ainda, as diferenças estruturais e operacionais entre as instituições financeiras e as cooperativas de crédito. Inteligência das Leis n.os 4.594, de 29.12.1964, e 5.764, de 16.12.1971.
Verifica-se, portanto, serem inaplicáveis aos empregados da reclamada, cooperativa de crédito, as normas que beneficiam os bancários.
Nesse sentido, precedentes da SBDI-1 do TST:
RECURSO DE EMBARGOS REGIDO PELA LEI 11.496/2007. EMPREGADO DE COOPERATIVA DE CRÉDITO. BANCÁRIO. EQUIPARAÇÃO. ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL 379 DA SBDI-1 DO TST. A matéria não comporta mais discussão, porque pacificada com a edição da Orientação Jurisprudencial 379 da SBDI-1 do TST, a qual preconiza: -os empregados de cooperativas de crédito não se equiparam a bancário, para efeito de aplicação do art. 224 da CLT, em razão da inexistência de expressa previsão legal, considerando, ainda, as diferenças estruturais e operacionais entre as instituições financeiras e as cooperativas de crédito-. Estando a decisão recorrida em consonância com orientação jurisprudencial desta Corte, o recurso de embargos não alcança conhecimento, na forma do inciso II do art. 894 da CLT, restando superada a alegação de dissenso jurisprudencial Recurso de embargos não conhecido. (E-ED-RR-105500-25.2007.5.03.0059, Rel. Min. Augusto César Leite de Carvalho, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, DEJT 31/08/2012).
RECURSO DE EMBARGOS INTERPOSTO ANTES DA ÉGIDE DA LEI N.º 11.496/2007. COOPERATIVA DE CRÉDITO. EQUIPARAÇÃO. BANCÁRIO. ARTIGO 224 DA CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO. Os empregados de cooperativas de crédito não se equiparam a bancário, para efeito de aplicação do art. 224 da CLT, em razão da inexistência de expressa previsão legal, considerando, ainda, as diferenças estruturais e operacionais entre as instituições financeiras e as cooperativas de crédito. Inteligência das Leis n.º 4.594, de 29.12.1964, e 5.764, de 16.12.1971.- (Orientação Jurisprudencial n.º379 da SBDI-I). Dessa forma, afigura-se imprópria a aplicação, no caso concreto, do entendimento consagrado na Súmula n.º 55 do TST. Tal verbete é expresso ao referir-se a 'empresas de crédito, financiamento ou investimento, também denominadas financeiras', categoria em que não se enquadram as cooperativas de crédito, consoante a legislação citada na Orientação Jurisprudencial n.º 379 da SBDI-I. Recurso de embargos conhecido e provido. (...). (E-RR-246600-03.2001.5.12.0002, Rel. Min. Lelio Bentes Corrêa, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, DEJT 29/6/2012)
Conclui-se, desse modo, que a decisão proferida pelo Tribunal a quo contrariou o entendimento consolidado na Orientação Jurisprudencial nº 379 da SBDI-1 desta Corte.
Assim, conheço do recurso de revista por contrariedade à Orientação Jurisprudencial nº 379 da SBDI-1 do TST.
2 - MÉRITO
2.1 - EMPREGADO DE COOPERATIVA DE CRÉDITO - EQUIPARAÇÃO A BANCÁRIO - DESCABIMENTO
Como visto, a Corte regional aplicou o art. 224 da CLT ao caso e deferiu o pagamento das horas laboradas além da sexta diária como extraordinárias, porque o autor deve ser considerado empregado bancária, não obstante trabalhar em uma cooperativa de crédito.
Em primeiro lugar, os arts. 966 e 982 do Código Civil de 2002 vedam a equiparação de instituições bancárias (sociedades anônimas, portanto, empresariais) às cooperativas de crédito.
Entretanto, em face do princípio da primazia da realidade, tal vedação, por si só, não obstaria a equiparação postulada pelo obreiro, uma vez que o enquadramento do empregado depende da atividade econômica desenvolvida por seu empregador.
É certo que ambas as entidades coletam, intermediam e aplicam recursos financeiros, motivo pelo qual se enquadram na categoria de instituição financeira.
Contudo, o Banco desempenha tal função profissionalmente, com o objetivo de proporcionar a distribuição dos lucros aos seus sócios, pessoas físicas que, por meio da aquisição de ações (parcelas constitutivas do capital social da empresa), visam à obtenção de dividendos oriundos do exercício social, estando presente o affectio societatis na relação empresarial. Exerce, pois, atividade econômica.
A cooperativa de crédito, entretanto, busca, como objetivo primordial, o fomento da atividade desempenhada pelos cooperados, motivo pelo qual a coleta, a intermediação e a aplicação de recursos financeiros por ela desenvolvidos não podem ser tidas como finalidade principal, mas como meio para o fortalecimento da categoria profissional por ela auxiliada. Não se trata, pois, de exercício de atividade econômica.
Além disso, a Resolução nº 3.106/2003 do BACEN limita a atividade da cooperativa aos seus cooperados, óbice a que não se sujeitam os bancos, dada a diversidade existente entre as finalidades das duas instituições em questão.
Dessa forma, inviável a extensão dos direitos assegurados aos empregados bancários ao obreiro empregado de cooperativa de crédito, ante a impossibilidade de enquadrar a cooperativa de crédito no conceito de empresa; por serem absolutamente diversas as atividades desempenhadas, e porque a forma de constituição de ambas é distinta.
Nesse exato sentido é a Orientação Jurisprudencial nº 379 da SBDI-1 do TST:
EMPREGADO DE COOPERATIVA DE CRÉDITO. BANCÁRIO. EQUIPARAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE.
Os empregados de cooperativas de crédito não se equiparam a bancário, para efeito de aplicação do art. 224 da CLT, em razão da inexistência de expressa previsão legal, considerando, ainda, as diferenças estruturais e operacionais entre as instituições financeiras e as cooperativas de crédito. Inteligência das Leis n.ºs 4.594, de 29.12.1964, e 5.764, de 16.12.1971.
Logo, os empregos de cooperativas de crédito não podem ser considerados bancários e não estão sujeitos às disposições do art. 224 da CLT.
Portanto, equivocada a conclusão alcançada pelo Tribunal Regional, devendo o acórdão recorrido ser reformado para que a jornada de trabalho do autor seja de oito horas diárias.
Em razão do exposto, dou provimento ao recurso de revista da reclamada para fixar a jornada laboral diária do autor em oito horas e afastar a condenação ao pagamento, como extraordinárias, das 7ª e 8ª horas trabalhadas e seus reflexos.
II – RECURSO DE REVISTA DO RECLAMANTE
1 – CONHECIMENTO
Presentes os pressupostos extrínsecos referentes à tempestividade (fls. 182 e 184), à representação processual (fls. 18) e dispensado o preparo, passo ao exame dos pressupostos intrínsecos de admissibilidade.
1.1 – DIVISOR 150
O reclamante pugna, diante da aplicação do art. 224 da CLT, pela adoção do divisor 150, uma vez que estava submetido à jornada de 30 horas semanais, excluindo-se o sábado.
Diante do provimento do recurso de revista da reclamada, quanto à impossibilidade de equiparação da jornada dos bancários às cooperativas de crédito, nos termos do entendimento consubstanciado na Orientação jurisprudencial nº 379 da SBDI-1 do TST, resta prejudicado este tópico do recurso do reclamante.
1.2 – INTERVALO INTRAJORNADA – CONCESSÃO PARCIAL - PAGAMENTO TOTAL
Corte regional negou provimento ao recurso ordinário interposto pelo reclamante e manteve a sentença no que concerne à condenação pela ausência de concessão integral do intervalo intrajornada, de acordo com os seguintes motivos (fls. 162-164):
INTERVALO INTRAJORNADA
Insurge-se o Reclamante contra a sentença acerca do intervalo intrajornada. Extrai-se da decisão:
A prova oral produzida pelo demandante - mais convincente que aquela da ré, mormente quando a testemunha trazida por esta última exerce cargo de confiança e ainda trabalha para a demandada -, autoriza a conclusão que a jornada de trabalho era das 7h30min às 19h, de segunda-feira à sexta-feira, com 30min de intervalo intrajornada .
Ante o exposto, defiro o pagamento de horas extras, tidas como tais as excedentes da 6ª diária e da 36ª semanal (ausente amparo legal para adoção do limite semanal pretendido), vedado o bis in idem, ou seja, o cômputo em duplicidade de ambos os limites, que serão apuradas através da jornada acima fixada. Adicional de 50%. Devido, ainda, o pagamento como extra (ausente amparo legal para a incidência somente do adicional) do lapso de tempo faltante para o cômputo do intervalo intrajornada mínimo legal de 1h, conforme previsão do art. 71 da CLT. Divisor 180. Habituais, refletirão nos repousos semanais remunerados e com estes nas férias (acrescidas de 1/3), gratificação natalina, aviso-prévio e demais rescisórias. Incidirá a verba fundiária (percentual de 11,2%). A base de cálculo das extras deverá ser composta das verbas salariais quitadas, quais sejam: "SALARIO MENSAL" + "COMISSÃO DE CARGO" + "ADIC. P/ TEMPO DE SERV.".
Aduz que a decisão a quo foi obscura/omissa acerca do pagamento dos minutos não usufruídos do intervalo intrajornada (se o pagamento deve ser apenas dos minutos não fruídos ou do referido período somando-se o adicional correspondente - 50%). Questionou-se em embargos de declaração (fls. 296/297), os quais foram rejeitados sob a fundamentação de que " a pretensão (...) consubstancia revisão da decisão embargada " (fl. 311). Pugna pela reforma " para condenar o recorrido ao pagamento de uma hora como extra, pela concessão incorreta do intervalo intrajornada, com os mesmos reflexos das horas extras deferidas em primeiro grau " (fl. 334).
Sem razão.
A decisão não deixa dúvidas que foi deferido como extra apenas o tempo do intervalo mínimo de uma hora não usufruído.
Neste aspecto não merece reforma, pois nos termos do art. 71, § 4º, da CLT, é devido como extra somente o tempo do intervalo intrajornada mínimo não usufruído, ou seja, o tempo faltante para completar o intervalo mínimo legal de uma hora. Até porque não se mostra razoável que o empregado que usufrui parte do intervalo receba o mesmo valor daquele que não usufruiu qualquer tempo para descanso ou refeição.
Note-se que, consoante estabelece o dispositivo legal em comento, "quando o intervalo para repouso e alimentação, previsto neste artigo, não for concedido pelo empregador, este ficará obrigado a remunerar o período correspondente com um acréscimo no mínimo cinqüenta por cento sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho". Não há, portanto, amparo legal para o cômputo do período integral como extra, devendo a Orientação Jurisprudencial n. 381 da SDI-I, do E. TST, ser interpretada nestes termos.
Mantenho.
Inconformado, o reclamante alega que a decisão regional contrariou o entendimento contido na orientação jurisprudencial no 307 da SBDI-1, sendo certo que a supressão parcial do intervalo intrajornada acarreta o pagamento integral do intervalo e reflexos das referidas verbas.
É certo que o intervalo intrajornada mínimo é norma de ordem pública relacionada à medicina e à segurança do trabalho, sendo direito indisponível do empregado, concernente à proteção de sua saúde física e mental.
O referido intervalo se destina a repor as energias física e mental do empregado e possibilitar a sua alimentação durante a jornada, e a concessão apenas parcial do interregno não é apta a atender tais necessidades e não corresponde ao espírito da norma.
O art. 71, § 4º, da CLT, com a redação conferida pela Lei nº 8.923/94, criou o tempo ficto extraordinário, ou horas extraordinárias fictas, que passaram a ser devidas ao trabalhador, no caso de descumprimento do intervalo intrajornada mínimo.
Portanto, o direito ao repouso para descanso e alimentação foi equiparado ao direito à percepção da hora extraordinária, conferindo-se-lhe, por conseguinte, a mesma natureza jurídica salarial e passando a produzir os mesmos efeitos.
Nessa exata linha é a redação da recente Súmula nº 437, I, do TST, ad litteram :
INTERVALO INTRAJORNADA PARA REPOUSO E ALIMENTAÇÃO. APLICAÇÃO DO ART. 71 DA CLT
I - Após a edição da Lei nº 8.923/94, a não-concessão ou a concessão parcial do intervalo intrajornada mínimo, para repouso e alimentação, a empregados urbanos e rurais, implica o pagamento total do período correspondente, e não apenas daquele suprimido , com acréscimo de, no mínimo, 50% sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho (art. 71 da CLT), sem prejuízo do cômputo da efetiva jornada de labor para efeito de remuneração. (g.n.)
Assim, a redução do interregno intrajornada mínimo acarreta o pagamento do período total do intervalo de uma hora diária, acrescido do adicional de horas extraordinárias.
Por conseguinte, em decorrência da redução do intervalo intrajornada mínimo, o autor tem direito ao recebimento de uma hora extraordinária por dia, incluídos os reflexos.
Procede o inconformismo do reclamante, visto que a conclusão alcançada no acórdão recorrido diverge do posicionamento consolidado nesta Corte, merecendo reforma.
Com espeque no art. 896, "a", da CLT, conheço do recurso de revista, por contrariedade à Orientação Jurisprudencial no 307 da SBDI-1 do TST, atual Súmula nº 437, I, do TST.
2 – MÉRITO
2.1 - INTERVALO INTRAJORNADA – REDUÇÃO – PAGAMENTO TOTAL DO PERÍODO – HORAS EXTRAORDINÁRIAS
Em face dos motivos expostos acima e em razão da contrariedade por contrariedade à Orientação Jurisprudencial nº 307 da SBDI-1 do TST, atual Súmula nº 437, I, do TST, dou provimento ao recurso de revista para determinar o pagamento do tempo total de intervalo intrajornada mínimo, referente a todo o período imprescrito, com adicional de 50%, com reflexos em férias, 13º salário, FGTS, aviso-prévio e DSR, conforme se apurar em execução, devendo, ainda, ser excluídos dos cálculos os dias em que o reclamante não trabalhou, férias, faltas e licenças. Acresço ao valor provisório da condenação a quantia de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) e majoro as custas processuais em R$ 100,00 (cem reais).
ISTO POSTO
ACORDAM os Ministros da 7ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer do recurso de revista da reclamada, quanto ao tema "Empregado de Cooperativa de Crédito - Equiparação a Bancário", por contrariedade à Orientação Jurisprudencial nº 379 da SBDI-1 do TST, e, no mérito, dar-lhe provimento para fixar a jornada laboral diária do autor em oito horas e afastar a condenação ao pagamento, como extraordinárias, das 7ª e 8ª horas trabalhadas e seus reflexos. Por unanimidade, dar conhecimento ao recurso de revista do reclamante, quanto ao tema "Intervalo Intrajornada – Concessão Parcial - Pagamento Total", por contrariedade à Orientação Jurisprudencial nº 307 da SBDI-1 do TST, atual Súmula nº 437, I, do TST, e, no mérito, dar-lhe provimento para determinar o pagamento do tempo total de intervalo intrajornada mínimo, referente a todo o período imprescrito, com adicional de 50%, com reflexos em férias, 13º salário, FGTS, aviso-prévio e DSR, conforme se apurar em execução, devendo, ainda, ser excluídos dos cálculos os dias em que o reclamante não trabalhou, férias, faltas e licenças. Acresço ao valor provisório da condenação a quantia de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) e majoro as custas processuais em R$ 100,00 (cem reais).
Brasília, 25 de Fevereiro de 2014.
Firmado por Assinatura Eletrônica (Lei nº 11.419/2006)
Ministro Vieira de Mello Filho
Relator